Índice de Capítulo

    Boatos surgiram em meio aos agentes. 

    “Ficou sabendo que tem um grupo secreto fazendo coisas suspeitas por aí?”

    E se espalharam como fogo. 

    Em pouco tempo, dava para ouvir sobre isso em qualquer roda de conversa. Ninguém sabia como isso se espalhou, mas começou com alguém falando sobre isso em um perfil anônimo na rede social da Strike Down, onde eram postados todos os tipos de conteúdos interessantes aos membros. 

    “Até mesmo as falhas nos detectores foram culpa deles.”

    “Eles tão tentando ganhar dinheiro ou algo assim?”

    “Quem sabe… Mas eu não duvido nada que seja coisa da Black Room.”

    As coisas estavam saindo de controle conforme o tempo passava. Mas isso não importava. Não para quem decidiu espalhar esses boatos, afinal, era exatamente o que eles queriam — expor e encontrar o grupo secreto que provavelmente sequestrou Hana. 

    A partir daí, não iria demorar muito tempo até que eles se revelassem para a equipe oito, já que eles falavam abertamente sobre isso e pareciam ter mais informações que o restante dos agentes, deixando óbvio quem havia começado com tudo isso. 

    Bom, os boatos chegaram até os ouvidos do alto escalão da base e não pôde passar apenas como um rumor bobo criado por alguém entediado. 

    “Estão todos tão sem nada pra fazer? Essa coisa de grupo secreto aqui, conspiração ali… Já não temos problemas o suficiente?” George bufou, uma carranca em sua expressão. 

    “Bem… Acho que todos estamos beirando alguma coisa maluca depois de tudo…” Jin Li balançou a cabeça. 

    Os incidentes recentes eram preocupantes, e somados a não ter uma conclusão, realmente poderiam resultar em boatos estranhos. Seria surpresa se demorasse mais. 

    “Até agora eu me pergunto se a aliança com a Black Room foi mesmo a coisa certa… Eu sei como eles são bons em lidar com problemas, eles já se provaram demais. Mesmo assim, não dá pra saber o que Zero está pensando.”

    “Hahaha! Parece que alguém está sendo afetado pelos boatos”, Akira, sentado no lado oposto ao de George, zombou.

    “Nem brinca com isso! John e Amélie não estão aqui para conter esses fofoqueiros. Se isso sair de controle, vai ser um problema ainda maior.”

    George estava preocupado no quanto isso poderia arruinar sua reputação.

    Era justificável, no fim. Afinal de contas, toda a situação fora deixada nas mãos dos três líderes restantes, que ficaram no aguarde de ordens superiores enquanto observavam os movimentos de Zero. 

    “Ah, para. Nós já paralisamos a maior parte das atividades chatas. Por que se preocupar com um rumorzinho de crianças? Se está tão preocupado assim, que tal perguntar para a nossa querida convidada como lidar com isso?”

    Olívia estava sentada tranquilamente, saboreando uma xícara de café, quando foi arrastada para a conversa, bem no centro dela. Os olhos dos três líderes da Strike Down recaíram sobre ela. 

    Olívia repousou a xícara sobre o pratinho em cima da mesa. 

    “Esse tipo de coisa acontece de vez em quando. Se esperar, esses rumores vão desaparecer antes que percebam”, disse ela. 

    “Eu não falei?” Akira sorriu levemente. “Não precisam se preocupar tanto.”

    Apesar dos pesares, essa não era a primeira vez que boatos surgiram entre os agentes. Todos os anteriores sumiram, assim como Olívia falou. Mas o motivo que fazia George e Jin Li se preocuparem tanto era que os boatos pareciam interligados demais. 

    Eram tão realistas e faziam tanto sentido que eles até cogitaram a ideia de não serem apenas boatos. 

    “Não dá pra aceitar tão facilmente…”

    “Tá, tá. Deixando isso de lado, John e os outros fizeram contato, não foi? O que eles disseram?”

    Akira mudou o tópico da discussão. 

    “Huh? Ah, sim. Ao que parece, as investigações até que estão correndo bem, embora não tenham encontrado nada ainda. O alto escalão tá preocupado que possa ter relação com aquelas coisas… Eu sinceramente acho que é bem possível.”

    “Seriamente, eu ainda não consigo acreditar nisso. Aqueles relatórios e tudo mais. Eles são antigos demais. Quem garante que não são apenas livros de ficção da época? Sem contar que não estão nem datados.”

    “Mesmo que existam registros que comprovam isso?”

    “Mesmo que existam registros que ‘comprovam’ isso”, George reafirmou.

    Jin Li e George acabaram entrando em uma pequena discussão sobre o motivo de três dos líderes terem ido em direção à América do Norte: os altos e anormais níveis de radiação em alguns pontos terrestres.

    “Você deveria ser um pouco mais flexível”, disse Jin Li, com um olhar de desistência. 

    Discutir crenças com George era como tentar explicar a teoria da relatividade para uma criança que sequer sabia falar. 

    “Eu concordo com Jin dessa vez”, Akira se intrometeu, seu sorriso cínico tão visível quanto nunca. “Imagine só. Os seres humanos não são a espécie dominante na Terra. Isso não elevaria muito as coisas?”

    “Você só quer se divertir?” Olívia lançou um olhar ranzinza para Akira. 

    “Eu não falei nada disso.” Ele se esquivou. “Enfim, por que não pensamos em uma forma de parar os boatos e encontrar os culpados? Já que vocês se preocupam tanto com isso, é melhor fazer algo logo, não? Mesmo que a Comissão de Ética e Moral já esteja trabalhando nisso.”

    Rumores perigosos eram vistos como uma ameaça à ordem da organização, então certamente era trabalho para essa divisão. 

    Se isso elevasse o nível e se tornasse algo realmente capaz de prejudicar as atividades e integridade dos agentes e todos os envolvidos, deveria ser levado ao Conselho e só aí seria um assunto para os líderes resolverem — após passar por análises e discussões dos conselheiros. 

    Apesar disso, George não conseguia não se preocupar. 

    “Não era você que estava dizendo para deixar isso de lado? Que mudança foi essa?”

    “Não é nada. Só pensei que seria divertido combater essas notícias falsas. A Black Room está cuidando do trabalho de campo, afinal. Lidar com a Ascension é trabalho deles por ora.”

    “Isso não significa que nós tenhamos que ficar parados…”

    Akira deu de ombros. 

    “Vamos, pessoal. É só pensar nisso como uma forma de clarear a mente.” Ele se levantou e seguiu em direção à porta de madeira. “Se pensarem em algo, é só me avisar.”

    Com uma energia só dele, Akira deixou a sala com a mesa redonda, que agora possuía três assentos vazios. 

    Jin Li soltou um suspiro de visível cansaço mental. 

    “Ainda é difícil saber o que esse cara está pensando. Acho que só John consegue lidar com ele de maneira fácil.”

    “Hunf. Não vamos cair nos joguinhos dele. Todos aqui sabem que ele só gosta de atrasar as coisas porque acha divertido.”

    E ele sempre foi assim. 

    Cada um dos líderes tinha uma história, as quais remontavam suas jornadas até conseguirem atingir o patamar em que estavam. Alguns se conheciam desde a infância, devido às suas criações únicas, mas Akira era diferente disso. 

    Ele tinha sido alguém com um passado reticente. Pouco se sabia sobre ele. Apesar disso, já estavam juntos há mais de dez anos, então existia certa familiaridade com suas formas de agir em cada situação — extrema ou não. Todos já estavam acostumados. 

    “Deve ser difícil. Não conheço tantas pessoas assim.” Olívia ponderou sobre isso. 

    Mesmo na antiga organização, ela nunca teve problemas em lidar com superiores ou colegas de trabalho. Como diretora, havia conhecido centenas de pessoas diferentes, mas nenhuma capaz de fazê-la perder o sono. 

    “Enfim, acho que vou indo também. Preciso ver alguns relatórios”, disse ela, e também saiu.

    Os dois líderes restantes decidiram ficar mais algum tempo para discutirem alguns outros tópicos relevantes. 

    ****

    Akira seguiu pelos corredores e passou por alguns agentes, os quais o cumprimentaram com o devido respeito e foram respondidos à altura. Ele entrou no elevador logo em seguida e apertou o botão marcado como B5 após as portas se fecharem. 

    Como um sinal para isso, seu telefone tocou no bolso interno de seu paletó preto. O número desconhecido apareceu na tela de chamada, mas não era nenhum mistério para o homem. 

    Ele atendeu sem hesitar. 

    “O que foi? Já falei para não entrar em contato dessa forma”, disse. 

    “Me desculpe, senhor”, respondeu uma voz feminina do outro lado da linha. “Você já deve saber sobre os rumores, não é? Está óbvio quem os espalhou.”

    “Sim, sim, eu sei.”

    “Então… o que a gente vai fazer?”

    A mulher do outro lado sabia perfeitamente com quem estava falando, mas ela ainda falava em um tom descontraído, como se conversasse com um velho amigo. 

    “Apenas siga com o teatro. Já pegamos a garota, agora é só fazer ela chegar no limite. O que acontecerá depois é outra questão. Basta não deixar que nenhum idiota cruze a linha que eu marquei.”

    O elevador atingiu o terceiro subsolo. 

    “Você diz para forçá-la ao limite, mas isso vai dar mesmo certo? Quer dizer, como vamos fazer aquela menina despertar uma coisa que ela sequer sabe que existe?”

    “Ah, minha querida, essa é a essência das coisas. Portadores são seres simples. Assim como é normal para todo ser humano pensar o máximo possível para sobreviver e arriscar tudo, um portador vai explorar suas próprias habilidades o mais fundo que der para tentar sobreviver. Vocês podem fazer de tudo, desde que a mantenham viva e sã, então não precisam ficar nervosos.”

    “… Se você diz… Tá bem. Vamos fazer o necessário. E quanto aos colegas de equipe? Como vamos lidar com eles?”

    “Da forma como eu falei antes. Vamos seguir o teatro. Está claro que eles planejam nos atrair com esse ‘rumores’, então nós vamos cair e trazê-los até nós. Eles vão fazer de tudo para salvar sua preciosa companheira”, afirmou. 

    Depois de dizer que estava a caminho, ele desligou o telefone. O elevador chegou ao quinto subsolo nesse exato momento, então ele saiu. 

    À primeira vista, ele caminhou por um pequeno corredor, um som sutil de energia acompanhava aquele silêncio secreto, com algumas portas marcadas e separadas cada qual com sua especificação, sendo, algumas delas: Sala de Gerenciamento, Arquivos Acadêmicos entre outros. 

    Em cada uma dessas salas, estavam guardados computadores com servidores próprios para organizar os documentos especificados e nenhum dos computadores tinham conexão entre si, fazendo com que cada sala fosse única e só pudesse ser acessada com certo nível de autorização. Sendo elas:

    N1-FR. Qualquer agente tinha permissão para entrar nessas salas e tinham acesso a todos os dados disponíveis;

    N2-AR. Apenas agentes especiais, inclusos equipes numeradas, instrutores e todos os de nível superior;

    N3-AU. Apenas os conselheiros e líderes tinham acesso a essas salas. Elas guardavam um alto nível de dados e informações relacionadas às políticas internas, decisões éticas e outros documentos confidenciais da organização em escala global;

    N4-OB. O nível mais alto. Apenas os líderes tinham acesso a essas salas. Elas guardavam todos os dados essenciais para a organização, bem como identidades protegidas, arquivos sensíveis, segredos organizacionais e registros históricos de extrema importância. 

    Para Hana, por exemplo, ela só podia acessar salas de nível 1 e nível 2. O que não era a mesma coisa para Akira, obviamente. 

    Depois de passar por todos os scanners de led com cores específicas de cada nível, ele se aproximou de uma porta de metal fosco escuro, delineada por um LED branco que emitia uma luz fria e constante. No centro dela, um octógono em alto-relevo brilhava com bordas luminosas, pulsando suavemente em tons de branco.

    A sigla “N4-OB” estava gravada de forma minimalista acima do octógono. Era a única daquele subsolo. Lá dentro, estavam armazenadas todas as informações de que uma pessoa precisava para controlar um país, ou talvez o próprio mundo. 

    O centro do octógono abriu um escaneador de retina, como se a porta verificasse de quem era aquela presença e depois de validar a identidade do líder, liberou o acesso e se abriu lentamente, revelando um interior praticamente tomado por escuridão. 

    Leds brancas contornavam a sala e a principal fonte de luz era um supercomputador instalado no centro dela, com um painel de vidro servindo de monitor para as projeções holográficas.

    “É tão irônico”, disse Akira em um tom sombrio que ecoava pela sala. “Com um clique, ele poderia controlar o mundo todo, mas prefere usar métodos mais antigos como o caos físico… É um lunático mesmo.”

    O homem encarava aquela supermáquina desenvolvida com a melhor tecnologia do mundo. Computador este que superou o lendário Frontier. Mas este, na frente de Akira, era apenas um fragmento do computador real, localizado na sede Americana. 

    “Bom… Não que assim não seja divertido.”

    Se o caos sendo instaurado fosse algo que aquela pessoa queria, então era algo que Akira iria almejar. 

    Ele ignorou a máquina e seguiu para o fundo da sala. Após tatear a parede por alguns segundos, o que parecia apenas loucura, um clique ecoou. Então uma porta se abriu naquele lugar, revelando uma longa e escura escadaria para um local mais baixo que o quinto subsolo. A porta se fechou assim que ele desceu, como se sequer existisse ali. 

    <—Da·Si—>

    Por que isso está acontecendo?

    As dores já não a alcançavam mais. Talvez seu corpo tenha se acostumado após horas e horas de um interminável tratamento de choque. Seus olhos já não continham o brilho determinado de antes e ela só se perguntava quando ia acabar. 

    Tinha decidido ser forte no começo, mas isso estava começando a ficar impossível. Os malfeitores ao redor dela pareciam não se importar com descanso. 

    Pareciam estar contando os segundos até que Hana parasse de respirar de uma vez…

    As agulhas se infiltraram em sua pele mais uma vez. Cada um dos seis malfeitores tinha um par e cada uma das agulhas estavam conectadas a uma bateria de setenta e cinco miliamperes. Então eles a descarregavam no corpo da garota. 

    Toda aquela corrente elétrica de uma vez poderia ser letal para uma pessoa comum, podendo causar até mesmo parada cardíaca. Porém, para um portador, isso só seria agonizante até certo ponto. 

    Enquanto as descargas vibravam por todo o seu corpo, Hana gritava, sua voz soando dolorosamente, os olhos encharcados mal possuíam lágrimas para derramar. As luzes ofuscantes refletiam as máscaras inexpressivas dos malfeitores.

    Cada sessão de choque durava trinta segundos, então os malfeitores garantiam que ela não morreria e não teria sequelas depois de acabar. 

    Mais trinta segundos. 

    A voz de Hana não tinha para onde escapar. 

    Àquela altura, já havia queimaduras por várias partes do corpo. 

    Outros trinta segundos passaram. 

    A respiração da garota estava falhando, os músculos se contraindo com uma dor pulsante. 

    Parecia que isso duraria pela eternidade. 

    Alguém… me tira daqui… por favor…

    Quantas horas já haviam se passado? Um dia inteiro? Dois? Ela não sabia. Mas desde o primeiro choque, ela sentia que tinha começado a ficar suportável. Poderia ter usado suas habilidades antes para escapar, mas havia alguma coisa impedindo-a de ativar qualquer habilidade de ID. 

    Ela sequer sentia o fluxo de energia, como se tivesse deixado de existir.

    As agulhas foram retiradas e seguiu-se mais um tempo de silêncio. Ele era tão denso. Ninguém abria a boca desnecessariamente e era isso o que deixava mais assustador. 

    Apenas Hana tinha permissão para sofrer e seus gemidos agonizantes não alcançavam ninguém. Todos aqueles não passavam de monstros que não se importavam com quem estava sendo machucado, e tudo o que lhes interessava eram as ordens do chefe. 

    Passados aqueles segundos, eles acenaram entre si, prestes a iniciar mais uma sessão. 

    Uma espectadora, olhando a cena, pensou consigo:

    Esse não era o combinado.

    Cada gemido de Hana abalava seu coração. 

    Não era pra terminar assim.

    Ela estava tão chocada quanto aos resultados que sequer sabia como reagir. 

    Outro choque e seus batimentos aumentaram. Uma dor palpitante perfurou seu peito, lágrimas brotaram de seus olhos. 

    Mas ninguém notava isso. Estavam todos concentrados na eterna tortura que Hana estava sofrendo. 

    Até que…

    “Isso… é mesmo necessário?”

    Para a surpresa de todos, ela interrompeu o processo. Sua voz tinha um tom amargo. Toda a atenção se voltou para ela. Surpresa por agir sem pensar, ela não sabia como prosseguir e tropeçou nas próprias palavras, mas continuou, a mão sobre o peito:

    “Já… já se passou muito tempo e não tivemos nenhum resultado… Precisamos mesmo continuar com isso?”

    Ninguém respondeu imediatamente, mas logo a voz de um dos executores chegou até ela. 

    “As ordens foram claras. Onde você quer chegar?”

    “É só que… err…”

    “Seu único trabalho foi trazê-la aqui. O que há com você? Está fingindo empatia a essa altura?”

    Outra voz feminina interviu e também era de um dos espectadores. 

    “Eu não estou fingindo… Só acho que não precisa… Vejam, ela já nem reage como antes. Se continuar assim, vamos acabar com a mente e o corpo dela—”

    “Eu não sei o que você está pensando. Mas o que quer que seja, esqueça isso agora. Com exceção do líder, ninguém tem permissão para ditar como as coisas vão ser. E as ordens foram claras. Nós só temos um interesse aqui, nada mais.”

    “Mas—”

    “Se você continuar a interferir, vamos te pedir que se retire e esse comportamento vai ser reportado ao chefe. Você sabe que não tem lugar para amizades aqui.”

    A espectadora, então, fez sinal para os executores prosseguirem, acabando com qualquer esperança daquela agente de interromper o processo. 

    As agulhas perto da pele da garota, que estava incapaz de qualquer movimento ou fala, seus olhos sem esperança apenas acompanharam o movimento, desejando que ele parasse. 

    “Já chega.” E uma palma ecoou pela sala escura, junto a uma voz suave. 

    Todos os presentes rapidamente se viraram, parando tudo o que estavam fazendo, eles perceberam imediatamente quem havia chegado, então logo se aprontaram para prestar o devido respeito. Duas filas então se formaram desde a porta até a maca em que Hana estava deitada. 

    Akira passou por eles e se aproximou da garota, os olhos sem vida dela o encararam suavemente. 

    Em algum momento, Akira tinha posto a máscara de gás, então não era possível reconhecê-lo. 

    “Como você está? Não parece muito bem, não é?”

    Ele riu. 

    “Bem, esse é o destino de quem procura saber de mais. Você deve estar cheia de perguntas. É uma pena que não possa fazê-las no estado em que está. Mas não se preocupe muito. Logo mais seus heróis virão te salvar.”

    Akira acenou. Um dos malfeitores entendeu a ordem e acionou um controle que destravou as algemas eletrônicas de Hana. Embora alguns se perguntassem o que ele pretendia, não ousaram perguntar. Mas ele falou mesmo assim. 

    “Nós vamos conversar um pouquinho. Se você estiver pensando que vai conseguir lutar, desista. Você já deve ter percebido, mas, neste momento, essa sala se tornou um lugar impossível de usar ID ou qualquer habilidade.”

    Além disso, no estado em que estava, resistir era uma ideia distante — Hana estava incapaz de lutar. 

    “Certo, vamos lá.” Akira ficou de costas para ela e se apoiou na maca. “Você deve estar se perguntando porque fazemos isso e também porque estamos te prendendo aqui. Primeiro, que nós temos nossos próprios objetivos aqui dentro e a existência de vocês acabou se tornando uma ameaça para nós. Então, naturalmente, vamos ter que matar vocês.”

    O “Câncer” tinha acesso a todas as informações disponíveis sobre cada agente da organização. Eles sabiam sobre o histórico da equipe oito e sobre como cada membro se comportava em grupo e individualmente. 

    “Nós sabemos que se matarmos você, eles apenas vão se revoltar e fazer alguma coisa maluca e chamativa, dificultando as coisas ainda mais. É por isso que decidimos reunir vocês, e então, matá-los de uma única vez. Assim que eles virem para esse lugar, vão cair na nossa armadilha. Sem poderes, portadores dependentes não passam de vermes barulhentos.”

    Essa era a visão real de Akira acerca do mundo em que vivia. Sua face calma e sorridente dificilmente vazava suas verdadeiras intenções. Esse homem certamente possuía um coração mais sombrio do que parecia. 

    “… Por que…?” Fraca e quase inaudível, Hana tentou dizer algo. 

    “Por que estamos fazendo isso? É simples. Esse mundo tá muito bonitinho nessa era. Pelo menos foi o que ele disse. Mas não se preocupe, você não vai vê-lo decair mais. Você é fraca. Por sua culpa, seus companheiros serão capturados e mortos sem a mínima chance de revidar.”

    Ele riu maliciosamente. 

    “Vocês… Vocês não vão ir longe…”

    “É só o que você pensa, minha querida Hana-chan. Primeiro vamos tomar o controle da organização, depois vamos destruir o governo e  então tomaremos o controle do país. A Ascension é a única que vai sobreviver aqui.”

    Akira saiu de sua postura e caminhou até a bateria depois de recolher as agulhas dos malfeitores. Ele girou um botão, aumentando a amperagem da bateria até o máximo. 

    “Eu vou te mostrar o quanto inútil e imprestável você é pro mundo! Uma agente especial que não consegue se livrar de uma merda de armadilha dessas não passa de peso morto!”

    Sua voz ficou alterada e intensa. Ele se aproximou de Hana, o som vibrante da eletricidade era ouvido mesmo de longe. 

    As mãos aproximaram as agulhas.

    Então um choque brutal irrompeu pelo corpo de Hana, fazendo-a reagir muito mais que todas as dezenas de sessões que houveram antes dessa. Ela agonizou e se debateu; uma cena terrível de se ver. 

    “Por favor! Pare com isso! Isso já está ficando demais!”

    Ante aquela voz, os choques cessaram. Não por conta do pedido, obviamente. 

    Os olhos de Akira rodearam a multidão e viram a dona da voz. Não dava para saber que tipo de expressão ele estava fazendo, mas seu silêncio disse tudo. 

    Hana tremia em cima da maca. As queimaduras em seu corpo estavam mais sérias. Um silêncio pesado pairando na sala. 

    “O que esse inseto está dizendo? Eu ouvi alguma coisa?”

    Ele largou as agulhas e caminhou até aquela figura, que recuou alguns passos. 

    “Não… eu só—”

    “Continue o que estava dizendo. Você quer que eu pare? Então está querendo dizer que vai ficar no lugar dela?”

    O corpo dela estremeceu e se encolheu. 

    “Senhor… eu só…”

    “Será que ela é alguma amiga sua? Eu não estou entendendo o porquê de você me mandar parar. Você conhece as regras, não conhece?”

    “…”

    “Responda!”

    “Sim, senhor!”

    “Ótimo”, ele respondeu com uma certa calma na voz. 

    Ele se virou para sair e retomar o que estava fazendo. Tudo se seguiria conforme o planejado, já que aquela espectadora entendeu a situação… ou talvez não. 

    Talvez aquela fosse a única chance de conseguir livrar aquela vítima do sofrimento. Ela já não estava aguentando mais ver aquilo em silêncio. Cada grito ecoava em seus ouvidos e ressoava com sua própria alma. 

    Já tinha visto isso diversas vezes, mas aquela vez, em especial, era insuportável. 

    Antes que aquela pessoa se desse conta, havia agarrado o braço de Akira, interrompendo sua caminhada. 

    “!”

    Ela levantou a cabeça, um silêncio ainda mais denso encheu a sala. Naquele momento, todos que assistiam isso tinham um mesmo pensamento:

    Ela não devia ter feito aquilo. 

    Em um movimento rápido que os olhos mal podiam acompanhar, Akira girou seu corpo e chutou aquela espectadora no abdômen, lançando-a contra a parede. Um som metálico foi projetado quando ocorreu o impacto, e pelo som, dava para sentir a força com que o golpe foi desferido. 

    “Gah—!”

    Ela caiu no chão, como se suas forças tivessem sido neutralizadas. Uma dor aguda percorreu seu corpo, o ar já não conseguia entrar em seus pulmões. Provável que aquele chute tivesse quebrado algumas costelas. 

    “Tirem essa coisa repugnante daqui antes que eu mude de ideia”, disse Akira olhando com repulsa. 

    Com isso, dois dos membros levantaram a garota sem o mínimo de cuidado e a arrastaram para fora, por uma segunda porta. 

    O show inesperado acabou. Era hora de voltar às atividades. 

    “Hana-chan~ Espero que não tenha desmaiado ainda. Nós temos muito tempo pela frente.”

    Com uma ênfase na última frase, ele se aproximou novamente. As lentes da máscara de Akira refletiam de forma aterrorizante. 

    Não… Por favor, não…

    O que parecia ser um péssimo cenário, acabou ficando ainda pior.

    <—Da·Si—>

    A garota fora jogada cruelmente em um corredor estreito, escuro e que tinha um fedor horrível. 

    Ela permaneceu imóvel por vários segundos, sem forças para se mover. 

    Por que… Por que ficou desse jeito?! Não era pra ser assim!

    Ela mordeu os lábios fortemente e deu socos no chão. Então se levantou lentamente. A dor em seu abdômen era indescritível, como se os órgãos internos estivessem sendo perfurados pelos ossos, dificultando seus movimentos drasticamente. 

    Cambaleante, ela começou a se mover pelo corredor, enquanto seus olhos derramavam lágrimas sem parar. 

    Ela retirou a máscara do rosto e a largou no chão, revelando seu rosto. Era Mei, e sua expressão não era das melhores. 

    Isso tinha um motivo. 

    Hana-senpai… Me perdoa…

    Ela fazia parte do ‘Câncer’, embora não fosse por vontade própria nem por seguir os ideais deles. Ela concordou em capturar Hana, sob a promessa de que conseguiria que ela saísse de lá ilesa. 

    Mas foi tudo mentira. 

    A pessoa que deveria estar do seu lado, acabou mostrando sua verdadeira face. 

    Kurosawa-san… por que me traiu desse jeito?!

    Ela estava realmente seguindo os planos do líder? Mei não conseguia sequer imaginar o que se passava na cabeça daquela mulher. 

    Você vai pagar… Todos vocês vão…!

    Ela temia o que poderia acontecer com ela, mas tinha mais medo de perder Hana.

    Eu não posso continuar com isso. Eu tenho que tirar Hana-senpai daquele lugar.

    O peso de trair sua preciosa veterana recaiu sobre ela. Ela mal conseguia dizer que a salvaria, o que era tão hipócrita e nojento, visto que foi culpa dela Hana estar naquela situação. 

    Vê-la sofrer era como esfaquear o próprio pescoço.

    Mesmo assim… Eu causei isso… Eu tenho que reverter o quanto antes. Preciso contar a eles.

    O coração pesado, a mente carregada de culpa. Mei se arrastou para a saída antes que o líder mandasse matá-la.

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 0% (0 votos)

    Nota