Índice de Capítulo
    1. 3. “Ao infinito e além”1

    — Ei, papai! Pede mais soruzo! — Ranta gritou, espirrando macarrão e caldo de sua boca ainda cheia. Também levantou o indicador da mão esquerda.2

    Nas barracas, junto à vila dos artesãos, na zona sul, havia uma que era o único local da Allpea onde se conseguia a tal massa de macarrão chamada soruzo.

    Soruzo é um prato de carne jogada num caldo salgado, junto com macarrão amarelo que é feito amassando flor de trigo em finas fatias. Se alguém lhe perguntar se é gostoso, não é certo que a resposta seja sempre um sim. Afinal, é daquele tipo de prato cujo sabor não consegue agradar a todos. Especialmente no primeiro gole.

    No entanto, quanto mais você come, mais saboroso ele tende a ser. Algum tempo depois, ele começou a ansiar por isso novamente. Apesar de todas as vezes que ele já tinha comido, ainda se encontrava seduzido por tal culinária. Uma vez a cada dez dias – não, a cada cinco – não, não, se possível, a cada três dias – queria prová-lo novamente.

    Havia uma pilha de grandes tigelas na sua frente.

    Sete, no total.

    Ranta estava prestes a comer sua oitava tigela de soruzo. A nona tigela, que acabara de pedir, sairia em breve.

    Soruzo recém-feito, quentinho. Muito quente na verdade. Mas ele não queria perder tempo soprando então começou a devorá-lo de imediato.

    Acabou queimando o interior da boca. Honestamente, ele não conseguia mais dizer qual era o gosto. Sua barriga doía. Até parecia uma mulher grávida, prestes a dar luz

    A essa altura, comer equivalia a nada além de sofrimento, mas não parou. Este último gole finalizaria sua oitava tigela.

    — Bwahh…! Isso sim é que é comer de verdade! — Ele exclamou.

    Naquele mesmo momento, a nona tigela chegou. Quando o vapor característico chegou às narinas, ficou tonto.

    O aroma daquela perfeita harmonia de ossos de frango, gordura de porco, cebola e cenoura deveria abrir seu apetite de novo, porém, agora só resultou em uma forte azia.

    — Criança, você está bem? — O velho que administrava a barraca olhou para o rosto do rapaz.

    Ranta acenou com a cabeça para ele, enxugando o rosto com uma das mãos. Era uma confusão de suor, ranho e mais suor. Sem dúvidas, ele aparentava estar em maus lençóis. Bem, foda-se. Ele não se importou.

    — E é isso! 

    Ele retomou o trabalho e se atracou na nona tigela. A cada pedaço que engolia, sentia náuseas, vagarosamente, consumindo sua consciência. Quando o soruzo tentou executar o caminho inverso, rapidamente cobriu a boca.

    — Eu não vou vomitar.

    Não mesmo.

    Como se eu fosse permitir que isso aconteça.

    Eu tenho que comer. Vou comer, comer, comer e, depois, comer um pouco mais. Vou comer tudo, tudo mesmo.

    — Algum dia, vamos fazer isso. Abrir um restaurante.

    O seu companheiro – não, o rosto de seu amigo lhe veio à mente.

    Dessa vez, Moguzo… Sério… na boa, não me lembro de ele ser tão bonito assim.

    — Mas eu não quero fazer soruzo, quero fazer ramen. Vou economizar, estudar e, quando tudo estiver pronto, farei o melhor ramen de todos, vamos fazer isso, vamos abrir aquele restaurante.

    — … Certo.

    Independente de tudo que dissesse a si mesmo, nada disso chegaria ao seu companheiro.

    Tudo que posso fazer é comer. Agora, só preciso comer. Eu vou comer sem parar, esse tal soruzo que meu amigo tanto gostava. Comerei tudo o que puder. Vou comer descontroladamente, até mesmo quando já não couber mais nada no meu estômago. Comer, comer, comer, e continuar comendo depois que terminar de comer para poder comer mais depois. Merda, é isso mesmo. Comer até explodir.

    — Urrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrgh!

    Porque, cara?

    Porquê?

    ~or-p-que?.

    — Porque você não pode mais comer… ! — lamentou.

    Certo, parceiro! Ele pensou, abatido pela tristeza. Não importa o quanto você queira comer, você não pode, não mais.

    Então Ranta comeria a parte de seu parceiro. Mas qual o sentido disso? Como se ele se importasse. Tanto faz se tem, ou não um sentido. Já não importa mais. Ranta apenas pensou que isso era o que deveria fazer. Ele não conseguia evitar aqueles pensamentos, então simplesmente fez o que tinha que fazer.

    — Gwehhh… ! Pops! Mais uma tigela!

    — M-Mas, veja bem, garoto… — O velhote protestou.

    — Está bem! Só manda mais uma, rápido! — Gritou.

    — O-Ok.

    — Nove! — Bravejou.

    Só mais um pouco e teria sua nona tigela vazia. Ele se forçou a ir mais rápido. Tentou acelerar, mas, por algum motivo, a quantidade no pote simplesmente não diminuía. Suas mãos pararam. Uma náusea estonteante o atingiu. Ele não conseguia respirar. Sentia uma espécie de sufocamento.

    Enfim, se deu conta da situação. Havia muito barulho ao redor. Quando olhou, percebeu artesãos e soldados voluntários ao seu redor.

    O que? Todos estão olhando para mim. Por quê… ?

    — Ei, olha só, aquele cara já vai pra décima tigela! — Alguém apontou.

    — Uau… Sério…?

    — Não pode ser.

    — Isso é normal?

    — Eu não consegui…

    — Incrível…

    — Quer dizer, isso é loucura, não?

    — É, mas olha pra ele, aposto que logo logo ele já pede mais uma.

    — Se você está falando, então…

    — Ele vai sim, fica olhando. Dez tigelas? Eu não acredito. Simplesmente impossível. Dez! Acho bem difícil de acontecer.

    — Sim, isso deve ser demais.

    — Dez tigelas… Não, não, não.

    — Hmph… — Ranta bufou, e sentiu algo estranho quando o fez. Algo ficou preso em seu nariz? Ele levou a mão e descobriu que era um macarrão. Considerou jogá-lo fora, mas seu parceiro nunca faria isso, o arrancou do nariz e jogou direto para a boca.

    — Ei, deem uma boa olhada nisso, pessoal. — Ele disse com orgulho. — Dez tigelas? Isso é só um aperitivo. Vai ser moleza. Fácil como tirar doce de criança.

    E lá vou eu.

    Retomando a empreitada, acabou rapidamente com sua nona tigela. A décima estava a caminho. Sentia-se tonto, mas isso não era grande coisa.

    — Pode vir! — Ranta se levantou e levou a tigela à boca, despejando o alimento com caldo quente no estômago. A multidão bradou. Encorajado, ou instigado, pela euforia do público, terminou a décima tigela em pouco mais de dez segundos. Não apenas a massa e outros ingredientes – lambeu e sugou até a última gota do caldo.

    — O que você acha disso, hein ?! — Ele esgoelou. — Pops, pode mandar!

    — Subindo! — O velho respondeu.

    — Wooooo!

    — Ele pediu mais uma!

    — Esse cara é fora de série!

    — Isso é ridículo!

    — Continue!

    — Vai, não para!

    — Vai!

    — Vamos, você consegue!

    — Escutem! — Ranta vociferou, levantando os polegares. — Eu sou Ranta! Todos vocês, louvem meu grande nome!

    — Ranta!

    — Ranta!

    — Vai lá, Ranta!

    — Ranta!

    — Ranta…!

    — Pops, rápido! — Ranta berrou.

    — Certo! Uma tigela de soruz quentinho! — O velho respondeu.

    — Wahahahahaha! Onze! — Com uma risada, ele começou a sua décima primeira tigela. Por um momento ele se perguntou sobre o porquê de tudo isso, mas, nesse momento, ele já não se importava mais.

    Merda, é isso mesmo. Eu vou comer.

    Veja, Moguzo.

    Mesmo que eu possa fazer isso: comer, comer e comer.

    — Bwuh! — de repente,  engasgou com alguma coisa. Um macarrão saltou para fora de seu nariz e a multidão começou a rir. Antes que pudesse agarrá-lo, também caiu na gargalhada.

    Quanto posso comer? Vou até onde der. Vou comer até cair.

    Um dia, vou abrir um restaurante. Vai ser um de ramen, não de soruzo, como meu parceiro queria. Já decidi o nome. Vai ser a Barraca de Ramen: Ranta e Moguzo.

    Não, vai ser MOGUZO e Ranta. 3

    1. kk q trocadilho tosco[]
    2. Ranta arrumou um daddy e eu não to sabendo?[]
    3. emoji chorando[]

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