O fracasso bateu à porta.

    Assim que os olhos das sombras se ergueram diante do centro daquele andar, após centenas de milhares de quilômetros, lá estava: o castelo gélido mais colossal que poderia existir em todo o multiverso.

    Ewigeisenschloss.

    O Taj Mahal sentiria inveja.

    Tão vasto que parecia desafiar qualquer noção de proporção.

    Se repousasse sobre a Terra, sua base engoliria fronteiras, e sua altura dilaceraria a atmosfera até se perder no espaço.

    Seu interior poderia acolher um país inteiro, talvez o Chile, talvez mais.

    Ao redor, tudo havia cedido ao derretimento: rios inteiros transformados em mares instáveis, montanhas reduzidas a lama e vapor.

    Por falar em mares, as ondas alcançavam os céus e quebravam no litoral, uma praia onde montes tocavam as alturas.

    E, no entanto, permanecia. Intocado. Inquebrantável.

    Suas muralhas não eram apenas paredes de gelo: eram monumentos de eras, capazes de resistir a incontáveis fins e recomeços, como se o próprio tempo tivesse se ajoelhado diante de sua permanência.

    A ausência total de calor, antes do abismo, o nada, era o segundo maior fundamento da natureza caótica.

    — Algo não está certo… — murmurou o Suricato, deixando escapar um sopro pesado, impregnado de cansaço.

    Que patético…

    Pensou, revirando os olhos.

    — …A fortaleza deveria ter cedido.

    Seus lábios, ressecados e partidos pelo frio, ardiam ao se mover.

    A atmosfera congelante ainda tinha o poder de ceifar vidas, mesmo aquelas forjadas para resistir a extremos.

    E forçava-os a erguer o único escudo que possuíam: sua energia.

    Até a cobra estremeceu, o corpo ondulando num recuo quase involuntário; a própria pele parecia rejeitar o ar que a envolvia.

    — O frio deveria ter acabado! — espirrava.

    Um arrepio percorreu suas escamas, revelando a repulsa instintiva que tentava disfarçar em vão.

    — Então… o Caos do mestre desaparecer não foi apenas… um desmaio… — murmurou, a voz arrastada. Seus olhos, semicerrados, lançaram um olhar enviesado que cortava o silêncio, deixando no ar uma suspeita — Será?

    — Talvez…

    As demais sombras, imóveis até então, entreolharam-se em silêncio, como se compartilhassem a mesma dúvida.

    — Com certeza… — respondeu uma delas.

    Não havia apenas convicção em sua voz, mas também um temor quase palpável.

    — Mas… ele havia vencido. Pelo cansaço, sim… mas também pelo… poder…

    Tal hesitação na frase denunciava a incredulidade.

    — É o que pensávamos…

    Erdwahn apoiou o queixo entre os dedos.

    — Mas seríamos tolos, ingênuos demais, se acreditássemos que ele não teria a frieza para blefar.

    — Covarde… — Rosnou outra das sombras.

    — Sim, covarde… mas esperto. De alguma forma, conseguiu contrapor até mesmo as contramedidas do chefe! — virou-se bruscamente, dando as costas para a fortaleza, como se não suportasse mais encará-la — Está o segurando, disso tenho certeza! Mas… até quando? — a dúvida não apagava a chama em sua voz.

    Sua determinação resistia, ainda que a paciência já estivesse esgarçada até o limite.

    — Sei lá… até que eles consigam elaborar um plano para prendê-lo para sempre… ou para ceifá-lo de vez.

    Um silêncio pesado recaiu por um instante, antes de se romper num estalo de fúria. Cristais logo caíam, zombando de suas faces em flocos como chapéus de bobo da corte.

    O que eram… restos de uma piada fracassada.

    — Droga! — desferiu um golpe contra uma pedra grande como uma casa.

    A estrutura cedeu num estilhaço de inexistência: não restou pó, nem fragmentos, apenas o nada… como se cada átomo tivesse sido negado pela própria força física.

    Independente de seu humor, o frio não cedia.

    Mordia a pele até torná-la frágil como vidro, rachava os lábios com a crueldade de pequenas lâminas invisíveis e, corroía a paciência como ferrugem na alma.

    Cada respiração tornava-se uma nuvem efêmera, um sopro de vida que o ar gelado devorava antes mesmo de se dispersar.

    — Esse maldito frio tá me tirando dos nervos! — o grito quebrou a monotonia — E agora, talvez estejamos presos aqui… É o fim mesmo!

    Não era só frustração, nem apenas desespero.

    Era uma estranha vitalidade que nascia do ódio, um fogo sombrio que o aquecia por dentro, mesmo enquanto o corpo se entregava ao gelo…

    Então… esse é o limite da ironia dele.

    O pensamento veio seco, cortante, enquanto observava a mais irônica das sombras desabar em ódio, como se tivesse sido finalmente engolida pelo próprio veneno que sempre destilara.

    Ainda mais nele… seu único e, inevitavelmente, seu fatal rival.

    Seguiu adiante. Cada passo sobre a fina película de gelo que cobria as águas parecia prestes a ceder.

    O estalo leve sob as solas misturava-se ao silêncio esmagador da fortaleza, como um presságio.

    Como mascarava suas intenções?

    A pergunta latejava, reverberando sem resposta na mente.

    E ainda assim… sustentar este lugar? É o poder de um Rei?

    E de repente, o rebelde sumiu nas tempestades nevadas…

    Seu vulto dissolvido no branco sem fim.

    Isso o impeliu a mover-se também.

    E em um voo breve… sobre as poucas águas que ainda restavam, abriu-se uma cratera pequena, frágil como o suspiro de resistência de pertencer.

    Seus olhos, enfim, repousaram sobre o que restava de seu senhor.

    Não havia glória.

    Não havia majestade.

    Apenas um bloco de gelo, afundado na própria amargura, reflexo morto nas águas límpidas e cristalinas, mais lembrança que presença, mais ruína que rei.

    Enquanto os demais se dispersavam daquele lugar, se aproximou sozinho.

    Após pousar.

    Cada passo parecia carregar o peso de um luto que ninguém mais ousava partilhar.

    Era lento, pesado, como se testasse o próprio limite ou desafiasse o frio a devorá-lo por inteiro, carne, ossos e alma.

    Sorrateiro.

    Então ele perdeu…

    Agachou-se. O mundo pareceu encolher ao redor, o silêncio esmagando até o ar.

    E então mergulhou a cabeça nas águas.

    O choque foi imediato.

    Mas lá, no fundo, o viu.

    Borbulhas se erguiam em redemoinhos ao redor, como se tentassem aprisioná-lo em sua própria respiração.

    Era o caos, pulsando, debatendo-se, lutando em vão para prevalecer.

    Mas até sua resistência era falha.

    Por breves segundos apenas, e logo, ofegante, ergueu a cabeça como quem emerge para não se afogar.

    Mesmo essas águas…

    Cristais despencavam de novo sobre o espelho que refletia sua agonia.

    Quase morreu, esmagado pelo próprio reflexo.

    …Poderiam me reduzir a nada!

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