Capítulo 89 – Quem o destino privilegiou
A tensão pairava no ar de forma sufocante. Estranhos sentimentos invadiram os corações de todos, sem exceção, que observavam aquela figura no topo da Tokyo Skytree.
Por sua vez, Mayck olhava para a multidão formada lá embaixo. Seu olhar era indiferente, mas seus punhos cerrados delatavam seus mais profundos sentimentos, que o faziam hesitar em seguir em frente.
A ventania fazia seu cachecol e sobretudo tremularem como uma bandeira.
Consegui reunir uma grande quantidade… o quanto eles me odeiam? Ou será que me amam?
Era algo a ser pensado. Tudo o que ele disse que faria era revelar sua identidade, e isso atraiu uma quantidade surpreendente de curiosos, mesmo que isso não fosse mudar nada em suas vidas.
Havia portadores conhecidos por suas identidades reais, então não devia ser nada tão surpreendente, no fim das contas.
Bom, não há muito o que fazer. Vamos apenas terminar o que começou, ele pensou consigo.
De repente, Haruki se aproximou e já começou a falar.
“Ainda não consigo acreditar que você vai fazer uma coisa dessas”, disse ele.
“Por que diz isso?”
“Bom, é que você é do tipo que evita problemas… você mudou muito. Pra melhor, claro… eu acho.” Sorriu sem graça.
“Não se preocupe. Isso não me ofende. Até eu tenho que admitir isso.”
Sua mentalidade permanecia a mesma, porém, com algumas evoluções. Mayck sabia que não poderia conquistar sua paz se não fizesse sacrifícios.
“Hm… E quanto a Tsubaki-san, ela vai ficar bem?”
“Vai sim. Ela não é uma criança. Mas se for, vai deixar de ser hoje.”
“Isso parece tão cruel”, Haruki apontou em tom de piada. “Enfim, eu já preparei o que você queria. Boa sorte com o restante.”
“Certo. Valeu.”
Há alguns dias, Mayck esteve planejando uma forma de parar os ataques que vinha sofrendo. Existiam soluções como sumir por um tempo, mas o que ele queria era algo um pouco maior.
Era uma solução para três de seus problemas.
O primeiro, os ataques.
Obviamente, ele receberia a hostilidade da Black Room e da Strike Down, por motivos que ele sabia muito bem.
Olhando para a multidão, ele tentava conter a agitação que estava sentindo.
Foi eu que planejei isso. É tudo muito simples. É só não morrer. E quando acabar, eu vou ver como ela está. Espero que dê tudo certo.
“Essa tempestade deve continuar por, só menos, meia hora, então aproveite. Eu vou indo nessa. Não podemos ser vistos, afinal”, Haruki falou enquanto se afastava. Ele estava ajudando por conta própria, então se fosse pego pela GSN não escaparia com apenas uma advertência.
Além do mais, sua energia estava quase esgotada depois de convocar uma tempestade daquelas.
“Até mais”, Mayck respondeu.
Estando sozinho, ele moveu sua mão e uma máscara branca surgiu. Ele olhou para o céu. Não podendo ver a lua, sentiu uma certa decepção, mas logo se recompôs.
“Vamos nessa.”
Ao pôr a máscara no rosto, deu um passo para trás. A determinação que precisava já estava queimando em seu peito. Ele correu e se lançou da torre, rasgando o ar como um meteoro.
O vento cortava seu rosto enquanto ele mergulhava em direção ao chão. Seu coração batia forte e a adrenalina pulsava em suas veias. Por um breve momento, o mundo pareceu congelar, junto àquela tempestade de neve que atingia toda a cidade.
O silêncio tenso pairava sobre a multidão, interrompido apenas pelo som do vento zunindo em seus ouvidos. Com um estrondo ensurdecedor, Mayck chegou ao chão, pousando no meio da multidão, e uma onda poderosa de eletricidade se dispersou por toda a área, limpando toda a neve ao redor.
Seus olhos brilhavam com a determinação renovada, sua mão direita estendida para o lado agarrou firmemente o cabo da espada que se materializou como fragmentos de hologramas e reluziu com uma luz azul, a qual vibrava freneticamente.
“Então? Vamos começar?”
A multidão que o rodeava estava perplexa, mas suas mentes se iluminaram. Gritos de surpresa e raiva tomaram conta do ambiente e todos se lançaram para a batalha com suas habilidades únicas e armas.
Entre tantos indivíduos, havia pequenos grupos, mas a maioria estava ali individualmente, portanto, apesar de Mayck ser o único alvo, eles não se importavam em quem mais seria atingido por seus ataques, que iniciaram um show de luzes e explosões em diversas escalas.
Naquele cruzamento, entre altos edifícios e sob as luzes ofuscantes da torre, uma luta intensificou-se a um nível absurdo. Em pouco tempo, o que era neve tornou-se vapor e o asfalto já podia ser destruído com facilidade.
Mayck correu entre a multidão, manejando sua espada habilmente e cortando de todos os lados, traçando um rastro brilhante por um caminho qualquer. Ele evitou pontos vitais, mas tentou machucá-los o suficiente para pará-los.
A placa que tinha o nome da avenida veio girando em sua direção como um chakram, mas foi bloqueada pela lâmina do garoto, que a mandou na direção de outros portadores, os quais fizeram o que podiam para evitá-la.
Quando se enfrenta tanta gente, fica difícil calcular o que fazer. Tenho que confiar mais nos meus instintos do que nas minhas habilidades.
Com movimentos ágeis, Mayck jogou sua lâmina para o alto e entrou em um confronto mano a mano com vários portadores que se aproximaram demais. Ele distribuiu socos e chutes e também se esquivou deles como se estivessem em câmera lenta.
Eles até são bons…
Depois de um chute giratório que acertou a mandíbula de um adversário, Mayck saltou e agarrou sua espada. Movendo-a horizontalmente, ele girou e uma lâmina de ar cortou tudo o que estava no alcance — postes de iluminação e os edifícios no mesmo raio foram divididos ao meio. Uma boa parte dos portadores puderam resistir ao ferimento que receberam.
… Mas não o suficiente.
Entretanto, outra boa parte caiu devido aos ferimentos graves.
Uma intenção assassina alertou o garoto, que rapidamente se virou e bloqueou outra lâmina que se chocou com a sua. Uma onda de choque se dispersou, causando uma ventania tão grande quanto a da tempestade, que lentamente ia diminuindo.
O indivíduo que o atacara tão ousadamente era uma mulher e ela tinha um enorme sorriso esnobe em seu rosto, que denunciava seus dezoito anos de idade.
“Até que você não é tão ruim assim”, disse ela.
“Eu digo o mesmo”, Mayck respondeu e usou sua força para afastá-la.
“Hahaha! Isso é incrível. Você é muito forte. Merece o seu lugar no ranking. Mas eu ainda acho que você pode mais do que isso!”
Com um uivo ela disparou como uma bala, destruindo o terreno debaixo de seus pés, e lançando-se em direção à Mayck, manejou ferozmente sua espada de lâmina exageradamente grande, a qual poucos teriam força para sequer levantá-la.
“Tava demorando pra aparecer alguém como você…!”
Mayck a bloqueou e uma onda de choque como a de uma explosão limpou a área por um momento, afetando também os demais portadores, que precisaram se manter firmes para não serem jogados para longe.
Ambos começaram uma troca de golpes feroz, manejando suas espadas para cima e para baixo. Tudo isso enquanto atacavam e se esquivavam de outros portadores.
Como dito antes, não haviam muitos aliados entre eles, então cada um se importava apenas em ter sua presa.
A garota investiu novamente, preparando sua espada para um golpe destrutivo.
“Toma essa!”, ela gritou e cortou o ar com tal velocidade que o atrito das moléculas de ar foram superaquecidos e um rastro de plasma seguiu a direção do corte.
Friamente, Mayck saltou para o lado e o corte passou perto de seu rosto. Em questão de segundos, ele se aproximou da garota em uma velocidade alucinante.
“O quê-!”
Ela percebeu, mas era tarde demais. Mayck a atingiu com a parte sem fio da lâmina e a jogou para longe como uma bala. A garota atingiu alguns portadores, os quais foram arrastados com ela. Seus corpos se chocaram em um edifício e uma cortina de poeira se levantou.
“Você é forte. Devia ao menos ter perguntado seu nome”, Mayck disse a si mesmo. Ao olhar ao redor, percebeu que um silêncio incomum havia se instaurado ali.
Ué…? O que houve?
Entre si, os portadores falavam sobre o quão terrível era o poder do garoto.
“Ele é muito mais forte do que pensávamos”, diziam eles.
Era visível o temor que recaiu sobre eles. Os que conheciam a garota anterior sabiam sobre o verdadeiro potencial dela e podiam afirmar sem medo que ela estava lutando com quase toda a sua força.
“O que há? Não vão me dizer que desistiram? Não é o que vocês queriam?”
Percebendo a situação, Mayck provocou. Ele precisava ganhar um pouco mais de tempo.
Minha energia logo logo vai acabar. Eu preciso acabar com a maior quantidade possível.
Haviam diversos portadores no chão. Não dava para saber se estavam mortos, mas tinha uma boa quantidade com ferimentos graves, sendo carregados por seus companheiros, que olhavam Mayck com ódio fervendo.
Além disso, a paisagem já estava quase irreconhecível. O asfalto foi destruído quase por completo e os edifícios ao redor estavam em ruínas.
Mayck se perguntava se os portadores fugiriam, até que alguém gritou com força:
“Quem liga pra isso? Só vamos acabar com você de uma vez, seu merda!”
A determinação daquele indivíduo acabou contagiando os outros que, decididos, prepararam suas armas e habilidades para a continuação do show.
Mayck sorriu levemente.
“Beleza.” Ele entrou em um postura de combate com a espada a sua frente, cobrindo um de seus olhos. “Venham.”
A ventania congelante carregada de flocos de neve soprou sobre eles. Em um piscar de olhos, Mayck deixou um rastro na neve que voltava a cobrir o chão cheio de rachaduras.
<—Da·Si—>
Algum tempo antes, Masato ficou intrigado com a presença de Hana naquele local.
“Por que pai?! O que está havendo?!” A garota perguntava tentando parar as lágrimas que lutavam para sair.
Mediante aos gritos de desespero da filha, a expressão do policial não mudou. Sua voz ficou fria.
“Hana, é? Então você trouxe ela aqui pra me encurralar?”
“É… eu queria ver se tudo o que você me disse é verdade. Eu já vi casos em que os vilões estavam sendo obrigados a fazerem o que fizeram, sabe?” Mayck gesticulou. “Então, confirme tudo o que disse pra ela.”
Masato se viu sem saída. Havia caído perfeitamente em uma armadilha. O silêncio deixava tudo mais claro.
Ele analisou sua situação.
Não posso contatar Ryuu pois estou sem meu telefone. Não tem como dizer que tudo o que eu falei era mentira. Além do mais, ele falou sobre uma tempestade de neve, mas não ouvi nada sobre isso. O que ele está planejando?
Ele foi induzido a acreditar, pois estava ouvindo o rugido feroz da ventania ao fundo.
Estaria Mayck ganhando tempo? Ele não podia determinar. Não havia nenhuma brecha nas expressões, ações ou palavras do garoto. Tudo aquilo tinha sido feito para encurralar ele desde o início.
“Hm.” Masato sorriu. “Não há nada para confirmar. Se ela ouviu, então é o que é. Mas já que você quer ouvir de novo, então, sim, eu não me importo se é Tsukiko, Hana, Mayck ou Takashi. Nenhum de vocês tem valor pra mim. Tudo o que eu fiz até hoje foi apenas para disfarçar meus planos verdadeiros.”
Em cima da galeria, Hana não conseguia acreditar nas palavras proferidas por seu pai. Tudo aquilo havia sido um baque enorme em sua vida. Era muita informação para absorver.
Desolada, ela não sabia mais o que responder ou onde se apoiar. Ela não sabia se deveria correr ou ficar. Se deveria gritar ou se calar.
“… Mentira…”
Ela apertou a mão sobre o peito. Um aperto doloroso, como se esmagasse seu coração a atingiu; o ar em seus pulmões pareciam insuficientes. Hana caiu de joelhos, incapaz de se manter em pé.
A garota de capuz a observava com frieza em seus olhos.
Isso tudo… não, não, não, não… Digam que é mentira, por favor! Pai… Mayck!
Ela recorreu ao garoto, mas ele sequer a olhou. A pessoa que disse que a ajudaria acabara de abandoná-la em um momento extremamente crucial.
Por que não dizem nada? Vamos lá… é só dizer que é brincadeira que eu perdôo vocês… então… por favor…!
Hana suava frio. Suas mãos tremiam e sua vista ficava mais e mais embaçada. As lágrimas não puderam mais ser contidas e rolaram por seu rosto como uma chuva torrencial, que começava de repente.
Masato deu de ombros. As lágrimas de sua filha não o comoviam, de forma alguma. Ele era como uma casca vazia, obcecado apenas pelo próprio irmão. E Mayck observou isso com muita atenção; se Hana se decidisse, ele o mataria ali mesmo se necessário.
Os traidores não deveriam ter perdão, para ele.
“E então? Vamos acabar com essa porcaria logo? Tenho muitos assuntos a resolver”, o policial exigiu.
“Hana. Você viu e ouviu tudo. Eu sei que é difícil, te garanto, mas eu preciso que você tome uma decisão agora.”
O amor de uma filha para com seu pai estava sendo testado.
Hana olhou para Mayck com sua vista encharcada. Seu olhar incrédulo mostrava que ela não podia compreender o que tinha ouvido.
Ela estava incapaz de pensar em algo desse tipo naquele momento. Tudo o que ela podia pensar era em como estava encarando dois monstros que não se importavam nenhum pouco com ela.
“Hana. Eu sempre soube que você tinha se juntado à Strike Down. E não foi algo que eu descobri, mas um acordo que eu fiz para você estar lá”, Masato declarou.
“Como?!” Foi a vez de Mayck se surpreender.
“Do que vocês estão falando…?” Hana reagiu de forma idêntica.
“É. Essa é a verdade. Depois daquele incidente onde um moleque matou todos os membros de uma organização, uma pessoa entrou em contato comigo e me disse para colocar você naquele lugar. Obviamente, eu aceitei. Afinal de contas, isso tudo fez parte do plano dele.”
“Você está falando daquele cara?”
“Aquele cara”, Masato respondeu confiante.
Mayck apertou os punhos e respirou fundo.
Desde quando aquele cara está manipulando todo mundo?
Não seria exagero dizer que Yang tinha o mundo na palma da mão. Mesmo antes de conhecê-lo, ele já estava arquitetando tudo para atingir seus objetivos, os quais ainda eram um mistério para o garoto.
Seria aquela coisa de destino? Talvez, mas era melhor tomar cuidado com cada passo, pensou Mayck.
Masato abriu a boca novamente.
“Hana, minha filha, eu sei o quão forte você é. Estive acompanhando todo o seu histórico e fiquei feliz quando percebi que você estava seguindo os meus passos de justiça.”
“Justiça?” Mayck apertou os olhos.
“Então, Hana, junte-se a mim. Eu preciso de você para poder cumprir meus planos.”
“Para com isso, Masato.”
Percebendo o que o homem planejava, Mayck deu um passo à frente, mas…
“… ele precisa de mim…”
“Hana?!”
“Meu pai… precisa de mim… eu tenho que ajudá-lo…”
Sou sua filha, afinal…
Os ideais de justiça plantados em sua cabeça eram poderosos demais para que ela lutasse contra eles. Mayck entendeu isso sem precisar pensar muito. Era como se Masato tivesse criado a garota para que ela agisse dessa forma.
Uma marionete para concretizar seus planos frios e radicais.
Mayck apertou os punhos mais fortemente, como se fosse quebrar os ossos de suas mãos.
Hana desceu as escadas da galeria cambaleando e se aproximou do palco lentamente.
Para Masato, uma vitória. Para Mayck, uma chance de crescimento. Enquanto a garota passava por ele, ele disse:
“Pensa bem no que está prestes a fazer. Qualquer decisão que tomar, não vai ter volta.”
Talvez palavras não fossem o suficiente para impedi-la. Se fosse necessário mais do que isso, então as coisas seriam complicadas.
Em uma disputa de laços, Masato ganharia, com certeza. No entanto, o garoto não cederia tão fácil.
“Venha, Hana. Você pode me ajudar a capturar Mayck e realizar meu sonho. Você não vai se arrepender, eu te prometo. Sua mãe também ficará orgulhosa.” Sua mão estendida para a garota esperava uma resposta.
“Hana”, Mayck a pressionou.
“… vocês dois são cruéis”, ela murmurou. “Como podem fazer isso comigo…?”
Masato abriu a boca novamente:
“Hana, eu te ensinei a perdoar os outros, não foi?”
“… Sim, mas…”
“Hana, qual a sua verdadeira justiça?” Mayck a interrompeu antes que as palavras do policial fizessem moradia em sua mente.
É melhor que ela quebre agora e fiquei sem resposta do que se juntar a ele… Eu realmente não consigo me ver atacando ela.
A ideia de lutar contra sua melhor amiga o deixava com um gosto amargo na boca.
Hana virou-se para Mayck. Seus olhos não ficavam fixos nele, mas viajavam por todo o corpo dele e não o encaravam. Seus lábios trêmulos se moveram devagar.
“Mayck… você mentiu pra mim várias vezes…”
“Isso mesmo, Hana. Diga a ele. Diga que ele nunca a salvou de situações ruins. Pelo contrário, ele só te fez sofrer. Mas eu, Hana, sou seu pai, e tudo o que eu faço é para o seu bem. Anda, vamos. Venha comigo.”
“… Tem razão… você é meu pai… e eu devo te seguir”, ela disse.
“Sim, é verdade. Eu menti pra você, Hana. Mas o que é pior? Seu pai esteve te enganando até agora. Não só você, como também sua mãe, meu pai, meus avós… ele está ligado à pessoa que só trouxe ruína para o mundo. Não se esqueça disso.”
Mayck começou a jogar suas cartas na mesa. Suas palavras faziam sentido aos ouvidos da garota, que levantou seus olhos encharcados para ele.
“Escuta com atenção, Hana. Se você ceder agora”, Mayck tocou em sua bochecha de forma gentil, deixando-a surpresa. “Se você desistir agora, vai jogar no lixo todo o caminho que fez até aqui. É difícil, eu sei, falo por experiência própria. Você é quem mais sabe sobre mim e eu tenho certeza que pode ler minhas intenções com apenas um olhar.”
“Uhum…” Ela acenou, ainda incrédula e com o rosto corado.
“Para com isso! Não deixe ele te enganar com palavras doces, Hana”, Masato esbravejou. “Tudo o que ele quer é tirar você de mim e destruir nossa família, enquanto eu só quero reconstruí-la.”
“Ele está preso ao passado. Pense em tudo o que você tem agora, Hana. Sua equipe, seus amigos… sua mãe. Não perca tudo isso com uma decisão emocional. Eu confio em você. Por favor, Hana…”
Ele olhou profundamente nos olhos da garota. Suas palavras eram verdadeiras, não havia nenhuma má intenção por trás delas.
Tudo o que ele precisava era uma confirmação. Se Hana fosse com ele, tudo iria se resolver. Por outro lado, tudo seria ainda mais trágico.
Por favor… o garoto repetia dentro de si.
Segurando as mãos dela, ele sentiu o calor de sua pele. Ela estava tremendo como uma garotinha assustada. Não podia ser ajudado. A situação que ela foi colocada de repente era impiedosa, imperdoável.
Ele não poderia julgá-la se ela passasse a odiá-lo depois de tudo.
… Apenas tome a decisão correta.
“Qual sua resposta?” Mayck perguntou enquanto a mantinha olhando para ele, certificando-se que ela não fugiria.
“Eu…”
“Não o escute, Hana! Você só tem que me obedecer. Tudo o que você deve fazer é fazer sua família feliz. Eu não vou permitir que você me traia assim!” Masato instou com ela agressivamente, tocando seu ombro.
Porém, pela primeira vez, a garota que cresceu com o amor da família encarou seu pai com olhos ferozes. Mesmo que as lágrimas descessem, ela enfrentou a realidade.
“Que olhar é esse?! Você nunca foi assim!” Era possível ver a raiva tomando controle do policial aos poucos.
“Já chega”, ela disse. “Eu já cansei de toda essa situação. Vocês agem como querem e brincam de manipular os outros como querem. Não tratem os sentimentos dos outros como objetos para vocês usarem!”
Naquele ponto, onde Hana brilhou nos holofotes, os dois homens só podiam ouvir em silêncio.
“Sempre escondendo coisas de mim e contando comigo apenas quando é conveniente. Os dois são horríveis. São péssimos seres humanos… no entanto… mesmo assim, vocês são minha família. Eu amo vocês dois com todo o meu coração. Eu não quero ter de escolher algo tão difícil. Mas essa não é a hora de ser egoísta e pedir que vocês dois se reconciliem.”
“Então…” Masato encheu-se de esperança.
“Eu me decidi. A pessoa que cuidou de mim todos esses anos. Me deu uma esperança de viver, aliviou os pesos das minhas costas diversas vezes. Eu… vou tomar a decisão certa… seguindo a justiça que ele me ajudou a criar.”
Seus passos ficaram em câmera lenta aos olhos de Masato. A mão de Hana se entrelaçou à de Mayck.
O silêncio perdurou na sala de concertos. Ninguém ousou abrir a boca por um tempo. Aquela que observava continuou observando. A dupla que encarava o policial continuou a encarar e vice-versa.
Até que a quietude foi interrompida.
“Haha… Hahaha… Hahaha hahahaha!”
Masato riu alto e só parou quando perdeu o fôlego. Seu olhar era insano, como se a razão tivesse se perdido no breu que seus olhos eram.
“Entendi. Então essa é sua resposta, hein. Muito bem. Eu não quero me juntar a uma escória que abandona sua própria família. Assim como ele, você vai morrer. Vai ser perfeito. Eu vou matá-los como a dupla de cachorros imundos que vocês são.”
Ele apontou a arma na direção dos dois. A mudança era repentina, mas o que desencadeou isso era entendível. Mayck não ousou responder, mas percebeu que a pessoa em sua frente não tinha salvação, e mesmo que tivesse, não seria ele a salvá-lo.
Se for fazer isso, então é melhor fazer rápido.
Sacando sua espada, ele deu um passo para frente, mas foi interrompido pela mão de Hana, que se pôs em sua frente de forma autoritária.
“O que é isso?”
“Você tem coisas a resolver, não é? Deixe que eu cuide do restante.”
“Mas você…” Mayck estava receoso.
“Tudo bem… você pode pensar isso, mas é a única forma que eu consigo pensar de mudar quem eu sou de verdade. Além disso, você falou que confiava em mim, não disse?”
Ela o olhou com um sorriso meigo em seu rosto, seu olhar amoroso transmitia o quão feliz ela estava em ter ouvido as palavras de antes.
Mayck não podia lutar contra isso.
“Certo, certo. Entendi. Só tome cuidado, okay? Nos vemos depois.”
“Hm.” Ela acenou com a cabeça.
Rapidamente, Mayck soltou a mão dela e seguiu em direção a escadaria que levava para a saída, deixando para trás suas últimas palavras para a garota.
“Não tome uma decisão da qual se arrependerá depois.”
O som das portas se fechando ecoou pela sala. O silêncio era perturbador.
Pai e filha se encaravam ferozmente, o que estava totalmente errado, mas ninguém saberia dizer o que havia por trás daquela troca de olhares cheios de decepção de ambos os lados.
“Você não se arrepende? O que a mamãe diria sobre isso?”
“Não me arrependo e isso não me interessa. Você já tomou sua decisão. É hora de arcar com as consequências.”
A decisão foi tomada. Mas o receio de atacar seu próprio pai ainda queimava como brasa. Ela sentia vontade de chorar outra vez, mas não podia se dar a esse luxo.
Que destino cruel… Mas está tudo bem. Eu preciso seguir a minha justiça, assim como ele me mostrou uma vez.
Ela olhou para sua mão direita, que ainda tinha um pouco do calor de Mayck. Um sorriso brilhou em seu rosto.
Vamos pôr um ponto final nisso tudo.
Na galeria, a garota de capuz recebeu uma única instrução: interferir apenas se Hana estivesse prestes a ser morta ou matar Masato.
<—Da·Si—>
Aquele homem observou de um canto escondido o policial entrando na sala de concertos. Ele não queria estar realizando um trabalho tão entediante, obviamente, o que era demonstrado em sua expressão indiferente.
Se algo interessante acontecesse de verdade…
A falta de divertimento estava o matando.
No auge de seus 24 anos, ele mantinha uma ótima aparência, embora sua inspiração fosse seu mentor e responsável, o qual ele via como um modelo a ser seguido.
Seu porte era bastante atlético, e mesmo que ele não fosse narcisista, ainda se preocupava muito em se manter em forma e apresentável para qualquer ocasião; qualquer ocasião mesmo.
Não teve um passado fácil, mas acreditava cegamente que estava vivendo no seu melhor depois de ser resgatado por Yang e ter entrado no mundo dos portadores.
Seu trabalho lhe fazia bem. Se precisasse matar, matava, se precisasse salvar, salvava, e se alguém o irritasse, ele consideraria matar também. Não que ele não fosse mantido mas rédeas por Yang, mas, por eles dois, Ryuu causaria estragado por onde passasse. Ele só se contia porque era necessário — nunca se sabia quando alguém mais perigoso surgiria.
Apesar disso, ele não acreditava que algo assim aconteceria, apesar de haver vários candidatos em potencial.
A Ascension não era um lugar que ele prezava muito, na realidade. Ela era um mero instrumento para cumprir as ambições de Yang, portanto, enquanto ela fosse útil, ele trabalharia para ela, mesmo que custasse sua vida.
Além disso, laços não eram algo ao qual ele dava crédito. Amigos não eram importantes e se ele quisesse se divertir com uma mulher, só precisava dar algumas voltas para conquistar uma ou duas com sua aparência: alto, cabelos e olhos escuros, corpo em forma — parecia um modelo famoso.
Há pouco tempo, Yang lhe enviara para dois trabalhos chatos, como ele dizia, e um deles era auxiliar uma pessoa a plantar o caos no país — motivo que o fez aceitar sem muitas ressalvas.
Contudo, muitos eventos inesperados surgiram e os planos foram sendo modificados, mas nada garantia o sucesso.
Ryuu não podia dizer com certeza o que seu mentor planejava realmente, mas ele sabia que o objetivo daquela missão era afundar o Japão em desespero, assim como quebrar as duas organizações que agiam nas sombras, escondendo os portadores da luz do sol.
“E depois de tudo… o idiota veio mesmo resolver tudo sozinho. Que pateta.” Sua cabeça balançou em reprovação, vendo Masato entrar pelas portas de vidro da sala de concertos. “Bom, se algo der errado, então eu só preciso tirar ele de lá e acabar com as ameaças.”
E então, ele esperou. Alguns minutos depois, ele sentiu uma presença familiar, que o deixou em êxtase. Se fosse deduzir quem era, acertaria em cheio.
“A pessoa que está lá é…?”
Já fazia um bom tempo desde o último encontro que teve com Mayck. Ele ainda esperava terminar a luta que havia começado no dia da Catástrofe da luz vermelha.
Mas, embora ele quase tenha cedido a vontade de invadir o Tokyo Bunka Kaikan, outra coisa lhe chamou a atenção. Era uma energia incrivelmente colossal, que rodeou toda a área, manifestada em flocos de neve e uma brisa.
“Isso é coisa de um portador?” Ele pegou alguns flocos em sua palma, os quais derreteram com o calor de suas mãos.
A brisa se tornou mais forte de repente e começou a levar os flocos mais longe. Alguns segundos depois, Ryuu já tinha neve em seu paletó e cabelo.
“Mas que porcaria! Quem é o alucinado que está fazendo uma coisa dessas?!”
Ele teve que pôr as mãos na frente do rosto para se proteger do vento frio e cortante.
Aquilo lhe soou muito suspeito. Que era por causa de um portador já era óbvio, mas porque seria logo naquele dia, quando Mayck se apresentaria ao público? Mayck deveria estar naquele lugar e não na Tokyo Skytree?
“Tem algo errado aqui—”
Ele mal concluiu seu pensamento e uma saraivada de projéteis dispararam contra ele, forçando-o a recuar.
“Ah, porra. Era só o que faltava!” Ele olhou ao redor. A neve já cobria sua visão quase completamente; achar alguém que estava longe seria quase impossível naquele breu.
Não consegui detectar. Isso significa que não está usando ID.
Ele sorriu.
Quem é o desgracado que estou enfrentando, que pode me atacar com toda essa neve e ventania?
Ele foi obrigado a elogiar seu agressor, mesmo sem saber quem era.
O vento rugia em seus ouvidos e ele logo percebeu mais uma chuva de projéteis que cortavam o ar. Ele teve que recuar ainda mais.
“Já entendi seu objetivo. Quer me levar para longe, não é? Está certo, vou jogar esse joguinho.”
Ele não podia dizer o porquê, mas entendeu que quem quer que o estivesse atacando queria movê-lo para longe da sala de concertos. Então, ele se virou e começou a correr por cima da neve. Seus pés afundando e os projéteis passando por ele.
Era surpreendente que nenhum o acertasse, mas nada tão incrível. Para Ryuu, o primeiro subordinado direto de Yang, desviar daquilo era tão simples quanto respirar.
A paisagem branca se tornou um palco para ele parar e saltar com um pulso magnético abaixo de seus pés. Dezenas de agulhas brilharam no ar e foram lançadas na direção de onde os projéteis vinham.
Ryuu esperou acertar, mas pareceu que as agulhas não chegaram a lugar algum.
“Isso é bem desonesto. Não posso revidar se você ficar tão longe”, ele disse sarcasticamente para a figura que emergia daquela cortina branca.
Ryuu começou a analisá-la rapidamente. Não podia ver o rosto da figura por um simples motivo: ela estava usando uma máscara branca.
“Aha! Black Room? Eu não imaginei que iria vê-los por aqui. Será que é só coincidência?”
Ele riu alto.
“Não foi coincidência. Eu já estive te procurando há um tempo”, a figura disse. Sua voz era feminina e ela logo retirou sua máscara, revelando seu rosto. “Eu queria resolver um assunto antigo com você.
“Ehh? É isso mesmo? Não sei o que você quer, mas não vou recusar uma luta. Saiba que eu não pego leve nem com mulheres, hein.”
“Parece o mesmo idiota de sempre. Bom, que se dane. Vamos fazer isso logo de uma vez.”
Sem hesitar e sem dar muitas explicações, Stella sacou sua arma e começou a disparar contra Ryuu. Suas habilidades de tiro eram incontestáveis, mas os reflexos do membro da Ascension eram excelentes. Com suas agulhas, ela bloqueou todos os tiros no ar, causando pequenas explosões no momento do impacto.
“Ku ku ku. Muito bom, hein… Tá legal, vamos em frente com isso.”