Capítulo 17 – A Incursão do Elfo Negro
GolbZedh caminhava de volta para casa, o som abafado de seus passos sobre a trilha de terra misturado ao farfalhar distante das folhas. O vilarejo de Biel ficava a vinte minutos dali, e a rotina o ensinara a carregar as compras do dia de maneira equilibrada, sempre atento ao entorno. Afinal, morar afastado significava segurança, mas não ausência de riscos.
Ao chegar, viu a porta fechada. Nada fora do comum, embora estivesse carregando legumes e ervas em uma mochila de pano e esperasse que Tiko já tivesse se levantado. Usando o cotovelo, ele bateu na porta com firmeza.
Esperou. Nada.
Bateu outra vez, dessa vez com mais força. O som reverberou pela madeira.
— Garoto! — gritou, tentando soar paciente, mas já com uma pitada de irritação.
Nada.
— Mas o que… Será que ainda tá dormindo? — murmurou entre dentes, sentindo o calor da raiva começar a subir.
Equilibrando as compras com uma mão, ele girou a maçaneta e empurrou a porta com o pé, deixando-a abrir enquanto se ajustava novamente para segurar tudo. Entrou em casa e, ao colocar os legumes sobre a mesa da cozinha, o silêncio se instalou de forma pesada.
— O garoto! Vem me ajudar a separar isso! — gritou em direção ao quarto do garoto.
Nenhuma resposta.
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GolbZedh suspirou, esfregando os olhos com os dedos. Gritar na própria casa não era a coisa mais educada a se fazer, mas o isolamento da cabana garantia esse luxo. Mesmo assim, o silêncio continuava a incomodá-lo.
Com passos decididos, ele foi até o quarto de Tiko. O garoto sempre seguia uma rotina rígida: exercícios até o limite ou um rápido aquecimento antes de sair para caçar. Mas aquele não era um dia de caça, e eles ainda tinham carne da última vez.
Ao abrir a porta do quarto, GolbZedh esperava encontrar Tiko esparramado na cama. Mas o quarto estava vazio.
Vazio demais.
Seu peito começou a apertar, um incômodo crescendo no fundo da mente. Ele entrou e olhou ao redor, esperando alguma explicação óbvia. A cama estava arrumada, mas o baú…
GolbZedh abriu o baú de roupas com uma rapidez que traiu sua preocupação crescente. O espaço estava vazio. Nem as roupas, nem a velha espada estavam lá.
— Só pode tá brincando comigo…
Seus olhos varreram o quarto uma última vez antes de um pensamento aterrador surgir. Ele virou e quase correu até seu próprio quarto. Se Tiko tivesse saído, talvez fosse por algo urgente. Mas quando abriu seu próprio baú e viu o vazio onde a máscara deveria estar, a situação começou a se encaixar, e a sensação de mau presságio se solidificou.
A máscara. Aquela que comprara no festival da lua cheia anos atrás, ainda jovem e tolo o suficiente para participar das festividades.
Decorada com detalhes cuidadosos, era uma peça com o encantamento “Modificador Sonoro” embutido — uma peculiaridade que distorcia a voz do usuário, alterando-a completamente. Uma ferramenta perfeita para quem quisesse esconder sua identidade.
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E agora estava desaparecida.
GolbZedh fechou os olhos e respirou fundo, mas o ar parecia preso nos pulmões. Ele sabia o que aquilo significava.
— Ele foi…
A ideia era clara e terrível. Tiko, procurado em todo o reino, havia cometido a imprudência que sempre evitara. Ele tinha ido a uma cidade. Uma cidade de elfos.
⧫⧫⧫
Tiko despertou antes do sol nascer, movendo-se com a leveza de um gato pelas tábuas rangentes da velha casa. Ele abriu a porta do quarto de Golbzedh sem ruído, puxando do baú a máscara com cuidado, como se cada movimento fosse um crime em si.
Ele sabia exatamente o que aquilo significava: perigo, para ele e para o homem que havia o acolhido. Mas o caminho que escolheu exigia sacrifícios — até mesmo o sacrifício da confiança de quem o ajudou.
A máscara não era comum. Golbzedh mencionara, de forma quase casual, que ela havia sido comprada em um festival da lua cheia, quando a ideia de anonimato era parte da diversão.
A peça, porém, era mais do que uma simples relíquia de celebração; possuía um encantamento embutido, capaz de distorcer a voz de quem a usasse. Tiko precisava dela. E agora, mais do que nunca, precisava estar irreconhecível.
Ele havia crescido nas ruas movimentadas de Perestória, a grandiosa cidade dos elfos, então sabia muito bem onde procurar o que precisava. E o que precisava agora era dinheiro. Algo para financiar sua busca. Algo para seguir o rastro dos assassinos de seus pais.
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Algo que custaria o único bem de valor que havia conseguido salvar daquela tragédia: um colar com uma pedra azul reluzente, parte da coleção de joias de sua mãe.
Sabia o risco que corria. Perestória não era um lugar para andar despreocupado, especialmente para alguém com seu rosto estampado em cartazes de procurado.
Ele havia memorizado as lojas de penhor da cidade, catalogando mentalmente quais eram mais seguras e quais poderiam ser armadilhas. Se alguém reconhecesse o colar — se, por azar, ele acabasse na mesma loja onde sua mãe o comprara anos atrás — as coisas poderiam dar muito errado.
Os lojistas de Perestória eram astutos, e ele não precisava de muito para imaginar a suspeita que cairia sobre um estranho mascarado tentando vender um item de tanto valor.
Ainda assim, ele não tinha escolha. O colar poderia valer entre 20 e 30 moedas de ouro, e essa quantia era mais do que suficiente para seus próximos passos. Uma única moeda sustentava uma família comum por semanas; com trinta, ele teria margem para comprar informações — e informações eram tudo o que ele precisava agora.
Enquanto colocava a máscara no rosto e ajustava o capuz para cobrir seus cabelos, repetiu para si mesmo: “Só não entre na loja favorita dela.” Ele sabia qual era.
Por mais que sua mãe adorasse variar, sempre retornava àquela, a preferida. Se ele entrasse lá, correria o risco de ser reconhecido não apenas pelo item, mas também por tudo o que ele representava.
Ele sabia que evitar aquela loja em particular era essencial. A chance de o colar ter sido comprado ali era grande, e com isso, o risco de ser identificado era ainda maior. Antes de seguir para Perestória, decidiu passar por um vilarejo próximo.
Dois deles estavam a uma distância viável, mas Tiko escolheu o menor. Um lugar discreto, onde esperava passar despercebido. Embora sua vestimenta o tornasse tudo, menos isso.
Coberto da cabeça aos pés, ele parecia mais um vulto do que uma pessoa. As roupas usuais de treino — calça e blusa de linho gastas — eram agora sobrepostas por um manto negro pesado, com um capuz largo que ocultava a cor de seus cabelos.
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A máscara branca roubada de Golbzedh completava o conjunto. Os detalhes ondulados em azul em cada lado, embora ornamentais, davam a ela um ar de mistério. Mas o que deveria servir de camuflagem parecia gritar intenções duvidosas para qualquer olhar atento.
Tiko não podia deixar que vissem sua pele, tampouco seu cabelo. Um elfo negro era uma raridade entre os elfos da alta sociedade, e embora sua presença não fosse explicitamente proibida, seria o suficiente para atrair olhares longos e desconfiados. Pior, poderia provocar perguntas que ele não estava pronto para responder.
Então, mesmo enquanto o calor parecia sufocá-lo debaixo do manto pesado, ele se obrigava a aguentar. Cada gota de suor era um preço pequeno a pagar pela discrição.
Ele seguiu pela floresta, recusando-se a tomar o caminho aberto da estrada de terra. Qualquer um que o visse antes mesmo de alcançar Perestória poderia espalhar a notícia, e isso era algo que ele não podia arriscar.
Ao chegar às margens do vilarejo menor, agachou-se atrás de uma árvore. A sombra era um alívio temporário contra o calor, mas o desconforto o acompanhava enquanto esperava.
O tempo se arrastava. Horas se passaram. O sol queimava cada vez mais forte, e o manto parecia pesar o dobro. Tiko quase pensou em desistir e arriscar uma entrada furtiva no vilarejo, mas então, ouviu o ranger das rodas de uma carruagem. Finalmente, o transporte público estava saindo do portão do vilarejo.
Ele sabia, por conversas com Golbzedh, que o governo elfo havia posicionado cavaleiros em vilarejos como aquele. Isso significava apenas mais olhos atentos e mais perguntas indesejadas. Vestido como estava, sua entrada seria tão chamativa quanto um sino em uma igreja silenciosa. Ele seria notado. Pior, seria seguido.
Então, optou pela alternativa mais segura. Em vez de se arriscar a entrar no vilarejo, aguardaria que a carruagem saísse e pegaria carona. Assim, poderia chegar a Perestória sem chamar a atenção indesejada de guardas ou lojistas.
O plano era arriscado, mas ele não tinha outra escolha. A única coisa mais perigosa do que seguir em frente seria parar.
Tiko correu, os pés batendo contra o chão em um ritmo frenético, até alcançar a carruagem que já fazia a curva para a estrada principal, aquela que levava às grandes cidades élficas. Ele ergueu um braço, chamando atenção do condutor, que puxou as rédeas e diminuiu o passo dos cavalos até parar por completo.
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— Pois não? — perguntou o homem, com uma expressão desconfiada.
Tiko sentiu o peso dos olhares dos passageiros mesmo antes de entrar. A máscara que usava, ao menos, era um trunfo. O encantamento embutido nela alterava sua voz, distorcendo-a o suficiente para garantir que ninguém pudesse reconhecê-lo apenas por ouvir.
— Quase perdi a partida — disse, em um tom que tentava soar casual, apesar de sua postura apressada. — Quero uma passagem para a próxima cidade.
O condutor o observou por um instante, o olhar deslizando sobre suas roupas pesadas e o manto negro. Com o calor que fazia, aquilo era, no mínimo, estranho. Mas, para sua sorte, o homem parecia mais interessado nas moedas do que em fazer perguntas.
— Cinco pratas — respondeu ele, estendendo a mão calejada.
Tiko assentiu, retirando as moedas do bolso e entregando-as com cuidado, como se o gesto carregasse uma negociação muito mais importante do que realmente era. Assim que o condutor se afastou, ele subiu na carruagem.
O interior era simples e apertado, com bancos de madeira dispostos em duas fileiras opostas. Quatro pessoas já estavam ali, e todas viraram a cabeça para encará-lo no instante em que ele entrou.
Tiko sentiu os olhos varrendo-o dos pés à cabeça. Ele sabia o que estavam pensando. Com o sol a pino, alguém vestido daquela maneira era, no mínimo, peculiar. Ou suspeito.
Ele cruzou o corredor estreito e se sentou no fundo, ao lado de um elfo que, embora não dissesse nada, claramente fazia um esforço para não se encostar nele. O silêncio constrangedor durou mais alguns minutos, até que a carruagem voltou a se mover.
Logo, os passageiros perderam o interesse, distraídos pelas sacudidas da estrada e pelo calor abafado que tornava o ambiente quase insuportável. Tiko, por sua vez, ajustou o capuz e inclinou a cabeça, fingindo descansar enquanto tentava se misturar.
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O balanço ritmado da carruagem o acompanhava enquanto o caminho para sua cidade natal se desenrolava diante dele.
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