Capítulo 4 – Engrenagens em Movimento
A papelada estava assinada.
Na tela do notebook barato de Kim Jaemin, o e-mail da Junta Comercial da Coreia confirmava o registro: Aurora Consulting Ltda.
Era um nome provisório, escolhido após uma hora de debate entre Jaemin, Seokjin, Choi Mirae e Park Daehyun. Havia algo simbólico em “Aurora”. Representava um novo começo — o fim da escuridão que havia dominado sua vida por tanto tempo.
Sentado à mesa improvisada da kitnet, Jaemin encarava a tela com um misto de nervosismo e entusiasmo. O registro era oficial. O CNPJ estava ativo. Eles tinham uma conta bancária empresarial, um endereço fiscal alugado por ₩50.000 e um e-mail institucional ridiculamente formal: contato@auroraconsulting.kr.
E o mais importante: tudo havia sido feito com o mínimo de gastos — e o Sistema Magnata, fiel à promessa, já havia devolvido o dobro dos valores gastos em nome da empresa. Do simples aluguel da caixa postal até as taxas burocráticas do registro, tudo retornou multiplicado.
No extrato bancário pessoal de Jaemin, havia agora ₩312.000.
Pouco? Talvez. Mas era real, e vinha crescendo.
— Senhor Kim — chamou Seokjin, arrumando o colarinho impecável do terno, mesmo estando num quarto com cheiro de miojo. — Está pronto para a primeira reunião oficial da diretoria?
Jaemin riu, nervoso.
— Diretoria… somos quatro pessoas num quarto que cheira a Cup Noodles. Você acha mesmo que isso é uma diretoria?
— Cada império começa num porão, senhor. O nosso tem paredes — rebateu Seokjin, com um leve sorriso.
Os outros dois funcionários já estavam posicionados. Choi Mirae ocupava a ponta da mesa com um notebook fino e silencioso, conectada a redes privadas, acessando informações públicas e obscuras com a mesma facilidade. Park Daehyun, por sua vez, bocejava encostado na parede, rabiscando slogans absurdos num caderninho.
“Justiça no Café”
“Salário ou Revolta”
“Quer Direitos? Chame a Aurora!”
Jaemin respirou fundo.
— Então tá. Reunião da Aurora. Comecem.
Seokjin abriu uma projeção do sistema no ar, exibindo um painel minimalista, com os seguintes dados:
[Painel Aurora Consulting Ltda.]
> Caixa atual: ₩312.000
Funcionários CLT: 3
Clientes: 0
Projetos ativos: 0
Reputação: Nenhuma
— Nosso objetivo imediato — começou Seokjin, com tom firme — é tornar a empresa conhecida, confiável e lucrativa, sem atrair atenção indesejada. Para isso, sugerimos começar com ações sociais que envolvam a defesa de trabalhadores explorados, microconsultorias gratuitas e construção de autoridade digital.
Choi Mirae complementou, sem tirar os olhos da tela:
— Três estabelecimentos foram identificados próximos, todos com irregularidades trabalhistas. Um bar no bairro Hongdae, uma franquia de cafeteria em Gangnam e um pequeno escritório de contabilidade em Mapo.
— E a ideia seria… — Jaemin começou, mas Daehyun interrompeu.
— A gente oferece uma consultoria gratuita ou representação simbólica em nome da ONG fictícia que criei ontem: “Trabalhadores Invisíveis”. É marketing com propósito. Ganhamos visibilidade, começamos a construir reputação, e com sorte alguém faz uma doação ou compartilha viralmente.
— Tudo isso com orçamento quase zero? — Jaemin arqueou a sobrancelha.
— Não se preocupe — garantiu Daehyun. — Já estou fazendo networking num fórum de direito do trabalho com um perfil falso. Parece que sou uma advogada de 46 anos chamada Hyejin, e as pessoas AMAM ela.
Jaemin ficou entre o espanto e a gargalhada.
— Vocês são doidos.
— Profissionais, senhor — corrigiu Seokjin, sério.
Jaemin se levantou. Seus olhos dourados, agora um pouco mais confiantes, percorriam a pequena equipe.
— Tudo bem. Vamos tentar. Quero ajudar alguém de verdade. Mesmo que o lucro seja baixo. Mas não vamos forçar nada ilegal. A linha é tênue.
Choi Mirae concordou com um leve aceno.
— Sem interferência direta. Apenas exposição dos fatos e orientação às vítimas. Se os empregadores quiserem acordo, podemos intermediar. Se não… nossa ONG se encarrega de “tornar público”.
— Eu gosto de vocês — murmurou Jaemin, voltando a se sentar.
Na tarde seguinte
A operação-piloto começava com uma simples visita. Jaemin, acompanhado de Mirae, entrou numa cafeteria pequena em Gangnam, onde um estagiário de 19 anos trabalhava há três meses sem salário fixo — apenas com “comissão sobre vendas de doces caseiros”.
Choi Mirae, vestida com um blazer discreto e óculos falsos, usava um microfone embutido na gola e registrava tudo. Jaemin apenas pedia um café e puxava conversa com o rapaz.
— Você tá aqui faz tempo?
— Sim, senhor. Desde fevereiro. Ainda tô aprendendo, mas gosto daqui.
— Te pagam direitinho?
O garoto riu.
— Ah, é mais pela experiência, né? Dinheiro vem depois.
Jaemin sentiu um nó na garganta.
Horas depois, voltaram ao quarto. Jaemin estava visivelmente irritado.
— Isso é ridículo. Ele tá se matando por um copo de café e uma esperança vaga.
— É mais comum do que parece — disse Choi. — E é por isso que podemos fazer a diferença. Vamos preparar uma notificação simbólica em nome da ONG e entregá-la à loja. Sem ameaças, só orientação.
— E se não adiantar?
— Então vazamos os prints. Vídeos. Informações. Tudo online. Anonimamente.
Park Daehyun bateu palmas.
— E é aí que eu entro.
Ele virou o notebook para Jaemin. Na tela, um carrossel de posts prontos para redes sociais, com frases como:
“Estagiário ou escravo moderno?”
“Trabalhar sem contrato é legal? Descubra.”
“Você conhece seus direitos? Eles não querem que você saiba.”
— Isso é marketing com sangue nos olhos — disse Daehyun.
Jaemin, pela primeira vez, sorriu com orgulho.
— Vamos ensinar esse país a respeitar seus funcionários. E se, no caminho, ganharmos dinheiro com isso… melhor ainda.
Dois dias depois
A postagem sobre a cafeteria viralizou em um fórum coreano de denúncias trabalhistas. Um influenciador de TikTok repostou o vídeo com comentários indignados. Na manhã seguinte, o dono do café entrou em contato com a “ONG” pedindo desculpas públicas, oferecendo um contrato imediato ao estagiário e… um “apoio” de ₩500.000 à causa.
— Chame de doação — disse Seokjin, verificando a origem dos fundos.
O dinheiro pingou na conta da empresa. E no dia seguinte, o Sistema Magnata fez sua mágica.
₩1.000.000 adicionados automaticamente à conta.
Jaemin não sabia se ria ou chorava.
Estavam fazendo justiça. E estavam sendo pagos por isso.
Era real.
Era só o começo.
[Painel Aurora Consulting Ltda. – Atualizado]
> Caixa atual: ₩1.327.000
Funcionários CLT: 3
Clientes: 1 (ONG fictícia)
Projetos ativos: 1
Reputação: Iniciando (positivo em fórum local)
Naquela noite, olhando a cidade pela mesma janela de sempre, Jaemin se permitiu sonhar um pouco mais alto.
Eles haviam interferido no mundo real. Não com espadas. Não com magia. Mas com estratégia, coragem e… um sistema bizarro de funcionários gacha.
— Aurora… vai brilhar — sussurrou ele, com um sorriso.
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