Um homem que não cumpre um compromisso não é confiável. Um homem que não honra um relacionamento não é um homem de verdade. Um homem que trai uma deusa é… imperdoável.

    O vestido branco dessa divindade não servia apenas para lhe reforçar a beleza, mas para afirmar sua pureza. Pureza questionável, no entanto.

    A deusa Hera, Rainha dos Deuses, sempre “perdoou” o seu marido. A contragosto, porque ela queria mesmo era sumir. Ser livre. 

    Foram tantas as vezes que Zeus a traiu, que ela não o perdoava por “acreditar nele”, e sim porque virou uma ação automática. 

    Houve uma vez em que ela orquestrou uma rebelião no Olimpo, a fim de castigar o seu marido infiel. Mas o seu plano fracassou, e ela foi aprisionada, como represália.

    Zeus só a libertou depois de ela jurar sua lealdade. Daquele dia em diante, passou a temê-lo, sentimento que entrou para os motivos que tinha para se vingar.

    Sentada em seu trono, na sua bela sala, cujo teto era sustentado por colunas imponentes de cor branca, a Rainha do Olimpo soltava ares de insatisfação.

    “Quando não éramos casados, ele se apaixonou por mim. Fez de tudo para me conquistar e, quando conseguiu, me tratou, e trata, como se eu fosse uma ‘simples refeição’. Um brinquedo que o satisfaz”, pensou.

    — Jurar lealdade e fidelidade a um homem que lhe tanto trai, quanto respira, deve ser doloroso…

    —  Quem foi que disse isso!? — assustou-se Hera.

    A deusa sentiu algo pesar em seu ombro, e viu que era um passarinho. Ele alçou vôo, pousou em sua frente, e soltou uma fumaça roxa.

    Quando a nuvem se dissipou, revelou uma linda mulher de Chiton roxo.

    — Ah, é você, Eris… minha irmã.

    A deusa da discórdia a encarou, sorrindo.

    — Maninha, eu vim lhe propor uma ideia — ela disse.

    — Uma ideia…?

    Percebendo a expressão de desinteresse, a deusa do caos estalou os dedos, chamando a sua atenção.

    — Uma que beneficiará nós duas.

    — Me conte — pediu Hera.

    Ela se aproximou. Seus olhos carmesins, como janelas de sua alma, revelaram uma escuridão que assustou a Rainha do Olimpo, por um momento. Era um olhar digno dela, pois desejava o caos e a discórdia.

    — Meu irmão e seu marido é o homem mais infiel de todos, além de ser um criminoso. Um que sempre sai impune de seus delitos e infidelidades.

    Hera concordou com a cabeça, apoiando o queixo em suas mãos, com o cotovelo encostado no braço de seu trono.

    — Não concordo que ele saia impune. Porque eu mesma sou castigada por coisas que sequer fiz.

    — E então? — questionou Hera.

    — Proponho que unamos nossas forças. Eu, você e Ares, seu filho — explicou, com as mãos erguidas na altura da cintura, com as palmas viradas para cima.

    Cof, cof, cof!

    A deusa dos casamentos se afogou, ao ouvir isso.

    — Você está falando sério!? 

    — Não tenho porquê lhe pregar uma peça, irmã — disse Eris, no tom mais confiável possível.

    Como as duas quase não interagiam entre si, Hera não podia dizer que a conhecia bem. Confessou, por sua postura, inclinada para frente, que estava interessada.

    Ela se levantou e encarou a dama caótica.

    — Como você pretende por este plano em prática? E o que eu ganho, com você dando cabo de Zeus?

    — O que você ganha, minha irmã? Você ganha o Olimpo, o universo e um homem digno de ti. Um leal, cavalheiro e que te dará a atenção que merece. Além disso, quem estará em uma mão será ele, na sua — disse Eris.

    Um canto de sua boca esboçou um singelo, mas sincero, sorriso. O primeiro que foi honesto, desde que se casou com Zeus.

    — Eu aceito… 

    — Sei que está relutante — notou a deusa da discórdia —, pois, no passado, já tentaste se rebelar, e falhou. Mas você só fracassou por um único motivo… — e fez uma pausa dramática.

    Os olhos brilhantes de Hera revelaram o desejo de saber o porquê.

    — Você não teve muito tempo e nem recursos. Não tirou todas as alternativas que Zeus tinha para vencer. É porque tu, irmã, não tens a mente estratégica necessária para tal.

    O sorriso de Eris, apesar de diabólico, era belo.

    — Mas eu tenho a mente. Eu, que já causei inúmeras guerras e disputas, sei muito bem como vencer qualquer um, até o Rei do Olimpo.

    Hera recordou as histórias que ouvia sobre a irmã, por meio de Hermes, o mensageiro dos deuses. Ou seja, tinha uma base para confiar no que ela dizia.

    — Vou acreditar em você, minha irmã.

    — Deixe comigo. Não vai se arrepender — disse Eris, indo embora ao se transformar em passarinho.

    Eis um dos piores erros de Hera.

    ㅡㅡㅡ

    Um homem alto, vestindo uma armadura dourada e capa vermelha, treinava golpes de espadas com um soldado seu.

    — Ei, Ares! — chamou Eris.

    Ele a ignorou por trinta segundos, tempo que usou para desarmar o oponente e o fazer se render. 

    Virou o rosto em sua direção e perguntou:

    — Eris? O que faz aqui?

    Ela desfilava por entre os soldados, que se ajoelharam por onde passava, em sinal de respeito. Nenhum deles a achava bela, e muito menos formosa… todos sentiam um único e simples sentimento, um tão forte quanto o amor: o medo.

    Isso porque…

    “Sempre que ela aparece, pode contar que teremos trabalhos. E os trabalhos de Eris são quase suicidas!”, pensou um soldado, o menor entre os colegas.

    — Vim com uma ideia em mente — disse ela.

    “Oh, merda…”

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