Vi seres bípedes de todos os tipos voarem montados em pterodáctilos — ou bichos próximos deles. Eles cortavam o céu como agulhas voadoras.

    Corri pela mata, saltando por entre troncos caídos e, ao sair dali, me vi no campo ao redor do hangar — o QG de Kurone, mais conhecido como “Aishi”. Mas algo brilhou mais que ouro quando fui olhar com mais atenção a “força aérea”.

    “Meu Deus… que droga é essa?!”

    Uma enorme esfera esverdeada de eletricidade caiu das nuvens. Era como uma bomba atômica! Aquilo literalmente consumiu o hangar, evaporando tudo que tocava.

    Até o piso foi de ralo. Ventava pra cacete e eu quase fui jogado de volta pro mato, mas por sorte consegui me segurar em uma palmeira.

    Caminhei até lá e vi que a única coisa que restava intacta ali era o restante da escada, aquela que levava ao subsolo — para a caverna.

    Chegando ao último degrau, sentindo o calor que vinha da tocha pendurada na parede, ouvi passos vindo de trás de mim.

    — Vem cá.

    Era uma voz jovem e engraçada. Sim, meu mestre se materializou ali.

    — Mestre dos magos? — falei em tom de brincadeira, virando-me de costas. — O que faz aqui? Quer dizer, sempre me perguntei o motivo do senhor surgir do nada.

    — Bem, estou sempre contigo — explicou ele, coçando a nuca. — Eu sou literalmente a segunda alma em você.

    — Como?! — exclamei, assustado.

    — É exatamente como ouviu. Isso está bem fora do que está acontecendo, mas eu preciso lhe perguntar…

    O quê? Vai reclamar que não narrei de forma épica a invasão de um exército fodástico? Ah, devia ser isso. Você também deve estar se perguntando o porquê dessa narração morgada.

    — Edward, você vê propósito no que anda fazendo? 

    E que pergunta! Engraçado que foi um personagem desta história que precisou se tocar disso. Quarta parede quebrada com sucesso! 

    Pra falar a verdade, eu até sentia vontade de sair da situação em que me encontrava. Meus amigos, aqueles que provavelmente morreram assim que a bola de energia destruiu o hangar, poderiam dizer e expressar algo parecido. 

    A verdade é que eu já não via sentido em matar Sasaki Yuuta. Ele me assassinou na vida passada? Sim. Mas isso é necessariamente importante, sabendo que sequer poderei rever as pessoas que digo dele querer proteger? Provavelmente não.

    Posso até ter chances de acabar com a raça daquele desgraçado, mas não serei recompensado por isso. Meu esforço não só não me beneficia, como também pode custar minha vida — e eu não tava disposto a perdê-la de novo.

    Tenho quase certeza de que esse era o motivo pelo qual não conseguia usar os poderes do Rebelde Carmesim, mesmo com eles entrelaçados à minha alma — ele, a princípio, é o próprio herói, meu mestre. Isso me chocou por algum tempo, por isso fiquei boquiaberto.

    Se nada disso fazia sentido, por que diabos eu estava levando a sério?

    — Não, não vejo propósito algum — respondi, cerrando o punho direito e o erguendo.

    — E por que está nisso?

    — Por nenhum motivo tão elaborado ou bem pensado — falei francamente. — Só sinto que não devo deixar aquele doente fazer o que quiser.

    — Por obrigação, é isso?

    — Não. Ninguém tá me obrigando a ser a reencarnação do Rebelde Carmesim… é mais por… sei lá. Sabe aquela coisa de “se você pode, não tem razão para não fazer”?

    — Não, não sei não. Deixa pra lá, é inútil te perguntar algo desse tipo. Continue sendo um idiota, você é melhor assim.

    Caranha! Pra que isso?! Contendo minha raiva, olhei pra cima e encarei a luz do sol.

    — Eu só não quero deixar isso sair barato. Ficar parado não é a minha praia.

    O despropósito.

    O início desta história poderia dar algum engajamento para o que viria depois, e até mesmo dar a entender que algo “incrível” iria acontecer. Mas não se trata de nada disso.

    A história de Eduardo Ventura não é sobre uma jornada incrível de uma galerinha do balacobaco que vive altas aventuras, e passará na sua sessão da tarde. É sobre a falta de propósito de um garoto do século vinte e um.

    As coisas sempre passaram por mim. Eu era o idiota que fica imóvel no meio da multidão, em uma praia, e que prefere sentir as ondas o banharem a ir jogar vôlei ou nadar.

    Sempre gostei de ficar na chuva, porque sentir os alfinetes de água espetarem minha pele significa sentir que o mundo ainda me afeta — que não sou totalmente passivo.

    Algo em mim quer agir.

    Algo dentro de Eduardo Ventura sente, sentiu e sentirá tesão pela vida e por lutar por ela.

    Gosto do sem-sentido na mesma intensidade com que gosto de significar o universo e cada coisa que existe nele.

    Gosto tanto que nada me faça sair da inércia quanto tenho, vez ou outra, vontade de fazer algo por mim mesmo.

    — Não se irrite comigo — pedi —, só quero ir contra essa onda, pelo menos dessa vez. Não quero que as coisas aconteçam e a única coisa que eu possa fazer é aceitar e seguir em frente. Eu quero me vingar.

    Não só de Sasaki Yuuta.

    — Quero vingar o Eduardo Ventura que morreu naquele dia. Aquele garoto que queria ser um simples garoto capaz de tomar as próprias decisões e ir contra a maré. 

    Seguir em frente e aceitar as coisas como elas são?! Vai se ferrar! Eu nunca fui assim! Posso ter agido dessa forma, mas não é assim que eu me sinto! Nunca mais vou deixar meu destino nas mãos de outra pessoa!

    Estava lutando pelo garoto que queria ser diferente.

    — E pra isso, preciso me acertar comigo mesmo. Essa jornada… essa missão… isso é tudo parte do meu desejo de fazer uma loucura porque quero.

    Ele apenas riu.

    — Isso não faz sentido, seu idiota! — E tornou a rir. Ao se acalmar, tossiu igual um cachorro — Mas se isso significa que dará tudo de si…

    …Então não tem problema.

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