Capítulo 4: Recordações
Toco a campainha da casa de Beatriz — minha amiga desde os três anos.
O enorme muro que separa o terreno da mansão da calçada impede que eu veja o interior da residência.
Logo, ouço o barulho de passos vindo em minha direção.
O portão branco metálico se divide e começa a abrir.
Vejo uma garota da minha idade: oito anos.
Ela está usando uma blusa verde junto às calças jeans azuis. Seu cabelo loiro e olhos azuis estão com um ”brilho” diferente do habitual.
— Hadi?! — exclama ao correr até mim e então me abraça! — Feliz aniversário!
— Obrigado, Bia. — Retribuo seu gesto e ficamos assim por algum tempo.
Beatriz então se afasta, noto seu rosto avermelhado.
— Ora, ora, vejo que temos dois pombinhos aqui, não é mesmo?
Dona Laura, mãe de Bia, chega com as mãos atrás das costas.
— Oi, dona Laura.
— Olá, Hadria — diz e então revela um presente.
— Nossa! — Praticamente arranco a embalagem quadriculada de suas mãos. — Valeu!
— Fufu, de nada, querido. — Ela então olha para sua filha. — Vocês precisam ir, não é?
Bia, como se tivesse sido arrancada de um transe, responde:
— Hã? Ah, sim!
Ela então começa a caminhar e a sigo.
— Hadria. — Paro quando ouço a mãe de Beatriz chamando. Viro-me e a encaro. — Cuide da minha filha, está bem?
Quase que automaticamente, respondo:
— Pode deixar! Não vou permitir nada de ruim acontecer com ela.
Um sorriso genuíno se forma em meu rosto, porém ainda vejo preocupação estampada em sua cara.
— Eu prometo.
Sua face então se tranquiliza.
— Certo, estou contando com você. — Ela então fecha o portão após entrar em casa.
Empolgado, me viro para Bia, que está parada me encarando. Coloco o presente que ganhei na mochila em minhas costas.
— Vamos. — Pego sua mão e começo a correr. — Senão a gente vai se atrasar!
Corremos pela calçada, porém o sol escaldante logo faz com que cansemos.
— Ei, Hadi — chama Bia ainda ofegante.
— Oi? — respondo com o olhar fixo para frente.
De repente, ela para de andar. Após avançar alguns metros à sua frente, paro na sombra de uma árvore. Sinto a sensação agradável do vento batendo contra meu corpo.
— Beatriz?
— E-então… eu… eu… — noto seu rosto corando — t-tenho um presente pra você.
— Sério? Legal. — Espero um pouco para continuar a falar. — O que é?
Ela começa a se aproximar com passos lentos.
— Sabe, Hadi — Bia para a poucos centímetros de mim — eu… eu gost-?!
De repente, como se o tempo parasse, vejo tudo em câmera lenta. Olho para o céu e algo parecido com um meteoro em chamas está prestes a colidir com o chão.
Fito minha mais preciosa amiga, que está a poucos metros de onde o objeto flamejante cairá.
O tempo volta ao normal.
— BEATR-!!!
O impacto cria uma rajada de vento que me arremessa para longe, e colido contra algo rígido.
— Argt!
Sinto uma dor aguda na barriga, quando olho, vejo um pedaço de metal fincado em minha pele.
— Merda — murmuro.
Ainda nauseado, forço-me a ficar de pé e olho ao redor.
Caos, é tudo que vejo.
Uma cratera emanando chamas no meio da rua, vários lugares pegando fogo, corpos sem vida pelo chão, gritos de desespero…
“Beatriz.”
Encontro minha amiga caída no chão.
Imbuto mana nas pernas e corro até ela. Sinto uma dor latejante na recém ferida, mas ignoro e continuo.
“Por favor, não esteja morta.”
Chego e me agacho ao seu lado. Meu ouvido vai de encontro ao seu peito e foco em seus batimentos.
Nada. Não ouço nada.
“Não, não, por favor…”
Tum Tum.
Ouço um batimento. Fraco e lento, porém um batimento.
“Preciso levá-la até…”
Uma pressão indescritível preenche a atmosfera.
Com os olhos arregalados, viro em direção ao buraco no meio da rua, mas me arrependo no mesmo instante ao ver a coisa responsável por todo esse caos saindo da cratera.
Olhos vermelhos, pele acinzentada, manto escuro e uma foice negra junto às correntes em sua mão, que lhe dão um ar demoníaco.
Ele olha para mim com desprezo. Um sorriso macabro de dentes amarelados surge em seu rosto.
— Olá, garoto.
Acordo apavorado, meu corpo encharcado de suor, minha respiração ofegante e o coração acelerado.
— Merda — murmuro com a mão sobre a testa.
“Pensei que isso havia parado.”
Maldição Cratera. Esse foi o nome dado ao indivíduo responsável pelo ataque que me assombra até hoje. Isso se deve pelo fato de que em todo ataque que ela faz, sempre deixa uma cratera.
Ainda deitado, olhando para o teto, levanto meu braço para cima e o encaro. Após alguns segundos, me estico até a beirada da cama, pego o controle no chão e ligo a TV.
Uma mulher negra de cabelo ondulado aparece segurando uma pequena placa com a logo do jornal.
— Hoje completa uma semana desde a morte da ceifadora rank C+, Geila Possem. — Surge uma imagem de fumaça saindo da janela trincada do apartamento. — A maldição responsável ainda não foi encontrada, entretanto…
Aperto o botão vermelho do controle e a tela fica preta novamente.
Pego o celular encima da cama e vejo as horas: 8:49 am.
Levanto-me e vou até o banheiro. Após lavar o rosto, escovo os dentes.
Encaro o espelho e vejo que o coque do meu cabelo está uma bagunça. Solto-o e sinto os fios prateados baterem contra meus ombros.
Meus olhos ficam fixos no espelho.
“Se eu voltasse no tempo e dissesse a mim mesmo tudo o que aconteceu, ele acreditaria?”
— Haha — uma risada genuína ecoa sobre o banheiro.
“Claro que não, quem acreditaria que…”
Plim, Plim.
O som da campainha interrompe meus pensamentos.
Vou até a porta e olho pelo olho mágico.
Vejo um homem com roupas amarelas e um chapéu azul. Destranco e abro a entrada da minha casa.
— Bom dia — cumprimenta. — O senhor é Hadria Hiraeth?
— Sim.
Ele então abre sua bolsa e começa a mexer dentro dela.
— Meus parabéns — diz ao retirar uma pequena caixa — queria ter tido a mesma sorte que você.
“Sorte o caralho.”
Ele então estende o pacote e noto uma foice estampada em cada lado do pequeno objeto.
— Ainda não é tarde, você pode se tornar um ceifador até os 30 — digo enquanto pego a encomenda.
— Sim, sim, mas tem isso. — Ele puxa um pouco a calça e vejo que sua perna é na verdade uma prótese.
— Mas existem curandeiros.
Ele me encara com ceticismo.
— Garoto, para você, que vive nessa casa luxuosa, pagar por um ceifador curandeiro pode não ser caro — ele suspira antes de continuar: —, mas para pessoas comuns, como eu, é praticamente impossível. — Como se tivesse se lembrado de algo, o alejado dá de costas e começa a caminhar. — Bom, até mais!
“Que cara estranho.”
Fecho a porta e, após tranca-lá, começo a andar até meu quarto.
Claro, sei que pagar por um ceifador curandeiro não é barato, mas é tão caro assim? Nunca imaginei que R$200.000 pudesse ser tanta coisa.
Eu mesmo já perdi um braço, porém em menos de um dia já estava recuperado.
Após a morte da minha mãe, todo o seu dinheiro foi dividido para mim e seu filho mais velho, Arthur. Entretanto, nunca tive que me preocupar com isso, Dona sempre cuidou de mim, e cuida até hoje.
Chego ao meu quarto e sento sobre a cama.
Vejo um botão em cima da caixa e então o aperto.
Click.
Um pequeno holograma de um homem barbudo aparece sobre a estrutura quadriculada.
A mensagem gravada começa a passar:
“Olá, Hadria Hiraeth, sou David Ospol, diretor da Academia Ospol, ou Escola de Elite da Ceifa, chame como preferir.
Uma mensagem foi enviada a todos os nossos futuros estudantes, porém quis gravar esta pessoalmente.
Em uma semana, às nove horas da manhã em ponto, um motorista estará o aguardando para trazê-lo até a minha academia. Quando chegar, venha até mim, quero conversar com você.
Eu e sua mãe éramos velhos amigos… Foi realmente uma pena o que houve com ela, não acha? Bom, por enquanto isso é tudo. Estou ansioso para sua chegada, até logo… Hadria Lenox.”
Arregalo os olhos ao ouvir a última palavra.
O holograma então desaparece.
— Como ele sabe disso?
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