— Por que o fim te excita tanto?

    A pergunta de Eisfürst veio como um sopro gélido, quase roçando-lhe o ouvido, desviando-se a poucos milímetros de um golpe.

    Fragmentos de treva pairavam no ar, não fumaça, poeira grudenta que buscava a pele, tentando fincar raízes no corpo.

    Noctherr respondeu com um suspiro longo, pesado, quase um lamento.

    Sua face carregava aquela estranha repulsa pela própria existência — como se cada segundo fosse uma recusa silenciosa em continuar.

    — Porque ele é tudo o que sou!

    A lâmina em sua mão não se partiu de forma abrupta, mas se dissolveu, como gelo derretendo no vazio.

    Cada respiração naquele salão o drenava.

    A criogenia do ambiente roubava-lhe a agilidade, tolhiam-lhe as sombras, e, com cada instante, aproximava-o da exaustão inevitável.

    — É mesmo? — Ergueu o busto, olhos faiscando, vidro sob luz.

    Seu movimento seguinte foi um corte diagonal.

    Ao fazê-lo, conjurou um dragão colossal de gelo, que irrompeu no ar com um rugido que parecia rasgar o próprio espaço.

    A criatura investiu contra a sombra, o impacto projetando Noctherr para cima em meio a uma onda de choque que sacudiu o salão.

    Então… esta é a serpente que congelou este lugar?

    O pensamento mal se formou na mente de Noctherr quando sua lâmina interceptou as presas da criatura.

    Ainda assim, a distração foi suficiente para fazê-lo ser arremessado contra o limite daquela prisão — e o mundo ao seu redor pareceu estremecer.

    Nem o oitavo andar parecia feito para suportar aquilo…

    Obrigado…

    O dragão se desfez em uma chuva de cristais brilhantes, uma tempestade de vidro.

    — Glaswyrm… — Eisfürst ergueu a mão, e os cacos dançaram em sua direção, atraídos por uma fenda de vácuo que se abriu em sua palma — Ele está preso em minha lança há milênios!

    Sua voz soava carregada de devoção e domínio. Enquanto absorvia o gelo.

    — Os mitos dizem que ele é a própria ausência de calor na realidade…

    E, tão logo nasceu, selou-o em sua arma, não por crueldade, mas por misericórdia.

    Antes que Elar se partisse, os nove andares formavam um único corpo vivo, um vasto ecossistema que respirava em equilíbrio.

    Era um mundo onde cada nível alimentava o outro, como órgãos de uma mesma criatura. A prisão não foi uma sentença, mas a tentativa de preservar o que restava, para que o caos não se espalhasse igualmente por todos os andares.

    — Um deus selado numa marionete! — retrucou Noctherr, pousando com violência tal que o chão sob seus pés se abriu, revelando um vazio sem forma, logo recoberto por uma crosta de gelo — No fim, mentes ignorantes sempre tentam conter divindades que existem além do próprio cosmos.

    Não era apenas humano — era da própria existência.

    Sempre que um ser tinha o poder de dobrar a realidade e tingir o mundo com novas cores, ele o fazia… ignorando tudo o que antecedia sua obra.

    Frustração? Arrogância? Talvez apenas… humanidade.

    — Você sabe… que mesmo que eu caia aqui, vou te selar neste lugar, não sabe? — Eisfürst não sorria.

    Não há mais de três mil anos…

    — Mais mil anos?

    E então, subitamente, um silêncio estranho desceu sobre o campo.

    O som morreu.

    Os lábios de Eisfürst se moveram, mas nenhuma palavra saiu.

    Só então percebeu… o que já deveria ter visto instantes atrás.

    — O que foi? — Inclinou a cabeça, o tom carregado de falsa curiosidade.

    — Sua… sua essência… — as palavras escaparam num sussurro trêmulo — Onde ela está?

    — Por que te interessa?

    — Em que momento escapou?

    Havia movido sua peça no tabuleiro das sombras.

    — Por que esse medo na sua cara? Acreditou mesmo que iria me selar? Eu já estou preso há três mil anos! Nem Elohim, nem qualquer ser, decidirá meu destino.

    — Então eu… falhei…

    O espaço se comprimiu, metade do que era, e ainda sim era imenso, em sua lança, cristais o cobriram, uma armadura fina de gelo, convocando a si toda sua energia caótica.

    — Falhou! — a lâmina apontou para o oponente — Você é o inimigo para o qual me preparei por eras. A mão que tudo paralisa. Mesmo que seja mais forte, é aqui… que o seu fim se sela!

    — Não se eu…

    — Não! — interrompeu-o, e, sem pensar, arremessou sua lâmina para o lado.

    Sem jamais afrouxar a mão no cabo.

    Num instante, liberou energia suficiente para dizimar entidades… mas a investida morreu contra uma muralha de gelo, fria e impenetrável, que absorvia todo o impacto como se o próprio tempo ali estivesse congelado.

    Parou um ataque caótico sem sequer se abalar e, assim como surgira, desvaneceu, dissolvendo-se da mente de seu próprio conjurador.

    — Essenz… Allstarrhand!

    E, por fim, terminou — sem sequer piscar, como se o instante fosse sereno.

    Deixando-o diante de uma tempestade glacial que rugia um oceano em fúria, três mundos tremeram sob a liberação da essência de um dos Nove Reis Sombrios.

    — Você está em desvantagem! — bradou — Sem sua Essenz, só lhe resta a sua Chaoswirt!

    Já não era o mesmo.

    Enquanto declamava seus pensamentos como Shakespeare, a essência o envolvia — fiel, persistente — a mesma que nunca o abandonara, mesmo quando estava nu de vontade.

    Das suas costas brotaram seis asas imensas de gelo, tão vastas que fariam uma harpia baixar os olhos.

    Cada asa ostentava uma fenda triangular, marcando um selo para algo além da compreensão.

    Do peito até o ventre, pendia uma colossal tromba gélida, um estandarte de seu reinado absoluto.

    — Eu não entrei aqui buscando vantagem — respondeu, firme — Sabia que, ao pisar em seu domínio, enfrentaria nada menos que o rei em sua totalidade!

    Um breve silêncio cortou o gelo.

    — Mas… eu já venci este jogo! — seu olhar atravessou-o, sem hesitar — Você só está atrasando minha vitória.

    — Que seja!

    — Que seja… — Quase íntimo — me responda, irmão…

    Enquanto precisou recuar — um, dois passos — o gelo começava a se formar em sua pele, rachando o ar ao redor.

    O frio não vinha de vento ou clima… mas da presença absoluta do portador da essência, sufocante, esmagadora.

    — Como é… estar sem um plano?

    — É a mesma sensação de estar aqui… dia após dia! — na mão erguida, a escuridão se condensava em um aglomerado de luz morta, um brilho ametista que pulsava como coração — Deveria ser diferente?

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