Capítulo 12: O Cerco das Feras(II)
A criatura avançou, pesada, arrastando as patas com estalos ritmados que ecoavam nas paredes — toc, toc… CRAC — como se cada passo fosse um prego no caixão do silêncio. O ar vibrava com a presença dela, como se o próprio espaço recuasse em reverência ao monstro. Eleanor e Weast sentiam isso: o pressentimento de que aquele ser não era apenas um predador, mas um emissário de algo muito maior.
O monstro soltou um rugido — RRRAAAAAAAHHHHHH — que reverberou pela câmara como um trovão preso dentro da terra. Poeira caiu do teto, as pedras rangendo com o som. A parede atrás deles estalou com a reverberação. A pressão do ar parecia sufocar.
Weast deu um passo à frente, a lâmina tremendo entre seus dedos, não por hesitação, mas pela densidade da ameaça diante deles.
— Mantenha a esquerda. Eu puxo pra mim — sussurrou ele, os olhos fixos.
— Vai se matar. — Eleanor o seguiu de perto, firme, mas com o coração disparado como um tambor — tum-tum-tum — sob a pele.
O monstro atacou primeiro. Um salto repentino, o bafo quente e úmido atingindo-os antes mesmo das garras. Weast rolou para o lado — shfff! — e girou a espada, acertando de raspão a pata da besta. O som do impacto foi surdo — thokk!, metal contra carne endurecida.
Eleanor correu pelas pedras, subindo numa saliência lateral, o corpo tensionado como uma mola. De lá, lançou sua lâmina em arco, mirando o flanco da criatura. O golpe cortou, arrancando um guincho de dor — RRAARRHHH! — e um jato espesso de sangue quente, que respingou em seu rosto.
A criatura girou, furiosa. Sua cauda golpeou o ar — WHAAASH! — passando a centímetros de Eleanor, que recuou, tropeçando nas pedras molhadas.
Weast, sangrando do ombro após o impacto anterior, cravou uma estaca improvisada na base da espinha da criatura. O som da madeira perfurando a carne — SKRRRK! — foi abafado por outro rugido monstruoso. A criatura se ergueu nas patas traseiras, em agonia, as garras raspando as paredes — chrrkkk…
— Agora! — gritou ele, os olhos ardendo com a adrenalina.
Eleanor gritou também, mais de dor do que coragem, e saltou com tudo o que restava. Sua lâmina atravessou o pescoço do monstro — TCHRRRAK! — os olhos vermelhos se apagando num segundo, como brasas esmagadas sob a chuva.
A criatura caiu. O chão estremeceu — BOOOOM — e o som reverberou câmara adentro como um aviso aos que estavam nas sombras.
Silêncio.
Mas não por muito.
Um arranhar leve — krrrrk… krrrrrrrk… — rompeu o momento, vindo do túnel. Depois, outros sons: pesados, compassados, famintos.
— Eles estão vindo — murmurou Eleanor, ofegante.
Weast se levantou, limpando o sangue da lâmina contra o próprio casaco rasgado.
— Precisamos ir mais fundo. Não vamos aguentar outra luta aqui.
— E se for uma armadilha? — questionou ela.
— Então vamos cair nela do lado de dentro, não devorados aqui fora.
Começaram a desmontar parte das barricadas em uma das saídas. As tochas iluminavam mal, lançando sombras alongadas. Os sons vinham mais próximos — toc… toc… toc… — e algo como um rosnar subterrâneo — grrrrrhhh…
Correram para o corredor central, úmido, o chão coberto de limo. À frente, o túnel descia em espiral. Atrás, os gritos das criaturas tomaram a câmara — RAAAAH!, KKKHHHHHH!, sons animalescos com um timbre quase… consciente.
Desceram. As paredes tremiam sob seus pés, cada passo ecoando como se o lugar tivesse vida.
— Temos que encontrar uma estrutura — disse Eleanor, quase sem fôlego. — Qualquer coisa. Portas, plataformas, alçapões…
— Essa masmorra não é só pedra. Foi feita. — Weast observava os símbolos nos arcos, linhas antigas esculpidas com obsessão. — Isso aqui guarda algo.
Chegaram a uma bifurcação. O túnel da esquerda tinha marcas profundas, como garras ou runas corrompidas. Um som os chamou por lá — não era animal. Era mecânico. Engrenagens? Um zumbido grave vibrava no fundo da estrutura.
— Vamos pela esquerda — disse Weast, instintivamente.
Eleanor hesitou. Algo ali a fazia querer correr na direção oposta. Mas o olhar dele dizia: se vamos morrer, que seja buscando sentido.
Entraram no túnel. O som dos passos foi engolido pela espiral descendente. As criaturas os seguiam, o cheiro de sangue guiando a matilha invisível.
— Estamos nos aproximando de algo grande — sussurrou Eleanor. — Você sente?
— Sinto. — Weast pausou. — Mas não sei se é algo bom.
Logo, o túnel se abriu numa sala circular, forrada de pedras polidas e coberta por inscrições que pulsavam uma luz azul fraca. No centro, uma porta metálica com um mecanismo antigo, cercado por alavancas e símbolos.
— Isso é… um selo. — Eleanor se aproximou, tocando a superfície metálica. Ela estava fria, apesar do calor do ambiente.
— Acho que isso era uma prisão — murmurou Weast, notando as correntes quebradas nas laterais da câmara.
Atrás, o som das criaturas voltou — agora perto demais — toc-toc-toc… SHHRRRAAAHHH!!
Eles não tinham escolha.
Weast puxou a alavanca central. Um som profundo ecoou — THUUNGGGG — como sinos batendo nas entranhas da terra. A porta vibrou, e símbolos começaram a girar em padrões circulares.
— O que está fazendo?! — gritou Eleanor.
— Apostando tudo.
A porta começou a se abrir. A luz azul se intensificou, e uma brisa gelada escapou por entre as frestas.
A última visão que tiveram antes de a sala atrás deles ser tomada pelas bestas foi um vulto… dentro da nova câmara.
Uma figura alta, de armadura negra, como uma sombra sólida com olhos incandescentes. Estava presa… ou esperando.
E agora, desperta.
A porta terminou de abrir.
O frio os engoliu.
E as feras pararam.
Não de medo.
Mas de reverência.
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