Capítulo 05 - Talento Monstruoso

“Sim.”

“…”

“O queaaaaaa? Achei que tinha ouvido errado.” Grallu vibrou silenciosamente, a descrença gradualmente se espalhou por seu rosto.

“Eu disse sim.” Ikaris reiterou com uma atitude descontraída. Ele nunca teve a intenção de desistir.

Na Terra, ele era um prodígio como nenhum outro. Ele sempre aprendeu rápido e naturalmente se voltou para a invenção e a pesquisa quando cresceu. Era uma daquelas pessoas que tinha sucesso em tudo o que empreendia se colocasse seu coração e alma nisso.

De qualquer forma, viver como um idoso tinha pouco apelo para ele neste momento. Mesmo a xamã sem talento com meios e conhecimento limitados conseguiu viver por 46 anos. Ela alegou que os outros aldeões não viveriam muito mais do que ela por causa de sua centelha, mas seria esse o único motivo?

As frequentes doações de sangue, sua nutrição deficiente, sua higiene questionável e ambiente insalubre, seus equipamentos e instalações médicas inexistentes… Se incluíssemos todos os outros fatores, poderíamos pintar um quadro muito diferente.

Além disso, a xamã realmente dedicou toda a sua energia para resistir à radiação de sua Centelha Divina como ela afirmava? No mínimo, estava usando sua magia todas as manhãs para transmitir o idioma local aos outros mundos capturados.

Malia ficou igualmente atordoada, mas por dentro não pôde deixar de sentir pena do adolescente. Quando percebesse a dificuldade, ele seria capaz de manter a mesma expressão obstinada?

“E-eu também quero aprender magia!” Uma voz aguda de repente gaguejou ao lado deles.

Virando a cabeça, Ikaris viu a menina chorando de joelhos, as mãos entrelaçadas em súplica. Aparentemente, ela estava acordada há algum tempo.

Seu peito estava espremido pelos cotovelos dobrados, fazendo o menino perceber de repente que ele também estava nu desde o início da discussão. Percebendo que estava sentado de pernas cruzadas desajeitadamente na frente de Malia e Grallu, sentiu-se envergonhado e cerrou os dentes para abafar o sentimento de humilhação.

“P-por favor! Vou estudar muito! Pode não parecer, mas tenho as melhores notas da minha classe na universidade.” A jovem choramingou.

Ikaris lembrou que o nome dela era Ellie, ele tinha ouvido no dia anterior durante o ritual. Ela era muito bonita, uma loira adorável como ela poderia encontrar em qualquer lugar na Europa ou nos Estados Unidos, mas não tão bonita a ponto de virar a cabeça de qualquer homem. O que tinha a seu favor era sua fofura e uma mistura de vulnerabilidade e inocência que deixava os homens ansiosos para protegê-la. Muitos homens eram receptivos a essas características.

Mas não Ikaris. Este tipo de pessoas eram as mais inseguras e facilmente influenciáveis, as que dependiam dos outros para subsistir, mas também as mais propensas a trair os outros e os seus próprios valores quando o medo superava a razão e a dignidade. Neste planeta hostil, ela era apenas um fardo.

Malia e Grallu a avaliaram com um olhar semicerrado e ligeiramente desdenhoso, mas finalmente a xamã assentiu e repetiu o que havia dito ao adolescente.

“E-eu ainda quero aprender magia.” Ela declarou com uma leve hesitação no início, mas com mais firmeza no final.

A raiz de sua determinação não era tão pura quanto a de Ikaris. O horror da noite anterior simplesmente a aterrorizara. Ela nunca mais quis experimentar tal desamparo. É claro que Ikaris compartilhava desse sentimento, mas era o potencial ilimitado da magia que o atraía mais do que o poder que poderia vir com ela.

Vendo que ambos os sobreviventes da noite passada não mudariam de ideia, a velha xamã rosnou:

“Muito bem. Vamos começar então. O primeiro passo é alcançar a sua Centelha. Feche os olhos, inspire e expire lentamente, concentre-se na respiração e, quando estiver livre de distrações, volte o olhar para o seu mundo interior e tente sentir essa presença chamando por você e deixe esse sentimento crescer. Se você não sentir nada, então-“

“Feito.” Ikaris disse, seus olhos ainda bem abertos.

“O que?!” A velha gritou em estado de choque, evitando por pouco um ataque cardíaco.

Malia estava mais calma, mas ficou claro em seus lábios cerrados que ela também não acreditava. Ellie de repente sentiu que estava ficando para trás e, por espírito competitivo, fechou os olhos e se concentrou como nunca antes enquanto tentava encontrar sua própria Centelha.

“Você tem certeza sobre o que acabou de dizer?” Malia verificou friamente. “Se você está mentindo, descobriremos facilmente.”

“Eu não tenho razão para mentir.” Ikaris balançou a cabeça. “Não sei se minha centelha é considerada grande ou pequeno, mas mesmo que eu não possa vê-lo quando fecho meus olhos, ela monopoliza minha atenção, não importa o que eu faça, ela rouba minha atenção contra minha vontade. Assim que eu me concentro nela, ela cresce rapidamente e perco a noção do tempo. Me sinto absorvido por ela.”

“Você…” O rosto de Grallu estava lívido como se ela tivesse acabado de ver um fantasma.

Malia era menos óbvia, mas estava igualmente abalada. Agora mesmo, ela não resistiu em usar sua própria Centelha Divina para se certificar de que ele não estava mentindo. Logo um brilho estranho passou por trás de suas pupilas, quase como se ela tivesse acabado de pensar em algo.

Finalmente, depois de se orientar, a xamã disse com uma voz rouca:

“Se você está dizendo a verdade, descobriremos muito em breve se sua Centelha é grande ou pequena depois que você lançar um feitiço. Vamos esperar um pouco primeiro para dar a Ellie uma chance de nos impressionar também.”

No final, a pequena loira também os surpreendeu. Cerca de 30 minutos depois, mantendo os olhos fechados, ela anunciou:

“Eu posso sentir!”

Grallu mostrou uma leve descrença, mas um sorriso encantado… e desdentado iluminou seu rosto logo em seguida. Malia também ficou maravilhada. O talento de Ellie era bastante decente.

Deve-se saber que na aldeia havia adultos que perderam anos antes de poderem lançar um feitiço corretamente. Sua atenção inicial e habilidades de foco eram muito medíocres.

“Bom! Agora, você lançará um feitiço muito simples que é comumente chamado de Véu Negro. O objetivo é muito simples, basta desejar substituir o que o alvo de sua escolha vê por preto, como se você tivesse colocado uma venda em seus olhos. A experiência provou que este é um feitiço que custa quase nenhuma resistência e é relativamente seguro.”

“E o mais importante, não deseje que tudo fique preto em uma determinada área ou no seu nível você morrerá.” Malia os avisou. “Intenção é importante. Se sua Centelha interpreta seu desejo como tudo que a pessoa vê deve ficar preto, pode ser literalmente entendido como qualquer coisa no campo de visão dessa pessoa se tornará um objeto preto para sempre, semelhante a derramar uma lata de tinta preta permanente em eles. Sempre tenha em mente, pelo menos inconscientemente, uma ideia de quanto tempo seu feitiço deve durar ou você morrerá. Como regra, evite desejos absolutos como ‘eu quero ser forte’ e, em vez disso, prefira ‘eu quero ser mais forte’ ou ‘eu gostaria de me tornar mais forte’.”

Os conselhos da chefe da aldeia foram sensatos e Ellie agradeceu profusamente ou ela certamente teria cometido um desses erros. Quanto a Ikaris, ele assentiu baixinho, mas já havia chegado a essa conclusão depois de seus dois apagões no dia anterior.

Se ele tivesse formulado o desejo de curar instantaneamente todas as suas feridas, teria morrido. Sem perceber, ele apenas esperava se curar mais rápido e sentir um pouco menos de dor, já que sua mente racional sabia que uma recuperação instantânea era impossível.

“Existem fatores que podem melhorar as chances de sucesso e eficácia do feitiço?” Ikaris perguntou antes de tentar lançar este Véu Negro. “Você mencionou carga emocional e imaginação anteriormente.”

Grallu e Malia trocaram outro olhar, ambas lendo o próprio espanto nos olhos do outro.

“Imaginação e compreensão são importantes.” A xamã explicou pacientemente, começando a perceber que ela não estava olhando para um menino comum. “Se você puder imaginar este Véu Negro claramente, o feitiço será mais poderoso e fiel às suas expectativas. Quanto à carga emocional, emoções, sentimentos e humores também afetam o poder de seus feitiços. Raiva forte, serenidade feliz, desejo apaixonado, ou medo avassalador podem multiplicar o poder de seus feitiços no momento certo.”

“OK, eu vou tentar.” Ikaris assentiu.

Ele fechou os olhos, deixando suas pálpebras fornecerem a escuridão de que precisava para imaginar este Véu Negro e seu alvo. Uma imagem clara de Malia perdendo a visão apareceu em sua mente. Então, três segundos depois, ele voltou sua atenção para sua Centelha, cuja presença ele podia sentir o tempo todo e sussurrou:

“Estou pronto. Quem devo mirar?”

Grallu e Malia começaram a ficar insensíveis ao seu talento monstruoso e a velha xamã simplesmente respondeu:

“Me teste.”

“Véu N-“

Baque.

Ikaris imediatamente caiu de cara no chão, suas pernas bambas falharam momentaneamente em carregá-lo. Ele imediatamente encerrou o feitiço para evitar consequências mais graves. Deitado de bruços no chão e ainda incapaz de se mover, ele perguntou com preocupação,

“O feitiço funcionou?

” … “

As duas mulheres ficaram em silêncio, mas medo e esperança simultaneamente encheram o rosto da xamã. Por meio segundo, ela perdeu a visão, como se uma venda grossa tivesse sido amarrada sobre seus olhos. Malia entendeu imediatamente o que havia acontecido ao ver a reação da velha.

‘Que mente monstruosa…’

Então era isso que eles chamavam de talento. Eles não tinham o conceito de QI nesta tribo remota, mas Grallu sabia que sua inteligência inata provavelmente era extraordinária. Ele não pertencia a este lugar.

Infelizmente, algo mais também havia sido confirmado.

Sua Centelha Divina era minúscula.