— Se apresse! — dizia Slezzy, subindo pelas escadas do Hospital de Western.

    Roy o seguia em rápida velocidade. Ele o havia trazido no hospital, para que visitassem Sanches.

    — Você está tão ansioso assim para reencontrar aquele homem!? Você sabe que esse lugar tem elevador, não é? — indagou o Capitão enquanto subia as escadas, logo atrás do jovem.

    Slezzy ignorou aquela fala, acelerando cada vez mais os seus passos em direção ao quarto de Sanches.

    Era a terceira vez que Slezzy visitava o agente desde o dia do grande assalto ao Banco Central. Mas agora, ele poderia finalmente conversar com seu velho amigo, apesar de tê-lo conhecido a pouco tempo.

    Chegando próximo ao quarto, Roy e Slezzy se depararam com um doutor saindo da porta do mesmo. O mesmo doutor de todas as outras vezes.

    — Vocês devem ser os visitantes… que Sanches tanto estava esperando! — disse o doutor, sorridente. Ele havia deixado a porta do quarto aberta.

    — Como ele está, doutor!? — perguntou Slezzy, eufórico.

    — Ah! Foi tudo uma grande surpresa! Esperávamos que ele fosse acordar só daqui a um ou dois meses. Além disso, segundo os exames que realizamos ontem, todo o seu corpo está perfeito! Até mesmo as regiões das perfurações!

    — Quando ele será liberado? — perguntou o Capitão.

    — Presumo que… dentro de três ou quatro dias. Mas ele não poderá exercer as mesmas atividades policiais dentro dos próximos vinte dias! A fim de que a sua recuperação seja a mais eficiente possível.

    O doutor se despediu de Roy e Slezzy, caminhando para o fim do corredor, em direção a outro quarto daquela ala.

    Slezzy encarou o Capitão por alguns segundos.

    Eles estavam animados com aquele acontecimento repentino.

    Foi então que Slezzy decidiu dar seus primeiros passos até o quarto de Sanches. Seus pés estavam um pouco trêmulos e sua mão congelada.

    Ao adentrar o quarto junto com Roy, Slezzy se deparou com Sanches, que ainda se encontrava deitado naquela cama.

    O quarto estava bem iluminado, devido aos raios solares que invadiam a grande janela da varanda.

    Aquele agente vestia um pijama branco e cheio de bolinhas pretas.

    Slezzy abriu um grande sorriso no rosto, enquanto Sanches o encarava com uma expressão estranha.

    Se aproximando, o jovem iniciou sua fala:

    — San…!

    — Você assinou… não foi!? — falou Sanches, seriamente, interrompendo a fala do garoto.

    Slezzy ficou extremamente chocado no segundo posterior àquela fala.

    Os Irmãos Sam, que estavam logo atrás, passaram a encarar Sanches, fascinados.

    O garoto havia se travado; era como se um grande balde d´água fria tivesse caído em sua cabeça naquele momento. Seu rosto estava pálido.

    — Do que você… — O garoto tentou se expressar, mas foi interrompido outra vez.

    — Eu sei que você assinou um Contrato Preambular, garoto! Eu consigo vê-los atrás de você!

    Todo o seu corpo se congelou. Ele rangia seus dentes mediante toda a confusão causada em sua mente, enquanto ouvia algumas risadas dos Irmãos Sam.

       “Não, isso não pode estar acontecendo. Durante todo esse tempo, você também era um mentoreado? O que? Você sabia também de toda a existência desse mundo sombrio? Espera… como você consegue enxergar os meus demônios!?”

    Sanches se levantou da cama. E logo depois, caminhou até Slezzy, em pequenas passadas, descalço.

    Roy fechou a porta daquele quarto, trancando-a. Porém, o jovem nem ao menos escutou o barulho da mesma se fechando, já que estava completamente abalado e concentrado no andar de Sanches. Este que logo o confrontou:

    — As coisas não são mais como antes. E pelo visto, eu estava certo no dia em que te ofereci aquela chance. Pra ser sincero, não esperava tudo isso… Slezzy Kaliman — Sanches ficou frente a frente com o garoto. — O Tenente me ligou há meia hora atrás. Ele me atualizou sobre tudo.

    Sanches estava irreconhecível perante o olhar de Slezzy.

    Aquele não era o mesmo agente divertido e sarcástico que havia conhecido.

    — Ah! Soube que você foi responsável pela criação da Operação Caos! Que grande iniciativa, garoto! Fiquei impressionado!

    — Então… suponho que você tenha pensando em tudo, Sanches — comentou o Capitão.

    O Agente deixou de encarar o garoto, e caminhou até a vista da janela do quarto, próximo à varanda.

    — No dia em que te conheci, Slezzy… eu sempre soube que tudo estava prestes a mudar a partir dali…

    — Hum!? — O garoto, perplexo, encarou seu parceiro, que estava de costas para si.

    — Nunca… em mais de dez anos de trabalho para o NCC, eu havia retirado um secretário daquelas cadeiras para levá-lo às ruas de Maple. Mas, graças aos efeitos da minha Gankkai, pude enxergar algo em você, naquele dia… algo que nunca… tinha visto em outro humano.

    — Efeitos? — perguntou Slezzy, ainda trêmulo.

    — A partir do momento em que sua Gankkai é ativada, essa pequenina célula do seu corpo pode causar alguns efeitos colaterais; estes, em sua maioria, não são nada comuns aos seres humanos. E isso pode variar com o perfil de seu demônio. No mundo sombrio… todos chamam cada um desses efeitos… de “sonogamia”.

    — Que sem graça, Agente Sanches! Por que não deixa que o garoto descubra por si só? — indagou Haram, sorridente.

    Sanches ignorou o comentário daquele demônio, ainda observando a vista.

    — Você assinou o Contrato Preambular com um dos piores demônios do nosso mundo, Slezzy. Os Irmãos Sam. Eles procuram apenas os seres humanos com o maior potencial, e que também são desejados pela maioria dos outros. Além disso, a única que os satisfazem é matança e excesso de poder.

    — O que? Está dizendo que outros demônios… me desejavam!?

    Sanches se virou, com o braço sobre a janela aberta, encarando o Capitão e o garoto:

    — A minha sonogamia… me permite visualizar qualquer demônio, mesmo que ele esteja em sua forma espiritual. Sendo assim, no dia em que te vi, garoto… na sala de reunião do NCC… você não estava sozinho!

    Slezzy permaneceu calado, enquanto Sanches concluiu:

    — Na verdade… havia um cerco de quase dez demônios a sua volta. Bem ali. Então, eu percebi que deveria lhe conhecer melhor; e também saber o motivo de tanto interesse daquelas criaturas, que brigavam entre si. Já que… cedo ou mais tarde… você com certeza seria apresentado a uma delas.

    — Então… Por isso… você me escolheu naquele dia…

    Ignorando aquele assunto, o Capitão, ainda atrás do garoto, lhe indagou:

    — Você notou alguma mudança no seu corpo? Sabe… alguma mudança física ou mental… desde o dia em que assinou o seu contrato?

    — Ultimamente… tenho tido vários sonhos com o meu passado…

    — Todos os nossos mentoreados anteriores relataram isso — falou Haram. — Esses possíveis efeitos, variam de acordo com o demônio de cada mentoreado.

    Hiram completou:

    — Ou seja… a habilidade de Sanches, por exemplo, provém de seu respectivo demônio, Rayrack. Aliás, por que não o mostra… ao garoto?

    — O demônio… de Sanches? — perguntou Slezzy com um tom medroso.

    Sanches saiu de perto daquela janela, se aproximando dos demônios de Slezzy, enquanto dizia;

    — Slezzy, por acaso você se lembra do nome “Parim” …assinado em alguma parte do seu contrato?

    Os Irmãos Sam demonstraram um certo desconforto após aquela pergunta.

    A cena do dia em que Slezzy assinara o Contrato Preambular, passou por sua cabeça, em um único frame:

    O barulho do cair dos raios naquela noite; a visão sobre aqueles nomes presentes no contrato; os Irmãos Sam diante de si.

    Tudo bem ali, no topo daquele mesmo hospital, há algumas semanas atrás.

    — Sim… eu me lembro. Havia um nome “Parim” — respondeu, confuso.

    — Acho que você não se noticiou apropriadamente na época, já que estava bem ocupado com o treinamento. Mas… você se lembra do sequestro na rua Dominic?

    — Como eu poderia esquecer? — falou Slezzy, agora sorridente.

    — O nome daquele sequestrador era Parim Nurgal. Os Irmãos Sam causaram tudo aquilo. Aquele homem ficou literalmente louco. Foi constatado na autópsia de seu corpo, na época, a presença de mais de vinte comprimidos de antipsicóticos. Já que ele não havia suportado toda a insanidade desses demônios.

    Slezzy se alarmou com aquela revelação, desviando seus olhares lentamente para as criaturas atrás de si.

       “Vocês… me escolheram naquele dia… Quando o sequestrador foi baleado pelo tiro de Saith… Hiram já tinha decidido qual seria seu próximo mentoreado…!”

    Ah… Droga… Se eu não tivesse saído nas ruas aquele dia… Talvez eu não me meteria nisso… Não… assim como Sanches disse, isso aconteceria… mais cedo ou mais tarde…”

       Slezzy fechou suas mãos com uma extrema força.

       “Agora não tem como voltar atrás. Preciso seguir adiante!”

    — Terminaram o papinho explicativo? Han… não sei se estão lembrados, mas agora… estamos enfrentando uma corrida contra o tempo!

    — Você tem razão, Roy. Eu preciso me organizar, já que planejo voltar as ruas daqui a três dias, para auxiliar na Operação Caos! — respondeu Sanches.

    O clima daquele quarto parecia ter se equilibrado.

    — O que? Você sabe que a ordem médica… é que você cumpra pelo menos um período de vinte dias de descanso, não sabe!?

    — Assim como disseram que eu me recuperaria daqui dois ou três meses!? Esses doutores não sabem de nada!

    Roy se aproximou de Sanches, ficando cara a cara com o agente.

    Slezzy apenas observava aquela situação.

    — Você pode até ser um mentoreado…, mas ainda assim é um ser humano, Sanches! Além disso, ainda não tomamos sequer metade de cada região. Mesmo que retornasse às ruas, não conseguiria tomar sequer uma dessas áreas, dentro do prazo de trinta a quarenta dias. Seria um fracasso total! Depois, seguido de um forte contra-ataque desses mafiosos, que estariam fortemente armados.

    Sanches soltou uma leve risada, perguntando:

    — Você tem uma ideia melhor?

    — Para falar a verdade, eu tenho! — respondeu o Capitão. — Na minha visão, nossa única e melhor opção do momento… é a mais arriscada!

    — Hum!?

    — Vamos treinar todos os mentoreados e melhores agentes que estão do nosso lado; enquanto tentamos arrancar qualquer informação do mafioso capturado.

    Sanches soltou outra risada na cara do Capitão, pedindo:

    — Por favor… se retire daqui com o garoto!

    Roy cruzou seus braços e o confrontou:

    — Interessante… você… sempre seguiu pelo caminho tradicional e lógico, por todos esses anos…, mas qual foi o resultado? O que você mudou nessa cidade? Além de meros bandidos mortos ou presos em seu nome!? — Sanches deu um passo à frente, acareando o Capitão com seu olhar; porém, foi impedido pelo dedo indicador do mesmo, sobre o seu peito. — A primeira vez que você decidiu tomar uma decisão arriscada, foi retirar Slezzy daquela secretaria do NCC… graças a sua sonogamia, depois de quase dez anos de serviço policial. E agora… você pode ver o resultado bem à sua frente!

    Roy retirou o dedo do peito daquele agente.

    — Pense bem… no fundo, você mesmo sabe que é uma ótima opção! Além do mais, não há outra pessoa melhor para guiar Slezzy — Roy colocou a mão sobre o ombro daquele homem, em seguida. — Ouça, eu garanto que vamos conseguir alguma informação relevante daquele mafioso. Mas vou precisar da sua ajuda! Não deixe que tudo aquilo que você começou, tenha sido em vão!

    Roy terminou sua fala, retirando a mão do ombro do agente, que estava sem palavras diante de si.

    — Vamos… Slezzy — falou Roy, se virando para a porta do quarto.

    Notando que os outros dois passaram a se encarar estranhamente, Roy decidiu intervir, antes de abandonar aquela ala hospitalar:

    — Slezzy… foi completamente humilhado no dia de ontem.  Ele enfrentou um mentoreado extremamente superior, sozinho, sem nenhuma paciência para agir com estratégia, tomado pelo seu ego e raiva do momento — Slezzy se intimidou perante aquelas palavras. — Mas, quem sabe se o garoto tivesse… um treinamento adequado, combinados com sua determinação e personalidade; talvez… pudesse consertar os seus erros e evoluir a ponto de lidar com todos os maiores líderes do crime nessa cidade, mentoreados ou não…

    Sanches, de forma séria, firmou seus olhares sobre o Capitão, que logo concluiu:

    — Pense bem, Sanches. Você sabe muito bem o que é um talento desperdiçado!

    A seguir, o Capitão abandonou o quarto, acompanhado do garoto.

    Através de um pequeno vão daquela porta, Sanches observou a dupla que andou até o fim do corredor, desaparecendo logo depois.

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