Índice de Capítulo

    O silêncio após o caos reinou na caverna. Suspiros, tão secos quanto rápidos, ecoavam ao horizonte, sussurrando a surpresa que brilhava nos olhos dos desafiantes.

    Ônix sentia o pulsar de seu coração; ainda que estivesse lento, também se encontrava forte. Cada batida era um golpe diferente no peito.

    As condições transformavam sua mente em um vazio gélido e silencioso. Nesse cenário, uma gota de suor percorria sua testa antes mesmo da luta começar.

    Por um breve período, encheu o pulmão de ar e logo depois permitiu que vazasse pelos lábios em um ritmo onde ele estava no controle.

    Em seguida, jogou as mãos ao horizonte onde seus companheiros estavam, e desejou que as sombras viajassem e marcassem as costas de cada um.

    Escuridão nascia como uma única gota em cada dedo, para logo depois transformar-se em uma sutil névoa que caminhava até seus aliados.

    A atenção de cada um deles estava tão centrada no perigo à frente que nem chegaram a notar que o abismo aproximava-se deles. Pouco tempo depois, estavam marcados pela escuridão sem que percebessem, e assim Ônix tinha a garantia de que conseguiria trocar de lugar com eles caso fosse necessário.

    Certo, o mínimo de segurança foi entregue aos seus amigos, mas o que fazer agora? O olhar de poucos amigos daquela criatura não parecia paciente, e ele sabia disso.

    Não muito depois, seus olhos universais começavam a cerrar em busca de detalhes, e encontrou. Os punhos do rei fincavam no chão pouco a pouco.

    O motivo era desconhecido para ele, mas seus instintos o alertavam: ele desejava avançar, e não ia demorar para que isso acontecesse.

    Portanto, as pernas enrijeceram e firmaram-se no chão, de prontidão para uma resposta imediata caso aquele adversário desejasse a guerra.

    Infelizmente, esse foi o caso. Com os punhos afundados no chão, esticou o corpo para trás como se fosse um estilingue e lançou-se para frente.

    Seu avanço foi notável, como um jato a toda velocidade, mas o peso do corpo não permitiria que continuasse voando como desejasse.

    Pouco depois, tanto as mãos quanto os pés encontravam o solo, entretanto, isso não importava para o rei, bastava tentar de novo. Ainda no ar, jogou os punhos cerrados ao chão para afundá-los em um instante. Em seguida, lançou-se novamente para que sua corrida fosse eficiente.

    Dessa forma, quase no mesmo instante, Ônix começou a correr em direção àquele monstro, sem olhar para trás em momento algum.

    Os olhos de seus amigos arregalavam assim que percebiam o que ele estava fazendo. Andressa, ainda paralisada com o medo da morte, olhava-o desacreditada.

    Perguntas como: “Pra onde você tá indo…? Por que?” surgiam como relâmpagos na mente, até que uma gota de lágrima entregou-se ao pensamento de que ele iria morrer.

    — ÔNIX!!

    E assim ela gritou. Perante o perigo que sequer imaginou que existisse, seu coração entregou-se ao choro enquanto o observava avançar em uma luta que não sabia se podia vencer.

    O choque da impotência tinha seu preferido: Saito. Seus lábios entreabertos sequer conseguiam sussurrar, e as pernas não respondiam ao seu chamado.

    Tudo ao seu redor estava em câmera lenta, até mesmo o grito banhado em desesperança que Andressa tinha oferecido ao universo.

    Em pouquíssimo tempo, Ônix estava a alguns metros de distância do rei, que estava com o olhar sombrio fixo no pequeno garoto à sua frente.

    Seus pés jogaram-se ao chão e derraparam por um breve momento. Ao mesmo tempo, a mão esquerda se fechou e projetou-se para trás.

    Em seguida, lançou seu soco em direção à presa. Era rápido demais para seu tamanho, mas não o bastante para tornar impossível acompanhar.

    No entanto, não havia mais tempo para tentar esquivar; sendo assim, cessou sua corrida, firmou as pernas e fechou sua base, pronto para levar aquele golpe.

    Pouco tempo depois, o corpo percebeu o que tinha feito. Frio abraçou sua barriga, e um duradouro arrepio percorreu a espinha, mas os olhos permaneceram inabaláveis.

    BOOM

    O ataque acertou em cheio. O punho da criatura cobria por completo o corpo pequeno de Ônix, e os danos não podiam ser diferentes.

    A pele ondulou com o impacto, os ossos do braço estalaram em dor e os dentes cerravam sem que percebesse para que sangue não escapasse.

    O rei continuou esticando seu braço até que o golpe lançasse seu desafiante para longe, e não demorou para que esse momento chegasse.

    Ônix foi arremessado para trás. O sofrimento dos ossos o impedia de se movimentar no ar para que a queda fosse amenizada. As costas foram a primeira parte do corpo que encontrou o chão, e o impacto forçou com que ele ricocheteasse como uma bolinha de gude.

    Sua visão estava turva, e uma breve chuva de sangue escapou de sua boca. Não muito depois, colidiu de costas com a parede, que cessou seu lançamento.

    O corpo caiu como um saco de cimento, e os braços simplesmente jogaram-se no chão junto com o pescoço, com poucas forças restantes para levantar-se.

    Em um único golpe, o líder daquele grupo estava aparentemente derrotado, como se ele fosse só um ser humano comum. Eis essa a força de um rei.

    Saito, de longe, observava a situação de seu irmão: abatido, entregue à dor de um soco que ninguém dali sobreviveria se as situações fossem as mesmas.

    E pensar que, naquele momento, Ônix morreria se ele fosse só um pouco mais fraco, humano esse que Saito jurou que protegeria…

    … Isso enfurecia seu coração. Seu olhar escarlate começava a ferver como nunca junto do cerrar dos dentes. A mente indagava-se a si mesmo:

    “O que que eu tô fazendo?!”

    Os dedos dos pés fincavam no solo, e as pernas acumulavam forças para que seu avanço fosse ainda mais rápido do que o daquele monstro. Tudo o que aguardava era um gatilho ainda menor do que uma faísca, e teve: o rei estava caminhando em direção ao seu irmão.

    Imediatamente, saltou como se sua vida dependesse disso. O elemento de fogo impulsionava sua ida ao cuspir seu elemento na sola dos pés.

    Enquanto isso, manipulava o ar a sua volta para que a pressão não tornasse difícil seu avanço, e assim correu em direção ao maior desafio da floresta.

    Em pouquíssimos instantes, já estava do lado da criatura que nem se preocupou em olhar para trás, de onde o ataque vinha. Foi tarde demais quando seus instintos foram alertá-lo. Assim que o pescoço virou-se para o lado, um chute com o calcanhar abraçou seu nariz.

    O ataque foi certeiro, mas os danos não foram tão significativos quanto foram em Ônix; o máximo que conseguiu foi empurrar seu rosto brevemente para trás enquanto um pequeno chuvisco de sangue escapava da narina.

    A criatura não poderia deixar a situação só por isso, e não deixou; um soco de esquerda caminhava em direção ao corpo da nova formiga que o atacou.

    No entanto, ainda que estivesse enfurecido, não estava com a guarda baixa. Em um instante, cessou as chamas que abraçava seus pés…

    … No outro, ordenou com que o ar o impulsionasse para cima, e assim foi feito. O ataque do monstro avançou para onde ele estava anteriormente, passando longe de acertá-lo.

    Sendo assim, Saito cerrou o punho direito e o projetou para trás, prestes a lançar um golpe ainda mais forte do que o anterior, mas a pressa quase causou sua ruína.

    Utilizando o ataque anterior como um impulso, o rei saltou brevemente e jogou seu corpo para o lado, arremessando seu antebraço no corpo de Saito.

    E assim, não havia algo que Saito podia fazer para livrar-se daquele dano; sua única alternativa foi proteger o corpo com o braço enquanto criava uma barreira de vento para protegê-lo.

    Entretanto, devemos voltar alguns instantes antes desse evento, onde Ônix encontrava-se sentado, entregue aos roucos suspiros. Os olhos universais olhavam para baixo com uma confusão palpável, como alguém olhando para algo que nunca havia visto antes.

    Seus braços não respondiam ao seu comando, e os dedos nem pareciam existir mais; para resumir, o corpo estava incapaz de continuar…

    … Mas, por que? Essa não é uma pergunta que vem de mim, o narrador, e sim de Ônix. Ainda que estivesse ferido, não sentia nenhuma dor.

    Para ele, tudo estava normal, o mesmo oceano de dor habitava seu coração desde que reviveu nesse novo universo, nada havia mudado.

    Podia não saber a resposta, mas eu vos digo: Ônix não estava sentindo coisa alguma porque sua dor emocional superava a física. Diante desse abismo que nunca cessa, mas sim se fortalece, dor alguma ia atingi-lo. Dessa forma, tudo o que pôde fazer foi levantar o pescoço.

    Assim, respirou fundo, fechou os olhos e entregou-se à escuridão, não para simplesmente ficar parado, e sim para pedir por ajuda na escuridão de seu ser.

    “Eu… Não consigo me levantar…”

    Ele nunca viu as sombras que protegeu como um porto seguro, sempre foi o contrário, elas só ajudavam em um momento crítico porque Ônix não queria envolvê-las em sua dor; entretanto, sempre há a primeira vez para tudo.

    “… Será que vocês conseguiriam me ajudar?”

    Dito e feito. Dentro de seu corpo, escuridão caminhava em passos lentos, abraçando cada músculo e osso que sentia o sofrimento da dor. O abismo tomou as angústias físicas para si e, assim, tomou o lugar de cada fibra danificada, atendendo o desejo de seu mestre.

    Pouco depois, Ônix abriu os olhos e tentou de novo; felizmente, estava funcionando, para falar a verdade, estava melhor do que imaginava.

    Os dedos respondiam mais rápido, e os braços pareciam folhas. A leveza consumiu seu corpo, e, por um momento, sentiu-se como o vento.

    Um singelo sorriso acendeu nos lábios, e seus agradecimentos foram tão sinceros quanto. Assim, levantou-se e observou o que estava adiante: seu irmão e o rei.

    Nesse instante, Saito havia chutado o rosto do predador e o contra-ataque estava prestes a acontecer. Os olhos universais presenciaram tudo.

    A agulha da angústia cutucou seu peito. Uma coisa é não se incomodar e tampouco sentir as próprias dores físicas, outra é ver seu irmão ser atacado.

    Perante essa situação, os olhos brilhavam em concentração, e concluiu rapidamente: ele não ia esquivar disso, e ia ser problemático.

    Dessa forma, quando o ataque estava prestes a atingir Saito, Ônix trocou de lugar com ele e assumiu o risco de ser acertado novamente. A confusão, por sua vez, abraçou os olhos de Saito, que observou de leste a oeste até que entendesse o que tinha acontecido.

    Nada pôde sair de sua voz, mas o arregalar não mentia a preocupação e dor em seu coração. Mais uma vez, estava sendo protegido por aquele que jurou proteger.

    Voltando para a perspectiva de nosso garoto, o antebraço do rei estava há um instante de acertá-lo; entretanto, dessa vez, ele estava no controle.

    Sua palma rapidamente esticou-se e caminhou para frente e, assim que o golpe encostou no dedo, impulsionou-se no ataque para rodar no ar.

    A esquiva foi perfeita, mas não bastava só parar por ali. Com sua própria força, parou no ar e cerrou o punho direito, pronto para devolver o favor.

    Kong, ainda girando, foi avisado por seus instintos de que algo estava errado, e os olhos rapidamente encontraram o garoto que retornou.

    Ainda que fosse tão pequeno quanto aparentemente frágil, um mau-presságio rodeava aquele ser. Talvez, só talvez, ele pudesse ser uma ameaça.

    Próximo capítulo: A Volta do Abismo.

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