1.

    “Bom… Gostaria de começar o dia bem. Mas parece que é mais difícil do que pensei. Esse gosto doce e enjoativo continua na minha boca… Felizmente a minha cabeça parou de doer. As alucinações também diminuíram.

    Deitar me fez bem… Afinal, existem coisas bonitas em meio a essa desordem. Pássaros. Voando acima de mim. Eles devem estar bem felizes…”, pensou erguendo a mão, só para checar se o corpo respondia. 

    Fios negros com reflexos vermelhos se espalhavam na grama, como se a prendessem. 

    Pelas folhas, o sol vazava em lanças pequenas, acendendo o brilho castanho-rubro em seus olhos.

    “Falar sozinha em pensamento parece loucura… Mas me deixa lúcida. Uma enorme ironia…”, a palma se fechou contra o chão, tentando se ancorar, o vento lhe trazia um frescor gelado, por um instante ela quis acreditar que estava num jardim. Rainha de nada, princesa sem súditos.

    Até que o instante rachou.

    — Ei, não tá me escutando? — irrompendo o presente momento, uma voz conhecida.

    Ela piscou. E ele estava ali: um reflexo distorcido dela mesma, exibindo seus seis olhos escarlates. Igual, mas monstruosa, não riu, não falou, só fitou. Outro piscar, e o nada: nunca existiu.

    Isso não vai acabar tão cedo…”

    O ar ficou pesado e então a menina dos olhos de ágata decidiu, finalmente, voltar a sua atenção para a voz que incursionou sua paz.

    Ela vinha de uma mulher alta, com cicatrizes que percorriam do seu rosto até o seu pescoço, cabelos lisos e pretos, pele queimada. Também carregava uma mochila, aparentemente com alguns mantimentos.

    — Parece estar melhor, veste seu robe e vamo — ordenou a mulher, guardando um trambolho em seu coldre.

    — Preciso mesmo usar isso? perguntou, enquanto se sentava e agarrava o pedaço de pano.

    — Precisa.

    — Não vai me dizer por quê?

    — Aprendeu a falar e gostou de fazer perguntas?

    — Ah, eu só…

    — …? — encarou-a com curiosidade.

    — Nada… desistiu, por não querer estragar o sentimento bom.

    — Hm, vem, não tem tempo.

    A garota levantou-se. Sacudiu a terra das roupas, puxou o manto pesado sobre os ombros e seguiu-a, um passo atrás.

    — Qual era o seu nome mesmo?

    — É… ainda não consigo me lembrar, está tudo meio nublado na minha mente, eu imaginei que você teria essa informação…

    — Não, não tenho. Faz três dias, vai ser um problema continuar andar por aí desse jeito — disse pensando em voz alta, cochichando para si mesma. — Você precisa de um, como era o nome esquisitos daqueles rys?

    — Não que isso importe, podes me chamar do que lhe for mais agradável.

    — Para de falar como se fosse uma princesa, isso já está me enojando. Ah e vamos te chamar de Helena por enquanto, até você se lembrar quem é — concluiu, retornando ao seu caminhar.

    — Só porque perdi minhas memórias, não significa que me abstenho de sentimentos. Bobona, lesada, tonta, cabeça de vento. — murmurou estreitando os lábios.

    — Ahn? Disse alguma coisa?

    — Não, não, nada não.

    — Hmm, então vamos, tem marcas recentes para direção que vinhemos. Esse local parece perigoso.

    Helena deixou de lado a grosseria de sua acompanhante dessa vez e seguiu, um passo de cada vez, olhando para baixo. Um contentamento começou escalar sua face, admirando aquele pontinho verde uma última vez.

    Pisar na grama desse local era como trilhar uma maratona pelas nuvens, o desejo de seguir descalça, subiu por sua cabeça, ma—

    *crack*

    Um estalo seco.

    A sola do sapato dela havia afundando em algo úmido, partindo-o.

    Era a cabeça de um corpo, que, aparentemente, apodrecia na base daquela minúscula colina há algum tempo. Seu pequeno sorriso se desfez.

    Quando o barulho de ossos alcançou a pessoa que tomava a frente, fê-la parar e se orientar para a origem do som.

    — Você encontrou um, que sorte a sua. Avisei para prestar atenção por onde anda — disse a mulher, meio debochada.

    — Não acho que esse seja o melhor caminho… — protestou Helena, seus olhos mórbidos.

    — Não é, mas é o mais rápido e com sorte o que tem menos chance de encontrar alguém. Agora tira o pé daí — ordenou por fim.

    “Essa mulher realmente parece ter algo contra mim. Já eu, não sinto, será que… Não. Eu deveria parar. Antes que as alucinações voltem”, refletia, retirando seu pé lentamente, sua face se bagunçava a cada segundo encarando aquilo. 

    Quando ergueu o rosto, a vista se abriu: hectares de corpos expostos pelo tempo, ossos misturados a ferro retorcido, máquinas tombadas como carcaças. O pequeno monte verde que ficará para trás parecia agora uma mentira em meio ao inferno. Um inferno feito primordialmente de metal e carvão vegetal.

    2. 

    Horas se perderam.

    A estrada que seguiam possuía uma estrutura robusta e bem planejada, uma beleza perdida com o tempo. Cada passo que davam em meio aquela passagem ecoava em um tom baixo, quase imperceptível.

    Com o tempo, indícios de fumaça começaram a ser avistados, um grupo de seis pessoas que vinham à distância, em cima de um veículo de oito patas, lentamente. A mulher foi a primeira a avistar e resmungou — Não é possível… São eles.

    — Eles quem? — questionou Helena, se virando para a mesma direção da mulher.

    — O pessoal que estamos tentando evitar desde que acordou.

    — Eles estão distantes, podemos fugir ainda.

    — Não, não podemos.

    Helena colocou a mão em cima dos olhos para ampliar sua visão — Mas eles ainda estão beemmm longe — afirmou, convicta.

    A mulher se virou, ajeitou o manto de Helena, conferiu sua arma e por fim direcionou a voz para sua acompanhante — Escuta, só não fale com eles, deixa que eu resolvo e não deixa eles te verem.

    — Não entendo? Por que simplesmente não vamos para direção oposta?

    — Garota, só fica quieta e obedece. Estão a dez minutos de nós, se a gente tentar fugir estarão a um.

    — Não entendo.

    — Não precisa, eles são perigosos e perseguem rápido quem foge, se tá feliz com a informação, balança a cabeça.

    Helena assentiu mesmo estando com as sobrancelhas descompassadas. Assim seguiram.

    A fumaça expelida por aquele conglomerado de metal manchava o céu com uma cor escura. Uma mancha que chegava cada vez mais perto, o azul ia perdendo sua textura, até se tornar roxo e finalmente preto.

    Em pouco tempo, as interceptaram e pararam o aparato, uma escada foi jogada de cima daquele milagre da engenharia destrutiva, um dos soldados desceu e se pôs em frente às duas viajantes, ele era horrendo, expressava armadura.

    — Quem são vocês e para onde estão indo? — questionou enquanto os outros jogavam cartas em cima do veículo.

    — Somos de Centri, estamos apenas indo visitar familiares — a mulher respondeu com um claro desconforto.

    — Centri, é? Vocês têm coragem de sair de casa no meio dessa guerra… E esse aí do seu lado? Por que está escondido? Está contrabandeando pessoas?

    — Ah, não, não, ela é minha irmãzinha, sofre com o mal de Lime, afeto a voz dela. Ela não consegue nem gritar ajuda, quer ver a mãe uma última vez.

    — Mal de Lime… E para que cidade estão se direcionando?.

    — Lizume.

    Sua posição desconfiada logo se firmou — Polis decretou que ninguém deveria circular por essa fronteira devido à trégua após a morte do soldado do sol, deveria saber disso.

    — Saímos antes da investida começar, foi há três semanas.

    — Hmmm, ninguém deveria ter recebido permissão de deixar o país, foram pegas em meio a fogo cruzado?

    — Quase — riu nervosamente — nos escondemos em um abrigo para civis, recebi a permissão deles para continuar a jornada.

    — De que preparação?

    — Da preparação de… que inferno vocês com essas perguntas, HELENA, SE ESCONDA!

    Num movimento rápido, ela sacou a sua arma enquanto a outra mão buscava a granada presa ao cinto. O pino grudou no meio de seus dentes, e a granada girou em um arco perfeito, antes de aterrissar entre os soldados em cima do veículo.

    O estrondo seguinte despedaçou a calma da estrada. Pólvora, metal e carne se misturaram em uma explosão ensurdecedora.

    Três soldados foram dilacerados instantaneamente. Entretanto, os outros reagiram rápido, pulando assim que escutaram o zumbido da granada aterrissando.

    De súbito, tiros cortaram o ar.

    A mulher de cabelos negros sentiu o impacto de uma bala atingir de raspão o seu braço esquerdo. Um calor abrasador tomou conta do ferimento, mas ela não tinha tempo para reagir à dor. Por isso, jogou-se atrás de um dos destroços do veículo de metal pré-existente, engatilhando a sua arma com uma expressão feroz.

    Já Helena tropeçou para trás quando um dos soldados a mirou. Um disparo passou rente ao seu rosto, arrancando o capuz e expondo seu rosto. O choque veio na hora, como se já a conhecesse, ele começou a gritar: — Simetra! É a Simetra!

    Mais tiros varreram a estrada.

    Aproveitando a distração, a protetora de Helena ergueu a cabeça por trás da cobertura. Três alvos, calculou a distância e disparou.

    O primeiro tiro atingiu em cheio a cabeça de um dos inimigos e o corpo tombou sem vida.

    Restavam dois.

    Após matar o primeiro, a mulher deslizou pelo chão, aproveitando os destroços como cobertura, disparando novamente. 

    O segundo soldado caiu com um buraco perfurando sua têmpora.

    Restava apenas um.

    “Onde ele está?”, se perguntou. Cruzando sua visão para todos os lados, mas sem sucesso em sua procura, “Ele se escondeu?”, outra pergunta. Foi quando o choque finalmente veio: “Onde está Helena?”, o desespero tomou conta logo em seguida: — Merda! Inferno! Helenaaa! — Gritou correndo em sua procura.

    Após ser alvejada, Helena se enfiou em meio a relva alta, corria, o máximo que conseguia, ainda havia algo atrás de si? Não tinha como saber.

    Seus pulmões queimavam, e o seu coração pulsava em sua garganta, desesperada como uma coelhinha prestes a ser abatida.

    Sua mente se cansou em ansiedade até enfim observar um soldado, daqueles do veículo de oito patas, com somente sua parte de cima do corpo, derramando os resquícios de sua essência pelo solo. 

    Seus dedos tremiam, e então, em um movimento rápido, agarrou a arma que acompanhava o defunto, pesada e fria. 

    Uma nostalgia bizarra lhe revisitou, como se ela já tivesse feito isso milhares de vezes, centenas? Milhões.

    Um, dois, quatro, seis, sua fuga continuava, seu órgão pulsante subia em cada tropeço.

    *crack*

    *fush*

     *crack*

    “Tem realmente alguém?”, assustou-se com os barulhos dos galhos se quebrando e a grama alta se mexendo.

    Passos. Muitos mais. Um, dois, três, quatro, quem a perseguia era rápido, mas o seu fôlego já estava arrastado.

    Helena podia sentir seu peso, seus passos pesados esmagando tudo que encontrava pela frente.

    Precisava fazer algo urgente, ele estava chegando, cada vez mais perto.

    Os tropeços se somavam, os galhos estalavam, o peso do perseguidor ganhava chão, atos falhos se acumulavam.

    Foi quando o último passo foi dado.

    Helena parou. Decidida a enfrentar seu destino, girou por de trás de uma árvore que a muito tempo perderá sua cor. 

    Seu perseguidor havia perdido seu rastro por um instante.

    Esse instante foi o suficiente.

    De repente ambos estavam frente a frente.

    Os olhos de Helena se encontraram com os do soldado que a estava perseguindo. Ele não teve tempo de reagir: suas mãos tremeram, os seus músculos se enrijeceram.

    E nesse instante o gatilho foi puxado.

    O disparo rasgou o vale.

    O mundo pareceu parar. Apenas o cheiro de pólvora e o eco metálico persistiam no ar.

    *BANG!*

    Recuou um passo, depois outro. Seus lábios se entreabriram e um filete de sangue escorreu por seu queixo. Lágrimas começaram a descer por todo seu rosto, algo tentava sair por sua boca, mas apenas um gorgolejo escapou.

    — Si… me…

    Seu corpo, enfim, caiu sem vida.

    Helena permaneceu ali, imóvel, com seu rosto maculado pelo sangue de um outro alguém. Apenas encarando o corpo.

    Oque sentia não era medo. Não era nojo. Era… familiar.

    [Um frio correu por sua espinha. E uma voz surgiu atrás de si, sorrindo: “Parabéns. Você conseguiu.”]

    Era novamente aquele ser, o eco.

    — Sim… — expressou Helena, com o ar irregular.

    [“Se sente melhor?”, Disse à criatura, se aproximando e se ajoelhando em frente ao corpo morto.]

    — É estranho…

    [Ela arqueou os lábios, “Sempre é na primeira vez, mas essa não parece ser a sua.”]

    “Não… é…? Eu não sei…”, refletiu internamente.

    Helena encarou suas mãos, elas ainda estavam segurando aquele presente da morte, aquele gosto voltou a impregnar sua boca, agora dez vezes pior, o sabor foi lentamente se intensificando, até finalmente se tornar amargo, insuportável.

    E então algo deslizou na frente de Helena e apalpou seu rosto, era a mulher — Helena, você está bem? Está machucada? — Perguntou em pânico, enquanto procurava algum ferimento.

    Helena piscou e a criatura sumiu, como se despertasse de um transe.

    — Hm?

    — Ferida? — perguntou novamente.

    — Não estou…

    Ela respirou fundo em alívio — Ufffff — em seguida pegou a arma da mão dela e jogou para longe — Foi erro meu, vamos. — Finalizou, se levantando e voltando para o caminho.

    Mesmo após ela tirar a arma das mãos de Helena, a menina continuou a observar o nada por um tempo.

    Seu corpo não obedecia, e sua mente girava em um turbilhão impossível de controlar.

    O vazio agora parecia uma dádiva.

    A mulher percebeu que sua companheira de caminhada havia virado uma estátua — Helena? — perguntou.

    As duas ficaram ali, paradas.

    Até finalmente as pernas de Helena voltarem a obedecê-la — Perdão… eu já estou indo…

    E elas se foram, deixando mais um pedaço de destruição naquela terra arrasada.

    3.

    Dois dias se passaram e as duas seguiram seu caminho.

    Nesses dias à protetora de Helena percebeu que ela não estava falando tanto como o habitual, nada para ser mais específico. Nenhuma palavra sequer, a mulher imaginou que talvez o último acontecimento tenha realmente mexido com ela.

    — Hele—

    — Que—

    As duas falaram ao mesmo tempo.

    — Oque iria dizer Helena? — perguntou a mulher após alguns instantes.

    — Ah, não era nada de mais —  Helena hesitou, a voz baixa, relutante. — É que… Por que está tudo destruído? Tudo isso, creio que eu deveria saber antes, mas agora sem memórias, eu estou perdida, em todos os sentidos.

    Suspirou fundo antes de responder — Se está perguntando isso pela Simetra…

    — Não! Não… Quer dizer, também, mas não por literalmente isso, é por tudo, sabe? Todo o resto.

    A mulher a observou por um momento, “Não é por ela ter matado alguém?”, pensou, mas mesmo assim tentou sanar as dúvidas proferidas anteriormente — Não houve um motivo, apenas uma guerra sem sentido.

    Helena se aproximou em dúvida. — Há milhares de cadáveres espalhados por todos os lados, tudo isso por nada?

    — Não foi exatamente por nada, mas a razão nunca fez sentido — ela parou, chutou uma pedra que atravessou o caminho e se segurando profundamente antes de continuar.

    — Quem começa essas guerras são homens idiotas — sua voz carregava desprezo. — Eles querem mais que seus vizinhos. Pedras, terras e mulheres. Mas nunca é o suficiente.

    Ela cerrou os punhos — E por esse fato eles mandam soldados morrer no lugar deles, só para conquistar o que nunca conseguiriam sozinhos.

    À medida que falava, a mulher se irritava. Seus gestos se tornaram bruscos, descontando em pedras e raízes pelo caminho, como se cada objeto fosse cúmplice dessa miséria.

    Helena a olhava atônita, nunca a viu assim, quase descontrolada, e justamente por isso a cena ganhou um tom cômico. Ela tentou se segurar, mas a tenção dos últimos dias espalhou na forma de um impulso incontrolável, e ela riu, muito, tanto que parte de seu manto caiu.

    — Qual é a graça? — perguntou a oradora enquanto parava de andar também.

    — É só… engraçado ver esse lado seu. Sempre tão séria, achei até que me odiava, mas te ver assim… — disse Helena, ainda rindo entre soluços.

    — Aí aí aí, não, eu não te odeio, e me chame de Alice, não de senhora.

    Helena continuou rindo um pouco mais, demorou até conseguir se recompor, enquanto enxugava suas lágrimas, Alice se aproximou e puxou sua túnica para cima, escondendo seu rosto novamente — Vai ser um problema se verem seu rosto, cuidado para não deixar seu capuz cair.

    — Me perdoe, não consegui me controlar.

    — E sobre o que aconteceu dois dias atrás…

    Antes de Alice terminar, Helena tomou a frente — Está tudo bem, Alice, nós não tivemos escolha.

    Alice deixou o ar suspenso por alguns instantes, observando Helena caminhar despreocupada à sua frente. A lembrança do disparo, o sangue e o olhar vazio da garota ainda pesavam em sua mente, Será que ela realmente está bem?”, refletiu.

    — Helena! — chamou, quase sem perceber.

    A jovem parou e virou-se, exibindo um pequeno sorriso cansado.

    — Sim, Alice?

    Alice hesitou, muitas perguntas lhe queimavam a garganta, mas no fim, apenas suspirou — Não é nada… só coisa da minha cabeça. Esse assunto me desgasta — desviou seu foco. — Vamos seguir.

    — Sim, senh- digo, Alice! Aliás, o que vamos comer hoje?

    Alice retraiu diante da mudança repentina de assunto — Sem gracinha, não somos amigas.

    — Ahhh, como pode dizer isso? — retrucou fazendo bico.

    — Muita fala e pouco movimento das pernas.

    Dessa vez, a calmaria não veio seco; ficou no ar como uma trégua, um intervalo em que cada uma mergulhou em seus próprios pensamentos. Helena pareceu chateada, mas logo encontrou outro jeito de se distrair, deixando a tensão se dissolver pouco a pouco no caminho.

    Algumas horas se passaram antes de Alice parar, jogar a sua bolsa no chão e começar a preparar o lugar 

    — Vamos acampar aqui, já está tarde. Pega as geringonças na mochila e arruma o lugar para dormir, tem um rio perto, então eu vou lá pegar água — disse, andando em direção aos arbustos.

    — Tudo bem, farei isso! — respondeu, ajoelhando-se junto à mochila. Seus dedos mergulharam entre os objetos até encontrar o que precisava.

    Primeiro vieram os sacos de dormir, ásperos como lona. Antes de estendê-los, Helena arrancou tufos de mato e varreu o chão com as próprias mãos, como se quisesse expulsar dali qualquer pensamento incômodo. Alinhou os sacos com um zelo exagerado, mais para ocupar a mente do que por real necessidade.

    No centro, começou a juntar alguns galhos caídos. Não foi difícil, a floresta oferecia o que precisava. Um a um, ela carregou pedaços de madeira até formar uma pequena fogueira improvisada.

    Ainda assim, algo parecia incompleto. Helena tamborilou os dedos no queixo, pensativa, até que a ideia surgiu como um estalo: arrastou com esforço um tronco pesado para perto do fogo, seria o banco perfeito. Quando as chamas finalmente se ergueram, ela se sentou, respirando fundo, como se tivesse erguido um lar inteiro em poucos minutos.

    — Muito bem — disse uma voz, surgindo da escuridão.

    Helena inclinou a sua cabeça, tentando mirar o que havia atrás de si. Para seu alívio, era apenas Alice, que colocou a panela em cima do fogo e prosseguiu falando: — Vou fazer alguns vegetais para comer, a gente tá perto da cidade.

    — Sim, senh- sim, Alice. Ah, e eu esqueci de lhe dizer, mas agradeço muito por tomar conta de mim. Sei que não gosta da maneira que falo e, sobre isso, tentarei melhorar — pronunciou com uma expressão meiga.

    Alice olhou para Helena e balançou a cabeça com um breve silêncio. Nem ela sabia o que isso significava.

    Uma pena que essa paz não durou muito.

    O dia chegou ao seu término de maneira caótica. Aquela velha história de gato e rato. Por sorte ninguém foi jogado ao fogo, pelo menos não nesta noite.

    Uma penumbra que para qualquer espectador poderia ser descrita como intrigante.

    Noite estrelada, fim de um dia.

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