Índice de Capítulo

    O som do mar abafado, como se alguém estivesse submerso, era facilmente palpável. Névoas rosadas pulsavam como um coração enquanto desapareciam e reapareciam na escuridão.

    O abraço da água escapou de seus ouvidos e a névoa se dissipou completamente. Um confortável calor abraçou seu corpo, desde os pés à cabeça.

    Ar puro penetrava as narinas. Luz encharcava as pálpebras, enaltecendo o sol brilhando como a estrela que é, destacando-se no céu sem nuvens.

    Saito abriu os olhos, como alguém que desperta de um sonho, processando as informações que vinham em um ritmo igualmente lento e leviano.

    As costas sentiam a temperatura do chão. Quente o bastante para ser desagradável, mas não tanto para que causasse feridas. Não demorou muito para sentar-se.

    Apoiou os antebraços no joelho, pensando no que tinha acabado de acontecer. Por que Celeste não falou nada desde o início? Era realmente ela? Sua aparência diferente lhe causava essa dúvida.

    As lágrimas escorrendo como um pano encharcado das bochechas dela apertavam seu coração, cortando suas dúvidas. Lágrimas como aquelas só são possíveis para quem sofre.

    “Impossível não ser ela…”

    Certo. Celeste também ressuscitou, mas não está ao lado de Ônix por opção ou por interferência externa? Essa indagação própria foi facilmente respondida por ele mesmo.

    “Seria muito idiota se ela não viesse porque não quer. Não tem como alguém ter tantos arrependimentos com algo e não querer arrumar com uma ressurreição.”

    Ótimo raciocínio, sua lógica faz total sentido, mas outro questionamento válido surgiu em sua mente: se isso aconteceu com Celeste, por que não com a família de Ônix?

    Saito encontrou-se em algo parecido com um paradoxo. Se tivessem revividos, estariam acompanhando Ônix. Eles não reviveram ou também se tornaram divindades?

    Os leitores atenciosos sabem que apenas a primeira alternativa é válida, mas ainda existe um nevoeiro que não responde à pergunta do por que eles escolheram não reviver.

    Saito suspirou, curvando os braços ao chão. Assim que fez isso, percebeu que a bainha não se encontrava mais em sua cintura, surpreendendo-se por um momento.

    “Eita… Perdi minha katana?”

    Outro suspiro surgiu, dessa vez em frustração. A perda de sua arma dificultaria sua jornada quando enfrentasse mais oponentes difíceis; talvez ainda mais do que Celeste.

    “Bom… fazer o quê.”

    Aceitou até que rápido demais. De repente, uma notificação surgiu no canto inferior direito de sua visão, subindo de forma lenta enquanto carregava uma mensagem:

    Sistema de Jogo — Notificação
    Diga, ou pense: “Menu” para abrir o sistema de jogo pessoal! Lá, poderá acessar tanto seu inventário quanto outras abas disponíveis.

    Retirou-se da mesma forma que veio assim que sua mensagem foi lida. Saito estranhou por um momento, ainda não acostumado com o fato de estar vivendo em outro mundo.

    “Deixa eu ver… Menu!”

    Uma linha ciana horizontal surgiu à sua frente, alterando para a cor azul escuro como um camaleão que troca de cor de forma discreta e lenta.

    Logo após, expandiu-se verticalmente, formando um grande sistema azulado com algumas abas para acessar. A que mais lhe chamou atenção foi a opção “Inventário”.

    “Eita… Não é que funciona?”

    Outra notificação surgiu do mesmo lugar de anteriormente. Dessa vez, uma conquista havia sido concedida: “O jogador ‘Saito’ abriu o menu pela primeira vez.”

    Interessante. Nesse mundo, conquistas serão dadas de acordo com o que o jogador fizer, sendo-lhe visíveis apenas as próprias conquistas, não as dos outros, a não ser que seja algo global.

    Tudo isso é muito legal e tudo mais, mas já estava enchendo demais o saco de Saito, que franziu a sobrancelha em desagrado, pensando consigo mesmo:

    “Será que não tem como desativar essas notificações não?”

    Partículas cianas começaram a surgir do ar no momento em que pensou nisso. Não demorou muito para que se transformassem naquele sistema ciano.

    S1 Minimizado
    Deseja desativar as notificações? Isso ainda não desativará as conquistas globais.

    (Sim) (Não)

    Aceitou desativar no mesmo instante em que leu, conseguindo tirar o que incomodava brevemente sua paz. Agora sim, hora de voltar ao que é de fato interessante.

    Saito pressionou por alguns segundos a opção “inventário”, mas foi o suficiente para ativar a função. O sistema alternou sua interface de imediato para se adequar ao que oferecia.

    Felizmente, lá estava sua arma, guardada lá por algum motivo que nem ele sabia. Um sorriso agradável surgiu em seus lábios, clicando nela logo após.

    Partículas prateadas surgiram do chão, flutuando até as coxas de Saito logo depois, locomovendo-se como névoas. Não demorou muito para que se transformassem em sua arma já posta em uma bainha.

    — Bem-vinda de volta.

    Pegou seu cabo, sentindo a leveza única que somente sua arma tinha. Levantou-se, guardando-a na cintura em seguida, olhando para o sistema azulado em forma de inventário.

    Agora, sua katana já não estava mais lá, sinalizando que havia sido retirada. Pensou: “Menu” novamente, fazendo com que esse sistema desaparecesse como o vapor da água.

    Uma fenda rasgou o céu, como se estivesse abrindo o zíper de um estojo. Seu barulho distorcido ecoou como uma espécie de erro, chamando a atenção de Saito.

    Waraioni caiu de lá, colidindo as costas ao solo como se fosse um saco de cimento. Seus ofegos eram tão palpáveis para os ouvidos quanto um fone.

    Saito percebeu sua respiração irregular. O suor escorrendo entregava seu cansaço como um ladrão traiçoeiro, mas sua curiosidade insistiu em fazê-lo perguntar:

    — Foi de boa?

    Waraioni olhou para o lado, observando seu irmão de pé olhando-o de cima, estendendo a mão. Aceitou sua ajuda e, em meio a um sorriso em seus lábios, respondeu:

    — Foi legal pra caralho! Pensei que eu ia morrer logo no começo!

    Saito riu, apontando para o céu e respondendo: “Se morrer, volta pro lobby. Tu sabe, né?” Waraioni retrucou com um “Cala a boca!”, mas também rindo com a piada feita.

    De repente, um sussurro cósmico ecoou de cima, como se o universo estivesse falando algo. Ao olhar para o céu, uma fenda decorada com universos e galáxias havia sido formada.

    Ônix surgiu de lá, pousando levianamente como uma folha que desgruda da árvore. Seu olhar era cabisbaixo, observando o solo sem notar a presença de seus irmãos.

    Ergueu seu rosto logo depois, finalmente os notando. Acenou para eles, dizendo: “Opa!” com um semblante aparentemente neutro e despreocupado.

    Saito o observou, notando esse falso relaxamento, como se até mesmo sua fala precisasse de esforço para acontecer, mas, ainda assim, ainda não tinha certeza o suficiente para entrar nesse assunto.

    — Bem-vindo de volta. Tá tudo bem contigo?

    Uma pergunta aparentemente inocente, mas cheia de malícias. Suas dúvidas poderiam ser cessadas com essa simples pergunta, mas a resposta não foi algo agradável.

    Ônix recordou de tudo o que aconteceu até agora. O tratamento frio que recebeu do sistema, sua tentativa de suicídio, algo o abraçando, o tutorial obrigatório, as sombras chorando enquanto eram absorvidas…

    Tudo isso aconteceu em uma única manhã; e o que mais lhe doía era a ausência de sua família e amada. Ainda assim, ergueu um sorriso falso, como se estivesse tudo bem e respondeu:

    — Nada de ruim aconteceu!

    O coração de Saito foi rasgado, como se o leão da dor predasse seu alvo. Mesmo que não soubesse o que tinha acontecido, seus instintos quase o fizeram chorar.

    Algo também incomodava o coração de Waraioni. Ele não era do tipo reflexivo, nem sequer se atentou ao fato de a família de Ônix estar ausente, mas sabia que algo estava errado.

    Decidiu seguir suas intuições, mas sabia que um “O que aconteceu?” não seria de ajuda alguma. O que perguntar? Seu coração o guiou para a resposta mais provável:

    — Ônix… Se eu te perguntar uma coisa, promete me responder sem mentir?

    E agora, o que faria? Mentir para isolar seus irmãos de suas maldições ou ser sincero com as únicas bênçãos que lhe restaram, tornando-os cientes de todas as suas dores?

    — Eu…

    Baixou a cabeça, pensando em qual resposta entregar. Uma máscara caiu do céu, colidindo com o solo, interrompendo seu momento de dúvida e busca por uma resposta.

    Era completamente branca como o ferro, mas escureceu rapidamente, como se o abismo mais profundo possuísse aquele objeto, tornando-o seu.

    Logo depois, explodiu em partículas, formando a imagem de um homem que, de pouco a pouco, foi se tornando cada vez mais real, como se trouxesse alguém de volta.

    Por fim, lá estava ele: a mesma pessoa que havia atacado Ônix há pouco tempo. Estava com os olhos fechados, tampando-os, como se a luz o machucasse.

    Ao sentar-se, abriu ligeiramente seus olhos, tentando olhar levemente para cima. O brilhar ausentou-se por um momento assim que Ônix ficou diante dele para estender a mão.

    — Precisa de ajuda, amigo?

    A pessoa paralisou por um instante, observando Ônix tão radiante quanto o sol que havia sido ocultado por ele. Aceitou a ajuda, levantando-se logo depois.

    — Obrigado. Desculpa por antes, me apresentei mal. Eu me chamo Morfius, espero que consiga me perdoar pelas minhas ações.

    Ônix sorriu, respondendo que não havia problema algum. Perguntou logo em seguida como foi o tutorial de Morfius, indagando se deu tudo certo. Ele respondeu logo em seguida:

    — Uhum, deu tudo certo! Obrigado por perguntar. Vocês podem me ajudar? O tutorial me ensinou algumas coisas úteis. Conhecendo a força de vocês, acho que conseguirão sem problemas.

    Waraioni franziu a testa, torcendo os lábios em reprovação. Mal se conheceram e já está pedindo ajuda? Essa ação não foi nem um pouco do agrado de Waraioni, que retrucou em seguida:

    — Ô, sujeito, espera um pouquinho aê… Tu atacou meu mano agorinha e ainda tá pedindo ajuda?

    Ônix riu brevemente, tentando acalmar a situação com uma aparente alegria, mesmo que ela não existisse. Disse que não haveria problemas em ajudá-lo, então Morfius seguiu com sua abordagem.

    Morfius disse “Menu” ao vento, conjurando o sistema azulado que estava visível a todos. Logo depois, pressionou a opção “Poderes” e infinitas descrições surgiram.

    Em seguida, disse: “O príncipe de sua raça guerreira, cujo planeta foi destruído pelo seu imperador”. Devido a isso, todas as opções foram descartadas e sobraram apenas uma com a frase dita.

    Esse era o sistema de desafios de poderes. Apenas uma pessoa pode desafiá-lo, mas, se apenas uma pessoa tiver os poderes dados pelo sistema e o restante não, estes poderão ajudá-lo.

    É necessário criar um grupo para serem levados juntos ao mesmo local. Quebraram um pouco a cabeça para descobrir como fazê-lo, mas não demorou muito.

    Agora, com o grupo criado e todos prontos, bastou requisitar o desafio para que eles fossem levados até lá de uma forma única e, de certa forma, marcante.

    Próximo capítulo: Preso ao Sistema.

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