Índice de Capítulo

    Um solo tão branco quanto a prata. Um ar frio, mas confortável, dançando ao redor do corpo de qualquer um que esteja presente, como se tivesse vida própria.

    Impregnava nas narinas como uma supercola, mas, ao mesmo tempo, voava com tanta liberdade quanto pássaros ao céu, aproveitando as vidas que têm.

    No entanto, toda essa beleza tinha em seu berço um profundo silêncio, como se nem o vento existisse ali, mesmo que sua presença fosse notável.

    Do leste ao oeste, não havia nada e nem ninguém, apenas um profundo horizonte que parecia que não tinha fim, entregando-lhe a solidão que ali existia.

    Morfius encontrava-se nesse lugar, com as pupilas caminhando em uma pequena ansiedade, tentando procurar algo que desmentisse a solidão.

    “Não tem ninguém aqui?”

    O pulsar do coração era tão forte e audível que parecia não estar somente dentro de si. Sua respiração ecoava como se estivesse saindo de um megafone, e seus passos eram tão marcantes quanto.

    O movimento dos ossos ao respirar… Foi a primeira vez que ele conseguiu ouvir esse barulho vindo de si mesmo, tudo por causa do imponente silêncio.

    A garganta estava levemente trêmula, encolhendo involuntariamente, desejando esconder-se para sempre, mas, nem que seja só uma vez, uma tentativa tinha que ser feita.

    — A…

    A hesitação o consumiu, envolvendo-o em insegurança. Nunca esteve ali antes, e se isso acordar algo indesejado? Por algum motivo que nem ele conhece, conseguiu completar a palavra:

    — Alô…?

    Sua voz ecoou como a ondulação da água, replicando-se incontáveis vezes, como se estivesse coberto em incontáveis túneis, mas nenhuma resposta lhe foi concedida.

    Uma leve sensação de alívio apertou seu peito. Baixou a cabeça e fechou os olhos sem que percebesse, soltando um profundo suspiro enquanto um suor escorria das bochechas.

    Enquanto esse suor andava livremente, diversos desvaneios lhe surgiram. Seria tão ruim se algo aparecesse, algo tão incômodo que poderia lhe causar a morte.

    E se algo, forte o suficiente para matá-lo sem dificuldades, aparecesse? Ou ainda pior do que isso: um sistema? Sem mais tempo para pensar, a gota explodiu no solo.

    Seu som ecoou como um leve raio, mas nada aconteceu. Morfius arregalou os olhos ligeiramente devido ao barulho, mas, até então, nada de ruim surgiu.

    “Ufa…”

    Sua felicidade durou pouco. As luzes começaram a piscar sem pausa, como se estivesse acontecendo uma queda de energia repentina.

    O ar tornou-se denso, limitando seus movimentos, enquanto sua movimentação brusca o impedia de ouvir qualquer outra coisa senão a dança do vento.

    Sem que pudesse indagar do como e do porquê, tudo se apagou de repente, deixando-o só com a escuridão, sem que pudesse sequer enxergar algo.

    Seu coração nunca esteve tão rápido. Olhava ansioso de um lado para o outro, mas nada conseguiu enxergar, senão a sombra que parecia sorrir para o seu desespero.

    Uma sirene, tão alta quanto a erupção de um vulcão, começou a ecoar. Incontáveis trovões caíam como chuva no solo, como se tentasse explodir os tímpanos dos ouvintes.

    Morfius ajoelhou-se, tampando suas orelhas, enquanto gritou o mais alto que podia, tentando tornar o externo inaudível, mas de nada adiantou, isso não aconchegou seu desespero.

    Fechou os olhos com tudo que tinha, rezando para que tudo acabasse logo, até que, sem que percebesse, seu grito era a única coisa que estava existindo.

    Tudo parecia ter voltado ao normal. Um leve calor apalpou suas pálpebras, convidando-o para abrir os olhos e, assim que o fez, tudo tinha voltado ao normal.

    A respiração irregular entregava seu nervosismo. Suor escorria pela testa com tanto fervor que dava a impressão de que ele tinha acabado de correr uma maratona.

    Os joelhos tremiam, sem forças para agir perfeitamente, mas, ainda assim levantou-se. Risos nervosos vazaram dos lábios, junto ao mais profundo alívio em seu peito.

    Tudo estava bem, até ele ter a ideia estúpida de olhar para trás. Um duradouro arrepio percorreu seu corpo inteiro, e, seu coração? Parecia estar parado.

    Olhos grandes e impiedosos, como se tentasse cortá-lo, por mais que sua cor fosse em um tom lilás e agradável, sua intenção assassina era vermelha como o sangue.

    Enorme quanto uma televisão tecnológica, mas, exceto pela cor de seus olhos, tudo era uma profunda escuridão, como se as sombras vivessem naquele sistema.

    No topo, havia escrito “S2” em um tom prateado, como se tentasse esboçar gentileza, mesmo que todo o seu contorno fosse sombrio e indelicado.

    Seus olhos desapareceram, sobrando apenas sua interface. Não demorou muito para que algumas letras aparecessem em meio ao barulho de teclas, até que formassem palavras:


    S2
    Vou ser breve, lixo. Escolha seu apelido de jogo.

    Morfius ainda sentia suas pálpebras tremerem, enquanto os pulmões se esforçavam para respirar, tentando resistir ao medo que envolvia cada um de seus órgãos.

    Engoliu seco, tentando acalmar-se, mas um nó invisível impediu-o de dizer qualquer coisa, enquanto o tambor em seu peito batia tão forte quanto o soco de um boxeador.

    “Se eu não falar nada rápido… Isso vai me matar!”

    Leu cada palavra com o máximo de atenção que tinha, mas não fazia ideia do que seria apelido de jogo, por mais que a resposta pudesse parecer óbvia.

    Alguns segundos se passaram, mas, para sua imaginação coberta em desespero, muito tempo havia se passado, e ele não viu-se tendo outra escolha senão perguntar:

    — Desculpa… O que seria esse apelido…?

    O chão começou a tremer, como se um terremoto estivesse próximo de sua ação. A cor daquele sistema começou a oscilar entre o carmim e o abismo, tentando manter-se calmo.


    S2
    Vai realmente se fazer de burro, sua escória?

    Morfius não sabia mais o que podia fazer. Sua ação de indagar resultou em uma breve ira que não gostaria de despertar, restando apenas manter-se em silêncio.


    S2
    Certo… Vou tentar ser mais paciente com você. Todos os jogadores têm o direito de ter apelidos para ocultarem seus nomes reais, desde que seus poderes tenham origem do sistema, e não criados por eles.

    Uma explicação óbvia, mas que foi de ajuda para um desinformado como Morfius. Esse pouco tempo de diálogo com o sistema serviu-lhe como dica, como se mostrasse a ele que nada de ruim aconteceria.

    Sentiu-se mais aliviado, soltando um breve suspiro discreto, enquanto afirmava que havia entendido, deixando com que o silêncio novamente dominasse a atmosfera.

    Assim que voltou seu olhar para a interface, havia uma grande mensagem destacada nela, escrita “Carregando…”, permanecendo assim por um breve período.

    Seus olhos reapareceram, com um ligeiro arregalar de surpresa, desaparecendo logo depois. Aparentemente, a informação que conseguiu foi muito interessante… Ou melhor, a informação que lembrou.

    S2
    Quase que eu me esqueço… Aparentemente, você já tem um apelido, certo, “Morfius”? Deseja mantê-lo?

    Seu coração pulsou fortemente, como um filho que sabe que sua mãe descobriu um segredo seu. A lava consumia seu peito em ansiedade e, involuntariamente, perguntou:

    — Como você…?

    Nenhuma resposta lhe foi dada, como se aquele sistema risse de seu medo, entregando-lhe o amargo sabor do silêncio, fazendo-o baixar a cabeça em submissão.

    — Deixa… Eu vou manter.

    Um breve silêncio surgiu, até que um redemoinho tão pequeno quanto uma fruta nasceu de repente, flutuando até Morfius, ficando rente ao seu rosto.

    Em um passe de mágica, transformou-se em uma pequena estrela escura, que logo após formou-se em um sistema pequeno, informando-lhe o básico:


    S2 Minimizada
    Missão: Conhecendo o sistema.
    Requisitos: Aprenda a usar o sistema de jogo.
    Penalidade: Nenhuma, não há como falhar nessa missão.

    Ele leu a mensagem com calma e, assim que terminou, esse sistema minimizado desapareceu da mesma forma que veio, deixando-o a sós com S2.

    Uma breve curiosidade abraçou seu coração, perguntando a si mesmo como que seria usar o sistema, visto que, no mundo em que estava, isso devia ser algo acessível.


    S2
    Morfius, se sua missão é essa, provavelmente você não sabe como visualizar sua vida, energia, vigor, habilidades e pontos de distribuição, correto?

    As sobrancelhas de Morfius franziram-se brevemente, junto a um abrupto arregalar dos olhos. Não era dever do tutorial ensiná-lo o que, aparentemente, seria o básico?

    Em um tom desanimado, quase incrédulo, indagou ao sistema: “Era pra eu saber dessas coisas…?” enquanto aguardava pacientemente uma resposta.

    Um longo suspiro ecoou de S2, junto a uma pausa que durou alguns segundos. Aparentemente, também ficou decepcionada ao saber que ele não tinha acesso a essas informações.


    S2
    Meu Deus… O incompetente do S1 aparentemente não fez o trabalho direito. Faz o seguinte: fixa seu olhar em algum ponto isolado durante alguns segundos, com o máximo de concentração que você tem.

    A dúvida floresceu em seu peito. Isso é algum tipo de meditação? No que o ajudaria? Ao invés de prosseguir com a orientação, preferiu tentar perguntar:

    — Desculpa, no que isso vai me…

    Sua frase nem foi concluída, mas foi longa o bastante para que o espinho do desagrado abraçasse a alma da S2, fazendo-a entregar-se para a raiva reprimida em si.

    Pela primeira vez nesse ambiente, sua voz ecoou como um trovão que desfaz montanhas, mas, ao mesmo tempo, sua delicadeza feminina ainda estava presente.

    Sua cor oscilava entre a escuridão da alma e o sangue do ódio, porém, entregou-se completamente ao desprezo que consumia seu coração, deixando-se levar:


    S2
    FAÇA.

    Seus suspiros irregulares impediram o reinado do silêncio. Seus olhos marejavam em ódio, e gotas de suor nasciam em sua interface, escorregando pelo rosto.

    Demorou alguns segundos para que ela percebesse que havia falado, e isso aumentou seu desagrado. Essa tecnologia seria útil, mas, agora, não tinha mais acesso.

    S2
    Ah… Porra, moleque! Você me fez falar, agora não posso mais ficar digitando.

    Uma breve confusão nasceu no olhar de Morfius, assim como a abelha pousa na flor. Por mais que desejasse saber do porquê sua presença era um desagrado ao sistema, optou pela melhor decisão:

    — Desculpa… eu acho.

    Infelizmente isso não cessou nem um pouco o incômodo que existia nela. Por mais que desejasse, não poderia fazer nada contra ele, apenas prosseguir com sua obrigação.


    S2
    Cala a boca e só faz o que eu mandar. Vim aqui a pedido do sistema, não pense nem por um momento que eu quero te ajudar. Não discuta comigo.

    Seus olhos cortantes pareciam queimar o pobre jogador. Vendo que não havia nada a ser feito senão obedecer, apenas optou por seguir as orientações dadas.

    Sentou-se no chão, na posição de Lótus. A temperatura gélida do solo consumiu suas pernas e começou a escalar seu corpo, mas isso não era importante agora.

    Fechou os olhos, entregando-se à escuridão que habitava seu interior. Os pulmões esticavam, animados em respirar, e o coração batia como um tambor imparável.

    Iluminando o abismo, um breve brilho lilás pulsava, no formato de névoa, como se fosse sua guia para completar sua missão, por mais que isso fosse-lhe incômodo.

    S2 suspirou, retornando para seu estado calmo. Sua voz era ainda mais doce do que o mel, como se fosse algo além do que poderíamos chamar de celestial.

    — Visualize uma barra de vida, como se você fosse um personagem de um videogame.

    Ele começou a imaginar… O que seria uma barra de vida? Imaginou algo retangular, com o mesmo tamanho de um lápis, mas ainda mais branco que qualquer prata.

    — Ótimo. Está completa, mas, o que aconteceria se você sofresse danos?

    A cor prata começou a esvaziar, como a água escorrendo de um copo quebrado, até que eventualmente chegasse em seu fim, tornando a barra de vida vazia.

    — Perfeito. Pode parar a sua concentração agora e abrir os olhos.

    Fez como pedido, mas aparentemente nada havia mudado em si. Um breve desânimo o abraçou, até que seu olho esquerdo começou a sentir uma leve queimação.

    Ao mover sua pupila ao lado superior esquerdo, pôde finalmente perceber que sua barra de vida agora se fez presente, sendo igual ao imaginado.

    Um pouco à esquerda, havia um pequeno círculo, e dentro dele havia uma foto do seu rosto. Acima da barra de vida, havia seu apelido e, um pouco ao lado esquerdo, tinha destacado “P1” em cor azul.

    Um sorriso duradouro nasceu em seus lábios, satisfeito com sua conquista. Não sabia o quão útil isso seria, mas certamente lhe ajudaria a saber quando fugir.

    Voltou seu olhar para S2, como um cão aguardando por instruções. Inesperadamente, novas informações abraçaram seus olhos ao observá-la.

    Seu nome, Sistema Dois, flutuava como folha sendo levada pelo ar. O símbolo do infinito preenchia sua barra de vida, indicando que ela não era um oponente que morreria por algo.

    Foram boas informações dadas pelo seu sistema interno, mas não desejava vê-las para sempre. Pediu internamente para que esses dados desaparecessem, e assim aconteceu.

    S2 distanciou-se brevemente de Morfius, erguendo uma parede curta, com um alvo de arco e flecha destacado no topo, deixado óbvio para onde mirar na instrução seguinte:

    S2
    A segunda etapa é sobre o controle de energia.

    Uma explicação curta, mas ela também sabia que só isso não bastaria para fazê-lo entender. Ele levantou sua mão, mas seu questionamento já era algo esperado.

    S2
    Relaxa, eu sei o que você vai perguntar: “como funciona essa energia?”, vou explicar tudo.

    A energia nesse mundo se manifesta como o jogador desejar, e, conforme um tempo, tudo fica automático, porque vai ficar sob controle do instinto a maneira de usar a energia.

    Se o jogador sentir-se ameaçado, uma aura vai cobri-lo, protegendo de ataques externos e psíquicos. Se sua aura for muito forte, a dor recebida vai ser mínima.

    Claro, com o tempo é mais benéfico pensar em usá-la o tempo inteiro, mas a energia vai ser drenada como a água. Jogadores mais experientes usarão essa proteção somente quando forem atacados.

    Também há seu modo de ataque. Se concentrar muita energia, mesmo que inconscientemente, poderá disparar uma esfera de aura, sendo destrutiva de acordo com sua força atual.

    A energia vai ser gasta dependendo do quão forte o ataque será. Quanto maior o tamanho, mais destrutivo, mas a velocidade será altamente reduzida, podendo deixá-lo vulnerável.

    Com toda a explicação chata dada, S2 deu-lhe a ordem mais divertida: “Concentre-se na palma de sua mão e acerte o alvo que eu acabei de criar pra você.”

    Morfius levantou-se, focando-se no centro do alvo. Começou a concentrar-se em sua respiração enquanto abria sua palma, mirando-a no centro de onde desejava acertar.

    Seu interior começou a esquentar tanto quanto lavas de um vulcão. O calor o envolveu, mas nada disso o deixava incomodado, parecia o revigorar.

    Uma esfera nascia em sua palma de pouco a pouco, tornando-se cada vez maior a cada segundo que se passava, sendo tão destrutiva quanto a aparência dedurava.

    A admiração pousou em seus olhos. Dava pra acreditar que aquilo era o seu poder? Até pouco tempo atrás, suas preocupações era se a conta de luz viria mais cara que o mês anterior.

    Sua alegria transformou-se em distração, e isso relaxou seu corpo, servindo de gatilho para o disparo daquela energia, que avançou tão velozmente quanto a queda de um trovão.

    O impacto jogou seu braço para trás. A esfera avançou rasgando o ar, sendo ainda mais barulhenta do que a corrida de um jato de elite, acertando o alvo com precisão.

    Deu-se luz a uma estrondosa explosão assim que ela acertou seu alvo. O vento tornou-se tão instável quanto um furacão, jogando qualquer humano próximo distante dali.

    Morfius voou para longe, mas a adrenalina não escapou de seus olhos. Seu pouso foi eficiente, e logo depois tudo voltou ao normal, como estava antes.

    Ainda não tinha percebido, mas uma pequena barra em tom azul surgiu abaixo da sua vida, estando desgastada devido à esfera explosiva que acabara de usar.

    Era pequena, não tinha metade do tamanho da barra de vida, mas ficará maior e mais polida conforme seu progresso, tendo que deixá-la mais forte na aba de atributos.

    O próximo passo será aprender sobre o vigor, tendo como primeiro objetivo o Vigor Evasivo, tendo uso exclusivo a esquivar de técnicas, mas não pode usá-lo diversas vezes na mesma hora sem se cansar.

    S2 invocou um manequim assim que piscou os olhos, configurando-o para reagir a qualquer humano que ficasse perto dele, servindo perfeitamente como um boneco de treinamento.

    Sua última orientação foi descrever o Vigor Evasivo, dando-lhe a dica para arregalar os olhos assim que for acertado, garantindo-lhe uma esquiva em troca de seu suor.

    Próximo capítulo: Combatendo o sistema (1).

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