— Se tiver algum problema, me contate.

    Kyle acenou com a cabeça, confirmando e logo passou pela porta de madeira rústica, que rangia um pouco nas dobradiças enferrujadas.

    — É hora de fechar isso — sussurrou Cole.

    Ele deu uma boa olhada ao redor, seus olhos vermelhos percorreram cada canto daquele lugar isolado.

    A cabana ficava no meio de prédios antigos, cercada por árvores altas e escuras, com troncos grossos cobertos de musgo.

    O vento soprava leve, balançando as folhas e trazendo um cheiro de terra molhada.

    Cole queria ter certeza de que não havia ninguém escondido a espreita, só então ele fechou a porta com um empurrão forte.

    De repente, a cabana inteira, com suas paredes de toras mal alinhadas e telhado torto, começou a tremer.

    Diante dos olhos de Cole, tudo se distorceu, como se a realidade estivesse sendo sugada.

    Um buraco negro se abriu bem onde a cabana estava, engolindo a construção inteira em poucos segundos. Depois não sobrou nada além de um pedaço de terra vazia, como se a cabana nunca tivesse existido.

    ⧖⧗

    Horas antes

    Jaro nem teve tempo de terminar o que ia dizer. Antes que a última palavra saísse da boca dele, uma luz amarela, brilhante como o sol do meio-dia, começou a sair da mão de Raizen.

    Era uma energia quente e palpável, que foi direto no peito do garoto. Jaro gritou, cheio de dor, enquanto seu corpo magro se contorcia.

    Foram cinco minutos que pareceram uma eternidade. Ele sentia como se milhares de agulhas finas estivessem perfurando cada pedacinho da sua pele, especialmente no peito, onde a luz parecia queimar mais forte.

    O rosto dele, pálido, estava retorcido e seus olhos vermelhos como sangue, arregalados de agonia. O cabelo curto e bagunçado, negro, grudava na testa por causa do suor.

    Raizen, observava tudo com atenção. O corpo desse menino é monstruoso! Pensava ele, enquanto gotas de suor escorriam da sua testa larga e pingavam no chão de madeira polido da mansão.

    Ele estava concentrado e exausto. Até que, finalmente, a luz amarela sumiu, e Raizen abaixou a mão, respirando fundo.

    — Terminei.

    Nesse exato momento, as pernas de Jaro cederam, e ele desmaiou. Antes que o garoto batesse no chão, Lila, com seus cabelos pretos presos num rabo de cavalo bem firme, se jogou para frente e o segurou nos braços.

    — O que você fez com ele?! — perguntou Lila, gritando, mas ao notar o olhar assustado do balconista, ela respirou fundo e tentou se controlar.

    — Fiz o de sempre — respondeu Raizen, ainda ofegante. — Só implantei a runa no peito dele pro registro. Mas a mana dele… ela tava lutando contra mim, me impedindo de terminar.

    — E o que isso quer dizer? — Lila franziu a testa, confusa, segurando Jaro com mais força.

    Raizen, saiu de trás do balcão onde trabalhava. Era um móvel velho, cheio de arranhões e manchas escuras, que ficava no canto da mansão, ele se aproximou de Lila e do garoto, seus passos ecoavam no chão de madeira.

    — Não sei ao certo — admitiu ele, coçando a barba rala no queixo. — Você já deve ter percebido que ele não tem muita mana, né? Mas, a maneira que o corpo dele circula mana é anormal, ouso dizer que até melhor que um aprendiz de primeiro grau.

    Será que ele tá ocultando o poder mágico dele? Não, isso não faz sentido nenhum. Pensou Raizen, intrigado.

    Isso porque guerreiros com alta mana possuem um controle absurdo sobre ela, e podem oculta-las.

    E mesmo inconscientes, guerreiros com grandes poderes mágicos, dificilmente seriam envenenandos ou sequer seria possível implantar uma runa em seus corpos.

    — É só uma ideia, mas… que tal a gente dar uma olhada na identidade dele? — sugeriu o balconista, os olhos brilhando de curiosidade.

    Lila hesitou. — Você esqueceu que só os superiores podem ver isso?

    Raizen deu um sorriso torto, mostrando os dentes brancos.

    — Eu tô preso dentro dessa mansão há 20 anos, Lila. O que importa ficar mais um tempo aqui?

    — Faça o que quiser… — murmurou Lila, por fim. Ela estava tão curiosa quanto ele, mesmo tentando disfarçar.

    Raizen assentiu e colocou a mão de novo perto do peito de Jaro. A mesma luz amarela apareceu, mas agora mais fraca, tocando a pele pálida do garoto. De repente, um painel meio transparente surgiu no ar diante deles, como uma janela flutuante, exibindo algumas informações em letras brilhantes:

    ──────────────
    Sistema Moong

    ∴: Codinome: 102

    ∴: Idade: 14 anos

    ∴: Mana: >58<

    ∴: Hierarquia: ?

    ∴: Classe: Guerreiro Secundário
    ──────────────

    — Agora eu entendi por que te colocaram pra cuidar dele… — comentou Raizen, impressionado.

    Lila ficou de boca aberta. Quando Kao, o contratante dela, disse que precisava de alguém pra cuidar de um menino, ela achou que era brincadeira. Mas ele insistiu, falando que o garoto tinha talento, e até jogou uma moeda de ouro brilhante na mão dela. Na hora, ela ficou chocada era o mesmo pagamento que recebia pra proteger gente importante, como nobres ou mercadores ricos.

    — Tem certeza que essa runa tá funcionando direito? — perguntou ela, ainda desconfiada. Mas, ao mesmo tempo, isso explicava como Jaro tinha conseguido sair do Distrito Verde, uma área mais simples e segura, e chegar ao Distrito Azul, um lugar muito mais perigoso.

    Raizen franziu a testa, ofendido. — Claro que tá funcionando. Fui eu que criei e configurei essa runa. Você sabe que eu não erro quando o assunto é isso.

    O que deixou os dois realmente assustados foi que o nível de mana dele, 58, era só um pouco acima da média pra idade dele. Mesmo assim, o controle que ele tinha era absurdo! E mais, esse nível de mana era muito baixo pra alguém sobreviver no Distrito Azul, um lugar cheio de conflitos.

    — Bom… — Lila se levantou, ainda segurando Jaro nos braços. O garoto parecia leve como uma pluma, mesmo desmaiado. Ela pegou algumas moedas de prata no bolso da calça e jogou pra Raizen. — Obrigada pelo trabalho. E espero que nenhuma informação saia daqui.

    — Claro — respondeu Raizen, pegando as moedas no ar com um movimento rápido. — O que meus clientes me contam morre comigo.

    Lila virou as costas e saiu da sala como se fosse levada pelo vento, carregando Jaro com ela. Raizen, por sua vez, voltou pra poltrona estofada atrás do balcão, um móvel velho com o tecido rasgado nas bordas. Ele pegou um livro grosso, de capa de couro marrom, e murmurou pra si mesmo: — Acho que os ventos vão mudar no Distrito Azul…

    ⧖⧗

    — U-u-au! Q-q-que lugar é esse?! — falou um garoto magrelo, com cabelo castanho cortado bem reto, tipo uma tigela mal feita na cabeça.

    — Que incrível! É aqui que a gente vai treinar?! — comentou outro, um menino mais encorpado, com cabelo preto penteado pra cima num topete exagerado e cara de valentão.

    O grupo de adolescentes e crianças, estava diante de uma cena impressionante. Eles olhavam para grandes construções que pareciam prédios, mas com um toque futurista, fachadas lisas de concreto misturadas com detalhes rústicos de pedras antigas. As estruturas eram altas, algumas tão altas como torres que subiam até quase tocar o teto da caverna onde estavam.

    Quando olharam mais ao redor, perceberam que estavam numa base subterrânea. As paredes da caverna eram irregulares, com veios de minerais brilhando, e o chão era coberto por um piso liso de pedra polida.

    Acima deles, o teto se abria em um buraco enorme, deixando entrar a luz do sol, que iluminava nuvens brancas e pedaços de uma floresta verdejante lá em cima.

    Eles também entenderam, aos poucos, que a porta por onde tinham passado não era uma simples entrada. Era um portal.

    — Lixos! Olhem bem pra isso tudo e guardem na memória, porque vocês nunca vão esquecer essa visão! — exclamou o professor com um sorriso convencido estampado no rosto. — Esse aqui é o salão de treinamento e também a base de inteligência do distrito azul!

    Kyle viu que jovens estavam supresos, e os olhos arregalados de espanto, e isso só fez ele inflar ainda mais o peito, orgulhoso. Ele começou a andar.

    — Vamos logo, que hoje não temos muito tempo. Me sigam — disse ele, virando o rosto pra trás pra encarar o grupo. — E não me arrumem problema, entenderam?

    Todos engoliram em seco. Pra eles, Kyle era como um monstro saído de um pesadelo, musculoso, ombros largos e uma presença que parecia engolir a tranquilidade. Ninguém queria testar a paciência dele.

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