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    Tal como um mar infinito, tingindo o abismo, havia o céu. Ele não estava sozinho; havia consigo incontáveis estrelas regando sua beleza como pétalas de uma flor.

    Encontrava-se acima de todos os seres, e os iluminava, guiando-os pela escuridão. Desde as árvores aos pássaros, todos cumpriam o seu papel diante da natureza.

    Sobretudo, não havia folhas caindo, tampouco os cantos que calavam o silêncio. Havia um único elemento que os fazia temer exercerem suas funções.

    Parecia uma explosão, mas não era tão piedoso quanto. Batia contra a carne de alguém feito um martelo contra o prego, mas não tinha tanta imprecisão.

    Sua presença ecoava por quase toda a floresta, em um ritmo único e marcante, avisando a todos que, dali, crescia uma semente com o nome de dúvida, e o apelido da árvore seria “resposta”.

    Ao se aproximar cada vez mais da fonte daquele som, é possível ver um garoto de pele morena em cima de alguém deitado, tão ensanguentado quanto morto.

    O corpo caído não resistia mais aos golpes; os únicos movimentos que ainda haviam nele vinham de seus braços, que se erguiam involuntariamente a cada pancada.

    Aquele que o atacava já sabia que seu alvo estava incapacitado, e ainda assim continuava a acertá-lo, cada vez com mais brutalidade, virando-se contra seus princípios.

    O universo em seus olhos não se movia e tampouco estremecia; era fixo em suas ações, enquanto ao mesmo tempo não podia parar a dúvida das estrelas.

    “Isso foi certo?”

    Por cada lágrima que as sombras derramaram, Ônix martelava aquele jovem arrogante com uma piedade inexistente, tentando obter uma resposta de onde sabia que não existia.

    “Por que você fez isso?”

    Acompanhando o ritmo de seus golpes, podia ouvir gotas de algo que caía dentro de si, explodindo contra o chão, vindo de um céu distante.

    Não dava para saber se eram as lágrimas dos caídos, ou até mesmo se aquilo não era uma alucinação; só era perceptível, da mesma forma que se ouve o chamado de um querido.

    “Punir os maus é a coisa certa a ser feita?”

    Enquanto seu punho fechado caía mais uma vez, a resposta subia até as nuvens, afastando-se feito uma folha, deixando-se levar pelo ar que se fez sutil.

    Como um último pedido de socorro fútil, atingiu mais uma vez seu adversário já morto, deixando que o impacto de seu ataque ecoasse por todo o norte.

    Na ausência de seus golpes, restou apenas o som abafado de sua respiração, enquanto incontáveis gotas de sangue escorriam por seus dedos, como partículas de chuva.

    Além disso, não existia mais nada, tampouco o balançar das árvores, menos ainda o agradável sussurro do vento que passava por um ouvido e saía pelo outro.

    Ao olhar para o céu, o abismo ainda estava lá. Mesmo que os lábios mantivessem silêncio, ainda era audível o choro dos que sofreram, esvaindo-se de pouco a pouco, até que se tornasse mudo.

    Nada mais há em sua mente agora, nem mesmo aquela voz que existe dentro de nós, narrando tudo o que vê, julgando tudo o que existe. Até mesmo ela se calou.

    Sem que percebesse, caiu para o lado como se fosse um manequim fraco e oco, não conseguindo nem sequer sentir os braços que ainda estavam grudados em seu corpo.

    Podia tentar se levantar, e o fez, mas o máximo que conseguiu foi permanecer ajoelhado. Inconscientemente, seu corpo não desejava ver o resultado que o levantar lhe daria.

    Por fim, assim como começou, lá se encontrava Ônix novamente: fraco, sem saber aonde ir e nem como chegou onde está; no entanto, não estava só.

    Abaixo de seus joelhos, tão macia quanto pétalas de uma rosa, a escuridão começou a se aglomerar, convidando-o para um lugar protegido; só precisava de sua permissão.

    Seus olhos não paravam de encarar o céu, tentando buscar alguma luz de esperança, sem saber que o que procurava vivia no abismo, dentro de si e, agora, abaixo.

    A escuridão o cutucava com cuidado, da mesma forma que a brisa do vento passa por seus cabelos, até que ele finalmente doasse a atenção que ela desejava.

    Ao olhar para baixo, algumas sombras o observavam com o olhar brilhando em gentileza, estendendo a mão para que pudessem levá-lo aonde desejavam.

    Uma breve confusão abraçou o universo que morava em Ônix; sobretudo, compreendia que, dessa vez, seria a vez das sombras o guiarem e o abraçarem.

    Confiando naqueles que protege dentro de si, esticou a mão para os gentis dedos que o convidavam, dando a permissão para que fosse levado aonde queriam.

    E então, as sombras que foram cuidadas por ele o agarraram para o abismo e o abraçaram, como se ele fosse um travesseiro, tentando transferir a dor que morava no coração dele para elas, mas elas não tinham essa permissão.

    Ainda que a angústia morasse em seu coração, Ônix sentiu-se confortável o suficiente para fechar os olhos, deixando as sombras abraçarem tudo o que ele as abraçou.

    Enquanto cuidavam de seu mestre, também o levavam para um lugar distante dali, mas ainda no norte, lugar esse onde juraram proteger quem guardavam.

    Ônix emergia do abismo de pouco a pouco, flutuando como se estivesse sendo abduzido por algo que insistia em levantá-lo, tirando-o das sombras e levando-o para a luz das gramas.

    Por um momento, pensou que estava sozinho. Ainda era a floresta, que tinha o mesmo silêncio e as mesmas névoas; no entanto, a preocupação que deixou para trás, as sombras fizeram questão de cobrir.

    Ao levantar a cabeça levemente para frente, pôde ver uma esfera, tão escura quanto rígida, escondendo algo como se a vida de toda a escuridão dependesse disso.

    Ao notar que seu dono havia finalmente chegado, começou a se esvair de pouco a pouco, deixando o vento levá-la para Ônix, retornando para o conforto que tanto esperava.

    Nesse ritmo único, o que guardava era revelado gradativamente: do cabelo ao rosto, do rosto ao pescoço e, por fim, do pescoço até o resto do corpo.

    Ainda mantendo o mesmo sorriso de sempre por ter protegido quem devia, lá estava Andressa, desacordada pelo cansaço, mas sem nenhum dano aparente.

    Ela também havia matado alguém para que Ônix não tivesse que se esforçar. Qual diferença tinha entre quem eles mataram se a podridão que morava em seus corações era a mesma?

    Se Ônix não a tivesse defendido, ela teria esse mesmo sorriso de agora? Se Andressa não tivesse se enfurecido, ele não teria que defendê-la matando o orc do mesmo jeito?

    Enquanto entendia a gentileza que podia vir através de uma violência protetora, caminhava ajoelhado para poder abraçá-la, agradecendo o seu sacrifício.

    Um profundo e longo suspiro foi dado. Suas pernas, antes cansadas, carentes de determinação, puderam mais uma vez se esforçar para levantar.

    Após seu breve agradecimento, virou-se de costas e levantou-se, curvando-se ligeiramente para frente e levando os braços cuidadosamente para trás.

    Em seguida, a teleportou para suas costas, segurando-a com delicadeza para que ela não caísse, mas, sim, pudesse descansar enquanto ele caminhava sem pressa.

    Os assuntos do norte se encerram aqui. Agora, partiremos para o sul, para que possamos observar as provações que Morfius e Saito deverão passar.

    Próximo capítulo: Não É o que Parece.

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