Capítulo 18: Rituais e Vingança
Enquanto Ivar e Elara se aproximavam da saída do andar Restrito, um frio cortante percorreu a espinha de Ivar.
Algo estava errado.
Ele instintivamente puxou Elara para trás de uma das estantes quando ouviu um ruído estranho, um som quase imperceptível, como se o próprio ar estivesse sendo distorcido.
Elara prendeu a respiração, os olhos atentos.
— O que foi? — ela sussurrou.
Ivar não respondeu de imediato.
Ele fechou os olhos por um breve momento, aguçando seus sentidos arcanos.
E então sentiu.
Uma presença.
Algo ou alguém estava ali com eles.
Ele abriu os olhos novamente e virou-se lentamente para a porta. O brilho azul da fechadura mágica havia desaparecido, o que significava que alguém do lado de fora a havia destrancado.
Elara percebeu isso ao mesmo tempo que ele, e sua expressão ficou sombria.
— Fomos descobertos — ela murmurou.
A porta rangeu ao se abrir, e passos pesados ecoaram pelo corredor estreito.
Ivar e Elara recuaram mais fundo entre as estantes, ocultando-se nas sombras.
A luz fraca do ambiente revelou a figura que acabara de entrar: um homem alto, envolto em um manto vermelho escuro, com um capuz cobrindo parte de seu rosto.
Mas o que realmente fez o coração de Ivar acelerar foi o símbolo bordado no peito da túnica, o mesmo que ele havia acabado de ver nas páginas do ritual.
— Um cultista… — Ivar sussurrou, sua mente já calculando os próximos passos.
O homem caminhou lentamente pela sala, seus olhos varrendo o ambiente como se soubesse que não estava sozinho.
Elara lançou um olhar para Ivar, silenciosamente perguntando o que fariam.
Ele ponderou por um breve segundo.
Poderiam tentar escapar sem serem vistos, mas se o cultista notasse a ausência das páginas e das chaves, alertaria os outros.
Poderiam eliminá-lo agora, garantindo mais tempo antes que qualquer suspeita surgisse.
Ou poderia segui-lo e ver até onde ele iria. E foi isso que ele decidiu.
Ivar segurou o braço de Elara, sinalizando para que aguardasse. Ela franziu o cenho, mas não protestou.
O cultista parou diante da mesa onde a caixa estivera momentos antes. Seus dedos deslizaram pela superfície de madeira, como se procurasse algo.
Ele então murmurou um feitiço, e um brilho fraco emanou de suas mãos.
Ivar sentiu a tensão aumentar.
O homem estava verificando vestígios mágicos.
Se fosse habilidoso o suficiente, poderia detectar que alguém havia tocado nos artefatos recentemente.
Elara se inclinou levemente para perto de Ivar.
— Se ele descobrir, teremos que agir rápido — sussurrou.
Ivar assentiu, os olhos fixos no cultista.
Após alguns instantes, o homem suspirou e se afastou da mesa. Ele lançou um último olhar ao redor da sala, então virou-se e caminhou de volta à porta.
Ivar esperou até que o cultista saísse e, em seguida, seguiu silenciosamente atrás dele, mantendo-se nas sombras.
Elara o acompanhou, tão furtiva quanto uma caçadora espreitando sua presa.
O corredor estreito levava a uma escadaria em espiral, descendo ainda mais fundo na estrutura da biblioteca.
O cultista movia-se com pressa, claramente indo a um destino específico.
Ivar trocou um olhar rápido com Elara antes de continuarem descendo.
Eles desceram até os andares inferiores da biblioteca, e após alguns minutos, o homem parou diante de uma parede, até então comum.
Ele ergueu a mão e recitou outra série de palavras em uma língua antiga.
Símbolos brilharam por um instante antes de desaparecerem.
A parede se abriu com um rangido lento.
Do outro lado, um corredor longo e logo adiante uma sala iluminada por chamas avermelhadas se revelou.
No centro, um simbolo estava desenhado no chão, e três outras figuras encapuzadas estavam ali, esperando.
Ivar prendeu a respiração.
Eles haviam encontrado algo muito maior do que esperavam.
Elara se aproximou ligeiramente de Ivar, os olhos atentos às figuras na sala. O cheiro metálico de incenso e sangue pairava no ar, misturado ao calor opressivo das chamas.
O cultista que haviam seguido se adiantou e parou diante do círculo, abaixando a cabeça em um gesto de reverência.
— Os preparativos foram concluídos? — uma voz rouca perguntou.
Um dos encapuzados assentiu.
— Sim. Mas a caixa… foi aberta.
Ivar e Elara trocaram um olhar tenso.
— Alguém esteve no andar restrito? — o cultista recém-chegado questionou, seu tom endurecendo.
— Não sabemos — outro respondeu. — A fechadura mágica não foi violada, mas há uma perturbação nos resquícios arcanos.
O silêncio que se seguiu foi denso.
— Então já podem ter o que precisamos — a voz rouca concluiu.
O cultista recém-chegado se ergueu e apertou os punhos.
— Se for o caso, precisamos comunicar Lorde Kaygon imediatamente. Não podemos permitir que o ritual seja comprometido.
Ao ouvi isso, Ivar sentiu um frio percorrer sua espinha, com uma mistura de ódio. Seja lá o que estavam planejando, precisavam detê-los antes que fosse tarde demais.
Então, um dos cultistas se virou para o símbolo no chão, recitou palavras arcanas, e então a figura de Kaygon apareceu.
Era uma projeção, um ritual utilizado apenas por magos que ultrapassaram suas capacidades mágicas, pelo estudo ou por pactos.
E então, recuperaram as páginas restantes? — Kaygon perguntou.
O cultista hesitou por um momento antes de responder.
— Ainda não, meu senhor. Mas acreditamos que alguém as tenha encontrado. Há vestígios de magia no local onde a caixa foi guardada.
A figura projetada de Kaygon permaneceu imóvel por um instante. Então, seus olhos brilharam com um tom carmesim.
— Isso é inaceitável! Vocês juraram que tudo estava sob controle. Se essas páginas caírem em mãos erradas, o equilíbrio do ritual será quebrado.
O tom de sua voz era calmo, mas carregava uma ameaça implícita.
— Lorde Kaygon, encontraremos o responsável e recuperaremos as páginas. Ninguém sairá vivo desta cidade sem que saibamos.
Ivar cerrou os punhos, controlando a raiva. Kaygon, seu padrasto, um homem envolvido em corrupção e mortes de não humanos em massa, além de assassinar a mãe, a esposa e a filha de Ivar, um Lorde que manipulava cultos e sociedades secretas como peças em um tabuleiro.
E agora, ele estava diante da prova de que Kaygon realmente estava envolvido.
— É ele, Elara. É Kaygon… — Seus dentes rangeram e seus olhos púrpuras emanaram um energia desconhecida — …esse verme ainda terá o que merece… eu irei me vingar, pela minha mãe, pela minha esposa, pela minha filha e por todos que sofreram em suas mãos.
— E você terá sua vingança, Ivar. Mas agora não podemos fazer nada, apenas observar e escutar. Vamos obter toda a informação que pudermos aqui, mas não podemos ser vistos — respondeu Elara.
Ivar respirou fundo, tentando controlar a raiva que fervia dentro de si. Seu corpo tremia levemente, não de medo, mas de fúria contida.
A energia que emanava de seus olhos se dissipou lentamente, mas a promessa de vingança permanecia ardendo em sua alma.
Kaygon.
O nome ecoava em sua mente como um lembrete cruel de tudo o que havia perdido.
Elara tocou seu braço, firme, mas sem agressividade.
— Concentre-se, Ivar. Se nos descobrirem agora, perderemos qualquer chance de impedir esse ritual e acabar com Kaygon de uma vez por todas.
Ele fechou os olhos por um breve segundo e assentiu.
Lá embaixo, os cultistas ainda aguardavam instruções.
— O artefato só pode ser usado uma única vez, encontrem essas páginas imediatamente. Se necessário, varram cada canto desta cidade. Eu não aceitarei falhas! — ordenou Kaygon.
Os cultistas se curvaram em reverência, cada um deles entendendo a gravidade da situação. O tom frio e implacável de Kaygon não deixava espaço para erros.
— Sim, meu senhor. Partiremos imediatamente.
A projeção de Kaygon começou a se dissipar, mas antes que sumisse completamente, ele fez um último aviso.
— Se falharem, não precisarão retornar.
O silêncio pesado que se seguiu fez Ivar prender a respiração. Ele sabia que Kaygon não fazia ameaças vazias. Esses cultistas seriam descartados como meros peões se não cumprissem sua missão.
O líder encapuzado se ergueu e gesticulou para os demais.
— Dividam-se. Quero informações sobre qualquer movimentação suspeita na cidade. E verifiquem os mercadores de relíquias. Se alguém estiver tentando vender ou esconder as páginas, encontraremos.
Três dos cultistas assentiram e deixaram a sala, movendo-se com pressa pelo corredor oculto.
Elara se inclinou ligeiramente para Ivar.
— Isso nos dá pouco tempo — sussurrou.
Ele apertou os punhos, os olhos voltando para o círculo ritualístico.
O líder cultista virou-se para o último membro restante.
— Quanto ao sacrifício?
O homem de manto vermelho assentiu.
— Está sendo mantido nas celas abaixo do santuário. Ela ainda resiste, mas não por muito tempo.
Ivar trocou um olhar com Elara.
— Precisamos descobrir quem é essa prisioneira, se ela é importante para o ritual deles, precisamos impedir que a levem — murmurou.
Ela concordou.
— E se houver uma chance de salvá-la, precisamos agir rápido.
O cultista fez um gesto com as mãos e a parede começou a se fechar novamente.
Ivar e Elara não tinham mais como sair. Eles estavam presos do lado de dentro, e a única escolha seria lutar.
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