A noite parecia mais escura que o normal, o vento frio trazia os lamentos de fantasmas, e a neblina encobria toda a cidade. Em meio a todo esse ambiente sombrio e aparentemente abandonado havia uma taverna, a Taverna Fantasma Inquieto. 

    Embora o nome passasse outra impressão, o local era bem movimentado, havia música, pessoas bebendo e jogando, todos se divertindo.

    Enquanto isso, alguém observava tudo lá de fora, Ivar, vendo que parecia seguro, decidiu entrar. Ele andou até o balcão, fez o pedido de uma jarra de água e uma refeição básica, e foi até uma mesa vazia para se sentar e esperar a comida.

    — Preciso economizar — murmurou para si mesmo, enquanto seus olhos percorriam o ambiente animado da taverna.

    As chamas da lareira lançavam sombras dançantes nas paredes de madeira, e o aroma de carne assada e pão fresco preenchia o ar, criando um contraste agudo com a miséria que Ivar carregava consigo. Suas vestes, embora funcionais, estavam surradas e sujas pela viagem. 

    Dois anos tinham se passado, e ele havia visto e enfrentado horrores inimagináveis desde a perda de sua esposa e filha, e sua jornada não estava nem perto de terminar.

    A jarra de água e a refeição chegaram rapidamente. Era uma sopa simples, acompanhada de um pedaço de pão duro, mas para Ivar, era um banquete. Ele comeu em silêncio, cada mordida um lembrete de sua necessidade de manter suas forças para o que estava por vir.

    Do outro lado da taverna, um grupo de homens robustos jogava dados, rindo alto e zombando uns dos outros. Em uma mesa próxima, um bardo tocava uma melodia alegre em um alaúde, sua voz clara e firme abafada pelo barulho das conversas e risadas. 

    Mas nem todas as faces estavam tão relaxadas. Em um canto, um homem encapuzado observava a sala com olhos atentos, como se esperasse algo, ou alguém.

    Ivar sentiu um calafrio percorrer sua espinha, um instinto adquirido ao longo dos anos de batalhas e perseguições. Ele olhou ao redor, disfarçadamente, tentando identificar qualquer ameaça potencial. A atmosfera era amigável, mas ele sabia que era melhor se precaver do que confiar nas aparências. 

    Em um mundo onde traições eram comuns, manter-se sempre alerta era essencial.

    Terminou sua refeição e se recostou na cadeira, sua mente vagando para os eventos dos últimos anos. Desde que jurara vingança, sua vida se tornara uma série de confrontos sangrentos e descobertas obscuras. 

    Ele tinha encontrado pistas sobre o paradeiro de Kaygon, mas sempre havia algo mais a ser desvendado, algum obstáculo a ser superado.

    Uma sombra se aproximou da mesa de Ivar, interrompendo seus pensamentos. Erguendo seu olhar, viu um meio-elfo aparentemente vivido, com a barba apresentando alguns fios já grisalhos e olhos um pouco cansados, mas amigáveis.

    — Posso me sentar? — perguntou o meio-elfo, apontando para a cadeira vazia em frente a Ivar.

    — Fique à vontade — Ivar assentiu lentamente, estudando o estranho. 

    Ele se sentou com um suspiro de alívio e estendeu a mão. 

    — Meu nome é Bronn. Você parece alguém que já viu e viveu muita coisa.

    Ivar apertou a mão de Bronn, seu aperto firme, mas não hostil. 

    — Sou apenas um viajante, procurando respostas e um pouco de paz.

    Bronn riu, um som áspero e sincero. 

    — Não encontrará muita paz aqui, amigo. Mas respostas… talvez eu possa ajudar. O que está procurando?

    Ivar hesitou, pesando suas palavras. Ele não podia confiar em ninguém completamente, mas precisava de informações. 

    — Estou procurando por um homem chamado Kaygon. Ele tem contas a acertar comigo.

    O rosto de Bronn ficou sério. 

    — Kaygon, você diz? Esse nome não é bem-vindo por aqui. Mas sim, eu já ouvi falar dele. Um homem perigoso, com muitos aliados. Você tem coragem de ir atrás dele.

    — Não é coragem, é necessidade — respondeu Ivar, sua voz sombria. 

    Bronn assentiu, compreendendo a determinação nos olhos de Ivar. 

    — Eu entendo. Há rumores de que Kaygon junto com outros nobres tem um esconderijo nas montanhas ao norte. Não é fácil de encontrar, e menos ainda de invadir. Mas talvez eu possa arranjar um mapa… se você estiver disposto a pagar o preço.

    — E qual seria esse preço? Ivar perguntou, estreitando os olhos.

    — Um favor por outro favor — Bronn respondeu, inclinando-se para mais perto. 

    — Eu também tenho inimigos, e preciso de alguém com suas habilidades para cuidar de um pequeno problema para mim. Se você fizer isso, eu te darei o mapa.

    Ivar ponderou por um momento. Ele não tinha muito a perder, e qualquer pista sobre Kaygon era valiosa. 

    — Qual é o problema? —

    — Há um bando de ladrões aterrorizando as estradas ao sul da cidade. Eles atacam viajantes e comerciantes, e a guarda local não tem conseguido lidar com eles. Se você puder acabar com essa ameaça, o mapa será seu.

    — E como eu saberei que você cumprirá sua parte do acordo? — Ivar perguntou, a desconfiança era evidente em sua voz.

    — Você terá que confiar em mim, assim como eu estou confiando em você — respondeu Bronn, seu olhar fixo no de Ivar. 

    — Além disso, se eu não cumprir, você sempre pode voltar e me encontrar.

    Ivar considerou a proposta e finalmente aceitou. 

    — Muito bem. Diga-me onde encontrar esses ladrões, e eu cuidarei deles.

    Bronn sorriu, aliviado. 

    — Ótimo! Eles costumam se esconder em uma velha taverna arruinada ao sul daqui. Não é difícil de encontrar, mas eles são muitos e bem armados. Tenha cuidado.

    Ivar se levantou, pronto para partir. 

    — Não se preocupe comigo. Eu lidarei com eles, e quando eu voltar, espero que você tenha o mapa pronto.

    — Estará esperando por você! — respondeu observando enquanto Ivar saía da taverna e desaparecia na noite escura.

    A brisa fria carregava consigo a sensação de ser observado. Ele sabia que estava sendo seguido; o perseguidor estava atrás dele há dias, talvez até semanas. Ivar estava acostumado com perseguições e sabia como despistar ou confrontar os que o caçavam.

    Ele andou pelas vielas escuras da cidade, passando por becos estreitos e ruas desertas. Quando sentiu que estava em um ponto estratégico, se escondeu nas sombras e esperou. Não demorou muito para ver uma figura encapuzada passando silenciosamente. 

    No momento certo, Ivar saltou sobre a pessoa, agarrando-a com força.

    — É melhor me deixar em paz se não quiser morrer! — rosnou Ivar, forçando a figura ao chão.

    Mas antes que pudesse obter uma resposta, Ivar foi jogado para trás com uma força tremenda, como se dez homens o tivessem arremessado. Ele rolou pelo chão e se levantou rapidamente, apenas para ver a capa da figura cair no movimento.

    Revelou-se uma mulher, mas não uma mulher comum. 

    Ela era uma Aasimar, uma raça meio-anjo com sangue celestial. Suas asas majestosas de cor carmesim, que haviam jogado Ivar para trás, agora estavam à mostra. Seus olhos brilhavam com determinação enquanto ela se aproximava dele, com uma mão na espada embainhada ao lado.

    — Fique parado aí, Ivar! — ordenou a mulher, sua voz firme e autoritária.

    — Você é acusado pelas mortes da família do duque Kaygon, das crianças do templo humano e de inúmeros outros nobres. Eu te levarei sob custódia e ganharei a recompensa pela sua cabeça.

    Ivar se levantou, limpando a sujeira de suas roupas. Ele não se renderia tão facilmente, mesmo que as acusações fossem verdadeiras. 

    — Sim, eu sou o responsável pelas mortes de todos eles. As crianças foram um erro, a morte delas me atormentarão até os meus últimos dias, mas todos os outros mereceram morrer — ele diz cerrando os punhos — eu faria tudo de novo e ainda matarei muitos mais. Não é você que vai me impedir, caçadora de recompensas. Se me seguir, serei obrigado a te matar. Fique longe!

    Antes que a Aasimar pudesse reagir, Ivar usou uma magia antiga que a paralisou por alguns segundos. Ele aproveitou a oportunidade para desaparecer nas sombras da noite, deixando a caçadora de recompensas imóvel, mas consciente.

    A mulher lutou contra a paralisia, finalmente se libertando do feitiço. Ela ficou ali, olhando para a escuridão onde Ivar desaparecera, seu coração cheio de frustração e determinação renovada. Ele havia escapado desta vez, mas ela não desistiria tão facilmente.

    Enquanto Ivar corria pela cidade, sua mente estava cheia de pensamentos sobre a inesperada confrontação. Ele sabia que teria que lidar com a caçadora de recompensas novamente. 

    Sua jornada estava se tornando cada vez mais perigosa, e ele precisava estar preparado para enfrentar não apenas seus inimigos, mas também aqueles que o perseguiam por vingança ou recompensa.

    Ele finalmente encontrou abrigo em um armazém abandonado na periferia da cidade, onde poderia descansar e planejar seu próximo movimento. 

    Ivar sabia que precisava lidar com os ladrões ao sul para obter o mapa de Bronn, mas agora ele também tinha que se preocupar com a Aasimar que estava em seu encalço.

    Enquanto se acomodava para a noite, Ivar sentiu um misto de cansaço e determinação. 

    O caminho à sua frente era árduo e perigoso, mas ele não desistiria até conseguir sua vingança e trazer sua filha de volta.

    Ele fechou os olhos, e se permitiu um breve momento de descanso antes de enfrentar os desafios do amanhecer.

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