Capitulo 111 - O inesperado
Caleb respirou fundo ao encarar a porta branca. Se perguntava no que responderia caso sua mãe fizesse a pergunta mais difícil naquele momento.
Após ter recebido a missão de vigiar Mayck Mizuki e descobrir se ele tinha relação com o portador Olhos azuis, ainda não tinha feito tanto progresso — pelo menos não tinha provas o suficiente para apontá-lo como tal.
Ou seja, teria que mentir e dizer que estava trabalhando nisso. O problema era que ele estava envolvido em algo paralelo que não tinha muita coisa a ver com sua missão principal. Talvez não tenha realmente nada a ver.
Mesmo assim, ele não podia voltar atrás.
Encarando o sensor, ele respirou fundo de novo — Já tinha feito isso umas quatro vezes até mesmo antes de chegar ali —, então tocou-o com o dedo indicador. Depois de um pequeno som de confirmação, a porta se abriu.
Ah… Queria que a Isa estivesse aqui. Ela é muito boa em desconversar e mudar o ritmo de qualquer situação.
Caleb sentiu a extrema falta que fazia não ter sua equipe com ele em um momento como esse.
Assim que entrou, ele se deparou com uma sala não muito ampla, porém recepcionista, com uma mesinha no centro e dois sofás de alguma espécie de material requintado postos de frente um ao outro. A janela de vidro com persianas brancas davam passagem para a luz solar, que iluminava e refletia nas paredes igualmente brancas, decoradas com alguns quadros sob paineis ripados de madeira.
Na mesa, havia um vaso com plantas bem cuidadas, que davam um ar de aconchego e calmaria naquela sala, misturado ao aroma de café fresco, há pouco servido pelo serviço de quarto.
Olívia estava sentada no sofá à esquerda. Como o dia só estava começando, ela apreciava uma xícara de café com leite e alguns biscoitos que estavam no prato sob a mesa. Seu olhar atento para a janela fazia seus olhos prateados brilharem, assim como os de Caleb — uma característica que comprovava o parentesco sem mais perguntas.
“Caleb, bom dia. Já tomou seu café da manhã?” Olívia olhou para o garoto e sorriu gentilmente.
“Sim. Acordei já faz um tempo”, ele respondeu. “Você disse que queria falar comigo. Sobre o que é?”
Ele a lembrou do motivo que a fez chamá-lo, então Olívia calmamente repousou a xícara sobre a mesa.
“É verdade. Eu quero saber sobre a sua missão. Teve algum progresso?”
O que Caleb mais temia foi friamente jogado sobre ele sem mais nem menos.
Por um segundo, seu corpo congelou. Ele atentou aos olhos de sua mãe.
E agora? O que eu faço? Eu minto?
Sua mente entrou em estado de turbulência e ele quase começou a tremer. Os olhos de sua mãe parecia que iriam perceber qualquer mentira, por menor que fosse.
Caleb, melhor do que ninguém, sabia que não dava para esconder coisas da diretora da Nova Lótus.
Ah! É mesmo. Eu não vou mentir. Basta não mencionar. Isso! É perfeito!
Não dava para saber de onde tal ideia surgiu, mas com certeza não era de um Caleb pronto para qualquer situação, mas um em pânico. Afinal, o Caleb centrado, cabeça da sua equipe, não era um cabeça de vento.
Parecia que a influência que sua mãe tinha sobre ele era muito maior no fim das contas.
Ele fechou os olhos, sentindo-se vitorioso por algum motivo, e estava prestes a abrir a boca quando Olívia falou primeiro.
“Ah—”
“Nenhum, não é?”
“Mas eu ainda nem disse nada.”
“Está estampado na sua cara”, ela afirmou. “Se estava pensando em mentir, esqueça. Se você tivesse algum progresso, teria me dito mais cedo.”
O sentimento de vitória de Caleb desmoronou. Realmente não dava para esconder nada de Olívia. Como esperado da mulher que reestruturou sua organização.
Caleb não tinha como vencê-la. Ele suspirou, deixando aquela tensão ir embora.
“Mas se você já sabia disso, então me chamou pra quê? Eu ainda tenho coisas pra fazer— Ai!”
Um biscoito voou em sua cabeça.
“Olhe como fala.” Olívia levantou-se. “Na verdade, alguns assuntos urgentes apareceram. Eu só quero que você fique mais atento. No ritmo que as coisas estão, elas só podem piorar.”
“O que isso quer dizer?” O garoto massageou a parte da cabeça onde a colher atingiu.
“Lembra que Masato Tsubaki estava desaparecido?”
“Sim, lembro. O que tem ele?”
A curiosidade de Caleb se aguçou. Para sua mãe o chamar ali e mencionar isso não devia ser coisa simples ou banal.
“Há alguns dias”, disse ela. “Takashi o encontrou.”
“Huh? Que bom? Isso é uma coisa boa, não? Eles são grandes amigos, afinal.”
Pelo pouco que Caleb sabia sobre Masato, ele era bem próximo da família Mizuki, então já o conhecia por conta disso. Sabia sobre seu desaparecimento e, por isso, questionou sua mãe quando ela lhe mandou investigar Mayck, perguntando se era viável fazer isso em um momento tão delicado.
Olívia, no entanto, sabia mais do que parecia. Em resposta a Caleb, ela respirou fundo e cruzou os braços. O garoto imediatamente percebeu que havia algo errado ali.
“Realmente seria algo bom, em circunstâncias normais. Mas a situação é bem diferente. Takashi me contou que aquele Masato não é o mesmo que conhecíamos.”
Uma expressão pesada tomou conta de seu rosto, junto a um olhar decepcionado.
“Ao que parece, Masato não desapareceu por algum incidente ou coisa do tipo, mas por conta própria.”
“É sério…?” Caleb resmungou. Isso era algo que ele sequer imaginava. “Mas por quê? O que aconteceu?”
“A resposta está no passado. Masato está ajudando alguém na busca de algum poder misterioso. Não vou entrar em detalhes, mas ao que tudo indica, ele está junto ao grupo chamado Ascension.”
“Ascension… os criminosos que estão criando toda essa maldita bagunça…”
Em todo o planeta, não tinha portador que nunca tivesse escutado o nome da infame organização ramificada da Strike Down, que se corrompeu, cujas intenções poucos sabiam. Seus líderes eram um mistério e o máximo que se sabia sobre eles era que tinham a capacidade de desaparecer do mapa sempre que havia uma pista sobre eles.
O indivíduo mais conhecido da Ascension, era Yang, simplesmente por que ele estava presente em todas essas pistas sobre a organização.
“Parece que Masato encontrou algo com eles que satisfaz seus desejos antigos e isso o fez ser fisgado facilmente, e como ele abandonou sua família sem nenhum remorso, temo que isso estava sendo cultivado há muito tempo.”
“Entendi. Mas que poder é esse que eles estão atrás?”
“Você vai descobrir logo. É um poder que nunca deveria ser liberto. Por enquanto, se foque em completar sua missão. Quanto antes você acabar, melhor.”
“Sim, pode deixar comigo. Eu vou descobrir se há ou não uma relação de Mayck Mizuki com os portadores. Se é só isso, eu vou indo então. Tenho que fazer alguns preparativos.”
Caleb saudou sua mãe com um gesto e virou-se para partir.
“Caleb.” O garoto parou ao ser chamado. “Tenha cuidado. Eu confio totalmente em você”, disse ela.
Caleb não sabia dizer quais emoções o invadiram ao ouvir isso. Sua mão parou perto da maçaneta, parecia que algumas palavras sairiam de sua boca, mas ele as deteve, cerrando os dentes.
“Sim. Vou ter cuidado”, falou e saiu após abrir a porta.
Antes de cumprir o que sua mãe lhe mandara fazer, ele tinha que resolver a questão envolvendo as quatro facções em que se meteu.
Não era, definitivamente, para ele ter se envolvido com isso, mas quem poderia imaginar que uma simples curiosidade levaria a uma situação tão complexa?
Só me resta esperar o que aquele cara tem em mente. Talvez o encontro de hoje seja uma entrada para o fim dessa bagunça toda.
Assim que a noite caiu, Caleb foi para o local designado para o encontro marcado por Takeru.
Chegando lá, não era nada além de uma área deserta, com uma enorme cratera no meio dela, cujos arredores estavam fechados com faixas de não ultrapasse. As autoridades sabiam que ninguém iria respeitar aquilo?
“A Catástrofe da Luz Vermelha”, Caleb sussurrou.
Naturalmente, ela já tinha ouvido falar dela, embora seus menores detalhes fossem desconhecidos para ele. Só sabia que foi um conflito entre portadores e a Ascension.
Agora, apenas um reflexo de vastidão, repleto de poeira e escombros da velha estação, que havia ali anos atrás, restou. O silêncio ali era como o de estar em terras áridas, longe de tudo e todos, ao som do vento, apesar das luzes da cidade serem visíveis ao longe. Ainda era difícil acreditar que aquele lugar estava em Tóquio.
Enquanto encarava aquele abismo de centenas de metros de altura, ouviu passos se aproximando dele e se virou para ver. Era Takeru, e havia mais alguém com ele. Um homem de cabelos grisalhos escovados para trás e com uma cara fechada.
“Finalmente chegou. Pensei que iria se atrasar para algo que você mesmo marcou”, disse Caleb com sarcasmo em sua voz.
“‘Que eu marquei’ é uma menção muito forte, mas vou desconsiderar isso.”
“Espero que as negociações corram bem. Isso está ficando cada vez mais trabalhoso.”
“É… talvez fiquem sim, mas também podem piorar. Nunca se sabe.”
Takeru afirmou isso com certa subjetividade em suas palavras. Caleb estranhou isso, mas pensou que talvez Takeru soubesse que a negociação não iria funcionar por conta da natureza de Yamada. Bom, só o tempo diria.
Depois de alguns minutos, uma pequena comitiva de quatro homens se aproximou. Era Yamada, o qual estava acompanhado por seus tenentes Aoi, Gure e Aka.
“Boa noite, senhores. Essa é uma boa recepção, mas têm certeza que vão se garantir em apenas três?”
Yamada não guardou suas palavras, e as proferiu em um tom ameaçador assim que se aproximou.
“Isso é mais que suficiente. Agora que você não tem uma arma, não apresenta ameaça maior que um mero cupim”, Takeru respondeu com um sorriso leve em contrapartida.
“Hahaha. Eu vejo, então está ciente do que aconteceu. Então foi você mesmo quem começou isso tudo? Aonde pretende chegar?”
“Achei que estava óbvio. Eu almejo o mesmo que vocês: estar no topo do submundo. Mas, para isso, tenho que fazer alguns sacrifícios. O que você acha, Yamada? Que tal uma aliança para derrubarmos os outros dois?”
“Eu estava imaginando, no caminho, o que seria. O que te faz pensar que eu vou aceitar isso?”
Caleb como um mero acompanhante, prestou atenção à conversa, mas não pôde deixar de notar alguns olhares do próprio Yamada em sua direção. O sentimento de desconforto em seu peito estava aumentando a cada segundo.
“Você aceitando ou não, sua derrota é inevitável. Sua única chance de conseguir alguma coisa é se aliando a mim.”
O discurso de Takeru mudou um pouco quanto às suas intenções iniciais. Yamada não pôde deixar de contestar isso.
“Você está se contradizendo. O que quer dizer com minha derrota ser inevitável? Está dizendo que possui uma carta poderosa na manga?”
Nisso, seus olhos fixaram-se em Caleb mais uma vez, um olhar penetrante e desconfiado, que fez o garoto estremecer um pouco. Não era de medo, era mais como uma sensação de que aquele cara sabia demais.
Takeru percebeu o que Yamada estava pensando e sorriu. Na verdade, suas intenções eram diferentes do que fez Yamada pensar.
“Não, você entendeu errado. Esse moleque não tem nada a ver”, gesticulou, abanando a mão como se estivesse pondo Caleb para trás. “A realidade é muito diferente.”
Um sorriso malicioso se apoderou de seu rosto. Yamada estreitou os olhos, percebendo que algo estava diferente.
“O que isso significa?”
“Ha… Desculpa. Eu vou parar de mentir.” Takeru suspirou pesadamente e depois de ajustar a postura, continuou. “Eu não tenho nenhuma intenção de fazer de você um aliado.”
“Oh? Então para que serve esse encontro? Apenas para você reafirmar suas intenções? Se for o caso, é uma completa perda de tempo. Mesmo sem o soro, eu ainda posso fazer muita coisa.”
Os homens de Yamada deram um passo à frente, ante a um conflito em potencial.
“Ah, espere, não entenda errado. O roteiro que o garoto preparou não estava ruim, mas eu achei melhor fazer as coisas de uma forma diferente. Principalmente depois de descobrir quem eu estava acompanhando.”
Caleb percebeu o olhar fuzilante de Takeru e imediatamente um alarme soou em sua cabeça. Aquilo realmente estava fora do roteiro que Mayck passou para Caleb, que teve sua cabeça inundada por dúvidas.
Do que ele está falando? Aonde esse cara pretende chegar?
O garoto se absteve de falar naquele momento, esperando que as coisas voltassem ao rumo que deveria ter originalmente, porém, não parecia que as coisas se ajustariam a seu favor. Ainda mais quando uma voz grave em alto e bom som os interrompeu.
“Parece que eu cheguei um pouco mais tarde do que o previsto. Se divertiram em sua reunião, Takeru e Yamada?”
Como um fantasma vindo das profundezas, Akagi se aproximou deles e se estabeleceu há poucos metros de distância de ambos.
Não só Caleb ficou estupefato, mas também os dois líderes e os subordinados.
“Haha… isso era para ser secreto. Como você chegou aqui?” Takeru sorriu amargamente.
“Ora, ora… Não queria receber a minha presença? É uma pena, pensei que já estava preparado para acabar com isso de uma vez. Ainda mais com a saída repentina dos Kurokawa da disputa.”
Outra expressão de dúvida estampou o rosto dos primeiros a chegar ali. Como assim os Kurokawa se retiraram da disputa?
“Hum? Vocês não foram contatados? Bem, que seja. Ontem, um representante dos Kurokawa apareceu na minha frente e disse que eles estavam deixando a disputa de lado. Seja lá o que tenha acontecido, essa é a melhor hora para resolver essa questão entre nós.”
As palavras de Akagi pareciam verdadeiras. Takeru cerrou os dentes com força. Depois de derrotar Yamada, ele planejava chantagear Kurokawa com a mídia e colocá-lo contra Akagi, mas parecia que isso tinha ido água abaixo.
“Entendi. Então esse era o plano desde o início. Enviou um mensageiro para me alertar dessa reunião com antecedência para garantir que eu viesse, e então me encurralar com Akagi”, Yamada afirmou, depois de pensar um pouco.
Realmente seria um bom plano, se fosse verdade, claro. Mas não era bem assim, no entanto, Takeru nem pensou em desmentir, afinal, ele próprio pensava que Yamada tinha compartilhado informações com Akagi.
“Nesse momento, o cessar-fogo já foi deixado de lado e meus homens só estão esperando a ordem para invadir suas bases e destruir suas forças. Por que, então, não resolvemos o ultimato aqui e agora? Bem, eu não acho que vocês tenham uma chance mesmo.”
Akagi tinha um tom extremamente sério. Em contrapartida, Takeru riu alto.
“Ah, merda! Foda-se! Se é assim que as coisas terminam, então vamos nessa”, disse ele, afrouxando a gravata.
Ao seu lado, alheio a toda a conversa, Caleb tentava processar as informações que recebeu segundos atrás. Como as coisas tinham tomado aquele rumo? Sua mente estava esbranquiçada. Ele apertou os punhos, estreitou os olhos e cerrou os dentes.
“Ei! Takeru! O que você está fazendo? Não era para seguir desse jeito.”
Como as coisas entre os líderes terminariam não importava. Afinal, esse era o objetivo. Seja quem fosse que vencesse, ele e Mayck dariam um jeito logo após o fim, mas isso era uma visão um pouco mais distante ainda, então a confusão de Caleb era mais pelo momento que as coisas aconteceram.
“Você acha que eu tô ligando, seu pedaço de merda? Eu nunca tive intenção de seguir suas ordens. Só precisava fingir para encontrar uma forma de te derrubar cedo ou tarde.” Ele riu. “Bom, você me ajudou a conseguir o que queria. Já cumpriu seu papel.”
“De que porra você tá falando?”
Sem dizer nada, Takeru meteu a mão no bolso interno de seu paletó. O que tirou de lá deixou Caleb paralisado por alguns segundos.
Era uma seringa contendo o soro confiscado por ele.
“Cara…!”
Estava confirmado. Caleb havia sido traído. Num momento de raiva e descontrole, ele avançou em Takeru e agarrou-o pelo colarinho, encarando-o nos olhos.
“Seu filho da puta! Como você conseguiu isso?! Estava trabalhando pelas minhas costas?!”
“Hahaha! Incrível! Nem mesmo o marionetista sabia que você roubou minhas ampolas, Takeru? Você foi um maníaco e tanto.” Yamada parecia estar se divertindo com a situação. Seus homens também riram.
“É, moleque. Eu não vou perder meu tempo com explicações. Você não tem mais utilidade pra mim, então espero que suma.”
Nesse mesmo momento, o homem de cabelos grisalhos chutou fortemente no abdômen de Caleb. O impacto foi tão poderoso que o jogou para a cratera.
Merda!!
Depois, Takeru voltou-se para Yamada e Akagi.
“Me falaram tão bem desse garoto. Não pensei que ele fosse ter um fim tão comum”, disse Yamada com um olhar de reprovação.
“Se liga. Ele era só uma ferramenta conveniente que apareceu em boa hora. É o culpado por toda essa merda também. Mas isso não importa mais. Se querem resolver isso, vamos começar agora. Ginro.”
Takeru se posicionou e chamou seu melhor subordinado para o seu lado. No entanto…
“?!”
Whoooosh…!
Uma lufada de vento poderosa veio por trás deles, levantando poeira e fazendo suas roupas tremularem. Todos, sem exceção, cobriram os rosto com os braços involuntariamente.
“Mas que caralho—”
Quando olharam para a direção da cratera, encontraram uma figura flutuando a alguns centímetros do chão. Seu corpo foi envolvido por um vórtice prateado reluzente, que girava a uma velocidade alucinante.
“Ele é um portador afinal”, Yamada comentou com uma expressão ligeiramente satisfeita. No fundo, ele tinha criado expectativas depois do que o mensageiro lhe disse.
A aura de Caleb naquele momento havia mudado. Facilmente ele seria dito como um portador de nível 5, mas era óbvio que poderia ser mais perigoso que isso.
“Moleque idiota… Ginro!, acabe com ele de uma vez.”
“Sim, senhor!”
O homem de cabelos grisalhos lutou contra a ventania e caminhou na direção de Caleb. O par de luvas em suas mãos foi levado pelo vento assim que o tirou, revelando mãos prateadas que reluziam com o brilho da lua.
Sem esperar segunda ordem, Ginro disparou contra Caleb. Mesmo que a força do vórtice o impedisse, ele conseguiu se aproximar a uma velocidade considerável. Sua mão aberta com os cinco dedos juntos agiram como uma lâmina, que deslizou contra Caleb.
No entanto, o risco branco que pairou no ar por alguns instantes fora sugado pelo vórtice, como a luz era sugada por um buraco negro. Ginro rapidamente recuou, ao ver que tinha algo estranho.
Sua visão, porém, foi ofuscada pelo mesmo brilho branco, que foi devolvido a ele como um poderoso projétil. Sua reação foi se defender pondo os braços de aço na frente do rosto, mas isso não impediu que ele fosse arrastado para trás.
Uma expressão de espanto apareceu no rosto de todos. Quanto poder.
“Eu realmente não esperava por isso, Takeru. Não imaginei que você estivesse tramando algo assim. E acho que ele também não. Sendo assim, vou para-los aqui.”
“Parece que você deixou o moleque muito irritado, Takeru.”
“Tsk. Era o esperado de alguém filiado à Strike Down”, Takeru declarou com uma expressão de desgosto. “Isso não vai me intimidar. Mate-o logo, Ginro!”
O homem de cabelos grisalhos se recompôs e avançou contra Caleb de novo com uma velocidade descomunal que o garoto mal pôde perceber.
Quando se deu conta, estava caindo no fundo do abismo, com Ginro agarrado em sua cintura.
“Seu verme imundo!”
Caleb foi pego de surpresa pela capacidade de adaptação daquele homem. Ele nada pôde fazer para evitar a queda livre, mas potencializou seu vórtice para se separar dele.
A queda durou apenas alguns segundos, apesar da altura. Os dois caíram de pé, o chão abaixo deles se rachou profundamente.
O vórtice de Caleb se desfez.
Naquele breu, ambos se encararam ferozmente.
“Isso se tornou mais pé no saco do que deveria. É melhor eu não ter piedade de vocês.”
Apesar da provocação, Caleb só recebeu o silêncio de Ginro em resposta.
Mas isso não importava realmente. Não era como se Caleb esperasse alguma coisa de alguém que só seguia ordens dos outros igual a um robô cujo programa não possuía muitas funções.
O problema, no entanto, era que o homem de cabelos grisalhos, com as mãos de aço não o deixaria sair daquele lugar tão facilmente.
Já que Takeru confiou aquela luta a ele, então ele não era pouca coisa, e Caleb não era o tipo que subestimava seus oponentes.
Apesar disso, ele tinha que sair dali o quanto antes.
Essa situação não fazia parte do roteiro. Se aquele cara realmente não esperava por uma traição dessas, então eu preciso avisá-lo o quanto antes.
A ideia inicial era que fizessem uma aliança com Yamada e derrotassem Akagi, porém, as coisas terminaram de um jeito diferente e até Akagi estava lá.
Segundo Akagi, seus homens já estavam posicionados, apenas esperando o sinal para começar uma guerra total.
Claro, Caleb não conhecia o homem chamado Akagi muito a fundo, então poderia ser apenas um blefe. No entanto, o contrário também existia como possibilidade.
Acho que vou mandar uma mensagem—
Antes que pudesse terminar sua linha de pensamento, Ginro encurtou a distância entre eles muito rapidamente e desferiu um soco contra ele, mirando no rosto.
Caleb conseguiu desviar ao deslocar-se para a direita, mas logo uma sequência rápida e poderosa veio em seguida. Os dois se enrolaram em uma luta de socos e chutes habilidosos, cada qual com sua especialidade.
Ele é forte!
Caleb era mais ágil então tinha vantagem na esquiva. Ginro, porém, tinha golpes mais precisos e avassaladores, o que estava causando problemas ao garoto, quando este precisava bloquear.
Cara irritante!
Os golpes vindo daquelas mãos e pés de aço não eram nem um pouco leves e cada movimento de Ginro criava uma corrente de ar imponente.
Isso vai ser mais difícil do que eu imaginava.
Se não usasse sua ID, ele provavelmente perderia muito tempo, até porque Caleb nem cogitava a ideia de perder. Então ativou sua ID novamente.
“.”
Agora que o garoto foi retirado de cena, era hora dos adultos resolverem seus assuntos.
Uma atmosfera hostil pairava sobre eles.
“Olha, não é querendo ser chato, mas eu ainda estou em vantagem numérica. Vocês pretendem mesmo atacar sem mais nem menos?”
“E temos alguma escolha? Eu não vou aceitar nenhuma proposta de adiar esse confronto.”
“Eu concordo dessa vez, moleque. Vamos resolver tudo agora. Meus homens já estão em posição. Quando eu terminar aqui, irei destruir quem sobrar das facções de vocês, caso se recusem a me obedecer”, Akagi declarou.
“Há! Quanta confiança.”
Takeru meteu a mão atrás das costas e sacou duas pistolas.
Akagi entrou em posição de luta, com dois socos ingleses que mais pareciam luvas de aço em suas mãos.
Os três tenentes de Yamada ficaram em sua frente, com suas armas prontas.
Mas, claro, nenhum dos três pensaram que aquela breve reunião acabaria bem, então, basicamente, pensaram na mesma coisa.
Como se invocados, três pelotões, de cada uma das facções, avançaram por trás, dando início a mais um conflito de tiros, socos e cortes.
Ao mesmo tempo, os batalhões espalhados pela cidade também iniciaram seus confrontos generalizados e a cidade foi tomada por tiros e explosões.
A luta final entres as facções começou.
Com o vórtice ativo em volta de seu corpo, Caleb não precisava se preocupar em se mover para atacar ou esquivar dos ataques explosivos de Ginro.
Ele só precisava estar focado em manter e absorver os ataques com a melhor precisão possível. Perder o foco ali significaria mais trabalho para voltar.
A parte ruim disso, era que Ginro não carregava nenhuma emoção em seus golpes. Era como se ele lutasse por pura obrigação.
Se ele tivesse raiva ou qualquer outro sentimento naquela luta, já teria perdido há muito tempo.
Isso porque o vórtice era capaz de absorver e redirecionar energia ao seu redor, assim como ataques inimigos e emoções — boas ou ruins —, amplificando sua própria força e permitindo que ele aumentasse seus poderes usando aquela energia absorvida.
Era por isso que estava sendo tão difícil. Caleb só poderia aumentar seu poder com os ataques de Ginro, o que não era um bom combustível sozinho.
Não acho que ele saiba sobre isso, mas com certeza percebeu que tem algo de errado. Foi por isso que ele conseguiu me pegar de surpresa naquela hora.
Apesar dos pesares, o homem de cabelos grisalhos tinha uma inteligência bastante alta.
Ele correu até Caleb e saltou, girou e desferiu um chute poderoso usando sua perna direita, mas, assim como os outros golpes, foi absorvido pelo vórtice, então tomou distância novamente.
Seu olhar se mantinha neutro em sua expressão carrancuda. Ele parecia estar analisando o poder de Caleb.
“O que foi? Não vai atacar mais? Ótimo. Eu vou começar o meu turno”, declarou e se pôs em posição de ataque.
Em um piscar de olhos, ele encurtou a distância até Ginro. Um giro, dois giros e atingiu o homem com uma meia lua. Por se defender com os braços no último segundo, Ginro foi lançado para o chão, mas rapidamente se levantou, ao perceber que Caleb pisaria em sua cabeça logo em seguida.
Ele viu que se não tivesse feito isso sua cabeça teria sido esmagada igual ao solo onde estava segundo atrás.
Porém, não parou por aí, Caleb gingou e começou a pressionar Ginro com suas excelentes habilidades de capoeirista. Ele estava claramente na vantagem, visto que o subordinado de Takeru sequer tinha tempo para reagir ou contra atacar.
Em um dado momento, quando Caleb foi aplicar uma outra meia-lua de compasso, ele foi surpreendido por um golpe parecido, mas que lembrava mais karatê. O choque entre as duas pernas gerou uma onda de choque poderosa que rasgou o ambiente ao redor por uns dois metros.
Ele travaram nesta posição por alguns segundos.
Dessa vez, Caleb realmente sentiu o peso daquele chute e cerrou os dentes. Enquanto sua perna feita de carne e osso transferiu a dor por todo o seu corpo, Ginro mantinha uma expressão neutra, enquanto parecia se gabar de sua perna de aço.
Ambos se afastaram.
O vórtice não reagiu ao golpe?
Caleb estava confuso. Sendo um ataque inimigo, teria de ser absorvido, mas não foi o que aconteceu.
Na realidade, Ginro não tinha atacado. No último segundo antes do impacto, ele parou completamente, então o ataque tinha sido feito unicamente por Caleb.
Mas, mesmo assim, o subordinado número um de Takeru não foi abalado. Ainda mais que o poder de Caleb estava muito mais amplificado desde o início da luta.
“Tenho que admitir que você é bem resistente. Mas me diga: porque você trabalha com Takeru? Estando em uma das duas organizações principais, você teria mais utilidade e seria mais valorizado, não acha?”, Caleb falou. Não esperava nada em resposta, mas aconteceu o contrário.
“Eu devo minha vida a ele. Jurei ajudá-lo com o que quer que seja”, respondeu com os olhos sérios.
O garoto pareceu surpreso a princípio, mas logo se recompôs.
“Ignorando que vocês são o mal da sociedade, eu entendo seus motivos. É, admito. Sua lealdade é algo que me impressiona. Mas eu também tenho meus motivos para estar aqui e eles não perdem para o seu. Vou tirá-lo do caminho, mesmo que isso resulte em sua morte.”
Com um olhar de “venha com tudo o que tem”, Caleb se colocou novamente em posição de capoeira e começou a gingar.
Ginro entendeu o recado, e, sem falar nada, posicionou-se com uma mão na frente e outra atrás; posição de um carateca.
Mais alguns segundos se passaram. O vórtice ao redor do corpo de Caleb se intensificou e produzia um som como o de uma ventania. Enquanto isso, Ginro concentrou sua energia, transferindo-a para as partes mais fracas de seu corpo.
Um apito de início imaginário soou e Caleb foi o primeiro a agir. Com sua agilidade e movimentos giratórios, ele facilmente dominou a luta. Seu vórtice conseguia distorcer o campo de visão de Ginro, evitando que ele pudesse acompanhar todos os movimentos imprevisíveis do garoto.
Mas, em contrapartida, Ginro se mantinha estável, concentrado nos golpes mais poderosos, evitando-os com suas mãos e pés.
Os dois trocavam golpes em uma velocidade alucinante, capazes de distorcer o espaço ao redor deles.
Vendo uma abertura ao desviar de uma rasteira, Ginro não perdeu a oportunidade. Ele levantou a mão com velocidade, moldando os dedos como uma agulha e deslizou-a com força para baixo, visando perfurar Caleb de cima.
O garoto ainda estava no chão nesse momento. Ele percebeu o ar sendo rasgado em sua direção e usou seu corpo flexível, torcendo-se em um giro rápido, e esquivando no último segundo.
A mão de Ginro atinge o chão com um impacto brutal, como uma lâmina no concreto, fazendo-o rachar e lançar estilhaços para todos os lados.
Suor desceu pelo rosto de Caleb. Ele com certeza morreria se recebesse aquele golpe.
Essa foi por pouco. Esse cara é um demônio…!
Interrompendo seus pensamentos, uma sensação familiar invadiu seu corpo, como se algo faltante estivesse indo para o seu devido lugar.
Isso é…
Caleb conhecia muito bem aquela sensação. Era a sensação que ele estava esperando muito naquela luta.
Ginro sussurrou algo. Não era exatamente um sussurro, mas chamou a atenção do garoto.
Ele…
O homem que tinha sido nada mais que uma máquina obediente até então.
… Ele está rindo?
Ginro levantou sua voz em uma gargalhada, como se fosse a primeira de toda a sua vida. Parecia que ele estava segurando aquela risada por muito tempo.
Sua voz grave e pesada ecoou pela cratera de centenas de metros de profundidade.
“Eu não sei o que é isso… mas, neste momento, sinto que essa coisa batendo no meu peito vai explodir”, disse ele, rindo alto.
Caleb ficou atônito, à princípio. Por que isso tão de repente? Como aquela casca vazia, programada para acabar com a própria vida estava sentindo tanta excitação?
Caleb sorriu de canto.
Quer saber? Foda-se. É melhor assim.
Ele sentia todo aquele poder se acumular dentro dele. Esse, com certeza, era o combustível que faltava para acabar com aquela luta. As emoções de Ginro no ar eram tão densas quanto seus golpes pesados.
“Ninguém… ninguém que eu precisei matar sobreviveu tanto tempo apenas pela sua própria força”, disse Ginro. “Todos morreram em poucos minutos de luta contra mim…”
“Está dizendo que você é a pessoa mais forte aqui?”
“Não. Mas eu sei que existem poucos como você. Eu vou te reconhecer como um oponente de verdade. É melhor se preparar.”
Dizendo isso, Ginro tirou sua gravata e paletó, jogando-os no chão, como se não tivesse intenção de recuperá-los depois. Certamente, a excitação que ele estava sentindo naquele momento criou uma expectativa sobre Caleb, então ele queria lutar com tudo o que tinha.
Vendo que seu oponente já estava preparado para continuar, Caleb não perdeu tempo e concentrou aquela energia que estava em suas mãos.
Ambos se lançaram um contra o outro, desferindo golpes poderosos de seus respectivos estilos de luta; um exímio capoeirista e um magnífico carateca.
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