Dhaha já conseguia ver seus ossos esmagados por aquelas mãos gigantes, a sombra do colosso escondeu o céu nublado e escureceu sua visão. 

    Memórias o acertaram como pequenos cacos de vidro, Dhaha estava vendo sua vida passar diante dos olhos.

    Antes que o grande amontoado de ossos tocasse o chão, um clarão cruzou o chão. O som estridente do metal atingiu seus ouvidos e o trouxe para a realidade.

    “O que…?”, sua mente estava confusa, e seus olhos ardiam com tamanha luz.

    — Você está bem, herói? — disse Mirena, estendendo o outro braço.

    Não era apenas sua amiga que estava diante de seus olhos, era uma heroína. O tipo de heroi que ele queria ser.

    Ele não teve outra escolha a não ser engolir as palavras de antes, a realidade o acertou como uma martelada no estômago. Mirena não precisava ser protegida.

    — Melhor impossível. — Forçou um sorriso.

    — Estou vendo, parece que um carro te atingiu, e ele gostou tanto que passou de novo.

    Ela ergueu o amigo. O corpo de Dhaha estava pesado e lento.

    — Imaginação sua. — O douradiano alongou os braços e pernas o mais rápido que pode. — Mas então, qual o plano?

    Se viraram para o monstro, agora recuperado. Se movia lentamente, mas cada movimento era capaz de causar tremores.

    — Ele é grande, né? — Mirena começou.

    — Um dos maiores que já vi.

    — Eu não tenho certeza do que faremos. Ainda não consegui encontrar uma fraqueza, e não temos tempo para apenas fazer picadinho dele.

    — E nem energia pra isso.

    Dhaha deu uma rápida olhada pelo monstro, reavaliando o caminho que fez antes

    — Ele ficou bilu tetéia quando eu cheguei perto do cangote, talvez seja a fraqueza — concluiu ele.

    — Bilu… o que? Enfim, então se cortarmos a cabeça… isso acaba?

    — É… acho que sim?

    — Bom, se der errado, é bater até cair… [Caleidogênese]! — O braço se moldou novamente, agora na forma de um machado de batalha.

    — Até que aprendeu rápido… [Metalóxis]! — Dhaha fez o mesmo, ambos com machados de batalha em mãos.

    — Um ataca…

    — E o outro ataca mais!

    Ambos arrancaram na direção do monstro, como duas bolas de fogo. Atingiram a perna direita, Dhaha golpeando por baixo, com um corte horizontal, e Mirena por cima, com um corte vertical.

    O monstro urrou, seus joelhos cederam e tocaram o solo. O soco veio logo em seguida, mas nenhum dos dois estava lá mais.

    Com um salto para trás, escaparam do golpe, e com um para frente, se impulsionaram pela mão sem dedos do colosso. 

    Cortavam a ulna da criatura com suas armas estendidas para os lados, Dhaha pela esquerda e Mirena pela direita, como se houvesse um espelho entre os dois.

    Escalaram até o úmero da coisa, outra mão tentou atingi-los, mas saltaram para as costelas. O monstro soltou um grito ao golpear o próprio braço:

    — Ai meu Rock!!!

    — Ele é mais burro do que parece! — gritou Dhaha saltando de uma costela para a outra.

    Seu machado se moldou em um martelo e golpeou um dos ossos titânicos. Mirena veio logo em seguida, seu martelo golpeou por baixo daquele osso. Com os dois acertos, a costela voou para o meio da floresta.

    Subiram para o ombro, saltando, abaixando, correndo, agiam como se soubessem exatamente o que o outro faria, como uma dupla de dançarinos. Cada movimento que Dhaha ameaçava fazer, Mirena copiava como se já tivesse o repetido dezenas de vezes

    O monstro girou, lançando os dois em pleno ar. Sua mão agora cobria o mesmo ombro, a coisa respirava ofegante, mesmo sem pulmões.

    — Eu sou do Rock!!!

    O brilho branco cobriu os céus. Um grande machado fincou no outro ombro do monstro, preso a uma corda de metal. 

    — Vamos! — gritou Mirena. Voando como pássaros alvos, os dois se impulsionaram com a corda e retornaram para o topo do monstro.

    Suas armas rapidamente se remodelaram em pares de espadas, executando cortes em sincronia.

    Quando Dhaha golpeava na vertical, Mirena ia pela horizontal. Quando golpeava para cima, Mirena mirava para baixo. Encaixaram as armas na junta da criatura, e com uma mudança repentina de forma e uma explosão, romperam o ligamento do ombro com o torso do titã.

    O ar vibrou com o grito do monstro. Sem o balanço dos dois braços, o esqueleto tombou para o lado, seu crânio atingindo o chão.

    Moveu a mão descontroladamente, tentando afastá-los de si. Os dois aproveitaram a queda para irem ao pescoço, desviando dos golpes antiaéreos.

    Usaram o braço que restava para deslizarem, pendurados lado a lado pelas espadas. Pousando sobre o pescoço, a criatura os golpeou de cima, mas afastaram a defesa do inimigo com o golpe de dois martelos.

    — [Metalóxis]!

    — [Caleidogênese]!

    Com a criação de duas montantes, ambos subiram o crânio do monstro e se jogaram na direção do pescoço.

    A última coisa que a criatura pode ouvir foi o quebrar de seus ossos, seu crânio despencou no chão como uma rocha imensa. Seu braço já não lutava mais, estava estendido pelo chão, não demorou para que o corpo da criatura começasse a se desfazer, restando apenas poeira de ossos e o brilho tênue do carma.

    Quando a adrenalina acabou, a mulher sentou no chão exausta, seu braço de volta ao normal.

    Dhaha deitou no chão, ao lado da amiga, e não demorou até adormecer. Seus membros estavam rígidos, seu ombro parecia ainda mais lesionado.

    — Eu não acredito que vou ter que carregar ele de novo… — sussurrou a garota, com a mão no rosto. Seus olhos pararam na floresta. — Não, melhor esperar ele acordar. Roger não deve conseguir andar…

    Ela se levantou e caminhou para a cratera que antes era o lago, o desabamento levou toda a água para o subsolo.

    — Será que ainda consigo salvar algo…?

    Começou descendo pela escada improvisada de antes, cuidando para a exaustão não derrubá-la. A maior parte da gruta estava inundada, pouca coisa havia restado.

    Vasculhou abaixo das pedras, as gotas de chuva tornavam mais fácil de movê-las. Encontrou espadas tortas e empoeiradas, armaduras amassadas, e algo que fez seu estômago revirar e a culpa atingi-la com um martelo: O que restou de seus companheiros.

    Alguns dos cadáveres escaparam da inundação, mas já estavam desfigurados pelo combate. Tudo que podia fazer era prestar algumas rezas para Lebkraut, o Deus da Vida.

    Preferiu não olhar muito para os cadáveres, continuou caminhando entre as pedras nutrindo a esperança de encontrar algo.

    E essa esperança foi atendida, mas não como ela queria: um pequeno laço vermelho preso a um pedaço de tecido rosa, tudo que restou da neta do comerciante.

    Mirena fechou os olhos em luto, seu coração batia lentamente. Tentou rezar, mas as palavras se enrolaram na garganta. Ergueu a cabeça, pegou alguns pertences e subiu a caverna.

    A chuva caia, mas parecia muito lenta. Tudo parecia lento, como se o tempo tivesse parado ao redor da ardenteriana.

    Caminhou até a floresta, encontrou Roger deitado na mesma árvore que tinha sido deixado. Seus olhos estavam sem cor, nem pareciam vivos.

    Levantou o amigo, apoiando seu braço no ombro, e o levou até perto de Dhaha. As gotas de chuva atingiram o rosto como balas, a água pesava em suas costas. Encarava o céu, mas seus olhos estavam em outro mundo.

    Eles não venceram, apenas sobreviveram, e a guerra estava apenas começando.

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