Já era noite quando o ataque começou. Em poucas horas, as fortificações foram derrubadas e, as casas de madeira e palha, começaram a queimar conforme as esferas de metal em chamas eram disparadas para dentro da vila.

    Conseguimos ter uma visão quase completa do vilarejo devido aos morros de mineração. Porém, a irregularidade no terreno também traz desvantagens no deslocamento: nos força a ter que descer por meio de um caminho íngreme até as ruas principais.

    Olhando lá de cima, sou afligido por tristeza, tudo estava irreconhecível, uma destruição dessa magnitude jamais tinha nos atingido. Abaixo a cabeça tentando rejeitar a cena ao meu redor.

    Os pés dos soldados e os meus, caminham em um pique considerável. Todos estão apressados, mas a tropa é incapaz de correr devido a falta de segurança em descer com o armamento pesado.

    Um guerreiro musculoso, de largas placas metálicas; carrega um largo escudo metálico na minha frente. Reconheço ser da forja da qual trabalho, devido ao seu brilho único: que reflete meu rosto com precisão.

    Ao ver-me no espelho, encaro um garoto de orelhas pontudas e cabelo castanho. Seus olhos têm a mesma cor de seus fios, e a pele é levemente escurecida – queimada pelo sol de tanto trabalhar. Eis, então, uma aparência comum, tão facilmente confundível; que o fez usar presilhas metálicas no cabelo para não ser confundido.

    Quando acabo de refletir, volto a espiar as ruas abaixo, sinto a empatia aos poucos me roubar o ar do peito. Tento respirar fundo para me acalmar, entretanto, por causa dos telhados de feno queimando; um pó cinza no ar adentra as minhas narinas. Paro para tossir só por alguns segundos.

    Enquanto me recupero, percebo que estou atrasado em relação ao grupo. Outra bola de fogo é disparada e atinge a parede do morro ao meu lado.

    Ao ver as chamas caindo, meu corpo para por completo. Rápido, antes de qualquer reação minha, escombros se acumulam na passagem.

    — Por que você parou? Nido! — grita um soldado amigo, seu tom logo vira preocupação.— Você ‘tá me escutando?

    Meu corpo cessa, proibindo a resposta.

    Desde a infância, sofro de um medo irracional por fogo. O jeito que ele toma o ambiente e destrói tudo que toca, me atormenta com uma sensação, cujo a origem não é contada. Ele me deixa em estado de fraqueza, paralisando meu corpo — só me resta esperar o tempo que meu corpo decide para se recobrar.

    É de fato um empecilho irracional; quando o ato da forja, foco da vila inteira, é colocado na balança. Por sorte, ou melhor, por causa do meu chefe atencioso; sou descontado desta parte do trabalho e, em troca, eu trabalho o dobro todos os dias com a minha carroça.

    — Agora desça pelo barranco! Dê um jeito! — intervém o líder da tropa. — Nos encontre no objetivo!

    A paralisação tem seu fim. Após a ordem dada, faço assim como me foi exigido. Salto morro abaixo, intercalando entre pulos e arrastões contra a parede. Termino a queda com rasos ferimentos, diferente do campo de batalha que entrei.

    Entre os dispersados pelas ruas, atravesso os confrontos contra os invasores estrangeiros. Por motivo da minha estatura, e um pouco de sorte, consigo escapar por baixo dos golpes travados acima de mim.

    — Merda. Se eu parar — murmuro em desespero. — Eu vou morrer!

    Olho as minhas mãos e as minhas vestes, este é um mal costume. Sempre revejo o que tenho — mesmo já sabendo a resposta para a dúvida.

    Tudo o que possuo é: uma espada curta de uma mão e um envelope. Dentro dele, está o motivo da minha missão, entregar uma carta de conteúdo desconhecido ao gerente dos óleos.

    Não foi permitido ler. O plano exigia que o mínimo de pessoas tivessem acesso ao conteúdo. Se Regin, o homem que me deu o trabalho, tivesse ao menos me escutado, saberia que uma carta é mais arriscada.

    Me contradigo: “Mas quem me escutaria?”

    Paro a checagem de itens e volto meus olhos ao caminho. Assim que os levanto, sou pego desprevenido e atingido por um escudo pesado.

    O impacto atordoa, meu ouvido está zunindo. Cambaleio para trás e me banho numa poça de líquido vermelho.

    Noto que minha mão está apoiada sobre o corpo de um homem da raça inimiga, que tem 3 vezes o meu tamanho.

    Eu ergo meus olhos e vejo que o escudo tinha um símbolo familiar – um pequeno castelo, com água na parte inferior e uma coruja ao lado direito, eis a bandeira do castelo da minha vila.

    Olho para o rosto dele, está carregado de desgosto, reconheço ser o filho do meu patrão, Randi. A minha face, ligeiramente, se contorce de uma crítica a um falso sorriso.

    — Eu te atrapalhei? Desculpa, Randi. — Me curvo aos seus pés.

    Curvado, vejo um semblante rápido, um objeto rudimentar, atingindo o corpo do homem caído ao meu lado.

    Fico de joelhos para ver melhor, e um grito me chama a atenção. Lá estava um bárbaro invasor, batendo contra o seu peito e rindo, enquanto começa a mirar com seu outro machado. Eu quase me mijo.

    Ele caminha até mim, com seu manto de pele castanho, que quase o cobre por inteiro. Pisando sobre cadáveres, o fogo destaca seu caminho, assim como a parte inferior do rosto — perdido entre a barba suja, está um enorme sorriso.

    “Ele precisa mesmo? Digo, sou uma presa tão fácil assim?”

    Ele me vê temê-lo e seus lábios crescem ainda mais em seus cantos. Acabo de confirmar: ele é um psicótico.

    Imploro por ajuda, mas ninguém se importa.
    Me arrasto de costas, procuro se os oradores estão aqui para me salvar. Nenhum sinal, até o portão do castelo está trancado.

    “Não tenh- não temos chance! Os oradores nos traíram? Mesmo após aquela… maldita profecia do imperador?”

    Ele para de querer jogar sua arma ao ver que não fui capaz de fugir. Ele abaixa seu machado de arremesso e o segura mais firme, ele quer me fatiar.

    Está escuro por causa da noite, mas consigo ver rachaduras profundas na lâmina e no cabo. Julgo: ela está enfraquecida!

    “É isso! Eu posso quebrar o machado com a minha espada”

    Saco a espada curta da bainha. Levanto ela contra o sorridente, esticando meu corpo ao máximo. Meu corpo está tremendo e, ao brandi-la, cheguei até a fechar os olhos.

    Me envergonho durante a execução: “Nunca lutei com uma espada, nem contra alguém desse tamanho!”

    Ele defende o ataque com o machado e me desequilibra no processo. Sou mais leve do que suas expectativas: durante a falsa queda, consigo fazer outra fraca investida.

    A lâmina corta a frente do seu manto, e se choca contra uma grossa armadura. Nem fui capaz de arranhá-la.

    Ele se irrita, batendo seu machado em velocidade extraordinária contra a parte cega da espada — que se parte ao meio.

    O impacto me jogou entre as pernas de alguns guerreiros. Sofro alguns chutes e pisadas, mas isso me permite escapar.

    Desisto da batalha. Agora me rastejo no chão como uma verme de terra, e o rosto manchado de lágrimas.

    Por fim, me arrasto até uma porta aberta, sem nem saber onde estou entrando. Sorrio, soltando uma risada que lembra um porco. Mas perco a graça quando escuto o grito do invasor: ele ainda estava atrás de mim.

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