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    O dia poderia estar sendo melhor em sua opinião, mas Dahlia sempre foi alguém que se conforma com aquilo que tem. Se ouvir um velho menestrel contando histórias (um tanto mal desenvolvidas em sua opinião) sobre heróis e deuses antigos era o momento mais divertido disponível, ela aceitaria.

    Aquele mundo de fantasia se mostrou mais insuportavelmente tedioso do que o esperado. Embora conhecer raças fantasiosas ainda lhe impressionasse, a completa falta de eventos emocionantes era um fardo que a entediava. Sem internet, sem filmes, música boa ou alguém com quem conversar no mesmo nível. 

    Ainda não tinha visto magia ou um monstro de verdade em ação, estava vivendo em um cenário mais parecido com a representação da fantasia criado por um bando de entusiastas do que a verdadeira fantasia em si.

    Pelo menos Caxias parecia feliz com aquele espetáculo medíocre. Os dois estavam em uma praça movimentada da grande Alighieri, na companhia de outras crianças assistiam a um velho bardo narrando aventuras com fantoches de mão.  

    O cúmulo da alegria.

    A nobre bocejou sem esconder seu tédio, seus olhos semicerrados. Não se tratava apenas da apresentação ser ordinária, o enredo era terrível, ainda que apenas a jovem parecesse manter aquela opinião visto os olhos arregalados dos pirralhos a cercando de todos os lados.

    Enquanto as crianças e seu amigo jardineiro sentavam no chão, ela repousava em uma cadeira decorada de almofada azul, um mordomo em suas costas a mantendo protegida do sol com uma sombrinha azul sobre seus cachos loiros. Ela puxou a manga azul (céus, não suportava mais essa cor) do vestido e se acomodou com o queixo repousando sobre sua mão.

    — Cê realmente se diverte com isso?

    — Hum? — o garoto tirou os olhos do show para a encarar — O que cê falou?

    — Perguntei se cê realmente gosta disso.

    — Gosto. — respondeu envergonhado sob o olhar reprovador.

    A dama o encarou, então deu de ombros como a pessoa que acreditando estar certa, vendo pouco valor em uma opinião obviamente errada.

    — Se cê gosta de bobajada feito essa arte baixa.

    — Dália, qual seu problema?!

    — Nada, uai, só tô dizendo que não é muito impressionante. Eu já vi coisas muito melhores. — falou se referindo às obras de seu mundo.

    O garoto pobre não entendeu dessa forma. Ele se levantou rapidamente do chão para encarar sua amiga olho a olho.

    — Você quer se comparar? Tô cansado de você fazer isso. — disse com o dedo em riste em sua direção.

    — Cuma? Foi só um comentário ué.

    A jovem com alma velha, embora não tão velha, descartou o comportamento incomum como as inconstâncias de um coração infantil.

    — Você sempre age como se fosse melhor que eu!!

    — Caxias, isso é besteira, nuncagi como si fosse melhor que você. Mesmo que, objetivamente, modéstia a parte né, você sabe. — ela deu de ombros não vendo a direção que estava tomando — Eu sou melhor que você, némez?

    Uma mulher adulta, experiente e que deixando a humildade de lado, sempre foi reconhecida como um prodígio mesmo em seu mundo. Um abismo de diferença rachava a terra entre eles, simplesmente não havia comparação possível onde ambos ocupassem a mesma hierarquia.

    Ele estava chocado, obviamente surpreso com uma confissão tão fácil. Saiu da boca dela de forma tão natural que se sentiu ainda mais ofendido do que já estava e reagiu da forma que se esperaria de uma criança.

    — VOCÊ É UMA IDIOTA!! — e correu para longe dela.

    — O que? Caxias tá indo pra onde?! — ela olhou para o lado para ver seu mordomo e o encontrou balançando a cabeça em decepção — Mas uai, qui que eu fiz?

    E não havia errado em sua opinião, para todos os efeitos ela era melhor do que o cidadão médio daquele mundo. Sua crença não vinha de um lugar de arrogância (em sua própria concepção), era um fato.

    E mesmo em seu antigo mundo, ela sempre foi uma espécie de prodígio. Sua superioridade naquele era esperada, até inevitável. Claro que uma criança não entenderia a mente de um adulto, ela precisava se desculpar mesmo estando certa.

    Com um aceno dispensou o mordomo e correu pelo mesmo caminho tomado pelo aprendiz.


    — Ele parece um monstro pra você?! Seu idiota! — gritou a mulher reptiliana.

    Para grande desgosto do, de fato, monstro, eles estavam causando uma grande cena. Ambos foram impedidos de entrar em Alighieri para uma rápida revista dos produtos carregados na carroça. Os guardas não pareceram ver problema na mercadoria.

    O problema parecia ser os ocupantes do veículo, especificamente aquele com menos escamas e mais ferimentos. Não muito assustador, admitiam os guardas, mas um perigo desconhecido.

    Já observaram a entrada e saída de muitas espécies, desde anões a hobbits, elfos brancos e negros, mas nada como aquele enfermo na carroça que os encarava com fúria fria e assassina.

    — Imaginei que os guardas dessa cidade pudessem reconhecer um elfo quanto vissem um, um grande engano.

    — Um elfo? — perguntou um guarda respondendo a bruxa. — Ele é um elfo para você?

    — Parece o que se não isso? — respondeu a bruxa com dentes rangendo.

    O guarda encarou o enfermo com olhos atentos, variadas possibilidades correndo por sua mente e sendo negadas uma a uma. Por um momento até mesmo pensou em um goblin, mas era uma ideia estúpida, pois goblin algum teria uma aparência como aquela.

    — Tsc, está bem. — admitiu contra sua vontade, então encarou as escamas da bruxa — Quanto a você.

    — O que?! — respondeu com raiva, seus braços apoiados no quadril e seu queixo erguido 

    — Não se metam em problemas — resmungou irritado e saiu derramando maldições sobre aqueles semi-humanos malditos.

    Com a mesma irritação, a Bruxa voltou a carroça e retomou suas rédeas. Os cavalos voltaram a se mover e o portão foi aberto para dar passagem. Atravessaram os muros e os olhos amarelos do monstro se arregalaram, estavam finalmente em Alighieri.

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