A jornada para fora da mina foi uma ascensão do inferno para um purgatório desconhecido. A carroça de carga que os transportava balançava desconfortavelmente, mas para Agouri e Teseu, era como flutuar em uma nuvem. Depois de meses ou anos na escuridão perpétua, a luz do sol era uma divindade esquecida, pintando o mundo com cores que eles mal se lembravam.

    — Olhe, Teseu! O mar! — Agouri exclamou, apontando com o dedo trêmulo para o azul cintilante no horizonte. Ele se virou para Hermes com um sorriso que ia de orelha a orelha. — Você acredita nisso? Ar puro! Vamos ter camas de verdade! E o Jovem Lorde vai conseguir um curandeiro para você!

    Teseu, apoiado no canto da carroça, assentiu, um sorriso fraco, mas genuíno, em seus lábios pálidos. A tosse ainda o abalava, mas seus olhos, antes turvos de desespero, agora continham um brilho de esperança. A promessa de cuidado, a gentileza inesperada do Jovem Lorde, era um bálsamo para sua alma cansada.

    Hermes permaneceu em silêncio. Ele via o mesmo mar, o mesmo céu azul, as mesmas colinas verdejantes da Calcídica. Mas para ele, a beleza era uma tortura. Cada vislumbre da vastidão do mundo era uma facada, um lembrete de sua liberdade perdida, de quando ele podia cruzar aquela distância em um piscar de olhos. A brisa salgada que animava seus companheiros apenas trazia para ele o eco das palavras de Sêneca: “É apenas uma jaula diferente.” Ele olhava para a esperança nos rostos dos dois rapazes e via apenas a ingenuidade de cordeiros sendo levados para um matadouro mais bem decorado.

    Após horas de viagem, os portões da villa surgiram. Eram imensos, feitos de madeira escura e reforçados com bronze polido. Ao passarem por eles, o queixo de Agouri caiu. Teseu arregalou os olhos.

    Era um paraíso. Um complexo de edifícios de mármore branco interligados por pátios abertos, colunatas e jardins meticulosamente cuidados. O som suave de fontes ecoava pelo ar, misturando-se com o perfume de lavanda e jasmim. Mosaicos coloridos decoravam os pisos, retratando cenas de deuses e heróis — uma ironia que queimou no peito de Hermes. Para ele, aquilo não era um paraíso. Era uma imitação vulgar e sem vida do Olimpo, uma maquete construída por mortais que não compreendiam a verdadeira divindade.

    Eles foram recebidos não pelo Lorde ou sua família, mas por um homem mais velho, alto e esguio, com uma túnica cinza impecável e um rosto que parecia ter sido esculpido em pedra. Seus olhos não demonstravam crueldade nem bondade, apenas uma eficiência fria e absoluta.

    — Eu sou Fílon, o administrador desta casa — ele anunciou, sua voz tão sem cor quanto sua túnica. — Vocês foram escolhidos para servir. Esqueçam a mina. Suas vidas antigas acabaram. Aqui, vocês seguirão as regras, ou desejarão a simplicidade de uma chicotada. Sigam-me.

    Suas palavras eram um balde de água fria na excitação de Agouri. Eles foram conduzidos através dos pátios deslumbrantes até uma área de serviço mais austera, mas ainda assim infinitamente mais limpa que a mina. O primeiro destino foram os banhos.

    A sensação da água quente foi um choque. Para Agouri e Teseu, era um luxo inimaginável. Mas para Hermes, ser despido e esfregado por outros escravos era uma nova humilhação. Suas cicatrizes, antes escondidas pela sujeira, ficaram vividamente expostas sob a luz. A marca em seu peito, a cicatriz em forma de caduceu, pareceu pulsar friamente quando a água a tocou. Ele se sentia como um animal sendo limpo, sua história de dor sendo catalogada pelos olhos curiosos e temerosos dos outros servos.

    Após o banho, receberam túnicas simples de linho cru. A textura do tecido limpo em sua pele era estranha, vulnerável. Fílon retornou e os inspecionou com um olhar crítico.

    — Suas funções foram designadas. — Ele consultou uma tabuleta. — Teseu.

    Teseu se encolheu sob o olhar do administrador.

    — O Jovem Lorde ordenou que você seja levado à ala médica. Receberá tratamento para sua enfermidade. — A confirmação da promessa fez o rosto de Teseu se iluminar, e Agouri sorriu abertamente para o irmão.

    — Agouri. — Fílon continuou. — Você foi designado como atendente pessoal do Jovem Lorde. Responderá diretamente a ele. Não o desaponte. As consequências seriam… severas.

    Agouri assentiu vigorosamente, a empolgação superando o medo. Servir ao homem que os salvara? Era uma honra.

    — Hermes. — Fílon virou-se para ele, e seus olhos pareceram se demorar um pouco mais. — Você cuidará dos jardins do pátio oeste. Seu trabalho é manter a beleza do lugar. No entanto, a Lady expressou um interesse em sua… aparência única. Você permanecerá à disposição dela. Se ela o chamar, a qualquer hora, você obedecerá sem questionar. Entendido?

    Hermes apenas assentiu, seu estômago se revirando. Ele era uma ferramenta para o jardim e um bibelô para a Senhora. A jaula estava se mostrando.

    Um servo levou Teseu, que olhou para trás com gratidão e esperança. Outro gesticulou para Agouri, que seguiu com um passo saltitante, ansioso para encontrar seu novo e benevolente mestre.

    Hermes foi deixado com Fílon, que o conduziu em silêncio até os jardins do pátio oeste. O lugar era de uma beleza estonteante. Rosas, lírios e hibiscos cresciam em profusão, dispostos em padrões geométricos ao redor de uma fonte de mármore que retratava ninfas dançando. O trabalho seria tedioso, mas pacífico. Por um instante, sozinho entre as flores, sob o céu azul, Hermes sentiu o nó em seu peito se afrouxar minimamente.

    A sensação durou pouco.

    O farfalhar de seda anunciou sua chegada. A Lady Kratos caminhava pelo jardim, seus passos silenciosos sobre o caminho de pedras. Ela não olhou para ele diretamente, preferindo admirar uma rosa vermelha.

    — A beleza exige cuidado constante — ela disse, sua voz musical, mas com um tom de aço por baixo. — Cada pétala, cada folha, deve estar perfeita. A menor imperfeição arruína o todo.

    Ela finalmente se virou, e seus olhos azuis o avaliaram da cabeça aos pés, demorando-se em seu cabelo branco e em seu rosto. Hermes permaneceu imóvel, a cabeça baixa como Fílon havia instruído.

    — Então, este é o anjo branco que minhas minas sujas escondiam. — Ela se aproximou, parando a poucos passos dele. Sua presença era avassaladora, carregada com o perfume caro e o peso da autoridade absoluta. — Levante o rosto.

    Lentamente, Hermes ergueu o olhar, seus olhos encontrando os dela. Ele não mostrou medo, nem desafio. Apenas um vazio profundo.

    Um sorriso enigmático tocou os lábios da Lady. — Veremos se você é tão bom em obedecer quanto é em ser… decorativo.

    Ela se virou e se afastou com a mesma graça silenciosa, deixando-o sozinho com o perfume de seu rastro e o som da fonte. A ameaça não estava mais implícita. Tinha um rosto, um nome e um desejo perigoso em seus olhos. A jaula era de fato dourada, mas suas grades eram tão frias e duras quanto as de qualquer outra prisão.

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