Capítulo 114 - O que se esconde na névoa
As gotas de chuva lavavam o asfalto sob os pés de Mayck, seu som intenso acobertava até mesmo sua respiração.
Seus cabelos estavam molhados, sua roupa encharcada, mas ele não parecia incomodado com isso; havia outras coisas ocupando sua mente naquele momento.
Ele já estava bem distante do último palco, e se encaminhava para um novo. Local onde seria sediada a conclusão de um outro evento, que ocorria de forma simultânea.
Por mais abafado que estivesse, Mayck pôde ouvir um som atrás dele.
“Ei!”
Seus passos lentos cessaram e ele se virou. Caleb estava ali, arfando. Parecia ter corrido muito para encontrá-lo. Ele estava na mesma situação. Com os punhos cerrados, ele se aproximou.
“Pensei que você já tivesse ido…”
“Eu conversei com Yamada.”
Quando Mayck falou, foi interrompido.
“E então?”
“Ele me contou que já sabia sobre a reunião e todos os detalhes do plano que nós tínhamos.”
“Certo…”
Mayck apenas respondia com poucas palavras, esperando o garoto continuar — ele já sabia o que estava por vir.
“Foi você quem contou…”
“Você acha??”
“Só eu e você sabíamos tantos detalhes..”
O garoto de cabelos prateados tinha certeza em suas palavras.
“Foi você quem deu a ideia de reunir Yamada e Takeru para derrotar Akagi. A não ser que isso tenha vazado, não tinha por que ele aparecer lá. Você entrou em contato com os dois e traiu a gente, não foi? Por que?”
Yamada tinha dado com a língua nos dentes e dito tudo o que aconteceu dias antes da tal reunião e o quanto ele já sabia sobre os planos de Takeru.
Caleb encarou Mayck firmemente, esperando uma resposta.
“Eu não tinha dito a ele para manter segredo de qualquer forma…” o garoto sussurrou a si mesmo, mas Caleb pôde ouvir claramente. “Bom, é como você imaginou. Eu falei com Yamada, também disse a Akagi sobre a reunião.”
“Mas… por que? O que você pretendia desde o início? Você fez isso sabendo em como acabaria?”
A cidade em chamas, corpos por todos os lados. Só de lembrar, Caleb sentiu seu coração se despedaçar. Ele não era o tipo de agente que resolvia tudo com violência se houvesse outros caminhos, até porque sua organização prezava pelo pacifismo. Então ele cresceu com o ideal de quanto menos machucar, melhor.
Ver aquela destruição sem escala o deixava aflito.
“Eu já sabia como acabaria”, respondeu. “Mas me responda uma coisa. Em nenhum momento você pensou no porquê de eu ser tão cooperativo? Apenas dizer que eu era membro da Black Room foi capaz de te convencer?”
Mayck segurou o silêncio por alguns segundos, esperando que Caleb entendesse um pouco, mas ele só deu um passo à frente e continuou seus questionamentos.
“O que isso quer dizer…?” Seus punhos apertaram ainda mais.
“Você é inteligente. Não deve ser tão difícil assim entender o que eu quero dizer”, disse Mayck, tirando a máscara do rosto.
Caleb tropeçou nas próprias palavras, seus batimentos aceleraram. Aquele era realmente Mayck Mizuki, como ele já tinha suspeitado. No entanto, ter a confirmação de forma tão inesperada… Isso realmente o pegou desprevenido.
“Para não perceber tanta coisa, você devia se envergonhar de ser quem você é.”
“De que porra você tá falando?! O que você queria que eu percebesse afinal? Eu confiei em você. Como você foi capaz de—”
“Eu? Eu não. Eu não tive nenhum envolvimento direto com tudo isso.”
“?!”
“Fale a verdade. Em nenhum momento eu me envolvi diretamente com Takeru. Você pediu minha ajuda, eu te dei conselhos sobre o que poderia fazer. Foi você quem aceitou tudo sem questionar. O que estava pensando afinal?”
“Você… Por que…?”
“Mm? Achou mesmo que mexer com tantos criminosos ia terminar sem nenhuma consequência? Que ingênuo. O que sua mãe pensaria de tudo isso?” Mayck gesticulou.
Os olhos de Caleb caíram, seu corpo estremeceu.
“Centenas, ou até milhares de mortes, uma guerra que poderia ter sido evitada de várias formas… mas o que você decidiu fazer? Decidiu investigar por conta própria, e isso só resultou em destruição.”
Não importava de que ângulo olhasse, se Caleb não tivesse se envolvido, a conclusão seria bem diferente.
“Está vendo aquelas luzes avermelhadas? Elas significam que muitas vidas foram ceifadas enquanto elas eram acesas. Pessoas se mataram por algo que você começou. Qual era sua única tarefa, Caleb?”
Caleb lembrou-se de sua tarefa original: descobrir quem era o Olhos azuis e se Mayck tinha relação com ele. Ele já tinha suas suspeitas, mas decidiu esperar um pouco mais e acabou entrando em contato com o próprio, que negou toda a ligação.
Pensando que seria uma oportunidade única para descobrir de quem se tratava, ele decidiu levar o garoto mascarado com ele em uma nova investigação.
Não podia negar que ficou maravilhado pelas capacidades dele; foi isso que o acabou empolgando a continuar.
Mas então, ele recebeu a notícia que na verdade não era ele quem estava usando-o, mas, sim, o contrário.
Para quê?
Apenas para esconder sua identidade…
“Eu não acredito que você foi capaz de fazer isso.”
… Chantageando-o a manter ela em segredo, após culpá-lo de todas as vidas que foram tiradas e toda a bagunça que foi criada, colocando civis em risco.
“Parabéns, Caleb. Seu plano funcionou muito bem. Apesar dos vários sacrifícios, você conseguiu evitar que os líderes continuassem guerreando e que o soro fosse espalhado… eu acho.”
Mayck bateu palmas leves, fazendo tais palavras soarem verdadeiras.
Caleb, por outro lado, estava desconcertado. Era muita informação para absorver. A ideia de ter sido manipulado desde o início não lhe caía à cabeça.
Seus dentes cerrados fortemente pareciam que iriam quebrar uns aos outros.
“Você esteve me usando o tempo todo… só pra eu não revelar quem você é…?”
“Só entendeu agora?”
Caleb reprimiu um som furioso. Tudo o que ele queria naquele momento, era socar Mayck com toda a sua força e continuar até fazer ele se arrepender do quão sujo havia jogado.
“Por que precisou ir tão longe? Se a gente tivesse conversado, daria para chegar em um acordo…”
“Eu não posso confiar em você. Não vou ficar me arriscando à toa. A partir de agora, você tem duas opções: ou feche a sua boca e finja que nada aconteceu, ou seja crucificado pelo seu próprio grupo.”
Mayck levantou dois dedos junto a essa explicação.
“Você não pode contar sobre mim a ninguém. Nem ao meu pai nem à Olívia. No momento em que fizer isso, o fato que Caleb liderou um massacre generalizado vai ser o principal tópico nas reuniões da Strike Down.”
“Haha… Não existe uma opção onde eu te denuncio e você é preso?” Caleb estava sorrindo nervosamente, seu nervos a flor da pele.
“Não. Ninguém vai acreditar em você. A não ser que você tenha gravado essa conversa de agora, não existem provas de que eu estava te ajudando.”
Era o ultimato. Caleb ponderou por um momento, mas apenas para assimilar algo que já estava óbvio desde o início: ele era a verdadeira marionete. Aquele circo foi montado com o único propósito de prender ele a algo do qual não poderia fugir enquanto não pudesse pesar as coisas na balança.
Mesmo que ele conseguisse provar que Mayck estava com ele desde o início, era um fato irrefutável que tudo se deu por suas mãos. Ele tinha sido o personagem principal naquela história.
“Você… Você é um lixo… Minha mãe me contou que você era filho de uma amiga preciosa pra ela, mas, diferente dela, você é um pedaço de merda”, ele cuspiu, reprimindo sua fúria.
“Lamento se te decepcionei. Não é nada contra você, é ao meu favor. Desde que você fique quieto, nada ruim vai acontecer”, Mayck afirmou e fez uma breve pausa, antes de dar as costas e continuar em frente, deixando Caleb ali, quebrado, em seus próprios pensamentos.
Porém, um rugido feroz se aproximou rapidamente. Mayck, agilmente afastou-se do pé de Caleb, que cortou algumas gotas de chuva perto de seu rosto.
A fúria estava estampada em seus olhos e ele continuou atacando, enfurecido.
Não. Talvez, a palavra mais adequada fosse frustrado. A frustração por ter sido feito e agido como tolo estava corroendo-o fortemente.
Caleb era um portador reconhecido por suas habilidades, que lhe fizeram ganhar reconhecimento como líder de equipe, além de ser filho da diretora da Nova Lótus.
Apesar disso, sua mãe sempre dizia que lhe faltava algo, porém, esse algo nunca apareceu.
Será que eu preciso ser mais confiante? Ou então confiar menos? Ele se questionava diariamente. Mas, provavelmente, ele já tinha encontrado a resposta.
Ele confiava demais em todo mundo. Mesmo que enxergasse a malícia por trás das máscaras, inconscientemente ele acreditava nelas.
E Mayck veio para lhe fazer enxergar isso.
Que droga…
Que droga!!
Aquele era um oponente que fazia o que estivesse ao alcance para conseguir o que queria. Definitivamente era um monstro assim como todos os outros, senão pior.
Numa tentativa de acertar um martelo com o pé direito, Caleb foi surpreendido por uma rasteira no pé esquerdo. Inevitavelmente, ele caiu, e antes que pudesse se levantar, uma força misteriosa o prendeu no chão.
Ali estavam aqueles olhos característicos. Caleb perguntou-se como não tinha percebido antes, já que combinavam tão bem com a expressão fria do garoto a sua frente.
“Relaxa. Não é só você que vai carregar esse peso todo.”
Mayck se afastou sem dizer mais nada e aquela força sobrenatural desapareceu. Porém, Caleb não se levantou ainda.
Totalmente derrotado.
Ele ficou em silêncio, observando as gotas de chuva pingando em seu rosto uma após a outra, de forma que tornava impossível contar.
Que idiota… Quando é que eu vou aprender minha lição?
As roupas encharcadas, pesadas e frias.
Ele remoeu e continuou remoendo sua frustração. Algum dia poderia olhar para tudo isso e não sentir arrependimentos? Só o tempo diria.
Mesmo que ele só quisesse se vingar de Mayck por usá-lo de forma tão cruel, ele sabia que o que movia o garoto não era apenas ambição egoísta capaz de machucar qualquer um.
Diferente de muitos que já entraram no caminho de Caleb, Mayck possuía algo mais para fazer o fez; não um mero motivo, mas um objetivo a alcançar, que não era apenas para si.
<—Da·Si—>
Alguns tempo atrás.
Depois de uma busca completa por vários templos, conhecidos e abandonados, Fuka finalmente chegou à conclusão de que a tarefa seria muito mais difícil do que esperava.
Mas isso já era óbvio desde o início. Afinal de contas, estavam lidando com um grupo ‘extinto’.
Apesar disso, o acontecido na floresta ficou em sua mente. Se Hachishakusama apareceu para ela daquela vez, então apareceria de novo. Isso era certeza.
Porém, por enquanto, só lhe restava esperar ansiosamente por esse dia.
Mayck não respondia às suas mensagens e nem atendia as ligações. Certo. Ele tinha dito que estava ocupado, mas não era meio cruel ignorar alguém que estava tentando ajudar seu amigo desaparecido?
Que seja. Vou fazer do meu jeito.
Junto aos garotos, que ocasionalmente eram seus colegas de equipe, ela iniciou uma série de pesquisas nos computadores da organização, em busca de qualquer informação sobre o grupo conhecido como Tengoku no Mon.
No entanto, tudo o que encontrava eram coisas básicas como o que faziam e como operavam — apenas o que um mero soldado precisava saber. Por isso estava sendo inútil.
Kaito já havia lhe informado que informações assim já teriam se perdido há muito tempo, porém, certamente havia algo estranho.
Qual era o sentido em deletar tudo relacionado a um grupo que já tinha sido apagado da existência? Para esconder o que eles faziam e como faziam? Se esse fosse o caso, documentos assim já teriam sido destruídos há muito tempo.
Não tinha razão para esconder coisas assim.
“Sei não… isso está me cheirando mal…” Yuno resmungou.
Era cerca de 14 hrs. O grupo estava reunido em um café conhecido na região, em frente a um pequeno parque. Havia xícaras de café e alguns waffles sobre a mesa. O jazz tocando num tom suave e o cheiro de grãos pairando no ar, misturados à luz ambiente criavam uma atmosfera acolhedora.
Apesar disso, o conteúdo da conversa entre os quatro integrantes do grupo não era lá muito adequado para o ambiente. O café, porém, não estava muito cheio naquele horário, eles podiam falar num tom confortável, onde podiam compartilhar suas informações de forma relativamente tranquila.
“O que você acha?” O garoto olhou para Kaito com olhos curiosos.
Kaito abaixou sua cabeça e encarou a xícara de café com leite, cujo vapor deixava seus óculos embaçados.
“Pode não ser algo tão importante mesmo, mas não dá pra deixar de lado com apenas isso.”
“Esse caso não é o único que foi esquecido. Tem vários outros. Se for apenas uma queima de arquivos desnecessários, então…” Fuka ponderou por um momento.
Apesar de haver nuvens naquele dia, não estava um clima frio, mas a garota ainda usava seu moletom preto e capuz.
“Hmpf! Se for isso, então a gente só tá perdendo tempo”, Rikki reclamou. “Não é só a gente falar com os chefões logo? Eles devem dar uma resposta.”
Em sua cabeça, as coisas podiam ser mais simples.
“Idiota. Se for mesmo para acobertar alguma coisa, nós não vamos sair de lá vivos.”
“No pior dos casos, vamos nos tornar soldados robóticos que só devem sacrificar a própria vida pelo bem da organização.”
Rikki soltou um “Idiotice” e voltou a tomar seu café, com a cara fechada.
“Mas, ainda assim, a única saída é buscar informações de alguém mais velho… Eu ouvi de um colega da minha turma que não é tão raro algumas coisas apenas desaparecerem assim”, Kaito afirmou.
“Eu também ouvi…”
“O problema é que ninguém nunca sabe o porquê. Se souberem, são os agentes de níveis mais altos… Oh, não!”
Kaito interrompeu sua fala repentinamente e se calou por completo, deixando Fuka e os outros em suspense.
“O-o que foi isso cara? Enlouqueceu?”
“Não… eu só pensei que… e se Haruki descobriu algo e eles mandaram silenciá-lo? Ele pode não estar vivo agora…”
“Para com isso seu grandiosíssimo idiota! Não tem como isso acontecer… Não tem né?” Yuno estava em choque com a revelação.
Por outro lado, Rikki riu alto e Fuka balançou a cabeça em reprovação.
“É sério que eu ainda insisto em falar com esses moleques?”
Eles eram um grupo bem aleatório e cheio de personalidade, de fato. Trabalho sério não era bem a praia deles e manter uma postura rígida também não parecia ser possível.
Mas… parando pra pensar… porque logo a mãe de Haruki? De tantos alvos, por que ela especificamente?
Fuka sabia que poucos sabiam sobre as circunstâncias familiares de Haruki. Afinal, o garoto não era do tipo que se prendia a lembranças tristes ou saía contando tudo sobre ele para todo mundo.
Apenas a organização e alguns poucos amigos sabiam uma pequena parcela de seu passado.
Então como…?
Teriam vendido a informação? Pesquisado sobre ele? O que ele teria a ver afinal de contas?
Talvez o garoto tivesse se envolvido com os remanescentes do grupo e feito algum tipo de acordo para trazer sua mãe de volta à consciência. Era provável, porém…
“E se…”
Fuka abriu a boca, atraindo os olhares dos garotos que ainda continuavam uma discussão inútil sobre o trágico destino de Haruki.
“E se a organização não tiver eliminado todos da Tengoku no Mon?”
“O que isso quer dizer?”
“Exatamente isso.”
“Você diz que alguns fugiram?”
“Não”, Fuka corrigiu. “Se fosse isso, então ainda haveria missões atrás deles. Sem contar que isso tudo aconteceu há mais de cinco anos.”
As memórias daquela época ainda estavam frescas em sua memória, como se fossem alcançá-la em um futuro próximo.
Um silêncio perturbador os envolveu. Certamente todos tinham chegado à mesma página.
A GSN tinha um acordo com os remanescentes da seita.
“Se eu entendi direito… então o que você está dizendo é muito sério.” Kaito quebrou o silêncio com essas palavras. Pela primeira vez, ele parecia estar lidando com isso da forma que deveria.
“Eu sei. Mas é a única coisa que consigo imaginar. Além do mais, nós fomos dispensados das atividades rotineiras e orientados a ficar atentos a qualquer chamado. Logo depois isso tudo começa. Não é suspeito?”
Haruki até havia comentado sobre o que seria o tal algo que poderia surgir em breve. Então se ele sabia o que era realmente, então o que Kaito falou fazia algum sentido. Não era o que Fuka pensava, no entanto.
Tengoku no Mon foi marcada como uma seita composta por fanáticos doentes que acreditavam no sobrenatural e na inferioridade humana com toda a alma. Acreditavam em seres superiores, e que os humanos não passavam de recipientes para seu poder.
Como receptáculos, seu único dever era servir somente a tais entidades. Isso os levava a rituais cruéis, em um nível que faria qualquer um questionar a própria sanidade.
Foi isso que a fez ser erradicada. Eles eram perigosos demais e a GSN se encarregou desse trabalho quando a Strike Down negligenciou as atividades problemáticas.
Entidades. Foi assim que eles nomearam, mas, na realidade, são todas as criaturas existentes no folclore japonês. Talvez vá até mais longe que isso.
Fuka sabia muito bem o que estava pensando. Seu sangue fervia só de imaginar.
“Realmente… Isso faz sentido.”
“Mesmo assim. Por que eles nos alertaram em primeiro lugar? Se fosse para esconder, o melhor era manter em segredo, não é?”
“Eu não sei. Mas agora temos por onde começar. Eu não tenho dúvidas de que pode ser isso.” Fuka se levantou rapidamente, afastando sua cadeira.
“Ei, ei, ei! O que pensa que vai fazer?! Se você estiver certa, investigar é pedir pra morrer.”
“Hahaha! Agora sim parece interessante.”
“Não apoie ela!”
Yuno repreendeu Rikki. Era justificável. Afinal, todo agente da GSN sabia que estavam cada um por si e que ninguém do alto escalão faria algo por eles a não ser oferecer treinamento e provisões para servirem a organização.
“Eu entendo como se sente, Yuno, mas Haruki pode estar em perigo nesse exato momento. Eu sei que é loucura, mas concordo com ela.”
Kaito se levantou.
“Vocês são dois malucos…”
“Hahaha! Que a diversão comece agora. Vamos logo atrás desses bundões!”
“Três malucos… Ah! Droga! Tá bom, que seja!”
Eles pagaram a conta e saíram rapidamente. Mesmo sem planejar em primeiro lugar, eles acessaram o sistema da organização, apenas o que os agentes tinham acesso.
Eles revisaram os supostos locais onde ocorreram as ondulações. Eram três delas e estavam localizadas em locais próximos uma da outra.
Apesar de inseguros sobre as muitas especulações e poucas informações, eles não perderam tempo e se dirigiram imediatamente para o local. De onde estavam, em Adachi, o trajeto era cerca de 250 quilômetros, então eles fizeram várias baldeações até o lugar.
Além disso, o restante do trajeto a partir da última estação deveria ser de ônibus, então eles demoraram mais que o planejado. Não exatamente, já que eles não tinham uma meta a cumprir.
Em suma, uma viagem que poderia ter levado ao menos quatro horas, levou cerca de sete, e quando conseguiram entrar na trilha a lua já estava bem alta no céu.
E embora não tivesse muitas nuvens, a iluminação era precária.
Com lanternas em mãos, eles seguiram a trilha principal e adentraram a floresta. Estavam em seus trajes de agentes, levando aquilo como uma missão séria.
Embora houvesse três locais, Fuka escolheu seguir para onde teve a maior ondulação dentre elas.
“Ai! Cassete!” Yuno reclamou após tropeçar em uma pedra. “Por que a gente tinha que vir justo agora? Droga… Eu odeio lugares escuros.”
“Para de chorar tanto, seu cabaço.”
“Caba—! Vê se morre, otário!”
“Hã?! Você quer apanhar, seu merdinha?!”
“Dá pra calarem a boca? Vão acabar chamando a atenção de algum urso com esse barulho todo.”
“Como se as lanternas não chamassem atenção, seu idiota!”
“Tivemos sorte de não encontrar nenhum urso ou javali até agora. Se aparecer algum, estamos ferrados.”
Depois de caminhar por mais de meia hora, era natural que estivessem cansados e estressados. Além do mais, a floresta tinha um ar abafado, o que dificultava a respiração. Os três garotos estavam com seus ânimos bem altos.
“Silêncio, todos vocês”, Fuka interferiu, virando-se para os garotos atrás dela, e jogando a luz da lanterna em seus rostos sem piedade.
“Ai! Meus olhos…!”
“Poxa, Fuka, bem que a gente poderia ter deixado pra vir amanhã. Isso aqui é terrível”, Kaito limpou seus óculos pela trigésima vez. “Sem contar que fica quase impossível achar algo que nem sabemos o que é nessa escuridão toda.”
“Hahaha! Já tão arregando? Fiquem pra trás se já estiverem cansadinhos.”
“Rikki…”
“Já chega. Prestem atenção. Segundo o mapa, a região exata de onde a ondulação se originou fica numa área bem mais elevada. Isso quer dizer que vamos demorar bem mais para chegar. Basta não perdemos o foco.”
“Uma área elevada? Você quer dizer no pico de alguma dessas montanhas?”
“Sim”, ela respondeu e continuou a caminhar.
“Ah, droga…” Yuno e Kaito reclamaram mais uma vez, porém, não tinham escolha senão ir atrás deles.
Eles caminharam por mais algum tempo entre as árvores e pedregulhos, saindo da trilha e seguindo para a direção que o mapa estava marcando no tablet de Fuka.
Finalmente chegaram a algum lugar. A floresta densa com clima úmido se estendia mais para a frente de forma inclinada. Naquele ponto, dava para ouvir o som distante de riachos que corriam infinitamente por aquela área. O farfalhar das folhas e canto de insetos levavam aquele silêncio a parecer uma melodia constante da natureza.
Fuka levantou sua lanterna e o grupo respirou fundo simultaneamente, deixando o gélido ar entrar em seus pulmões. A partir dali, seria uma subida de mais de dois mil metros.
“Vamos nessa, então…”
Chegaram até ali, não podiam voltar atrás. Seria uma completa perda de tempo recuar diante daquele monte imponente.
Então eles iniciaram a caminhada até o topo do monte. Conforme se aproximavam, o ar ficava mais rarefeito. Havia uma névoa que cobria o topo também. Era um trajeto cansativo, mas eles eram agentes treinados pela GSN, apenas isso não seria o suficiente para os impedir.
A cada metro que eles subiam, a névoa ficava mais densa, a ponto que três metros era o mais longe que podiam enxergar, sem contar que a temperatura caiu drasticamente, num ponto que parecia anormal.
Todos atentos ao redor, uma energia sombria e sinistra se apossando da floresta.
Falta pouco…
As lanternas iluminando a frente, dava para ver o caminho da luz.
“Ah!!” De repente um grito exagerado correu pela floresta quando ninguém esperava, o que os fez pular de susto.
“Que porra foi essa, cara?! Tá tentando matar a gente?!”
“É que… eu escorreguei e minha lanterna caiu”, disse Yuno, apontando para a luz que caiu monte abaixo.
“Você, hein… Esquece isso. Vamos em frente. Tome cuidado pra não cair também.”
“Peraí, não me deixem no escuro!”, ele choramingou e correu para o lado de Kaito.
Depois do susto, eles voltaram a caminhar, baixando a guarda sem perceber.
Barulhos nas moitas próximas os deixavam alerta, mas não eram nada além de pequenos roedores. Algumas aves faziam barulho nas árvores, mas eles não temeram.
“Ainda… falta muito…?” Kaito parou, arfando, com as mãos apoiadas nos joelhos.
“Estamos quase lá… Falta pouco. Aguenta aí.”
“Hehe… É o que dá quando falta tanta disposição física”, Rikki zombou do amigo enquanto o rodeava, mostrando toda a energia guardada.
Até Fuka concordava com isso, já que ela estava em ótimas condições. O ar estava muito mais rarefeito naquela altura, e misturando com a frieza e umidade do ambiente, era bastante admirável.
“Não falem… de mim… Afinal, Yuno é bem mais sedentário que eu. Não é?”
Ele olhou para Yuno, que estava… atrás dele? Não estava.
“Yuno?”
“Yuno!”
Eles procuraram com as lanternas. Yuno não estava mais reclamando desde que perdeu a lanterna, mas eles sequer perceberam isso. Pensaram que ele só tinha resolvido ficar em silêncio, então não dava nem para saber quando ele sumiu ou para onde foi.
“Merda… Será que ele desmaiou por causa do ar e caiu?”
“Ele teria avisado antes. Yuno não é do tipo que guarda tudo pra si. Procurem ele, rápido—”
Fuka mal terminou de falar e um grito apavorante irrompeu pelas árvores. Vários pássaros fugiram de seus ninhos e uma atmosfera pesada recaiu sobre eles.
Eles se juntaram, seus olhos cobrindo todas as direções. Algo estava errado.
As árvores pareciam estar retorcidas e as sombras criadas pela pouca luz que chegava a eles tomavam formas assustadoras. As folhas farfalhavam e balançavam de um jeito esquisito por conta de um vento que não tinha há poucos segundos.
“Isso foi…”
“Foi o Yuno! Ele não deve tá tão longe! Vamos! Sinto que não é bom ficarmos aqui parados.”
Com um consentimento imediato, todos correram para o topo do monte. De onde surgiu fôlego era um mistério, mas uma coisa era certa, Kaito tinha razão em sua afirmação.
Havia algo entre as árvores, observando os três silenciosamente, cujas vestes brancas serviam como camuflagem naquela névoa opaca. Sua presença sinistra não era a de um ser humano.
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