Índice de Capítulo

    Plutarco se adiantou. Ao ver a massa de carne e olhos se desprender da rocha, o escriba recuou. Ele sabia que sua presença ali seria apenas um estorvo. Correu para a entrada do anfiteatro, escondendo-se atrás de um aglomerado de pedras que lhe oferecia uma visão parcial da clareira, mas o mantinha fora do alcance imediato do gigante. Ele preparou a tabuleta com as mãos trêmulas, assistindo ao início do combate.

    Teseu não esperou. Aproveitando o momento em que Argos descruzou os braços, ele avançou. Segurou a xiphos com firmeza e mirou uma estocada na altura da coxa do gigante, buscando uma artéria.

    Argos sequer moveu a cabeça. Um olho grande, aberto em seu quadril, focou na lâmina que se aproximava. O gigante apenas girou o tronco levemente. A espada de Teseu cortou o ar, passando a centímetros da pele cinzenta.

    O movimento de Teseu o levou para a lateral de Argos. Ele aproveitou o impulso para tentar um corte reverso nas costas do monstro, uma área que seria cega para qualquer oponente normal. Mas ali, entre as omoplatas largas, três olhos piscaram e se fixaram nele.

    Argos lançou o cotovelo para trás com precisão. O osso duro atingiu os antebraços cruzados numa guarda improvisada de Teseu com um estrondo seco. A força do impacto levantou o garoto do chão e o arremessou para longe.

    Teseu rolou na terra batida e se levantou rapidamente, cuspindo poeira. Precisava imobilizá-lo.

    Ele bateu a palma da mão esquerda no solo árido. Concentrou-se, buscando a energia vital que a Dríade lhe ensinara a manipular. O chão tremeu levemente. Raízes finas e secas romperam a superfície de pedra e terra, enrolando-se nos tornozelos grossos de Argos.

    Ele bateu a palma da mão esquerda no solo árido. Concentrou-se, buscando a energia vital que a Dríade lhe ensinara a manipular. O chão tremeu levemente. Raízes finas e secas romperam a superfície de pedra e terra, enrolando-se nos tornozelos grossos de Argos.

    Teseu sorriu e avançou para atacar o alvo preso.

    Argos olhou para baixo. Ele simplesmente levantou o pé. As raízes, quebradiças e sem vida naquele vale estéril, estalaram e se partiram como gravetos velhos. Não ofereceram resistência alguma.

    O gigante avançou. Ele não corria, mas seus passos largos cobriam a distância rapidamente. Teseu tentou recuar, mas bateu as costas contra uma das paredes de pedra.

    Argos desferiu um soco direto. Teseu esquivou-se para a esquerda. O punho do monstro atingiu a rocha, pulverizando a pedra onde a cabeça de Teseu estivera um segundo antes. Estilhaços de pedra voaram, cortando o rosto do herói.

    Teseu aproveitou a proximidade. Ele cortou com a espada na horizontal, visando o abdômen de Argos. A lâmina atingiu a pele. Não houve corte profundo. A pele de Argos era dura e áspera como o arenito do vale. A espada resvalou, deixando apenas um arranhão branco.

    Argos agarrou a borda do escudo de Teseu com a mão livre e puxou. O garoto foi içado do chão. Com um movimento brusco, o monstro o arremessou através da clareira.

    Teseu voou por cinco metros antes de colidir com uma rocha saliente. Ele caiu de bruços, o ar fugindo de seus pulmões. Uma dor aguda irradiou de suas costelas direitas.

    Ele tentou se levantar, mas seus braços tremeram. O sol da meia-manhã batia implacável sobre sua armadura de bronze esquentando o metal que queimava sua pele através da túnica. Suor escorreu por sua testa, ardendo em seus olhos.

    O garoto levou a mão ao peito, tentando invocar a cura. Uma luz verde pálida brilhou em sua palma, mas oscilou e se apagou. O calor do ambiente e a exaustão física drenavam sua energia mais rápido do que ele conseguia focá-la. Ele não conseguia se concentrar para curar.

    Argos caminhava em sua direção, calmamente. Dezenas de olhos em seu peito e braços o observavam, analisando cada tentativa falha de movimento.

    Teseu se forçou a ficar de pé, cambaleando. Ele ergueu a espada para se defender do próximo ataque. O sol refletiu na superfície polida do bronze.

    Um feixe de luz intenso atingiu o plexo de Argos.

    O monstro parou. Ele grunhiu, um som de desconforto, e os olhos piscaram. Os olhos no peitoral e nos trapézios se fecharam imediatamente, lacrimejando. Ele recuou um passo, girando o tronco para longe do reflexo.

    Percebendo a folga, Teseu baixou a espada para descansar. Argos abriu os olhos novamente e voltou a avançar, irritado.

    Teseu olhou para o sol, quase a pino no céu sem nuvens. O zênite se aproximava.

    Ofegante, fitou seu peitoral brilhante e quente, então enxergou uma fenda estreita entre duas rochas altas no fundo da clareira, onde um pouco de sombra ainda existia.

    Teseu virou as costas para Argos e correu.

    Argos, vendo a presa encurralar-se, apertou o passo, seguindo-o para dentro do corredor de pedra.

    Plutarco esticou o pescoço, tentando ver o que acontecia. Por um momento, houve apenas silêncio e o som dos passos pesados do gigante.

    Então, Teseu reapareceu na entrada da fenda.

    Plutarco, escondido na entrada do vale, arregalou os olhos. O garoto havia tirado armadura. Agora, vestia apenas a túnica vermelha fina. Estava mais leve, mais rápido, mas um único golpe de Argos quebraria seus ossos sem o amortecimento da couraça.

    Ele se virou para a entrada da fenda. Argos parou próximo da abertura, transformando aquele corredor numa arena sem saída. Centenas de olhos focaram no garoto desprotegido.

    Teseu estava leve, mas mortalmente exposto. Ele segurava apenas a espada. Ele bateu a lâmina contra a rocha ao seu lado lançando um som metálico agudo que ecoou pelo vale.

    — Venha! — ele gritou.

    Argos, vendo a vulnerabilidade de seu oponente, avançou para esmagá-lo, cercando-o na passagem.

    Plutarco observava do seu esconderijo. Ele notou que Teseu respirava com a boca aberta e seus movimentos estavam ficando mais lentos. O sol refletia nas paredes vermelhas do cânion, aumentando a temperatura no local. O rosto de Teseu estava vermelho e coberto de suor.

    Dentro do corredor de pedra, Argos preparou um golpe amplo. Ele girou o tronco e lançou o braço direito em um movimento horizontal que cobria toda a largura da passagem. Teseu não tinha espaço para recuar.

    Ele se jogou para a frente, deslizando de costas pelo chão de terra solta. O braço de Argos passou sobre ele, atingindo a parede oposta e soltando lascas de pedra. Teseu passou por baixo das pernas abertas do monstro.

    Ele tentou se levantar rapidamente para correr em direção à saída, mas Argos reagiu. O gigante girou o quadril e desferiu um chute para trás com a perna esquerda. O pé de Argos atingiu o ombro de Teseu.

    O impacto lançou o garoto contra o fundo do beco sem saída. Suas costas bateram na rocha sólida. Ele caiu sentado e a espada escapou de sua mão por um instante antes de ele a segurar novamente.

    Teseu olhou para cima. Ele estava encurralado.

    Argos se virou para ele. O monstro caminhou devagar, fechando a única rota de fuga com seu corpo largo. Ele ergueu os dois punhos unidos acima da cabeça para desferir um golpe vertical.

    Nesse momento, o sol atingiu o ponto mais alto no céu. O zênite.

    O raio de luz incidiu diretamente sobre a superfície polida da couraça de bronze que repousava em uma rocha metros acima do rendido Teseu. O metal funcionou como um espelho e refletiu a luz solar em um feixe concentrado para baixo em uma inclinação diametralmente calculada.

    A luz atingiu o rosto e o peito de Argos.

    Dezenas de olhos no corpo do gigante se contraíram e fecharam imediatamente. Argos soltou um urro de dor e levou as mãos ao rosto, recuando dois passos, cego pelo clarão repentino.

    Teseu firmou os pés no chão. Ele sentiu um pouco da energia da terra fluir para seu corpo. Suas íris castanhas assumiram uma coloração verde brilhante. A lâmina de bronze de sua xiphos também brilhou, envolta por uma aura de energia esverdeada.

    Ele avançou rente ao chão. Argos ainda estava com as mãos no rosto e a guarda aberta na parte inferior.

    Teseu estendeu o braço e girou o corpo. A espada cortou o ar e atingiu a parte de trás dos tornozelos de Argos. A lâmina energizada atravessou a pele grossa e rompeu os tendões de Aquiles das duas pernas em um único movimento.

    As pernas de Argos falharam. Sem sustentação, o peso do gigante o puxou para trás. Ele tombou rígido.

    A parte posterior de sua cabeça colidiu com força contra uma rocha pontiaguda no chão da fenda. O estrondo do impacto ecoou pelo vale. O corpo de Argos estremeceu uma vez e depois ficou imóvel. Os olhos espalhados por sua pele reviraram e permaneceram abertos, mas sem foco. Ele estava inconsciente.

    Teseu se aproximou do corpo caído. A luz verde em seus olhos se apagou, devolvendo o castanho escuro às suas íris. A aura de energia em torno da xiphos desapareceu. O cansaço físico retornou imediatamente, fazendo seus braços pesarem.

    Ele segurou o cabo da espada com as duas mãos e posicionou a ponta da lâmina sobre a garganta exposta de Argos. O gigante respirava de forma rasa, inconsciente. Teseu preparou-se para empurrar o aço e finalizar a tarefa.

    Um barulho veio de trás do monólito de pedra, onde a entrada da caverna estava localizada. Foi o som de objetos caindo e cerâmica se quebrando contra o chão.

    Teseu parou. Ele olhou para a abertura escura na rocha.

    — Eudora… — ele sussurrou.

    Pensou que a garota poderia estar ferida ou tentando fugir em pânico. Teseu baixou a espada e correu, passando pelo corpo imóvel de Argos e entrando na abertura da rocha.

    O interior da caverna era amplo e fresco, protegido do sol externo. Teseu parou na entrada para que seus olhos se ajustassem à penumbra.

    O lugar não parecia uma cela. Havia peles de animais estendidas no chão formando um leito. Cestos com frutas e carne seca estavam encostados na parede. Um tear com um tecido pela metade ocupava um dos cantos. O cheiro de ervas secas e comida não remetia a um cativeiro.

    No fundo da caverna, uma mulher estava de pé. Ela usava uma túnica simples de lã púrpura, belíssima, com algumas runas amarelas gravadas nas barras do tecido. De costas, era possível ver que uma coroa de louros prendia seus belos e lisos cabelos dourados. segurava um vaso de barro pesado junto ao peito.

    Teseu deu um passo à frente, baixando a guarda. Ao som de seus passos, ela se virou, e seu queixo caiu. Ele tentou sorrir para acalmá-la.

    — Não tenha medo — disse ele, respirando com dificuldade. — Eu sou Teseu. O monstro caiu. Você está livre.

    A mulher não se moveu em direção a ele. A expressão em seu rosto endureceu. Seus olhos se encheram de lágrimas, mas não de alívio. Eram lágrimas de raiva.

    — Assassino! — ela gritou.

    Eudora ergueu o vaso acima da cabeça e o arremessou com força total na direção de Teseu.

    O garoto, pego de surpresa, apenas teve tempo de erguer o braço para proteger o rosto. O vaso de barro colidiu contra seu antebraço e se estilhaçou, espalhando cacos e água pelo chão da caverna.

    Teseu recuou, atordoado, olhando para a mulher que ele jurou salvar, sem entender por que ela o olhava com tanto ódio.

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 0% (0 votos)

    Nota