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    Rikard era rei de Greanalg, mas ver que sabia o nome de famílias que não lhe cabiam comando deixou Ezekel admirado. Por que leva o nome de tantos?, perguntara ao irmão, que o respondeu com silêncio.

     “Obrigado”, era o que conseguia dizer em silêncio. “Não fui abandonado.”

    — O que acha da minha Hildhit, Vossa Graça? — Mostrou a taça à filha para que enchesse de vinho. — Estou arranjando um ótimo casamento para ela. Cei Erhle Asselierss, seu nome.

    — Não o conheço… — Cei Sefriri tocou seu ombro e sussurrou na sua orelha. “Um bastardo?” Tocou sua cicatriz. Seu lábio começou a tremer e sentiu seus dedos tremerem. “Isso é algo a ser lembrado.’

    ‘Rikard estava certo.”

    — É o quinto filho do conde de Pântano Branco, em Aarvier — continuou o conde. Endireitou suas costas e juntou suas mãos no colo. Resvalou o rosto para o irmão, que estava muito bem acomodado em seu canto, então suspirou profundamente. — Bem, creio que já saí do tópico o suficiente: veio tratar de minha carta, Vossa Graça, ou são outros tipos de negócios?

    Coff! — pigarrou. — Perdão! Fui pego de surpresa.

    O príncipe pegou a taça na mesa e levou até a cabeça, mas entregou à Cei. Cei Sefriri bebeu um gole e ficou em silêncio, mas a língua dançava pelas bochechas de um jeito barulhento.

    — Perfeitamente doce, Vossa Graça. Pode beber sem ter medo.

    Ezekel o pegou e deu um pequeno gole.

    — Sim, perfeitamente doce! Que amoras deliciosas. — Pôs o cálice na mesa e endireitou a gola do terno woulevita. — De fato é sobre a carta, conde Goldwey. Recentemente estive em conselho com…igo mesmo. — Sentiu um gosto ruim na boca e a palma da mão coçando. — Percebi que não consigo governar a Cidade sozinho. — Abriu um sorriso amarelo. “Mentir é mais fácil do que esperava. Espero que isso não vire um hábito.” — Então escolhi pessoas para os cargos citadinos que faltavam.

    — Espero podermos, ambos, compensá-lo com nosso serviço mais uma vez — disse o Cei Arwil, cruzando as pernas de um jeito peculiar e repousando o cotovelo no braço do sofá.

    — Bem, sobre isso. Tomei como meu Mestre da Moeda, escolhi Sewel Halle. Para o cargo de Confessor-Mór, o Versicolista Derwil Rélac, que fez a cerimônia de noivado entre mim e a dona minha esposa. Um sacerdote virtuoso e ótimo amigo.

    Os dois permaneciam com um olhar neutro, fixos. Cei Awril Goldwey escondeu os dedos atrás do sofá, e tanto Ezekel quanto Cei Sefrir notaram os cavaleiros Goldwey voltando o olhar e ficando alertas.

    — Ao cargo de Magistrado-Mór da Cidade de Diamante, confesso que não pensei muito. — Abriu os braços. — Os termos da carta me pareceram muito bons.

    — Sinto-me grato pela oportunidade, Vossa Graça — respondeu conde Lawwell Goldwey, com um olhar de alívio e simultaneamente duro.

    — Mas o de Guardião-Mór será dado ao meu irmão, príncipe Natharel Ruth Godwill, Mestre de Armas de Greanalg, Três Vezes Ganhador do Torneio de Ferro de Greatedann e Mestre dos Draconeiros de Wouleviel — anunciou com a naturalidade de vento entrando pela janela. Seus dedos vacilaram.

    Fosse por um instante, Ezekel ouviu algo metálico soar. Cei Arwil Goldwey ergueu-se de chofre, de queixo erguido e com seus olhos cinzas arregalados. O conde rapidamente agarrou seu braço, apertando com força visível enquanto mantinha o rosto sério; o príncipe sentia seu coração acelerar e bater com estrondos de uma fera rugindo.

    — Tem certeza disso, id Baene? — indagou o Cei, sentando-se de volta. Olhou para seu irmão, que jazia calado e esfregando o polegar em no anel na mão esquerda. — Nós, da Casa Goldwey, temos o maior número de homens de armas prontos para servirem o senhor, protegerem a Cidade, você e sua esposa.

    Ezekel suspirou, olhando para a Cei. Sentia cada batida do coração querendo fugir pela garganta e seu terno woulevita se molhar de suor em pleno inverno.

    — Eu sei di…

    — Soube — interrompeu o conde Goldwey, inclinando-se vagarosamente para frente; sua voz ficou mais grave e rouca — que seu Palácio foi atacado, Vossa Graça. Quantos mortos em sua Guarda pessoal? Todos, não? Soube que invadiram pelo Ninho do Dragão e que levaram um ovo de dragão-real. A única muralha de toda a Cidade de Diamante fica no Ninho do Dragão, e ainda assim os invasores entraram por lá. — Seus olhos semicerraram-se, ocultando o cinza-escuro e velho nos olhos. Pôs a mão dentro da sua túnica, fazendo Ezekel recuar um pouco e erguer a mão à Cei, mas o conde tirou de lá um frasco cheio de pó esverdeado e ficou o girando entre os dedos. — Quem eram os invasores, Vossa Graça? Seus homens, o que eles fizeram para impedir? Dois príncipes e um rei estavam no Palácio e, soube eu, que nada impediu de que mais de trinta cavaleiros treinados fossem mortos por lâminas soturnas.

    — Conde! — bravejou Cei Sefrir, saindo de trás de Ezekel e levando a mão ao pomo de sua longa espada. Cei Awril riu em silêncio, cruzando as pernas e agarrando o cabo da sua. — Está insinuando incompetência dentre meus colegas juramentados?! Desonra mortos?!

    — Disse que os meus homens jamais deixariam que invasores desconhecidos entrassem no símbolo de união entre todos os Cinco Reinos, matassem muitos e saíssem com um troféu. — Destampou o frasco, libertando um cheiro que parecia a soma de várias flores; lavanda, groselha, jasmim, crisântemo, rosas e mais vários cheiros que Ezekel não reconhecia. O príncipe juntou as mãos, mantendo silêncio; por mais que seu coração parecesse explodir; mas o conde o cheirou perto do nariz e de repente seu rosto ficou aliviado. — Imprudência é sinal de juventude, Vossa Graça, e isso tens belamente. Reconhecer a falta de virtude e repensar decisões é um sinal de sabedoria. Tenho certeza de que nossos números serão uma ótima soma. Nós, da Casa Goldwey, temos os melhores homens de toda a Cidade de Diamante. Somando-os com os escudiamantes, digamos, somamos… dez mil homens? Isto somente dentro da Cidade. Nosso condado em Greanalg tem mais cinco mil facilmente.

    — Números importam, Vossa graça — disse Cei Goldwey.

    Ezekel suspirou profundamente. “Te agradeço, irmão.” Saiu do sofá confortável e fitou os irmãos ali. “Não são tão diferentes do que me contaste, ker-evne.” De chofre se virou e tomou o pomo da sua espada — uma espada longa, que Natharel falara ser inspirada em uma tal de Presa de Lobo de um tal de Ravel. “A partir de hoje serei um pária para meu eu.”

    — Quantos — falou, olhando-os de soslaio e em tom grave. — Quantos destes homens podem preparar para guerra em, digamos, antes da primavera?

    O conde saltou do sofá, seus olhos estavam arregalados como os de um pássaro e veias saltavam da sua testa.

    — Só o tempo para chegarem aqui seria o fim da primavera! — Atirou o braço esquerdo para trás, quase acertando a barriga da filha, que gemeu de susto. — Estamos no meio do inverno! As estradas estão cobertas de neve!

    “Seu condado é a duas semanas de viagem daqui”, murmurou-se Cei Sefriri.

    — Os traga aqui, treinados e antes da primavera e o cargo é seu, Cei Awril Goldwey.

    Os deixara em silêncio. Despedira-se encostando o pomo da sua espada no peito, então partiu, acompanhando pela Cei e por todos os cavaleiros que os cercaram. Uma brisa fria serpenteou por seus pés assim que saíram da mansão, onde na frente já esperavam a carruagem. O chofer desamarrou a corda da escada, e Ezekel então subiu, acompanhado pela Cei.

    Assim que a porta foi fechada, sentiu suas pernas ficarem fracas e o coração ceder; o torpor tomou conta dos seus olhos, onde as bordas de todas as coisas perdiam o sentido e enfraqueciam, virando manchas escuras.

    Suas pernas cambalearam para trás e ele caiu sobre o assento estufado, como se ficar de pé estivesse drenado toda sua energia e tempo de vida. “Deuses!”, implorou. Suas costas derreteram e fizeram do asseto uma cama desconfortável, mas até seu respirar estava tão difícil que não importava. Espinhos trocaram de lugar com seus músculos; o ar que respirava pareciam pregos…

    — Vossa Graça? — cantarolou a Cei, fitando-o com olhos que agora pareciam cinzas…

    — Mande… Compre sapatos… e pão para os mendigos.

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