Capítulo 7.5: O grimório.
Yoshiyuki havia meditado durante algum tempo, em seu quarto. Fez algumas anotações, e acabou chegando à uma hipótese.
Uma que o fez estremecer.
— A profecia… em quase todos os universos do Arucosmos, existe alguma passagem ou profecia, nas religiões que cultuam os deuses, onde é dito algo que se relacione ao fim deles e de seus respectivos mundos — murmurou.
Ele havia memorizado cada uma dessas histórias que ouviu, quando viajou por cada um dos trezentos e sessenta e cinco universos.
— E, em todos esses mundos, senti a presença do que por ora chamarei de “escuridão”. — Em sua mente, as imagens de Athena e Hera lhe vieram. — Em Mornal “Alfa”, o universo de Athena, senti essa tal escuridão mais evidente em Hera… e na própria deusa da guerra.
Apesar de que, no caso de sua amada, sentia algo estranho.
— A única escuridão que dela senti foi naquele sonho, onde nos beijamos — ele disse, corado. — O “estranho” nisso é que…
Ela não pareceu a Athena que conhecia.
— Era como se fosse outra pessoa. E isso me lembra, também, o episódio em que tentei usar o meu Pasting Recording — o seu Arcane Pawa. — Ela não só me barrou de sua mente, como também criou uma memória falsa.
Em um papel, usando uma pena com tinta na ponta, escreveu três nomes: “Alter Athena”, “Hera” e “Profecia”.
— É o mesmo padrão! — exclamou, com os cabelos eriçados. — Em todos os mundos há esse padrão de a escuridão se manifestar em três seres!
Com alguns bichinhos que pareciam slimes, ele prendeu os papéis nas quatro paredes do seu quarto. Ao final…
— Trindade. Tríade. Triângulo. Três pontos…
— O que essas palavras juntas deveriam significar? — alguém perguntou.
— Mente, corpo e espírito. O corpo é a parte material do ser. A mente controla o corpo, como um montador conduz um cavalo. E a alma é quem dá o movimento a esse cavalo. Uma existência precisa dessas três coisas para estar viva — ele disse, com os olhos arregalados.
Se ele sentiu que essas coisas pareciam “estar surgindo”, ou “nascendo”…
— É porque algo está induzindo a criação desse ser… é a escuridão!! — ele exclamou, quase louco.
Afinal…
— Você usou o seu poder em si mesmo, não é, seu retardado? — zombou a pessoa que ali estava.
Era Nahluna, a deusa da lua — e a mulher que ele beijou, inconscientemente.
— Você sabia que usar esse Arcane Pawa em si mesmo pode distorcer a sua noção de tempo, né? Confundirá as memórias e a realidade, se forçar — ela disse.
— Pormenores, Nahluna, pormenores. E o quê você faz aqui?
— Ah… ah, eu? Ah, nada. Só aconteceu de eu coincidentemente passar pelo seu quarto, e te ouvi falando sozinho — respondeu a deusa.
“Não fale isso estando vestida assim!!”, gritou em seus pensamentos.
Ela não parecia vestir nada além daquela habitual camisa de mangas compridas que, provavelmente, não era do seu tamanho — era quase um vestido.
— Enfim, eu já entendi tudo — disse Yoshiyuki. — Apesar de ser só uma hipótese, e eu posso estar muito, mas muito errado… pode ser que um ser esteja criando receptáculos seus, em cada um dos trezentos e sessenta e cinco mundos do Arucosmos — estava perturbado, o corpo tremendo, temendo que aquilo fosse verdade.
— Um “ser”? Você o chamou de “escuridão”, então ele é como um “opositor” de algo? Não que eu defenda essa ideia de oposição entre luz e escuridão. É muito simplório — falou Nahluna, sincera.
— É. Algo… algo como a contraparte de uma entidade da “luz”. Talvez…
Talvez a criadora ou criador do Arucosmos — essa era a sua ideia.
— Olha, você está sendo muito expositivo com essas suas ideias. Confesso que não entendi bulhufas — reclamou Nahluna, fazendo beicinho.
— Mas é claro. Estou há três dias e três noites trancado nesse quarto, vasculhando minhas memórias usando meu poder, e ligando os pontos.
— Em resumo, você ficou aí usando drogas, dando à luz a ideias totalmente zoadas e… quase nenhum sentido aparente.
Ele tossiu.
— Esse é o vocabulário da deusa que me criou… — disse Yoshiyuki, em voz baixa.
— Você vai ficar doente, se ficar pensando nessas neuras aí por tempo demais — ela avisou. — O que você faria, se eu não tivesse aparecido? Tentaria provar que é verdade, e iria agora mesmo à Mornal Alfa para investigar a vida dessas três pessoas?
Nahluna se aproximou, e o pôs contra a parede, dizendo:
— E o que faria, se estivesse errado? Ou melhor, sabendo que está errado? Não tem como isso tudo que você diz ser verdade, Yoshi. Pense nisso.
— Não… não tem como? — ele indagou.
— Não tem. São trezentos e sessenta e cinco universos, no Arucosmos. Apesar de possuírem semelhanças entre si, não há como inferir a existência de duas entidades que se opõem, e que sejam onipresentes — ela o contestou. — Seria um absurdo isso ser verdade.
“Seria um absurdo, huh?”
— Agora anda — Nahluna o empurrou, levando-o para fora do quarto. — Vai tomar um ar, beijar alguém, sei lá! Só saia desse quarto! Não quero morar na mesma casa que um lelé da cuca!
Ele foi expulso do próprio quarto.
— Mas… você pode estar certo. Não é porque é um absurdo, que não pode ser verdade… ah, não quero me contradizer! — e fechou a porta.
ㅡㅡㅡ
Sem muita ideia de para onde ir, Yoshiyuki abriu um portal para a casa de Athena e entrou. Lá, sentou no sofá e esperou.
— Ah… andei pensando nisso por dias… ah, esqueci de uma coisa.
Abrindo um portal e nele enfiando a mão, Yoshiyuki tirou um livro enorme — um grimório.
— Entrego um exemplar desse pra cada representante dos mundos. É necessário.
Ele se deitou, finalmente sentindo o cansaço físico e mental.
— É a primeira vez que vou dormir, em três dias… ou talvez quatro? Não sei mais.
Sniff, sniff!
Ele cheirou o sofá.
— Tem o cheiro de Athena. É bom… muito bom… — e adormeceu.
Algum tempo se passou, e ele enfim abriu os olhos. Sentiu que sua cabeça estava sob algo macio demais, não reclamando, no entanto.
Estava deitado no colo de Athena!
— Você dormiu uns cinco dias, neste sofá — ela disse, com os seus olhos azuis a brilharem. — Eu li o livro que deixou na estante. Como era de magia, decidi dar à Hécate. Ela é a deusa da magia, afinal.
— Who .. whoa!!
Ele logo se levantou e sentou corretamente.
— Desculpe por isso — disse Yoshiyuki.
— Ehe, não tem problema. Você é fofinho enquanto dorme… — comentou a deusa da guerra. — Eu quase te bei… ah, ehehe…
Seu rosto, rubro, tentava conter as suas palavras.
“Os olhos…”
Os olhos dela eram azuis!
“Que bom… talvez a Alter Athena, a dos olhos lilás que vi em um sonho… fosse somente um sonho.”
ㅡ Por… por que me olha tanto? Assim fico sem jeito…
— É que você também é fofa — ele disse, aliviado.
ㅡㅡㅡ
Enquanto isso…
ㅡ Hoooh! Que incrível! Esplêndido! Mas esse livro é estupendo! — disse Hades, o deus do submundo, vestindo um chiton negro.
— Não é? Foi o tal Yoshiyuki, conhecido como “assassino de almas” que deu a Athena, e ela repassou à mim — disse uma mulher de cabelos rosados e chiton vermelho.
— Um incrível livro de magia! Que incrível! Posso ficar?
— Claro…
— Quero fazer alguns… experimentos, se é que me entende — ele disse, em tom malicioso.
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