Episódio 235 – Kajsa Ophand (1)
Cordelia não era a personagem bestial de Legend of Heroes 2.
Afinal, a Cordelia do jogo era uma garota elegante e delicada, que não se encaixava nas palavras “besta” ou “selvagem.”
Era Kajsa Ophand.
A verdadeira personagem feminina bestial de Legend of Heroes 2.
A égua selvagem do sul.
A bruxa decapitadora.
O monstro de Ophand.
Todas essas eram palavras cruéis associadas a uma adolescente que era a preciosa filha de uma família nobre, mas nem Kajsa nem os que estavam ao seu redor negavam esses apelidos. Pelo contrário, ela de alguma forma os aceitava e até se agradava deles.
“Porque é completamente verdade.”
A família Ophand era uma das Sete Famílias do Sul e possuía o sangue divino de um ser antigo correndo em suas veias, assim como a família real e as Doze Famílias do Norte.
Mas o problema era que o ancestral deles não era um anjo comum ou um deus. Era uma besta.
O Lobo Ganancioso, Fenrir.
Uma fera infernal nascida no submundo que, tocada pela pureza do deus solar Solari, renasceu como uma fera sagrada.
Fenrir compartilhou um amor que transcendeu as raças com a Santa Sophia Ophand, membro da ordem de Solari, e juntos tiveram muitos filhos. A atual família Ophand era considerada descendente de Fenrir.
Claro que, sendo uma entidade antiga — e ainda por cima uma fera sagrada — Fenrir não era apenas um lobo comum.
O Senhor dos Licantropos.
O Rei dos Lobisomens.
E graças à herança intensa desse sangue sagrado, de tempos em tempos nasciam descendentes com habilidades ou poderes tão absurdos que não poderiam ser considerados humanos comuns.
“No enredo do jogo, era a Kajsa.”
A habilidade de Kajsa era bem simples.
Um corpo forte.
Habilidades físicas além das limitações dos humanos.
Entre os onze personagens jogáveis de Legend of Heroes 2, Kajsa era a fisicamente mais forte e também a mais rápida.
“Porque o corpo dela é tão forte que ela nunca fica doente. Venenos também não funcionam contra ela.”
Ela realmente possuía um corpo de aço.
Claro, isso não queria dizer que sua pele fosse feita de aço ou que ela pudesse bloquear lanças e espadas com as mãos e pés como Jude, mas era verdade que ela tinha uma habilidade de desintoxicação tremenda e uma durabilidade quase como a de um zumbi.
“O único ponto fraco da Kajsa é a estamina.”
O motivo de Kajsa ser chamada de “comida instantânea de 3 minutos” ou “ejaculação precoce” era simples.
Porque o corpo dela não conseguia lidar com o aumento explosivo de suas habilidades físicas, e ela logo ficava exausta depois.
“É como um carro esportivo com um motor poderoso, mas com uma péssima relação custo-benefício.”
Uma vez que ela começava a correr sem controle, se tornava uma besta, mas isso consumia tanta energia que Kajsa só conseguia lutar com sua força total por 3 minutos ou menos.
Depois disso, ela literalmente não conseguia mais lutar por causa de sua fome intensa.
“Claro, ela consegue durar se não usar tudo quando luta.”
De qualquer forma, Kajsa foi treinada em artes marciais e sua resistência básica era tão boa quanto suas grandes habilidades físicas.
“É só que a economia de combustível dela é realmente ruim.”
Era assim a pessoa chamada Kajsa.
O arquétipo da personagem selvagem e bestial de Legend of Heroes 2.
O cão de caça da família Ophand, que caçava piratas enquanto seus cabelos pretos flutuavam ao vento.
Agora era hora de conhecê-la.
Dois dias depois de deixar o Mosteiro de St. Crute.
Cordelia tinha uma expressão emburrada.
‘Que irritante.’
Não era cansaço por andar a cavalo por muito tempo.
Mesmo sendo uma maga, o nível dela era alto o suficiente para que tivesse mais resistência física do que a maioria das cavaleiras.
‘Que irritante.’
Também não era o desconforto de acampar ao ar livre.
Depois de recordar as memórias de sua vida passada, acampar era como dormir em sua cama.
Comparado a dormir em um campo de neve enquanto uma tempestade de neve rugia ou dormir em uma fenda estreita de uma rocha nas terras selvagens, o acampamento atual era como um hotel cinco estrelas.
‘Que irritante.’
Mas ela ainda estava irritada.
Ela conseguia suportar Manuel tagarelando incessantemente ao seu lado. Ela ouvia suas palavras quietamente, pois também achava interessante o que ele dizia.
Ela não se importava com Carmen se gabando de seu marido e filha.
Na verdade, isso era até satisfatório, pois ela também podia se gabar de Jude.
Era a refeição então?
Tanto faz se precisavam de 2 ou 11 porções, estava tudo bem, pois foi Jude quem fazia.
Ela também estava satisfeita com a qualidade dos pratos.
‘Que irritante.’
Cama, refeições e companheiros de viagem.
Nenhum dos três elementos de uma viagem era o motivo de sua insatisfação.
Ainda assim, Cordelia resmungava enquanto fazia uma careta.
Porque não temos tempo.
Porque Jude e eu não temos um tempo a sós juntos!
‘Ugh.’
Em primeiro lugar, o grupo deles estava com pressa de chegar ao sul.
Ou seja, não tinham muito tempo para fazer uma pausa relaxante no meio da viagem.
Naturalmente, paravam várias vezes ao dia, pois precisavam descansar, mas estavam sempre reunidos em um só lugar, já que precisavam estar juntos durante as pausas na marcha.
‘Eueueue.’
Em segundo lugar, Manuel e Carmen não sabiam ler o clima.
Ao contrário de Dahlia e Maja, os dois nunca pensaram em dar a Jude e Cordelia algum tempo a sós juntos.
Manuel sempre seguia Cordelia, chamando-a de anjo isso e anjo aquilo, enquanto Carmen não era como aquelas tias intrometidas, pois não estava muito interessada no relacionamento romântico de Cordelia e Jude.
Pelo contrário, ela adorava se gabar da filha.
‘Ngh.’
Também era difícil se oferecer para a vigília da noite.
O número de membros enviados pelos Guardiões da Santa Cruz para essa missão era nove, como de costume nas suas missões.
Como eram nove pessoas, Jude e Cordelia ainda não haviam tido sua vez na rotação da vigília da noite.
Na real, ninguém nem cogitava dar turno de vigília pra ela ou pro Jude.
‘Tsk.’
Na verdade, ter algum tempo a sós não era necessário.
Eles não tinham nada de especial para fazer juntos.
Mas como dizer isso…
Como eu diria isso…
‘Nnggggh.’
Já era vergonhoso só de imaginar, e seria ainda mais se ela falasse em voz alta.
De qualquer forma, como dizer isso?
Deveria eu dizer que quero fazer isso?
Sabe, aquele tipo de coisa.
Aquele ato que faz o coração bater mais rápido, que te faz sentir bem e aquece o coração quando você o faz!
“Haa…”
Seria bom se pudéssemos andar a cavalo juntos.
Por que os Guardiões da Santa Cruz precisavam preparar um cavalo por pessoa? Será que eles tinham tantos cavalos assim? Um cavalo por pessoa é realmente necessário?
Mas foi nesse momento.
[Cordelia.]
[Eh? Ah! Sim!]
Cordelia se iluminou quando recebeu a magia de Jude, mas logo limpou a garganta e rapidamente fingiu estar calma.
Ela se virou para Jude enquanto fingia estar bem.
[Que foi? Aconteceu alguma coisa?]
[Por que está estranhamente feliz?]
[Feliz nada. Tô igual de sempre. Igualzinha. Totalmente normal.]
Com a insistência de Cordelia, Jude estreitou os olhos com desconfiança, mas logo assentiu.
[Beleza. Depois a gente treina mais essa sua atuação.]
[Oi?!]
[Enfim, acho que está na hora de nos separarmos.]
[Se-separar?]
[Sim, porque nosso propósito é diferente de qualquer maneira. Carmen e Manuel têm que encontrar Kamael, enquanto nós temos outro propósito, lembra?]
Cordelia ficou momentaneamente surpresa com a palavra “separar”, mas logo suspirou aliviada e assentiu com a cabeça.
[Isso mesmo, porque nosso objetivo é o brasão das sete famílias do sul.]
As sete famílias do sul.
Sete famílias que detinham o maior poder na região sul, assim como as doze famílias do norte.
Mas havia uma enorme diferença entre as sete famílias do sul e as doze famílias do norte.
As doze famílias do norte competiam entre si, mas isso não escalava para um conflito sangrento. Por outro lado, as sete famílias do sul achavam estranho se encontrassem umas às outras sem derramamento de sangue.
Eles se envolviam em brigas de gangue uma vez por mês e duelos uma vez por ano.
Obviamente, não brigavam com tanta frequência assim, mas não era exagero dizer que as sete famílias do sul estavam sempre em busca do sangue umas das outras.
No entanto, era bem surpreendente que essas sete famílias já tenham sido unidas sob uma única bandeira.
Carlos, o Matador de Dragões.
O grande herói do sul que lutou lado a lado com Lion D. Salen, um herói incomparável e o rei fundador do Reino Salen.
No passado, ele tinha sete vassalos que estavam unidos no sul, e esses vassalos se tornaram as atuais sete famílias do sul.
Embora estivessem sob o Reino Salen agora, o povo do sul considerava Carlos, o Matador de Dragões, como seu verdadeiro rei, e isso também se aplicava às sete famílias do sul.
“Aquele que herdar minha relíquia será o novo senhor do sul.”
Próximo de sua morte, Carlos, o Matador de Dragões, desapareceu repentinamente após deixar essas palavras, e a partir de então, as sete famílias do sul começaram uma luta sangrenta pela posição de sucessor de Carlos.
[Como você sabe, Carlos deixou uma pista pra cada uma das sete famílias, né?]
[Uhum! Se reunir todas, dá para descobrir onde tá escondida a relíquia que ele deixou.]
[Sim. Mas as sete famílias do sul estavam ocupadas demais brigando entre si, então não compartilharam informações… assim, depois de quase 300 anos, o sucessor de Carlos ainda não apareceu.]
Ela já sabia sobre isso mesmo antes de ele falar com ela agora.
Porque já haviam discutido sobre isso na capital real.
A razão pela qual enviaram Scarlet para o sul.
[Está na hora da Ladra Fantasma Bomba Rosa aparecer de novo, certo?]
[Isso mesmo.]
Junto com Scarlet, eles iriam roubar as sete famílias do sul para reunir as pistas.
E se dissessem que isso era uma competição para decidir a posição de Mestre dos Ladrões, Scarlet também se esforçaria ao máximo.
[Ela é uma ótima amiga.]
[Ela é.]
Jude e Cordelia se olharam antes de rirem, e Jude continuou.
[Para lutar contra o Dragão Negro Malekith, é necessário unir os poderes do sul. Precisamos de autoridade absoluta para fazer isso.]
[Mas será que, depois de trezentos anos, só o brasão do Carlos ainda vai fazer as famílias obedecerem?]
[Sim. Carlos é tratado como um deus no sul.]
Além disso, se existisse uma ameaça específica chamada Malekith, eles não teriam escolha a não ser unir suas forças.
[Passando para o próximo assunto, há um lugar onde precisamos parar antes de começarmos nosso trabalho preliminar. Você consegue adivinhar onde é?]
[Espera um minuto. Vou descobrir.]
Cordelia levantou a mão pedindo um segundo, fez uma cara concentrada, e de repente bateu palmas, mandando uma nova mensagem.
[Eu entendi! Você está falando da Kajsa, né?]
[Isso mesmo.]
Afinal, eles precisavam contar com pelo menos uma pessoa no sul.
Além disso, Kajsa era uma personagem jogável, então definitivamente precisavam se aproximar dela.
[Primeiro de tudo, sabemos muito pouco sobre o sul. Kajsa é a única personagem jogável no sul, e seu cenário começou quando ela fugiu do sul devido ao ataque de Malekith.]
Em outras palavras, para roubar corretamente as sete famílias do sul, eles precisavam de uma pessoa local – uma colaboradora, que soubesse muito sobre as outras sete famílias do sul.
[Beleza, entendi. Então se a gente vai atrás da Kajsa, temos que nos separar de Carmen, Manuel e do pessoal da Guarda, né?]
[Sim, é isso. Mas por que você está parecendo tão estranhamente feliz?]
[Não, não estou. Esse é o meu rosto normal, tá? Na verdade, estou triste por termos que nos separar deles, viu?]
Quando Cordelia resmungou enquanto falava, Jude estreitou os olhos novamente, mas não fez mais perguntas.
[Enfim, estou pensando em nos separar quando chegarmos no próximo cruzamento. A Kajsa já deve estar caçando piratas agora com Daram como base.]
Daram era uma das cidades portuárias da região sul.
Carmen e os Guardiões estavam indo agora para o maior porto comercial do sul, Bardos, que estava sob a jurisdição da família real, então teriam que se separar logo, como Jude disse.
[Haa. Não tem jeito. Vamos nos separar aqui. Sim, realmente. Não tem jeito. Não tem jeito.]
Cordelia falou surpreendentemente em um tom monótono sobre a magia, e Jude tentou conter o riso antes de dizer.
“Tudo bem. Eu vou falar com eles.”
“Tá bem!”
E cerca de 10 minutos depois.
Jude disse para Cordelia enquanto estreitava os olhos.
“Ei, Condessa.”
“Sim, Milorde.”
“Onde estão nossos cavalos?”
“Eu devolvi para a Carmen?”
“Por quê?”
“Porque eu tenho um cavalo forte aqui, né?”
Cordelia inclinou a cabeça, fingindo não entender por que ele estava perguntando, e Jude finalmente riu.
“Se eu correr com você nas minhas costas, vamos chamar muito a atenção, tá?”
“Eu sei, então faça direito, tá? Você é bom nisso, né?”
“Sim, sim, eu entendi.”
Você realmente quer ser carregada tanto assim, né?
Jude entregou a bagagem pra Cordelia e se virou. Toda animada, ela pegou os pertences, colocou nas costas e subiu nas costas do Jude.
“O cheiro do Jude.”
“Hã?”
“E-eu… não é nada. Sim. Vamos apressar.”
Cordelia respondeu evasivamente e enterrou o rosto no pescoço de Jude enquanto sorria discretamente.
“Enfim, vamos lá. Segure firme.”
“Pode deixar.”
Cordelia respondeu obedientemente, fungando uma vez antes de apertar um pouco mais o abraço em torno do corpo de Jude. Jude ajustou a posição de Cordelia e então impulsionou-se no chão.
E duas horas depois.
O que aguardava Jude e Cordelia quando chegaram na cidade portuária de Daram foi um evento inesperado e não Kajsa.
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