Índice de Capítulo

    Aviso de conteúdo sensível !

    Boa leitura

     Finalmente chegaram até Yuno. Apesar de tudo, conseguiram chegar vivos e inteiros até ali. 

    Era uma espécie de átrio amplo, com uma arquitetura estranhamente bizarra, como se tivesse sido projetada por alguém cuja cabeça estava tomada por pensamentos malignos. 

    O ar daquele local era incômodo, e parecia que aquelas dezenas e imensas estátuas de onis postas de guardas ao redor do pátio iriam se mover de seus lugares e destruí-los a sangue frio, sem que Rikki e Kaito tivessem a mínima chance de se defender. 

    Sem se ater muito aos detalhes, eles correram até um altar de pedra, de onde escorria uma quantidade considerável de sangue, rodeado de velas e no centro de uma espécie de círculo vermelho com palavras estranhas ao redor, escritos com uma caligrafia pesada. 

    Yuno repousava sobre ele, sua pele pálida e corpo magro, como se sua energia vital estivesse sendo sugada constantemente. 

    Kaito quase desmaiou ao ver o garoto, devido ao seu corpo que relaxou de forma quase instantânea, mas ele conseguiu se recompor. 

    Apesar da situação delicada de Yuno, ele ainda parecia ter salvação; escolheram acreditar nisso. Então arrancaram o garoto de cima do altar, desgrudando-o de vários fios nojentos e grotescos, que tinham penetrado sua pele. 

    Apressadamente, deixaram aquele lugar com arrepios em suas costas. Já haviam lutado muito para chegar àquele lugar, enfrentaram um grupo de cultistas malucos que gritavam, dizendo que eles eram sacrifícios para o “Homem da mentira”, enquanto os atacavam de forma amadora e afobada com facas ritualísticas e entoavam cânticos macabros. 

    Por conta dessas batalhas, eles estavam em estados ainda piores que quando saíram de perto de Fuka, e tudo o que queriam era sair daquele lugar, cuja atmosfera os assombrava constantemente. 

    Eles correram pelos corredores sombrios e silenciosos, carregando Yuno, e logo chegaram onde estavam antes. 

    “Porra…”

    Seus olhos contemplavam o estado do que antes era apenas um corredor. Estava em ruínas, como se uma explosão tivesse ocorrido bem ao centro, e várias salas ficaram ligadas diretamente sem a necessidade de portas. 

    “Acho que as duas se envolveram bem por aqui”, disse Kaito, abismado, mas logo voltou a si. “Não é hora pra isso. Vamos sair daqui de uma vez. Não sabemos qual é o estado do Yuno.”

    “É só você se mexer”, Rikki respondeu, iniciando uma corrida para mais ao centro daquela nova e ampla sala criada artificialmente. 

    Não demorou muito e eles encontraram Fuka, de volta a sua forma original. Parecia que o resultado da luta já havia sido decidido. Ela estava de joelhos, abraçando uma mulher de cabelos ruivos e pele pálida. 

    “Hã? Quem é essa mulher?” A surpresa apareceu em seus rostos. 

    “Mm? Ah! Vocês voltaram… e trouxeram Yuno. Que bom”, disse ela. Um sorriso melancólico apareceu em sua face. 

    “Parece que você está bem também.”

    “Sim… Depois do que Rikki falou, eu pensei bastante. Se continuasse daquele jeito eu realmente seria só um peso…”

    Seus olhos pararam em Rikki, que se encolheu um pouco, lembrando-se de algum tempo atrás. 

    “Huh.”

    “Essa aqui é a mãe de Haruki. Ela estava possuída pela Hachishakusama—”

    Ela nem terminou de falar e um “o quê?!” exagerado atacou seus ouvidos. Os dois garotos estavam completamente atônitos com a revelação repentina. 

    “Me deixem terminar… Ah! Que seja. Depois nós falamos disso. Vamos sair daqui agora. O mais importante é cuidar de Yuno.”

    “Espera, espera. Vamos levar a mãe de Haruki também?”

    “Não é óbvio? Ela ainda está viva e não é como se eu fosse deixá-la aqui. Além do mais Haruki deve querer vê-la, já que a maldição foi retirada.”

    Por alguma inspiração sobrenatural, Fuka começou a medir os fatos e motivos dela querer levar Miyuki com ela, mas os dois garotos já tinham deixado de ouvir há alguns segundos. 

    O motivo? A mulher ruiva abriu os olhos, mas também a boca e não era de uma forma que ela fosse falar, mas a boca se abriu de forma exagerada, expondo seus dentes afiados como lâminas. Seus olhos esbranquiçados, como se não houvesse uma consciência ali. 

    “Cuidado—!”

    Rikki agiu sob o desespero e se jogou sobre elas. Conseguiu tirar Fuka da direção dos dentes, porém…

    Crack!

    “Aaargh!!”

    Uma dor indescritível, seguida de uma dormência desesperadora percorreram seu corpo, e um líquido vermelho jorrou para todos os lados. Rikki teve o desprazer de ter os ossos de seu braço direito quebrados com uma mordida voraz.

    “Rikki!”, Fuka gritou horrorizada. 

    “Sua… maldita…!”

    Com sua mão esquerda, Rikki tentou se livrar dela desferindo um soco em seu rosto, mas Hachishakusama, que acabara de retornar, ficou intangível e saiu de perto rapidamente. 

    Imediatamente, ela lançou seus longos cabelos pretos e agarrou os quatro jovens pelo pescoço, erguendo-os no ar com aqueles fios que pareciam ser feitos de algum aço desconhecido, que mais parecia o aperto feito com manoplas.

    “Por que…?” Fuka pensou que as coisas tinham se resolvido, e por conta disso baixou a guarda, mas foi pega de surpresa ali. 

    Ao contemplar o semblante do monstro, percebeu que havia algo instável, como uma expressão chorosa contrastando com aquela face terrível. 

    Merda… Eu esqueci! Haviam duas consciências lá dentro. Miyuki pode ter se acertado, mas isso fez Hachishakusama ganhar mais força. 

    “Ah~ Eu terei você… Não adianta lutar… Esse poder é delicioso!” Em meio às lágrimas, os desejos verdadeiros do youkai se manifestaram.

    O que fazer naquela situação? Fuka estava perdida, mas, mais importante, ela tinha que libertar Miyuki de uma vez por todas. Para sua sorte, a linha entre a possessão e o domínio completo do corpo ainda estava tênue; Miyuki poderia lutar. 

    Eu tenho que voltar pra lá… Talvez a única forma seja exterminá-la de dentro pra fora. 

    Hachishakusama era uma existência espiritual, assim como ela em sua forma verdadeira. Isso significava que para matá-la de onde estava, teria de acabar com o corpo e isso resultaria na morte também de Miyuki. Portanto, a maneira mais eficaz de alcançar o final que desejava, era exorcizando o youkai por dentro. 

    Assim, carregando sua energia, ela a transferiu pelos cabelos do youkai até chegarem na cabeça dela, um mero contato seria o suficiente, e isso foi um sucesso. 

    Aguentem um pouco mais…

    Com Rikki e Kaito no limite e Yuno desacordado, ela tinha que se apressar. 

    No momento em que as energias se conectaram, o tempo parou e um silêncio irrompeu de repente.

    Em um piscar de olhos, ela foi transportada para aquele campo de flores mortas. Não havia muitas mudanças desde que saiu dali após Miyuki desmaiar. Por certo, apesar de ter tido uma conversa sincera com a mulher, ela ainda estava à mercê dos sentimentos ocultos em seu coração. 

    Tudo bem. Vamos encerrar isso. 

    Ela pensou em procurar a mulher, mas foi encontrada primeiro e os fios negros prenderam seus braços, puxando-a de forma violenta. As sombras estavam próximas às suas costas, querendo tragá-la violentamente. 

    “Você vai vir comigo!”

    “Seu monstro…” A garota cerrou os dentes. Algo queimava em seu peito. “Eu vou acabar com você.”

    Fuka respirou fundo, enquanto resistia às sombras. Uma luz irrompeu de seu corpo e todos os fios foram queimados tão rapidamente quanto linhas sob o fogo. 

    “Eu não vou deixar você continuar com isso. Espero que esteja pronta para desaparecer.” De repente, o tom de voz de Fuka mudou, como se ela estivesse no ápice de sua seriedade; a atmosfera em volta dela mudou. 

    Aquela mesma luz que afastou o youkai a envolveu. Era um brilho suave, limpo e divino, diferente da entidade que só emanava uma energia escura aterrorizante. 

    Os batimentos cardíacos de Fuka aumentaram, assim como seus cabelos, que ganharam uma tonalidade mais prateada. Os olhos de raposa brilharam e um traje composto por um Kosode e uma Hakama vestiram seu corpo como vestes celestes. 

    Como se fosse algo natural, Fuka estendeu sua mão e segurou um bastão dourado reluzente de cerca de um metro de comprimento. O bastão parecia vivo, com uma textura suave, mas firme ao toque. Numa das extremidades, os shide se desdobravam, suas formas etéreas e resplandecentes, emitindo uma luz suave, como se estivessem em constante movimento. 

    Fuka moveu seus lábios avermelhados e falou com uma voz suave:

    “Eu já aceitei quem eu sou. Fui uma tola por tentar apagar a mim mesma, prendendo-me nas minhas memórias, sendo dominada pelo medo. Eu falhei daquela vez, mas não vou repetir o meu erro. Não vou permitir que seres como você estraguem o mundo de pessoas como Hikari.”

    Naquele momento, dava para distinguir perfeitamente a luz das sombras, que estavam em lados opostos. O brilho divino que Fuka emitia era cegante, e apesar de isso ser incômodo para Hachishakusama, ela parecia ainda mais determinada a tê-la para si. 

    “Haha… Hahahaha! Ahn~ Isso é tão bom~ Eu vou te destruir, vou fazer essa luz se corromper e se tornar parte das minhas sombras.”

    Sem hesitar, Fuka chacoalhou o bastão na direção do youkai, que emitiu um brilho e lançou uma rajada de energia, a qual obliterou tudo em seu caminho. Hachishakusama conseguiu escapar com vida, mas recebeu alguns ferimentos em seu braço, como se chamas celestiais queimassem sua pele corrompida. 

    Apesar disso, ela não se abateu, mas gritou, furiosa e extasiada. Ao mesmo tempo que se irritava com a resistência da Kitsune, ela adorava ver aquele poder que em breve estaria em sua posse, embora não soubesse o motivo disso. 

    Estendendo seus braços, eles se esticaram de forma anormal, e tentaram agarrar a garota, assim como seus cabelos negros faziam. Saíram cerca de três pares de braços de suas costas, os quais, equipados com unhas longas e pretas, fariam um mal gigantesco caso acertassem Fuka. 

    Mas isso não parecia ser um problema para a raposa sacerdotisa, já que o poder emanando do gohei era capaz de manter os ataques destrutivos longe. As mãos de Hachishakusama eram repelidas e atingiam o chão, causando impactos poderosos e inimagináveis, jogando estilhaços para todos os lados. 

    Onde ela tá?

    Mesmo presa no combate esperado, Fuka ainda procurava pela consciência de Miyuki. 

    Você não foi devorada, né?

    Apenas naqueles segundos em que deixou aquele lugar para trás, o youkai tinha ganhado força sobre a mãe de Haruki. Dito isso, não havia se passado muito tempo — ainda havia esperança. 

    Esse lugar não é tão amplo pra ela se esconder de mim. Ela não deve estar muito longe.

    Seguindo a sequência de acontecimentos até ali, ela conseguia formar uma boa teoria sobre onde a encontraria. Ambas estavam conectadas espiritualmente devido às habilidades de Fuka, e quando isso aconteceu, era Hachishakusama quem estava no controle. 

    Então só deve ter uma resposta. 

    Ela olhou para o local mais provável: Hachishakusama.

    Assim que Fuka saiu, o youkai aproveitou a brecha deixada por ela e tomou o controle do espírito cansado de Miyuki, então tentou findar o que restava dela, assim, tomando o controle por completo. 

    Ela está aí dentro, não é? Eu vou tirá-la daí agora. 

    Fuka bateu o gohei contra o chão, fazendo a energia espiritual irromper no ar como uma ventania prateada e como uma bomba, que queimou todos os braços da entidade e abriu um caminho limpo até ela. 

    “Sua maldita!” O youkai foi infligido com uma queimação terrível em todo o seu corpo. Parecia que estava sendo lentamente cortada com uma serra. 

    O gohei, então, foi posicionado apontando para o youkai e brilhou intensamente. 

    Esse é o golpe final. Eu não sei quais eram suas intenções verdadeiras, mas seus desejos e os de Miyuki devem ter se misturado, não é? Afinal, as duas queriam o meu poder. 

    Fuka sentia isso. 

    Para salvar Hikari, Miyuki queria o poder da Kitsune emprestado, mas esse desejo foi corrompido por Hachishakusama e ficou embaralhado, fazendo-a pensar que era um desejo benéfico para si mesma. E sendo um youkai que representava a destruição e corrupção, não havia outra senão a imensa vontade de controlar algo que poderia ser muito maior que ela apenas para o mal.

    “Tudo bem. Agora é hora de libertar Miyuki e desaparecer, youkai. Espero que descanse do que quer que esteja te prendendo aqui.”

    Ao dizer essas palavras com serenidade e um olhar gentil, o gohei disparou uma rajada poderosa de energia que ofuscou todo o cenário, e Hachishakusama, incapaz de revidar aquele poder, foi engolida por ele, sendo dispersada como a escuridão no amanhecer, deixando para trás apenas gritos de agonia. 

    Ela se foi. Um tipo de luz que copiava o sol brilhou intensamente no céu acinzentado. 

    Apenas Miyuki restou ali, após a luz majestosa se dissipar.

    Ela abriu os olhos e viu seus pés sobre aquelas flores que olhava para elas: estava descalça, mas isso não a incomodava, afinal, sua consciência estava leve, seu coração estava calmo. 

    A falta de algo sombrio pairando sobre ela não causava preocupação alguma. 

    Rin.. Rin…

    O som suave dos sinos do gohei soaram em seus ouvidos como uma simples, mas suave e acolhedora melodia. A paz em seu coração foi restaurada. 

    Ela olhou para a sacerdotisa raposa que se aproximava lentamente e um sorriso nasceu em seu rosto pálido. 

    “Você… Fuka…?”

    “Sou eu.”

    “Mesmo com a aparência dela, eu consegui te reconhecer…”

    “Uhum.”

    “Me desculpe… Eu te causei muitos problemas…” Miyuki baixou o olhar, sentindo um aperto no peito, mas um toque delicado em sua mão a fez levantar a cabeça. 

    “Não se preocupe. Vamos voltar agora, certo? Tem gente esperando por você.”

    O convite fez seu coração saltar, seus olhos brilharam e ela sorriu novamente. A mulher ruiva acenou com a cabeça e segurou firmemente aquelas mãos, que a tirariam daquela prisão de tristeza e dor.

    Finalmente tinha acabado. Parecia um sonho. Aquele inferno estava sendo deixado para trás e não havia mais nada que a prendesse ali. 

    Ela finalmente veria o rosto do filho que tanto amava. Mal podia aguentar de tanto êxtase em sua alma. 

    Eu esperei tanto tempo por isso… Muito obrigada, de verdade, Fuka. Eu perdi Hikari e muitas outras crianças, fiquei presa em correntes que eu mesma amarrei no meu pescoço… Mas você veio me salvar. Eu estava certa no fim das contas.

    Fuka era a luz de esperança que ela tanto acreditou. 

    Será que… dessa vez, eu poderei ter uma família de verdade?

    As duas, cercadas por um fio invisível, correram em direção à luz que brilhava no horizonte, enquanto, em seu caminho, um campo florido ressurgia em todo o seu esplendor. Algumas pétalas de flores de ameixa eram levadas por um vento saudoso, que acariciava seus rostos e diziam que elas fizeram um bom trabalho, não só ali, mas em toda a vida até aquele momento. 

    Um calor confortou seus corações. Sentiam seus medos e receios sendo carregados por aquele vento, para bem longe. 

    Miyuki olhava atentamente para as costas da sacerdotisa, que corria com firmeza sem olhar para trás. 

    Você é uma garota incrível… Eu gostaria de passar mais tempo com você. Só que… é uma pena…

    <—Da·Si—>

    Haruki estava perdido em um breu, em meio ao silêncio atordoante. Seus sentidos não permitiam que ele dissesse onde era esquerda ou direita. Abaixo de seus pés, o chão parecia água, ondulando levemente. 

    Se o local mais profundo da alma de Mayck fosse aquele lugar solitário e sem cor, então aquela imensa escuridão era a do garoto ruivo. 

    Há muito tempo ele se via perdido ali. A noite vagava por aquele oceano que não o afundava e nem o levava à terra firme, apenas desejando um encontro, não importava com quem. 

    Talvez a primeira vez dele ali foi quando sua mãe adoeceu. Ele quis se trancar em algum lugar, vendo que não teria a mesma vida alegre de tempos atrás. 

    Sua mãe era uma mulher doce e gentil. Ela era um pouco grudenta também e tinha um jeito bobo de ensinar, mas ele sabia que ela só queria o seu bem, e seu amor por ele era demonstrado todos os dias em forma de refeições e brincadeiras.  

    Seu pai, um homem rígido e disciplinado era como um segurança da família, mas ele também tinha seu lado carinhoso e seu comportamento mudava bastante quando se tratava de sua família. 

    Era uma vida feliz. Haruki se sentia acolhido estando com eles, mas isso acabou de repente. Tão rápido quanto um sopro, que não hesitou em tirar tudo dele. 

    “Onde foi que eu errei?”

    Por muito tempo, esse garoto culpou a si mesmo. Sua frustração foi sendo derramada sobre os inimigos que teve que enfrentar sendo um membro da GSN. 

    Uma vez, um de seus alvos, no final de sua vida, coberto de sangue, gritou: 

    “Você não vai ser feliz nunca. É só um psicopata colocando a desculpa nas perdas que teve.”

    Ele não poderia negar que pensou nisso diversas vezes. Talvez fosse por isso que sua ID era focada no passado, mostrando um pesadelo para desestabilizar os outros e culpá-los por seus crimes. 

    “Assim como eu estou quebrado.”

    Pensar que aquele homem estava correto causava arrepios, uma sensação amarga, mas o garoto estava disposto a mudar isso. 

    “Eu não perdi tudo completamente.”

    Ele tinha amigos. Mesmo naquele momento, havia pessoas dando suas vidas para resgatá-lo de uma mentira. 

    Depois de suas perdas, ele conheceu Chika, uma garota enérgica, igual ao personagem que ele criou. Ela estava sempre sorrindo e rindo das coisas mais idiotas. Apesar disso, ele conseguia enxergar uma sombra por trás dela. 

    Mayck era um cara sério. Não falava sobre sentimentos e nem demonstrava muito. Isso não mudou, mas até que em certo momento ele começou a se abrir mais. 

    Hana se juntou ao grupo sendo aquela que repreendia os comportamentos exagerados. E mesmo que fosse muito séria, nem ela era capaz de evitar rir quando algo bobo acontecia. 

    “Eu não estou mais sozinho… E eles também têm seus próprios problemas.” Sorriu.

    Cada um tinha seu fardo a carregar. Ninguém estava livre da realidade que os cercava. 

    Pela primeira vez em muito tempo, Haruki deu um passo naquele lugar escuro e frio. A água ondulou sob seus pés, logo ele se viu caminhando, não sabia para onde, não havia rumo. Porém, isso não importava nenhum pouco. 

    “Aconteça o que acontecer, eu só não posso ficar parado.”

    Talvez ele nunca encontrasse a saída daquele lugar. Talvez, até o fim de sua vida, ele seguisse em círculos, mas estava tudo bem. Ele não estava tão perdido assim, no fim das contas. 

    Haruki abriu os olhos, após ser chamado pelo nome. Ele viu o céu noturno, ainda cinzento. 

    Parece que a chuva não vai parar tão cedo…

    “Finalmente acordou, hein. Pensei que tinha morrido mesmo”, disse Mayck, com um tom irônico. 

    “Eu disse que você podia.”

    “Mas eu não quis.”

    O ruivo se levantou, seu corpo estava extremamente dolorido, desde o topo da cabeça até a ponta dos pés. Ele também estava deitado no mesmo local em que caiu antes de ficar desacordado. 

    “Você podia pelo menos ter me colocado num lugar mais limpo”, reclamou.

    “Eu não quis também. Muito trabalho. Eu não sei se você ficou sabendo, mas eu não tô fora de casa há duas horas.”

    Haruki bufou e se sentou no tronco caído de uma árvore aleatória com marcas de guerra. 

    Os dois garotos, então, resignaram-se a observar aquele templo obscuro posto há alguns metros dali, cujas portas fechadas mantinham-se invictas há mais de uma hora num quesito de quem ficava mais tempo fechada. 

    “Será que eles estão bem?”

    “Quer ir conferir?”

    “Não…”

    Mayck respondeu com um “imaginei” e fechou os olhos, abaixando levemente a cabeça. Depois de alguns segundos, ele quebrou o silêncio. 

    “O que você vai fazer quando eles voltarem?”

    “Mm? O que isso quer dizer?”

    “Você vai dizer a eles que era piada, que você não estava possuído e só queria forçá-los a lutar contra o passado deles?”

    Haruki sentiu aquelas palavras atravessarem seu peito como lâminas e esboçou uma feição amarga. 

    “Isso realmente parece o que um vilão faria…” 

    “Não é?”

    Infelizmente, ou não, ele teve que aceitar seu destino. 

    Mudando seu semblante para algo mais sério, ele falou:

    “É claro que não vou dizer. Quer dizer, se eu fizer isso, provavelmente as coisas vão ser mais complicadas de lidar. É um saco ter que ficar explicando as coisas. Sem contar que não foi fácil passar todos esses dias perto daqueles alucinados malditos.”

    O garoto reclamou do fato dos cultistas passarem dias e noites cultuando algo através de um espelho gigante, o qual ele não conseguia ver. Era estranho, mas Mayck não perguntou sobre isso. 

    Foi nesse momento que as portas do templo se abriram num baque. Os garotos se levantaram imediatamente, seus corações palpitantes, ansiosos pelos resultados. 

    Do meio do breu, Kaito e Rikki saíram, carregando um Yuno adormecido nos braços. Devido ao fim da maldição, ele parecia menos pálido e não tão magro. 

    Logo após, saiu Fuka, vestida com seu habitual uniforme da GSN, embora estivesse em farrapos. 

    Haruki não percebeu, mas acabou soltando um suspiro aliviado. Mayck também deu o empurrãozinho que ele precisava para ir falar com eles, já que ele parecia hesitante. 

    “Ei, pessoal!”

    “Haruki!”

    “Cuidado! Ele ainda pode estar biruta!”

    “Do que você tá falando, idiota?!”

    Dentre as diversas reações do grupo, eles ainda pareciam ser muito próximos. Mayck admirou isso de longe.

    Mas ainda faltava algo. Mayck forçou um pouco mais sua vista e viu uma quinta silhueta saindo do templo, andando lentamente para a saída, como se não fizesse isso há anos. 

    Haruki também percebeu e parou por completo, seu coração bateu mais forte após errar uma batida. Fuka e os demais sorriram levemente, esperançosos por um bom encontro. 

    “Mãe…?”

    “Haruki…?”

    Ambos tiveram a mesma reação de choque e ficaram boquiabertos, até que cederam a emoção. Como uma criança, o garoto correu até sua mãe e a abraçou fortemente, deixando as lágrimas caírem por seu rosto como cachoeiras, levando com elas, toda aquela tristeza e saudade, medo e ansiedade, as quais se acumularam ao longo dos anos. 

    Não foi fisicamente, mas eles ficaram separados por muito tempo. Tempo o bastante para mal se reconhecerem à primeira vista. Mesmo que a felicidade estivesse queimando em seus peitos, aquele pequeno sentimento de perda não se dissipava. 

    “Você cresceu tanto…” disse Miyuki, sua voz leve e com a mesma gentileza de sempre. 

    “Hahaha… fique mais bonito agora, não acha?”

    Essa interação simples entre mãe e filho, troca de olhares em longos segundos de silêncio só fazia sentido para eles e para quem soube da história até aqui. Afinal, eles não interagiam um com o outro há muito tempo. 

    Fuka e os outros deram espaço a eles e se juntaram à Mayck, no tronco da árvore. 

    “Que bom, não é? Eles estão juntos agora.”

    “Uhum. Vocês fizeram um bom trabalho. E quanto a ele? Ele vai ficar bem?” Mayck olhou para Yuno, que respirava lentamente. 

    “Acho que sim… o estado dele está melhor que antes. Parece que está só dormindo. Então ele deve ficar melhor quando acordar”, respondeu Kaito. 

    “Se ele não acordar por bem eu dou uns socos pra ver se volta. Eu não passei por tudo aquilo pra nada.”

    “Não seja tão egoísta, Rikki. Você não foi o único a se machucar.”

    Os dois começaram uma discussão sem sentido sobre quem era mais egoísta, então Mayck os ignorou e olhou para Fuka, que logo abriu a boca. 

    “Nós conseguimos por pouco. Derrotamos Hachishakusama e salvamos Haruki. Podemos dizer que foi um sucesso, né?”

    “Com certeza.” O garoto acenou com a cabeça para Fuka, que parecia estar em seu maior estado de paz.

    “E também”, ela continuou. “Obrigada pela sua ajuda. Se Rikki não tivesse aparecido por lá, o resultado poderia ter sido diferente.”

    Ela realmente não teria aquele empurrão quando caiu pela primeira vez contra o youkai.  

    “Mas eu queria saber como você nos achou. Eu não tinha dito que não precisava que você viesse?”

    “Foi apenas sorte. Vocês fizeram uma bagunça então foi até fácil”, respondeu com sua calma de sempre. 

    Fuka percebeu que ele parecia firme nessa resposta, então apenas aceitou, sem motivos para insistir em algo sem sentido. 

    “É mesmo?” Então seus olhos se voltaram para Haruki e sua mãe. 

    Claro, o que Mayck disse foi apenas uma mentira. Não tinha como ele encontrá-los como apenas sorte. A realidade era bem mais simples que isso. E também estava ligada ao fato dele saber sobre o fingimento do amigo. 

    Na verdade, Mayck tinha sido contatado há alguns dias por uma certa pessoa que ele não via há tempos, Hubble, o qual lhe disse que Fuka e seus amigos logo encontrariam Haruki e que ele precisava estar presente nesse momento. 

    Não foi difícil perceber que era uma mensagem do próprio Haruki, mas como ele sabia que aqueles quatro iriam justamente para aquele local? Diferente de apenas intuição, ele decidiu confiar nos seus amigos. Sabia que eles encontrariam a verdade uma hora ou outra. 

    A amizade deles é até surpreendente, pensou. 

    Além do mais, Fuka parecia mais radiante, parecia que ela tinha superado os problemas que a aprisionavam há tempos.

    Um sorriso leve se formou em seus lábios. 

    Juntos depois de tanto tempo, Haruki e sua mãe apenas começaram a jogar conversa fora, sentados nas escadas do templo. 

    Era simples, mas eles não se importavam em perder tempo falando despretensiosamente. Eles queriam aproveitar cada segundo daquele reencontro. 

    “Então você também é um portador? Parece que puxou isso do seu pai.” Ela riu brevemente. 

    Um silêncio se seguiu de repente, então Miyuki tocou o rosto de Haruki e o encarou com um sorriso melancólico. 

    “Você se parece tanto com ele…”

    “… Eu sinto muito…”

    “Uh-uh. Está tudo bem. É uma pena que isso tenha acontecido… eu queria ver seu pai outra vez, mas… Ei, Haruki, me fale como você está se sentindo.”

    “Uh? O que é isso do nada?”

    “Sabe como eu estou? Eu estou feliz. Acho que nunca senti tanta felicidade antes. Quando eu conheci seu pai, quando eu te segurei nos braços pela primeira vez… Isso tudo parece memórias muito distantes agora.”

    Ela olhou para o céu. 

    “Por muito tempo, eu só enxerguei o cinza na minha vida, mas vocês dois foram minhas luzes que coloriram meu mundo. Sabe, filho, a mamãe não tem uma história feliz para contar, eu nunca fui alguém especial. Eu fui obrigada a seguir um caminho ruim por causa da minha família, mas não quero que você siga do mesmo jeito.”

    “Por que você…”

    “Sabe o que eu quero? Eu quero que você seja feliz de verdade. Arrume uma namorada, faça ela ser feliz junto com você. Tenha filhos e ensine para eles o caminho que eles podem traçar para chegarem a um bom futuro. A vida é difícil demais para seguir sozinho, então tenha amigos. Seja uma boa pessoa e não desista quando encarar problemas.”

    Ela acariciou os cabelos ruivos de Haruki, que tinha um olhar perplexo. 

    “Mas, mais importante, nunca se esqueça de que você é humano, então não se force demais. Se estiver difícil, peça ajuda. Não se esconda de jeito nenhum. Um prazer momentâneo nunca vai superar um de longo prazo, então pense duas vezes antes de agir.”

    Enquanto dizia isso com uma voz serena, o corpo de Miyuki começou a brilhar e pequenos fragmentos luminosos começaram a subir aos céus. 

    “Mãe, você…”

    “Desculpe.” Ela pôs o dedo indicador na frente do garoto. “Eu não contei antes, mas eu não vou ficar aqui por muito tempo. Meu sonho sempre foi ter uma família feliz, durou pouco tempo, mas valeu a pena. Eu tive um esposo maravilhoso e um ótimo filho. Mesmo que só no final, eu fui feliz.”

    A mulher se levantou e então gritou para o grupo um pouco mais longe.

    “Ei! Crianças! Cuidem de Haruki por mim, tá bom?!”

    “Mãe! Espera—!” O garoto se levantou e agarrou a mão de sua mãe enquanto tremia. 

    “Haruki. Despedidas são tristes, mas você tem que ser forte. Todos temos que fazê-las em vários momentos da nossa vida. Mas não se preocupe. Você ainda terá momentos maravilhosos pela frente, então aproveite bem.” 

    Ela se afastou dele e se aproximou das portas do templo, as quais se abriram lentamente, revelando um brilho forte vindo de dentro. 

    “Seja meu menino brilhante e se esforce para não perder essa gentileza que existe dentro de você. Continue sendo amável e esforçado. Sei que você vai ser recompensado no fim.”

    A luz ficou mais forte e começou a ofuscar toda a floresta com um brilho majestoso, gentil e reconfortante, até atingir o seu ápice e desaparecer com um piscar de olhos. 

    “Eu te amo.”

    E então só o silêncio restou. O que aconteceu ainda estava fresco nas memórias de todos, mas acabou tão de repente que pareceu até uma ilusão. 

    “Espera…”

    Inconformado, Haruki andou até onde sua mãe estava segundos atrás. 

    “Espera aí… Eu nem consegui falar nada.” Seus olhos encharcados, trêmulos. “Eu nem falei tudo o que eu queria dizer: ‘eu quero passar mais tempo com você’, ‘eu quero cantar com você igual a antes’, ‘eu quero conversar mais, pedir mais conselhos’, ‘eu também te amo’…”

    Suas palavras se perderam no vento, mas certamente foram ouvidas pelos fragmentos que ainda restaram, flutuando, até perderem sua luz e sumirem por completo. 

    Haruki caiu de joelhos, incapaz de segurar o choro, então levantou sua voz. 

    Incapazes de conter, o grupo também começou a derramar lágrimas; eles não aguentaram ver seu amigo naquele estado. 

    Exceto Mayck, que se resignou a apenas assistir. Não que seu coração não tivesse sido balançado; muito pelo contrário, ele apenas não queria derramar as lágrimas que forçavam a saída, mas sem sucesso.

    Em seu olhar, Fuka agradecia à mulher que lutou tanto por ela e Hikari, prometendo que não hesitaria em seguir seus passos corajosos, que ousou enfrentar seu próprio destino pelo bem de outrem. 

    Então restou apenas um clima de tristeza e gratidão, o qual ficaria marcado na mente de cada um deles.

    <—Da·Si—>

    Após se despedir do grupo, deixando Haruki sob seus cuidados, Mayck seguiu rumo de volta a sua casa. 

    O silêncio constante o perseguia pelas frias estradas, a garoa fina voltou a cair. 

    Seus passos ressoavam pelos arredores, mas não tinha ninguém que os ouvisse — era apenas ele e a solidão, caminhando juntos. 

    Naquele momento, a única voz que ele ouvia era em sua própria cabeça, que o lembrava de tudo o que ainda estava em aberto. Parte dele estava feliz por Haruki, outra parte o acusava de não ter estado presente quando ele precisou. 

    Ele sofreu por tanto tempo e eu tenho culpa nisso

    Será que eu posso me sentir bem depois de tudo?

    Sua consciência parecia estar sendo puxada para outro lugar. Ele já nem prestava mais atenção para onde estava indo. 

    “Eu sou um lixo.”

    Mayck Mizuki tirou várias vidas em toda a sua trajetória até ali. Se seu pai descobrisse, o que ele diria?

    O que seus amigos diriam?

    Ele sequer era digno de estar por perto?

    Talvez fosse melhor apenas se entregar e deixar que alguém realmente digno de ser feliz lutasse para salvá-los. 

    Por que as coisas tem que ser assim?

    Por que eu tenho que machucar cada vez mais pessoas?

    Suas ações causaram muitos problemas e renderiam muitas punições, mas ele estava ali, pronto para errar mais uma vez. 

    Até mesmo Haruna e Rika foram envolvidas nisso… Quanto mais eu vou destruir até que dê certo?

    Tudo o que ele tentava proteger escapava por entre seus dedos. 

    Sua respiração parecia ter ficado pesada. Por mais que ele inspirasse, o ar não entrava em seus pulmões. 

    Eu sou fraco. É por isso que não vou conseguir um futuro bom sem perder um monte de coisas. Eu nem sequer ajudei Hana como deveria e disse que faria. O melhor amigo do meu pai está afundando e eu não fiz nada para ajudar. 

    Por que ser feliz custa tanto? 

    Talvez ele só estivesse seguindo o caminho errado, mas isso não importava, porque não tinha como voltar atrás. 

    Mayck sentia inveja de Haruki por ter tido uma mãe que se preocupava com ele. Refletindo nas palavras dela, ele só conseguia ver tudo o que ele não poderia ser. Era apenas um ideal que nunca iria se concretizar. 

    Uma agulha perfurou seu peito repentinamente, então ele caiu de joelhos. Sua cabeça lotada de sentimentos e pensamentos ruins. Mayck olhou para as barreiras de contenção, melhor, para além delas. Ali, do outro lado, havia um morro bem alto. 

    Se eu pulasse, não precisaria pensar em mais nada. 

    As lágrimas antes reprimidas, escaparam sem resistência alguma. 

    Que merda eu tô pensando? Eu não posso simplesmente criar uma bagunça e fugir dela.

    Acorrentado em seus próprios ideais. Mayck não sabia se deveria continuar ou parar. Ele sabia que se pedisse ajuda, poderia ter uma chance, mas que porcaria de sentimento era aquele que impedia isso? Orgulho? Arrogância? Ele não conseguiria responder de forma alguma. 

    Só conseguia ser esmagado lentamente por aquela pressão invisível enquanto tentava se rastejar para algum lugar com um coração cheio de dúvidas, receios e medos. 

    De repente, enquanto olhava fixamente para o chão molhado com suas lágrimas, algo encostou em sua perna. Um felino se esfregava nele confortavelmente, como se buscasse atenção. 

    Mayck olhou para ele. Era preto e tinha olhos hipnotizantes que pareciam guardar uma galáxia neles. 

    A mão do garoto acariciou levemente o pequeno gato. 

    “O que está fazendo aqui? Não é um lugar seguro. Você deve estar perdido, não é? Assim como eu.”

    O gato ronrornou, aproveitando aquele carinho. 

    “Espera, eu já te vi antes… Você estava na floresta aquele dia, não é? Haha… Quais as chances?”

    Ele se lembrou da época em que lutou contra os institutos. 

    “Pensando bem… até mesmo ali, eu matei tanta gente…”

    Uma sombra pairou sobre seus olhos exaustos. Se continuasse pensando, só encontraria mais motivos para pular. 

    “Ei, o que acha? Quer vir comigo? Eu posso cuidar de você.”

    O gato lambeu seu dedo em resposta, então Mayck o pegou no colo. Ele não era nenhum pouco pesado, era como levantar uma pequena caixa de isopor. 

    Antes de partir, Mayck verificou seu celular. Eram quase quatro da manhã e havia mais de vinte chamadas perdidas de Haruna.

    Ele se perguntava o que tinha acontecido e diversas situações ruins passaram em sua mente.

    Eu só queria descansar…

    Mas se fizesse isso, Yang tiraria tudo dele em um único movimento. 

    Sem outra escolha, ele seguiu para casa, sabendo que ainda teria muita coisa para lidar logo mais. 

    Obrigado por ler. Comente e deixe sua opinião resgistrada ; )

    Até o próximo capítulo.

    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 0% (0 votos)

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.

    Nota