Capítulo 75
— Eu estou com muita pressa… por favor, não me encha o saco com esses seus truques novamente…
— Vá por mim, isso pode ser crucial… — falou Hiram.
Slezzy encarava os Irmãos Sam no corredor de seu prédio, a algumas horas antes de todo o ataque terrorista provocado por Salvador e seus subordinados.
O jovem retrucou:
— Nesse exato momento, Rainn e Harvim estão correndo um risco muito grande naquela escola… então… espero que seja lá o que tenha a dizer, sirva de algo.
Hiram deu alguns passos à frente para responder o garoto. Enquanto isso, Haram passeava sobre o corredor, observando os detalhes da rua à frente a partir daquela vista avantajada; acompanhando a conversa.
— Apesar de ainda sermos novos, mediante os outros demônios… conhecemos vários membros de todas as máfias dessa cidade. Dentre eles, Salvador…
A fala daquela criatura despertou grande interesse em Slezzy.
— Não há nada registrado no Coração das Sombras que nos impeça de revelar os pontos fracos do homem mascarado. Então… talvez possamos lhe ajudar…
— Lá vamos nós de novo… O que vocês querem em troca disso? — disse Slezzy.
Hiram sorriu:
— Não estamos te pedindo nada em troca! Na verdade, estamos apenas… lhe ajudando!
— Agora vocês se importam com a minha vida, por acaso!?
Haram interrompeu seus passos sobre o corredor:
— Salvador. De recruta de um pequeno grupo de marginais até um dos líderes da Asa Negra. É um guerreiro nato e experiente. Sua noção e estratégias, quando se trata de combates, chegam a ser invejáveis.
Hiram complementou:
— Seu controle de Arché Superior é extremamente absurdo. Suas conjurações são mortais e perfeitamente executadas. Mas mesmo com tudo isso, você ainda poderá abusar de duas coisas em seu possível e eminente combate.
— Dois pontos fracos!?
— Exato. A primeira coisa pode ser óbvia e talvez você mesmo já tenha chegado a esse tipo de conclusão… — respondeu Haram. — Sempre que aquele mascarado se meter em algum tipo de luta, ele sempre optará pelo seu estilo de conforto: o combate longo e sem qualquer interrupção.
Slezzy encarou o demônio, com seriedade. Este que concluiu sua explicação:
— Já estivemos perto o suficiente perante o poder máximo daquele homem, para concluirmos que suas conjurações favorecem fortemente o seu estilo de luta. Seu combate demorado e sem nenhuma quebra de fluxo… é sua maior arma secreta; já que… curiosamente… seus poderes obscuros provindos de sua classe de magia da morte, tendem a torná-lo mais forte a cada segundo. É como um efeito de bola de neve. Levando isso em conta, o uso de granadas de fumaça e da arma de gancho pode ser essencial.
Hiram se pronunciou, agora obtendo a atenção dos olhares do jovem para si:
— A segunda coisa… Devido a uma casualidade do passado… algo bem raro desfavoreceu Salvador. Seu demônio foi acusado e executado graças a quebra de uma regra mortal do nosso mundo. Desde então, mesmo com grande potencial para a classe de conjuradores, ele nunca mais pôde assinar qualquer contrato provindo de outro demônio da classe de magia da morte, embora ainda tivesse a chance de aprimorar tais poderes com um constante treino.
— O que isso significa?
— Isso significa, Slezzy…, que todas as conjurações mais fortes de Salvador, são na verdade extremamente limitadas, pois o mesmo não foi capaz de assinar um contrato poderoso a tempo, devido a execução de seu demônio. Assim, eu gostaria de deixar bem claro… que a assinatura de mais dois contratos da sua classe de magia de luz… lhe renderia uma extrema vantagem.
— Cá estamos novamente. No mesmo assunto de sempre. No final de tudo, o que realmente importa é sugar toda a minha vida restante.
— Por incrível que pareça, pela primeira vez, não estou tocando no assunto dos contratos apenas com esse propósito — A criatura parecia falar com sinceridade. — O poder dos contratos sempre será extremamente superior a qualquer tipo de conjuração inferior, mesmo com milhares de treinos e execuções. Então, mesmo que você não queira aceitar tal alternativa, é bom que fique ciente. No final de tudo, é apenas mais uma carta na manga… e quando você realmente precisar… basta decidir se vai utilizá-la ou não.
Hiram concluiu sua fala com um sorriso sombrio.
Slezzy refletiu sobre todas aquelas informações, num profundo silêncio.
Em seguida, sem encarar novamente seus demônios, o jovem começou a descer as escadas do prédio, a fim de se encontrar com Sanches no outro lado da rua.
*
Salvador estava com as costas encostadas sobre o portão de ferro que delimitava a área da oficina abandonada. Ele observava Slezzy, a cerca de dez metros à sua frente.
Sem mais delongas, o jovem largou os dois contratos que segurava com suas mãos; e começou a canalizar um grande raio amarelado.
Aquele poder era diferente de todas as suas conjurações anteriores.
Salvador se impressionou ao visualizar aquele tipo de conjuração. Seus olhos vibraram com a coloração perfeita daquele poder, além da forma em que Slezzy o manipulava, sem qualquer tremor, e com um exímio controle.
Surpreendentemente, antes mesmo daqueles contratos caírem e encostarem no solo da oficina; Slezzy acelerou seus passos na direção de Salvador, encarando-o furiosamente, posicionando toda aquela manipulação de poder com as suas mãos, de maneira agressiva.
O jovem estava pronto para finalmente confrontar o seu maior inimigo, até então.
Salvador, ainda atordoado, devido ao golpe anterior do garoto, utilizou de seus últimos resquícios de força para formar sua clássica parede transparente, composta por magia da morte.
No entanto, o que o mafioso não esperava fosse que, coincidentemente, ao tocar daqueles contratos no solo, Slezzy pressionasse toda aquela manipulação contra a parede criada, quebrando-a em seguida.
— O QUE!? — gritou Salvador, visualizando o avanço incessante de Slezzy, em sua direção, através da parede quebrada.
Apenas a cinco metros de distância de seu oponente, Slezzy berrava enquanto avançava, ainda conjurando o mesmo poder que acabara de utilizar para quebrar a tal parede mágica de Salvador.
Adiante, o jovem alcançou o corpo de seu inimigo, desferindo toda a conjuração contra o mesmo, causando um forte choque contra o portão de ferro, resultando na quebradura de toda aquela estrutura.
No fim, Slezzy arremessou o corpo de Salvador para fora da oficina, através de um gigante buraco causado naquele portão.
O mafioso se capotou, até seu corpo se colidir com um poste de luz central, que ficava no meio daquela área aberta.
Salvador podia sentir a rachadura de alguns ossos de sua costela. Ele gemia de dor, enquanto Slezzy saia lentamente da oficina, através do mesmo buraco.
Novamente a uma distância considerável de seu oponente, Salvador o provocou, após cuspir uma grande quantidade de sangue no chão de concreto que compunha toda a área aberta, lamuriando entre suas falas:
— O que é você? … não… você não é aquele mesmo garoto…
A seguir, Slezzy passou a rodear Salvador, enquanto este se contorcia de dor.
Com os Irmãos Sam ao lado, o garoto caminhava e conversava com o mafioso:
— Mas é claro que sou eu! Sou aquele que acabará com toda essa raça de pessoas malignas… que apenas apodrecem essa cidade… E você… É apenas um deles, mero Salvador…!
O mafioso riu perante o comentário do seu adversário.
O jovem prosseguiu, ignorando-o:
— Então… você pode me chamar de Slezzy Kaliman… durante os seus últimos minutos de vida! — concluiu, dando uma risada maléfica e apelativa logo após. Aquele tipo de atitude era incomum ao jovem, e o vilão sabia disso.
— Para ser sincero… eu não achava que você tivesse a coragem de chegar até esse ponto… — retrucou Salvador, nervoso. — Quem diria… dois contratos de uma só vez? …parece que você foi para o “tudo ou nada” mesmo… apenas por causa do seu estúpido desejo… de me derrotar!?
Slezzy interrompeu seus passos, ficando frente a frente com Salvador, mais uma vez. Seus olhares sombrios e extrema frieza denotavam um grande destaque.
Ainda que acabado e completamente machucado, Salvador o confrontou:
— De qualquer forma… fiquei realmente impressionado com o trabalho dos seus demônios, Slezzy… Os Irmãos Sam são realmente muito bons em coletar as vidas de seus mentoreados, com o mesmo jogo mental de sempre. Tive a oportunidade de presenciar isso a alguns anos atrás…
O mafioso tentava, de todas as formas, abalar o psicológico de seu oponente.
— Parabéns… Hiram… Haram… vocês transformaram esse mero jovem em uma verdadeira máquina de guerra! No entanto, é uma pena que ele será muito mal aproveitado… já que em breve… terá todo o restante de seus anos de vida, sugados por vocês!
Slezzy iniciou a mesma manipulação de coloração perfeita e amarelada. Porém, ele se surpreendeu ao ver que seu inimigo começou a se reerguer lentamente, ainda gemendo, mesmo após todos os seus golpes anteriores.
— Você acha mesmo que… — O vilão tossiu em meio a sua fala. —…vai me vencer… tão facilmente assim, garoto?
— Sejamos sinceros… — retrucou Slezzy rapidamente. — Suas forças estão completamente esgotadas… então, você só estaria preparado para mais uma luta, se houvesse algum tipo de carta na manga, o que o tornaria um grande hipócrita.
— Não… Diferente de você e todos os outros militares, eu não entro em um combate por uma simples questão de vida ou morte, moleque. Pois eu sou… um verdadeiro artista! Mesmo tendo várias de chances de lhe matar rapidamente, eu não o fiz, já que uma morte sem teatro… seria como o desperdício de toda uma vida… sem uma finalização decente…!
“Esse cara está louco!? Não… Talvez ele esteja realmente falando sério…, mas não posso me distrair!”
Os olhares de Slezzy e Salvador se vidravam incessantemente.
Os Irmãos Sam cochichavam entre si.
O mentoreado dos demônios, respondeu seu inimigo, ainda conjurando todo o poder dourado.
— Então… você quer um teatro? — riu em seguida. — Talvez, o Corvo tenha batido um pouco forte em sua cabeça, quando o expulsou de seu ninho…
Salvador franziu seu olhar e conjurou rapidamente duas manipulações de Arché Superior, uma em cada mão.
Naquele momento, um discreto brilho surgiu no centro de seu peitoral. Aquilo despertou a atenção do jovem.
— Antes que você morra… eu vou lhe dizer os dois motivos ao qual você nunca deveria ter pisado na merda do meu caminho… SLEZZY KALIMAN! — provocou Salvador, partindo para cima em seguida.
O jovem observou aquele avanço com total precisão.
Salvador havia saltado de sua posição inicial com apenas o auxílio de um pé, com seus dois braços para trás, que ainda conjuravam aquelas manipulações.
Slezzy não hesitou; e transformou toda a sua conjuração perfeita e dourada em uma barreira esverdeada e fosca, em questão de segundos.
— HAN? — gritou o vilão, posicionando seus braços a frente, colidindo-se com aquela barreira.
A barreira foi quebrada facilmente, assustando e derrubando o seu conjurador.
Com o subir da sujeira do chão de concreto ao ar, Slezzy não pôde enxergar com facilidade o segundo avanço de seu oponente. Apesar disso, ele desviou no último segundo, de um chute direcionado a sua cabeça, se reerguendo e partindo para um combate físico logo após.
Como Slezzy estava zonzo, ele focou apenas em desviar da maior parte dos golpes de Salvador, que em sua maioria eram chutes altos. Seu inimigo dizia enquanto tentava lhe agredir:
— O primeiro motivo, é por tudo de ruim que você causou às máfias da cidade!
“Bronk” “Bronk”
— E o segundo!? É por tudo que você pôde tirar de mim, SEU DESGRAÇADO!
O oponente do jovem não queria de maneira alguma que o mesmo se recuperasse facilmente. Aquela era a última chance de Salvador.
Slezzy estava sendo humilhado no combate, já que seu físico, embora treinado, não era o seu forte. Reconhecendo isso, o jovem utilizou sua arma de gancho, a fim de se distanciar de Salvador; disparando contra a parede de outra construção.
Entretanto, Salvador interrompeu a fuga do garoto, desferindo uma série de pequenas conjurações roxeadas ao longo da corda de aço daquela arma, cortando-a ao meio, provocando a queda de Slezzy, a alguns metros do chão.
Ao se colidir com o solo, o jovem escutou os rápidos passos de Salvador, na sua direção. Sendo assim, ele se levantou instantaneamente, ignorando toda a sua dor.
Logo depois, empunhou a sua espada.
Os dois partiram para mais um combate curto, onde Salvador ignorou a posse daquela lâmina.
Slezzy desviou de um forte chute em seu peitoral, agachando e cortando a pele da perna esquerda do seu oponente. Salvador gritou de dor, mas logo revidou com uma cotovelada em suas costas, derrubando-o.
Salvador liberou uma brecha ao verificar seu ferimento. E aquele único segundo, foi o suficiente para seu inimigo.
O jovem aproveitou do erro de seu oponente, levantando-se com auxílio de seus novos poderes, cravando um corte vertical sobre as roupas negras que cobriam o abdômen e tórax de Salvador, cortando-as.
Recuando, com as roupas rasgadas, o inimigo de Slezzy se chocou com o golpe. As vestes que cobriam seu peitoral se descosturaram e saíram de seu corpo, entre o ar.
Finalmente, Slezzy pôde detectar o que era o discreto brilho.
Além de ferimentos no peitoral daquele homem, também havia uma enorme cicatriz profunda, de formato vertical. Era algo exótico. Seu brilho de tom azul encantava facilmente os olhares de qualquer ser humano.
— Então… você também tem cartas na manga? — retrucou Slezzy, rindo. O jovem enxugou um pouco de sangue que cobria seu rosto.
“Afinal, o que diabos é isso? Uma marca brilhosa? Isso seria a marca de algum demônio? Mas… eu nunca ouvi falar sobre isso…”
Salvador estava constrangido, no entanto, seu olhar raivoso não deixava que tal sentimento se transparecesse.
— Cartas na manga? Não… — comentou Salvador, seriamente. — Na verdade, você está bem longe de descobrir o que é isso. Isso… é algo que demônio algum poderia conceder a qualquer mentoreado, Slezzy Kaliman!
Todo o momento foi cortado pelos barulhos vindos da portaria do colégio, que aparentemente, eram dos pais de todas as crianças dali, entre aplausos e gritos de alegria. Também era audível, os fortes passos das tropas armadas, que retomavam aquela parte do colégio, avançando sobre a área para assegurá-lo.
Salvador se preocupou com aquilo; e Slezzy aproveitou do fato para provocá-lo:
— É o fim da linha… Salvador.
O vilão, boquiaberto, suspirava profundamente.
— Todos eles estão a caminho… todas as tropas militares estão aqui! Você não tem saída! — À medida que Slezzy discursava, Salvador se enchia de ódio. — E eu não importo pelas mãos se quem seja, contanto que no final, você esteja morto. Mesmo que tente fugir, diferente de nossa última batalha… eu não ficarei parado desta vez, e o perseguirei até o inferno…!
O corpo de Salvador começou a ser dominado por uma energia de tom azulado, que provinha daquela mesma cicatriz.
Slezzy percebeu aquela façanha; e logo, realizou uma manipulação esverdeada, com suas mãos.
“A barreira de Défteros… Eu acabei de adquirir esse poder… e mesmo não tendo o treinado… sinto que posso utilizá-lo facilmente…”
“É realmente arriscado para um momento como esse, mas… é provavelmente a minha melhor defesa contra aquele tipo de poder… Além disso, essa é com certeza sua última chance… E eu devo sobreviver…!”
— Você tem certeza disso? — comentou Hiram ao observar aquela manipulação esverdeada. Mas o jovem apenas o ignorou.
O poder de Salvador provocava rachaduras no solo e nas paredes ao redor.
Após alguns segundos, a energia azulada já havia dominado toda a envolta do corpo do vilão, que comentou em seguida:
— Sabe… Slezzy… eu não gostaria que tivesse chegado a esse ponto…
— Hum!?
— Apesar de ter treinado esse tipo de poder, em situações rígidas e extremas… eu tive que utilizá-lo apenas três vezes em combates, ao longo de toda minha vida. Sem qualquer sobrevivente, eu lhe apresento… a Chama de Gamashi!
Slezzy não se desconcentrou.
— Após a sua morte… eu lhe prometo que cuidarei de todos eles… Emmeline… Rainn… Harvim… Diana… ah! Talvez eu possa contar uma versão… a qual você lutou bravamente até o fim! Sim…! Acho que eles vão precisar disso, antes que eu corte suas gargantas…!
Salvador se antecipou rapidamente, após concluir sua fala, partindo com todas as suas últimas forças que lhe restavam. O tempo não estava nada a seu favor. Ele sabia que estava prestes a ser cercado, e que precisava tomar uma atitude final.
Slezzy se concentrou ao máximo, enquanto observava o avanço imperdoável do vilão.
O mafioso aplicou todo aquele poder, violentamente, com objetivo de perfurar a barreira circular.
De repente, uma grande explosão surgiu após a colisão dos dois poderes, dentre os gritos de valentia dos dois conjuradores.
*
Foi possível escutar o barulho daquilo a quilômetros de distância dali, inclusive de dentro do colégio, cujo as tropas armadas já começavam a vistoriar.
Diferente de Sanches, que ainda se perdurava, ajoelhado perante o corpo morto de Kayber; Harvim se levantou e partiu para as escadas, para saber o que estava acontecendo.
Chegando no segundo andar do colégio, o menino de cabelos vermelhos, pôde observar, através de uma grande vidraça que permitia a vista do resto daquela área estudantil, que uma enorme fumaça rodeava as construções dali. Ele se ajoelhou em seguida.
— O que é aquilo? — perguntou um dos soldados que estava por perto, ainda assegurando os andares do colégio.
— Parece vir do pátio do colégio, entre a oficina e o centro de recreação infantil, agente Bryan… — respondeu um homem que guiava o soldado, que parecia ser o diretor da escola. Sua aparência era rechonchuda e elegante. “Slezzy… Por favor… derrote esse maldito mascarado de óculos toscos… Por Rainn… e por todos…” pensou Harvim, preocupado e em estado de choque. Seus olhos se travaram mediante a explosão.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.