A marcha até a cidade revelou mais do que Ian esperava. O caminho de pedras negras serpenteava pelas encostas. Havia vida não muita, mas o suficiente para provar que Altheria não era mais uma promessa congelada entre picos esquecidos. Era uma realidade construída em camadas. 

    À frente, a capitã que os escoltava caminhava com precisão militar, os olhos atentos ao entorno mesmo quando nada parecia ameaçador. Suas botas ecoavam contra o solo como se quisessem deixar marca. 

    Quando se aproximaram de uma bifurcação nas ruas enregeladas, ela finalmente falou. 

    — Capitã Neriah — disse, sem olhar para trás. — Membro do Círculo de Gelo de Altheria. 

    Ian arqueou uma sobrancelha, mantendo o passo ao lado dela. 

    — O Círculo, é? imagino que de ser importante — ele falou colocando o sobretudo

    — Minha influência lá é limitada — continuou. — Não sou uma das matriarcas. Apenas comando homens. 

    — E mulheres — Ian corrigiu, acenando com a cabeça para uma das guardas mais atrás. 

    — E mulheres — Neriah repetiu com um leve assentimento. — Mas o Círculo ainda não me vê como uma igual. Talvez depois desse encontro, as coisas mudem. 

    — Ah, sim. Nada como prender o Guardião do Norte pra subir de patente — Ian murmurou. 

    Neriah deixou um breve sorriso escapar

    — Essa é a Idéia… — ela olhou para Ian novamente — Na verdade minha ideia é ajudar o Guardião a ser reconhecido novamente, e com sua gratidão ser elevada de status dentro do Círculo de gelo.

    Ela olhou novamente para Ian, mas dessa vez parecia um olhar de expectativa.

    — Afinal, eu sou mais forte que muitos membros do Circulo, só preciso de uma oportunidade.

    — Olha só, quem diria que a Comandante era gananciosa. — Ele falou colocando as mãos nos bolsos do sobretudo, enquanto a encarava com um sorriso de canto.

    O silêncio se instalou novamente, mas era menos desconfortável agora. Apenas denso. 

    Ao entrarem mais profundamente nos limites de Altheria, a estrutura da cidade começava a se revelar. Construções elegantes feitas de gelo e pedra escura se erguiam ao redor, refletindo tons azulados e violetas mesmo sob o céu nublado. Torres arqueadas conectavam patamares diferentes com pontes suspensas. Era uma cidade vertical, como se tivesse sido esculpida de cima para baixo, da montanha ao chão.

    — O julgamento ocorrerá na base do Círculo — disse Neriah, por fim. — Foi construída sobre as ruínas do ataque… no local da queda do dragão. 

    Ian desviou o olhar para o horizonte, como se puxasse uma memória antiga. 

    — Qual delas? — perguntou. 

    Neriah parou. Pela primeira vez, hesitou. 

    — Houve… mais de uma? 

    — Dois locais de impacto, aquele desgraçado era forte — Ian respondeu, ainda observando ao longe. — Um ao sul do desfiladeiro, outro mais a oeste. O primeiro foi a queda. O segundo, onde morreu. 

    Ele olhou para a comandante que o encarava com um rosto impassível.

    — O que? Você está arriscando sua carreira sem ainda ter certeza que eu sou o Guardião? — perguntou Ian com tom de surpresa.

    — Não é o caso caro Guardião — ela respondeu de forma indiferente à provocação de Ian. — É que apenas os altos membros do círculo têm acesso às informações sobre a origem da cidade de forma precisa.

    — Interessante… faz sentido, tem muitas ruínas perigosas nessa região — Ian falou, olhando a cidade. — Vocês têm um bom sistema de controle, considerando a quantidade de ruinas que essa cidade tem.

    — Sim, temos — respondeu Neriah, seca. — Nossa prioridade é manter a segurança e a ordem.

    — Ah, sim, claro — Ian murmurou, sarcástico. — Segurança e ordem são sempre as prioridades, não é? Especialmente quando se trata de um prisioneiro como eu.

    Neriah o olhou de lado, um olhar de advertência.

    — Você não é exatamente um prisioneiro comum. Você é… potencialmente perigoso.

    — Potencialmente perigoso? — Ian repetiu, erguendo uma sobrancelha.

    Neriah não respondeu, mantendo-se séria.

    — A sede do círculo fica para lá? — Ian perguntou, apontando para o leste.

    — Sim — respondeu Neriah, breve. — Como… você sabia disso?

    — Imagino que escolheram o da morte — concluiu Ian. — Faz sentido. A mana residual ali seria mais intensa.

    Neriah encarou Ian por alguns instantes, até que ele se viu obrigado a responder:

    — Eu estava lá — ele respondeu, sem nenhum traço de humor. — Ou acha que “O Guardião do Norte” é só um título bonito?

    Neriah não respondeu, mas Ian podia ver a curiosidade em seus olhos.

    — Você não acredita em mim, não é? — perguntou Ian, inclinando a cabeça.

    — Eu ainda preciso de provas — respondeu Neriah, firme. — E é isso que o julgamento vai fornecer.

    Ian sorriu, um sorriso fino.

    — Ah, sim. O julgamento. Estou ansioso para ver como isso vai se desenrolar.

    Neriah o olhou de lado, um olhar de advertência.

    — Você não deve subestimar o Círculo, eles não são pessoas comuns, não os trate de forma leviana.

    Ian riu, um som baixo.

    — Eu não estou brincando, Neriah. Estou apenas preparado para o que vier.

    A marcha continuou, com Ian e Neriah liderando o grupo. A cidade se aproximava, com suas torres e pontes suspensas. Ian podia sentir a mana no ar, uma energia pulsante que parecia emanar da própria cidade.

    Ao longe, a Cidadela brilhava como o coração pulsante da cidade. Mais abaixo, o Distrito do Templo Inferior surgia entre as sombras de ruínas antigas. O centro onde julgamentos, estocagem e administração tomavam forma. 

    — Então é pra lá que estamos indo — murmurou Neriah — É onde as decisões são tomadas. 

    — Você sabe o que vai acontecer no julgamento? — perguntou Ian, quebrando o silêncio.

    Neriah hesitou antes de responder.

    — Não sei ao certo. Mas posso imaginar. Você será julgado pelo Círculo, verificarão se você está falando a verdade e depois irão querer ver sua força.

    Ian assentiu, pensativo.

    — E o que você acha que vai acontecer?

    Neriah o olhou de lado, um olhar enigmático.

    — Não sei. Mas posso dizer que vou acompanhar de perto.

    A caminhada até o Templo Inferior foi silenciosa entre eles, sendo cortada apenas pelos sons da cidade, crianças correndo entre as pontes, se escondendo com a ajuda da neblina da manhã, o sol apesar de já estar alto deixava a cidade em um tom de dia chuvoso devido à neblina.

    Após eles se atravessarem o mercado, Ian pode ver o chamado Templo Inferior, seria ali que o seu futuro em Altheria seria decidido… de um jeito ou de outro.

    — É um lugar impressionante — disse Neriah, notando o olhar de Ian. — O Templo Inferior é onde as decisões mais importantes são tomadas.

    — E é onde as pessoas importantes estão — completou Ian, com um tom neutro.

    Neriah o olhou, um olhar sério.

    — Sim. É onde seu destino será decidido.

    Eles chegaram ao Templo Inferior, e Ian pôde sentir a energia mágica emanando do local. Era um lugar de grande poder, e ele sabia que teria que estar preparado para o que estava por vir.

    — Vamos — disse Neriah, fazendo um gesto para que Ian a seguisse. — O julgamento está prestes a começar.

    Ian assentiu, e seguiu Neriah para dentro do Templo Inferior. Ele sabia que seu futuro em Altheria dependia do resultado do julgamento, e estava determinado a fazer o que fosse necessário para garantir que as coisas dessem certo.

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