Capítulo 2 - Chefe Seis Estrelas (Parte I)
Madrugada de 1° de março de 5997 d.E, Condado de Niewald, Império de Hunterburg.
Era uma noite escura, a estrada deserta mergulhada em um silêncio absoluto. As cinco luas de Testfeld permaneciam ocultas atrás de nuvens densas e carregadas. No alto de uma colina, destacava-se uma construção antiga e decadente: uma pousada de beira de estrada, abandonada há muitos anos. Porém, ela havia recebido visitantes mais cedo naquele dia.
O saguão principal era o epicentro de um massacre. Corpos estavam amontoados em um cenário grotesco, e uma mancha de sangue, espessa e irregular, se espalhava pela escadaria principal, e ia até a porta de entrada.
Entre os mortos, havia um único sobrevivente. Ele gemia fracamente, sentado no chão, com o ombro atravessado por uma espada que o prendia à parede. O ferimento era profundo, e o sangue pingava em uma poça sobre os pés do jovem. Seus olhos estavam vidrados, e sua visão, turva, oscilava entre a consciência e o desmaio iminente.
Acima, empoleirada em uma das vigas do teto, uma enorme águia o observava. A ave de penugem negra permanecia imóvel, o bico sujo de sangue humano. Com dificuldade, o sobrevivente forçou sua visão a se concentrar em uma figura à sua frente, mal iluminada pela luz vacilante de uma única vela no balcão. A silhueta era de um homem de costas, parado em completo silêncio. Ele mantinha uma mão no ouvido, a atenção voltada para um aparelho em sua mão que lembrava um rádio.
— Já chegou a Embach? — perguntou o homem, o aparelho firme no ouvido. — Não se preocupe, foi só um pequeno imprevisto, apenas um grupo de heróis que cruzei no caminho.
Ele fez uma pausa, como se escutasse o outro lado falar alguma coisa importante. E então continuou:
— Tentei interrogá-los, mas não consegui nada de útil. São heróis de nível baixo, não devem saber sobre o cofre celestial…
Outro silêncio se seguiu, e o homem balançou a cabeça levemente, como se concordasse com as instruções recebidas.
— Ótimo. Te vejo amanhã. — Ele desligou o aparelho com um movimento tranquilo, guardando-o no interior do casaco sem pressa.
Caminhou até o herói caído, o barulho de passos se misturado com os soluços e gemidos. As solas de seus sapatos deixavam marcas de sangue no assoalho empoeirado. Ajoelhou-se na frente do jovem, e em um movimento rápido, puxou uma pequena adaga de um dos bolsos. Sem hesitar, a posicionou contra a garganta do jovem ferido.
— Vamos lá, uma última vez… — disse, a voz fria e séria. — Onde está o rubi?
— Eu… eu… não sei do que você está falando… — gaguejou o jovem, as mãos trêmulas de medo, a voz fraca devido à perda de sangue.
O homem permaneceu em silêncio por alguns segundos, os olhos fixos nos do jovem. E com um olhar de tristeza e decepção, ele o encarou uma última vez. Antes de, finalmente, suspirar e falar com um certo peso na voz:
— Então você não tem utilidade para mim…
Sem hesitar, ele terminou o sofrimento do jovem com um único movimento certeiro. Ao se levantar, limpou o sangue da lâmina na manga do uniforme do herói caído, sem demonstrar qualquer emoção.
— Um outro grupo se aproxima… — alertou a ave, sua voz rouca e grave.
— Eu já percebi, Mávros. Fique atento. Não quero outra luta esta noite. — respondeu o homem, com frieza, ao remover sua espada cravada na parede, deixando o corpo duro cair no chão.
Ele caminhou até a porta, e a luz da vela iluminou parcialmente seu rosto à medida que ele aproximava. Era Herman Krieger. Seu cabelo escuro estava impecavelmente penteado, o bigode alinhado com perfeição. Seu uniforme negro do “Exército de Libertação” parecia intocado, exceto pelos sapatos manchados de sangue.
Ele estalou os dedos, e uma mensagem holográfica brilhou no ar diante dele.
[Ocultar Cadáver – X]
(Habilidade Exclusiva de Nível 90 – Classe: Assassino)
No instante em que as palavras se materializaram no ar, os cadáveres, o sangue e até os fragmentos de tecido rasgado começaram a se desintegrar em partículas minúsculas. Em um piscar de olhos, o saguão estava completamente limpo, como se nada houvesse acontecido ali. Até mesmo os sapatos de Herman, antes manchados de vermelho, estavam agora impecavelmente polidos. Não restava nenhum vestígio do massacre.
Herman apagou a vela solitária com um simples toque de seus dedos, e deixou a velha hospedaria mergulhar na sua habitual completa escuridão. Sem pressa, abriu a porta, e a madeira rangeu suavemente enquanto ele a empurrava. Ao sair da pousada abandonada, começou a descer a colina em direção à estrada sinuosa mais abaixo. A águia, empoleirada no teto, logo saiu por uma janela aberta no teto, e desapareceu no horizonte.
Levantou o olhar para o céu, onde as nuvens, antes densas e impenetráveis, começaram a se dissipar lentamente. Um suave raio de luar emergiu por entre os espaços abertos, e o caminho foi iluminado. Era Phyraxis, o primeiro dos cinco satélites naturais de Testfeld, que pela primeira vez naquela madrugada lançava sua luz pálida sobre o planeta.
Conforme caminhava pela estrada vazia, o som dos próprios passos e dos murmúrios distantes da fauna noturna eram as únicas companhias que ele tinha. Mas, ao avançar, um som distinto começou a surgir no horizonte, rompendo o silêncio. O rítmico trotar de cavalos ressoava ao longe, cada vez mais claro e próximo.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.