Índice de Capítulo

    Duas presenças pairavam frente a frente. O ar pareceu mais pesado, e o clima ameno, estava se tornado um início de uma nova guerra. Os dois combatentes tinham espadas de madeiras a suas disposições.

    De um lado…

    Kim Umbral, o cavaleiro da casa Kuokoa.

    E do outro…

    Guto Uma, o cavaleiro em treinamento de Insurgia.

    Ambos são cascas destinadas a evoluir em prol de seus respectivos objetivos. Um ser o melhor dos cavaleiros, mesmo que sua preguiça o atrapalhasse, e o outro, ser forte o bastante para proteger seu senhor e seus companheiros.

    O ar que parecia pesado, trazia lembranças de um tempo que um dia existiu. Kim, notou como o chão de areia era familiar com o dia que perdeu seus companheiros, e agora, novamente em Insurgia, estava diante a um oponente.

    Tal oponente deveria ter uma grande habilidade, tal que era treinado por 3 pessoas que não teve a menor das chances, estava tenso, mas calmo, firme, mas tranquilo. A arte da espada deveria ser a arte das artes, o mundo dos deuses.

    Para Guto, Kim não era apenas um obstaculo, ele viu no filho do rei, algo que necessitava superar, a velocidade em que evoluíra em instantes provava que era alguém que tinha tanto talento quanto ele.

    Guto, era considerado o com maior potencial dos cavaleiros em treino, e até em comparação com os cavaleiros já aprovados, ele superava muito todos, porém, ainda era imaturo demais. Talvez pela sua preguiça, ou por sua própria falta de motivação, mas isso era irrelevante agora.

    Neste momento, estava com uma chama acessa no peito. Um desejo intenso de superar algo novo, e isso, a chama da juventude, gritava no seu âmago.

    Ambos cascas destinadas a evoluir. Ambos motivados a superar o que estava a sua frente. Ambos estavam prontos para superar a sua próxima barreira, ambos estavam apostos.

    POW!

    Um tiro, foi o que trouxe o começo do combate.

    ✡︎—————✡︎—————✡︎

    — Kizimu, você acha que Kim vai ficar bem? Ele não conseguiu vencer nenhuma das lutas… ele pode ficar desmotivado e isso pode atrapalhar ele.

    Pandora estava ansiosa, ela não queria ver seu amigo voltar com sua psique destruída, mas Kizimu não pareceu estar ansioso, e sim, assistia com orgulho.

    — Não, dessa vez não. Eu posso sentir, tudo que ele sofreu até agora, ele absorveu. Kim, passou sua vida treinando, toda noite. Agora, ele está usando o resultado de seus treinos.

    — Mas….

    — Você pode não ter entendido as primeiras lutas, mas, Kim conseguiu se proteger de ataques muito velozes, a primeira, especializada em combate corpo-a-corpo, Kim conseguiu de proteger da maioria de seus golpes, mas, sua resistência não permitiu continuar.

    Pandora refletiu um pouco sobre o que Kizimu disse, e pareceu compreender.

    — Então, foi porque a luta demorou muito…

    — E por que ela era muito forte, são diversos fatores.

    Refletindo mais sobre as lutas, Pandora notou algo.

    — A segunda luta… Amara usou um truque. A gente não sabe se Kim não conseguiria lidar com ela em um combate corpo a corpo, mas ele não conhecia sua arma.

    — Exatamente, você compreendeu as duas lutas agora. Essas primeiras derrotas, foram fatores indesejados, que o deixou em desvantagem, Kim, ainda assim, conseguiu se manter nas duas, mesmo que por pouco tempo.

    Kizimu dizia, com ênfase, um orgulho próprio, como o seu senhor — mais do que isso — como um amigo.

    — Entendo…

    — Ernesto não foi uma luta, foi uma aula, ele ensinou tudo que Kim não compreendia, como um perfeito professor. Seus ataques, sempre tão perfeitos, provava que ele não mostrou metade do que era capaz.

    — Você acha?

    — Eu tenho certeza.

    — Você acha que Kim pode vencer?

    Kizimu olhou no fundo dos olhos pretos de boneca de Pandora.

    — Eu sei… ele vai vencer.

    ✡︎—————✡︎—————✡︎

    O ar turvou.

    Dois ataques colidiram com uma brutalidade imensa. Guto tinha um jeitão de desleixado, mas sua espada não cedia nem por um instante. Kim tentou controlar a luta, mas, era em vão. Guto, como uma rocha, permaneceu onde começou, e o embate teve seu início.

    Um, dois, três.

    Golpes sequenciados traziam um significado singelo.

    Nove, doze, vinte.

    Diversos cortes se cruzavam e se contorciam. Kim tentava serpentear sua lâmina de madeira para quebrar a defensa impenetrável de Guto, porem, o garoto defendia tudo com vigor. A poeira dilatava, o chão tremia, e tudo a volta dos dois parecia se mover diante a troca incansável dos dois.

    Não era uma luta, era uma dança.

    Não era um confronto, era uma arte.

    O tempo parou para assistir aquele confronto tão digno, as duas faces, a pintura e o borrado se misturava, como água e óleo, e duas prioridades eram invertidas.

    A espada do louro moveu para tentar corromper a perna e a meio passo interrupto, a madeira ecoou dando um som oco diante a mente. Kim percebera que os movimentos do seu oponente eram repetidos, e com poucos movimentos poderia defender aqueles mais ousados de seus ataques.

    Kim, usando todo o potencial de seu corpo e Guto, um ser treinado para usar apenas o necessário. Ambos traziam uma intensidade eloquente, e a luta parecia estar apenas em seu começo.

    A força necessária para devastar em um golpe, nunca era o suficiente. Os padrões de Guto eram rítmicos, mas, nunca ultrapassáveis, independente do que Kim fizera. Se for uma batalha de vigor, Kim usava muito mais que Guto, em compensação, seus anos de treino o fazia ter uma energia fora do comum.

    Porém, Guto não dava para trás, ele não queria ficar em uma luta enrolada, e a todo momento esteve preso na defensiva, que mesmo, sem dificuldade, mostrava que o mesmo não poderia sair de sua casca.

    Ambos, insatisfeitos com suas técnicas, se adaptaram ao outro em instantes, e a luta, ganhou uma nova cor na pintura do quadro de guerra, a dança que enlouquecia a plateia.

    Guto era uma mancha em um quadro, algo seco e desconexo com tudo, mas que se olhasse com atenção, era uma cor distante que fazia sentido em todo aquela aquarela. Enquanto Kim era um vibrante, colorido e estremante bela pintura

    Óleo e água, os cortes que cruzavam tudo. Cada baque era uma mistura de tremor nos céus.

    Guto, saiu de sua casca, em uma estocada, a sequência estrema e veloz dos 9 ataques consecutivos, e dançantes movimentos, provava que a mancha se adaptara aquela aquarela.

    Mas, não dando para trás, Kim, se adaptou aos movimentos que aprendeu. Usou a casca impenetrável do próprio Guto para defender. Eles trocaram de agentes, onde, Guto agora era o atacante e Kim o defensor, mas algo parecia diferente.

    Enquanto Guto sempre tinha uma firmeza e um ar de quem tinha uma linha a sempre ser seguida, a barreira indefensável, não parecia mais ser indulgente e fixa, ela era caótica e imprevisível, como se cada ataque preciso e ritmo certo, fosse uma nova casca de defesa diferente.

    A luta tinha tido uma virada impressionante, porém se manteve na mesma, as habilidades dos garotos sempre contrastavam ao mesmo, e diante disso, Kim não poderia falhar, essa era a vez dele de tomar controle do jogo.

    Se o ataque viria certeiro e nunca falharia em seguir seu fluxo, a mancha na pintura não poderia cruzar seu ataque em nenhum local diferente da maré que sempre seguia, pois então, Kim, o tsunami que consome tudo, dançou diante ao inevitável e cruzou um ataque como uma águia

    Não seria mais uma defesa para um ataque, seria um ataque para um ataque, e aquele que tivesse o melhor ataque seria vitorioso.

    Mas Guto não era tão ingênuo ao ponto de falhar em tal momento

    Um tsunami só poderia ser defendido por outro, a postura de ataque, foi invertida e contrariada, uma nova posição, um contra-ataque, quebrando a maré do tsunami e refletindo tudo aos céus.

    O tempo ainda estava assistindo os dois lutando, que faziam tudo em velocidades cada vez maiores, saindo cada vez do fluxo humano, porém, dentro do limite do lógico.

    O corte de guto cruzou uma linha intangível e ultrapassou a forma da maré da insanidade de Kim, no mesmo instante a lamina de Kim voou ao ar.

    No momento em que um espadachim perde a lâmina, já poderia ser decretado o próprio fim, seria apenas esperar o corte final, mas para um guerreiro, era apenas um empecilho, e um, que Kim Umbral, havia previsto.

    Sua lamina foi retirada, da mesma maneira que Ernesto retirou momentos atrás, e Kim já havia visto como seria o próximo movimento. Começou a entender sobre o que significava lutar na teoria, não seria mais um livro, agora faria historia.

    No momento em que Guto fez o próximo movimento, o que definiria a luta, Kim usou a mesma quebra de guarda que Bellatrix usou em si, quebrando a guarda de Guto e desarmando o mesmo.

    Naquele instante, Kim não apenas desarmou o garoto que ficou pasmo, mas acertou uma joelhada.

    O instante seguinte não poderia ser previsto por ninguém ali.

    O momento seguinte foi uma trocação de golpes, ataque e defesa. Kim, usava o máximo de seu corpo e Guto também, ambos tentavam cada vez mais coisas novas, agarrões, chutes, socos, golpes de esquerdas e direitas, ganchos. Nada, era possível atingir o outro.

    Kim, usando a tática da defesa perfeita e do ataque imprevisível, e Guto, que se adaptara melhor que qualquer um, fazia quase como um espelho invertido, ambos eram igualitários em sua essência, mas opostos em sua forma de agir, eles eram iguais e totalmente diferentes, e essa mínima diferença era a prova.

    A prova que um vencedor seria definido naquela troca de golpes.

    Kim, controlou a distância, dando espaço a cada golpe. Já estava lendo os movimentos de Guto como se fosse os próprios, e agora tentava superar algo insuperável, quanto mais evoluia, mais Guto evoluia, ambos estavam diante da própria lacuna do que seria a palavra inabalável.

    Guto, começou a sentir um certo cansaço, ele era o que tinha menos vigor naquele momento, porém, Kim desde o começo já havia usado tudo de si, cansando aos poucos no mesmo grau.

    Os golpes que antes pareciam trovões e relâmpagos, se tornavam cada vez mais naturais, diretas, sem muitas loucuras e poucas chances de vencer.

    Kim, tentou usar tudo que estava ao seu alcance para vencer, mas não parecia ter nada que pudesse fazer. Guto era perfeito e qualquer forma de evoluir, e aquele garoto cansado, tinha uma forma para defender.

    Precisava fazer algo que nem mesmo o garoto poderia fazer…

    Mas foi tarde demais, Guto, acertou um golpe na barriga e um soco na cara, jogando Kim ao chão, longe de si. O mesmo, aproveitando a oportunidade, não poderia deixar o oponente recuperar, e correndo contra o garoto.

    Vrush!

    Um corte de madeira cruzou os ares, Guto esquivou no último instante.

    Kim, havia controlado a briga para onde queria, e levou ataques aonde foi planejado, caindo onde previu, e finalmente recuperando sua espada, ou melhor, a espada do oponente, a sua fora jogada muito distante, mas a de Guto, estava bem diante a eles, apenas, não existia brecha para pegar.

    O garoto loiro, agora com uma lâmina, correu e finalizou sua finta, onde um falso ataque, deu a ele, um corte direto ao peito, jogando Guto ao chão, e…

    ✡︎—————✡︎—————✡︎

    — Zuldo, você lutou muito bem.

    Kim acabara de acordar, estava com sua cabeça repousando sobre algo macio e muito delicado. Demorou instantes para que pudesse notar onde estava, e quando tentou levantar, uma dor aguda gritou e seu corpo enrijeceu e instantes.

    — Foi muito engraçado, assim que você venceu Guto, logo em seguida, você desmaiou. Se esforçou demais, bobo.

    Dalia tocou no seu nariz de maneira meiga.

    Kim, embrigado com a vergonha e dor, apenas pode ficar vermelho. Sua mente era uma névoa densa de cansaço, ele pensou demais na luta que teve há momentos atrás.

    — Onde estamos?

    Kim sentiu seu corpo ao chão. Seu próprio corpo encontra a suavidade irregular da terra viva. A grama, úmida e fresca, acaricia a pele como dedos gentis, flexíveis, que se moldam sob o peso. Pequenas flores pressionam-se contra a pele, macias como seda em miniatura, exalando um perfume leve, doce, quase tímido. Cada movimento afunda um pouco mais o corpo naquele leito natural, onde o calor do sol e a brisa fria se misturam, fazendo vibrar os sentidos. É como se o chão respirasse junto, acolhendo, envolvendo, lembrando que a natureza também sabe abraçar.

    — Eu poderia dizer que temo onde acho que estamos.

    — Sim… estamos no meu jardim de flores.

    — …

    Kim, que já estava cansado da luta, sentiu-se mais oprimido diante ao temor, seu medo, sua raiva, sua fraqueza e sua falha. Aquele campo, tão familiar, não merecia ter seu eu plantado como um velho amigo. Pois foi Kim Umbral, aquele que maculou aquelas flores anos atrás.

    — Lembra de quando eramos pequenos?

    — Como poderia me esquecer. Foi naquela época que me deu o apelido de Zuldo, era ridículo.

    — Mas eu achava genial… mas agora, você está tão maduro…

    Dalia tocava seu rosto gentil, como se apreciasse o quadro, a sua frente, a bela pintura — Kim Umbral — apenas poderia ser alvo de carícias e conforto. O mesmo, sofrendo uma amálgama de emoções, fechou seus olhos e sentiu o acariciar em seu cabelo.

    A garota bela, de grandes cabelos brancos que cintilavam ao vento, trazia ao mundo uma beleza que desbalanceava a realidade. Seus olhos verdes como esmeralda são como joias raras que não poderia ser perdido de maneira alguma. E sua voz… a doce voz de um anjo, daqueles que poderia abençoar sua vida.

    Aquela garota, agora, acariciava os cabelos loiros de Kim, deixando o mesmo descansar lentamente.

    — Acho que Zuldo morreu com aquele garoto chorão…

    A fala inesperada de Dalia, fez Kim despertar.

    — Dalia?

    — Acho que… você merece um novo apelido… para mostrar que você amadureceu.

    — Um novo apelido?

    Dalia colocou seu dedo indicador sobre seu beiço e começou a pensar, sua face reflexiva era tão bela. Kim que a observava de baixo estava embriagado, como alguém pode ser tão esbelta nesse mundo, era até injusto. Mesmo que só pudesse ver mais da metade de seu rosto, era como ver a lua.

    — Kim, esse campo, antigamente existiam Girassóis… mas depois do incidente, por muito tempo, a terra ficou infértil.

    — Desculpa…

    — Não tem do que se desculpar, a culpa não foi sua, além disso, eu melhorei muito minhas habilidades como jardineira… cuidar, plantar, e prover…

    — Você é perfeita.

    Dalia sorriu, um sorriso que deixava o coração de Kim quente, conforto divino, beleza estoica.

    — Depois de muito tempo, novas flores surgiram aqui. Calêndulas. No geral, simbolizam alegria, felicidade, saúde e proteção.

    Kim olhou a sua volta e observou belas flores amarelas, muitas, atraentes e encantadoras flores.

    — Kalén…

    — Kalén?

    — Kalén como uma representação de Calêndulas, mas também, significando “Principal” e “Essencial” já que você é a pessoa mais essencial da minha vida e o personagem principal da sua própria história.

    Kim admirou muito aquele novo apelido, era simples, mas, algo tão profundo, com tantos significados. O garoto de olhos azuis, límpidos como os céus, olhou nos olhos verdes esmeralda de Dalia.

    Ela era uma garota tão incrível, e especial. Apenas estar perto dela acalmava seu coração. Lembranças do passado vieram a tona, e um desejo puro percorreu cada célula de seu corpo. Não tinha certeza do que era aquilo, mas como cavaleiro, não recuaria, e lutaria até o fim.

    Um tocar tão sincero de olhares mostrava um amor que estavam guardando há muito tempo.

    Kim, fracamente, elevou seu corpo, indo até onde seu coração ordenava, e diante aos céus, fez aquilo que sempre desejou e agora, do fundo do coração vacilante, os seus lábios se tocaram.

    O calor do momento e a energia que passava pela sua carne. O desejo e a vontade de tomar ela para e si e ter toda sua essência até seu âmago. Queria ela, deseja ela, amava ela, e queria perder-se dentro de sua vida.

    Tudo para si era como um jorrar em sua alma, seu ser contaminava aos ares, toques que contaminavam seu ser. A língua dela rodava em sua língua, e cada vez mais, o toque ficava mais intenso.

    Esse era o amor que tinha por Dalia, aquela que significava tudo para ele.

    Os lábios se recusaram a se soltar, onde, as línguas dançaram jovens como eram. Ambos, hipnotizados pelo desejo, aproveitaram aquilo que sempre quiseram experimentar, mas não de qualquer um, deles mesmos.

    Um amor mutuo que estava preso em seus corações desde que eram crianças.

    Os corpos aos poucos se separaram, mas, como um ímã que se recusava a se soltar, parecia que eles queriam se prender para sempre. Não queriam se separar, já que estavam distantes há tanto tempo.

    — Dalia… eu te amo.

    — Kim… eu também te amo… meu querido Kalén, e para sempre meu frágil Zuldo.

    O garoto, belo como uma pintura, riu, um sorriso confortável que não sentia há muito tempo. Tudo parecia que estava caminhando a passos lentos para o melhor dos momentos.

    — Não podemos ficar aqui, você precisa descansar.

    — Eu acho que posso me mover agora.

    Kim tentou se levantar, mas seu corpo falhou. Ele caiu, e seu corpo foi aparado por Dalia, que, com seus corpos próximos novamente e suas respirações tão unidas que pareciam uma, não puderam ceder o desejo, onde um novo beijo retornou ao fluxo diante deles.

    O calor manteve-se por momentos, até que novamente se separavam, com tristeza de quem não queria desunir.

    — Pode me levar até meu quarto?

    — Não, o meu é mais perto, vamos para lá.

    — Mas…

    — Sem, mas, vamos!

    — Certo… as suas ordens.

    Envergonhado, com suas orelhas vermelhas, eles foram juntos até o quarto de Dalia, para poder descansar seus corpos.

    ✡︎—————✡︎—————✡︎

    Kizimu estava sozinho.

    O eco de seus passos se dissolvia sob o peso silencioso das colunas de mármores azuis que sustentavam o teto abissal daquele salão. Agora, no grande púlpito do castelo real — conhecido por muitos como o Coração de Insurgia — ele se encontrava diante da figura que moldava o destino de milhões. Era a sala do rei.

    Tudo ali parecia projetado para reduzir qualquer presença humana à poeira. As paredes, talhadas em pedra escura com veios de prata viva, pulsavam levemente, como se o castelo tivesse um coração próprio. Lustres com chamas azuladas flutuavam acima, iluminando com frieza as tapeçarias que narravam guerras antigas, traições, sacrifícios — e, ao centro de todas as histórias, o mesmo rosto. O rosto do rei. Bandeiras de tecido nobre dançavam suavemente com o ar, ostentando a estrela negra envolta por linhas azuis que pulsavam, quase vivas, como o colar de Aisha.

    O trono, elevado em degraus como um altar profano, não era apenas uma cadeira: era um trono esculpido em uma estrela negra de cinco pontas, cujos braços eram serpentes entrelaçadas em espirais douradas. Atrás dele, uma enorme janela em formato de espinho invertido deixava passar a luz do céu nublado, tingindo a sala de um tom azulado e espectral.

    E ali, sentado com a postura de quem não pedia nada ao mundo, apenas decretava, estava ele.

    O rei.

    A sua presença não era apenas majestosa — era opressiva. Como uma força gravitacional invisível que curvava a espinha, afogava o peito e silenciava o ar. Kizimu podia sentir cada batida de seu próprio coração como um tambor de guerra — e mesmo esse som parecia desrespeitoso ali.

    O medo fluía. Fluía como veneno em suas veias. Mas também refluía, como se o ambiente o devolvesse em dobro, drenando coragem, deixando apenas a lucidez de que ali não havia escolha. Apenas destino.

    E esse medo… paradoxalmente alimentava o homem à sua frente.

    Kizimu compreendia com clareza angustiante: quanto mais o temessem, mais real ele se tornava. O rei não governava apenas com leis ou força militar. Ele governava com presença. Existir diante dele era aceitar que o passado, o presente e até o futuro estavam agora sendo moldados por aquele instante.

    E então, a voz surgiu. Não foi alta, mas ressoou como trovão.

    — Bem-vindo, Kizimu. Estava te esperando.

    O som atravessou o salão como uma sentença gravada em pedra.

    Kizimu, um garoto diante de um abismo coroado, havia sido convocado.

    E nada, absolutamente nada, seria o mesmo após aquela audiência real.

    — Por que eu fui chamado… sozinho?

    — Gostaria de conversar, de homem para homem, ou de rei para um senhor.

    — Entendi…

    A presença esmagadora deixava Kizimu sem saber para onde olhar, o medo que sentia era ilógico, mas, não entendia o porquê. Talvez olhar para algo tão poderoso o fizesse sentir fraco, mas, o rei parecia natural ao mundo.

    Por que ele parecia tão ameaçador, mesmo, sendo tão nobre?

    — Tem algo que queira saber sobre seu pai?

    — Quem foi meu pai? Ernesto parecia tão amedrontado comigo quando eu disse que era filho dele.

    — Hohoho, eu posso compreender.

    O homem começou a mexer no anel em seu dedo anelar com certa nostalgia, o homem então chamou Kizimu para perto.

    — Seu pai, Kizimu, foi um herói, maior que qualquer outro. Sua inteligência, ideias e ideais eram todos inigualáveis e para mim, ele foi mais que um amigo.

    — Por que você considera meu pai um herói?

    — Ele protegia aqueles que estavam ao seu lado, e sempre fazia de tudo para salvar a todos. Proteger todos e mante-los seguros… era sua sina.

    Historias paradas ao tempo, tempos que Kizimu, nem nos seus sonhos mais profundos poderá desvendar seu pai.

    — Por que… ele morreu?

    — Ele fez o que pode para trazer alguém de volta a vida, mas, humanos tem limites do quanto podem desafiar as leis.

    — As leis?

    O homem, a sua frente, que observava com nostalgia tudo, ficou tenso, como se lembrasse de algo assustador. Seus piores temores, como um homem tão forte e tenebroso poderia então sentir medo. O que poderia assustador o ápice da raça humana.

    — O ciclo.

    — Ciclo?

    — Existe uma lei no mundo, regras predefinidas que não podem ser alteradas. Mas, podemos burlá-las. Agora, apenas os bruxos mais poderosos podem aprender a manipular as leis sem quebrar o ciclo. Isso é uma dádiva, que apenas Anastácio e Hugo eram capazes de fazer.

    Hugo era um nome que Ronan já havia citado antes. Existiam diversos amigos de seu pai que não conhecera. O homem, a sua frente, um rei, era alguém que já teve contato com seu pai em algum momento. Quando esse contato veio? Por que seu pai era amigo de um rei? O quão grandioso seu pai era?

    — Meu pai… melhor, quem foi minha mãe?

    — Uma mulher forte e corajosa, mas sempre muito verdadeira. Ela separava as diversas brigas do grupo de estudo.

    — Grupo de estudo?

    — Seu pai tinha um grupo formado por 8 membros, ao menos era isso quando eu conheci ele. O mesmo apelidou de grupo de estudo, por estudar maldições.

    Um conhecimento novo que obteve, já ouviu falar do grupo que seu pai participou, mas era um mistério.

    — Meu pai estudou sobre maldições?

    — Principalmente aqui no reino. — Abriu seus braços com grandiosidade. — O reino de insurgia sempre teve uma grande ligação com maldições… ao menos, a família real sempre teve.

    — Que legal!

    Seu pai estudou no berço dos conhecimentos das maldições, sobre as próprias, e ali construiu um conhecimento que apenas ele e Hugo teriam.

    — Eu aprendi alguns rituais também, mas não entendo muito como eles funcionam.

    — Pode me mostrar?

    Kizimu ficou tenso, ele com uma mão mexeu no seu bracelete de prata, que ganhou de Ronan. Respirando fundo, abriu a palma. Lá existia um símbolo de ômega, feito por Masha, no mundo de aceleração de mentes.

    Primeiro, concentrou-se e fluiu a energia de seu corpo para fora. Uma faísca fraca saiu. Depois, gerou a partir de seu coração, bombeou gazes e fluiu uma pequena chama purpura. O homem colocou a mão no queixo, admirado, e sorriu.

    — Núcleos de Gama e Eta, usando um ritual de ômega para fluir os rituais… bem, para um garoto tão jovem, isso é algo impressionante. Ainda mais levando em consideração que você acordou em uma semana mais ou menos.

    — Sim… — falou com certa tensão. — O que Gama e Eta significa?

    — Eu não sou um especialista, mas, Gama é a vibração do ser, o campo eletromagnético da vida. E Eta é a chama interna, o calor vital que gera e sustenta a vida.

    Ômega era o final, onde tudo fluia para seu fim. Gama e Eta tinham seus próprios significados. A partir de cada núcleos, o misturar de suas essências, poderia criar novos rituais, tudo era questão de entender o que fazia cada o que.

    — Isso é muito legal.

    — Isso não é um décimo do que é núcleos e rituais. Existem diversos segredos que compõem a carne, tudo isso, estudado por seu pai e Hugo, foi extraído seu máximo. Sei que Hugo tem diversos alunos espalhados pelo mundo.

    Era tudo muito interessante, não conheceu tanto sobre maldições assim, e tinha certeza que Masha iria saber sobre essas coisas, pediria para ela ensinar a ele.

    — Aqueles dois que vieram ontem, eram alunos de Hugo.

    — Sério?

    — Sim, eles queriam tratar… de um certo assunto. — Kizimu notou, por um centímetro de alteração, que o rei não queria falar desse assunto.

    Kizimu poderia aprender muito sobre o próprio pai nessa conversa, o que ele deveria conversar? O garoto de cabelos pretos observou a volta, e notou a ausência da rainha, que, por outro lado, olhando mais ao lado, parada como um shogun do inverno, seus óculos de aro fino perfeitamente alinhados em seu olho dava um rosto afiado.

    Kizimu pensou o que ele mais queria saber sobre o pai. Procurou bem, no fundo, de suas intermináveis perguntas, e lá, encontrou algo.

    — Qual era o sobrenome de meu pai?

    O rei, mordeu levemente o lábio, um gesto sutil, que poderia representar que estava se segurando para não falar.

    — Garoto, sentimentos guardam memorias, talvez se lembrar de seu sobrenome, lembre do passado, e…

    — Quando eu lembrar de tudo, eu irei morrer.

    — Exatamente.

    Um clima pesado pairou, como se uma péssima notícia tivesse caído sobre os ombros dos dois.

    — Acho que me deixei passar, mesmo que eu responderia perguntas de seu pai, saber sobre ele, pode ativar memorias… não é muito seguro.

    — Eu… compreendo.

    — Obrigado por entender. Adorei a nossa conversa, você é um garoto muito sabido, estou impressionado. Pequena esperança.

    Algo no tom que o rei usou, passou um certo orgulho, um conforto que vinha de um pai.

    — Obrigado.

    E ali, se encerrava uma conversa entre um rei e um senhor.

    ✡︎—————✡︎—————✡︎

    A seda da cama era confortável. O calor da pele era reconfortante.

    Era ali mais um dia. Kim, se sentia melhor do que nunca. Nunca se sentirá tão feliz, calmo, energético, e cheio de vigor. Sua felicidade estava no seu ápice. Tudo aquilo que sonhava, ser feliz, dava ao seu rosto um tranquilo sorriso.

    Kim levantou, sem roupa, ocultou-se sobre os lençóis, e sentiu delicadas mãos segurando seu braço.

    — Não vai. Vamos dormir mais.

    Dalia, com seus cabelos bagunçados, não perdia sua beleza. Era uma doce vida ao cosmo. A garota, puxou o louro para a cama novamente. Kim, cedeu, e abraçou a pele despida da sua companheira.

    — Isso torna a gente namorados?

    — Tem algo contra?

    — Nunca. — afirmou com fortitude.

    Olhando frente a frente, ambos embriagados com a chama da paixão, se beijaram, e ali, naquele instante, se conectaram mais uma vez.

    Dalia estava agora fora da cama, de calcinha. Kim, mesmo que já havia visto mais do que jamais imaginou, ainda sentiu-se envergonhado. Ele começou a se vestir. A garota logo surgiu por trás, tocando em sua pele despida.

    — Essas cicatrizes são novas.

    — São de meus treinos.

    — Hihi, você treina fazendo o que para ter essas feridas?

    A garota abraçou-o por trás.

    — Eu sou toda sua. Tudo isso é seu. Por isso, seja meu, para sempre.

    Kim tocou a mão que o abraçava, sentindo seu calor, vivo e quente. Um sangue que pulsava, um rubor passou em sua pele, mas, se manteve firme.

    — Eu sempre serei seu.

    — Até que a morte…

    — Nos separe.

    Na manhã agora estavam na sala de refeição.

    — Hoje é o dia que o punhal sagrado vai ser apresentado na igreja, não?

    — É… acho que sim.

    Brielle e Guto conversavam despreocupados.

    A dupla de pombinhos, Kim e Dalia, acabará de passar juntos pela mesa.

    Kim, andou até seu senhor, e Dalia o seguiu, sentando ao seu lado.

    — Kim, onde esteve? Não voltou a noite toda.

    Ouvindo isso, Pandora observou, olhou as entrelinhas e ficou levemente vermelha.

    — Ah, Kizimu, não se preocupe, ele deveria apenas estar cansado. Dalia estava cuidando dele.

    — Oh, como eu cuidei.

    Pandora ficou completamente sem jeito diante a descarada afirmação de Dalia. Mesmo assim, Kizimu não notou a maldade, seu coração puro ainda desconhecia tal significado.

    Na mesa, se juntaram todos os últimos integrantes, com Aisha e Eleonor chegando por último.

    A garota otaku, estava com seu rosto tenso, muito tenso. Ela sentou a mesa tropega, como se sua atenção estivesse em tudo, menos no mundo. Para Kizimu, sua atenção foi completamente a esse detalhe. A garota não estava bem.

    — Eleonor — Kizimu chamou-a, a mesma se surpreendeu, e assentiu. — aconteceu algo?

    — …

    — Pode falar com a gente, o que tiver acontecido, podemos resolver juntos.

    Kizimu estava do outro lado da mesa, e entrou em um assunto que apenas sua observação precisa tinha efeito, mesmo assim, algo acalmou Eleonor, ou apenas, um fósforo caiu sobre uma bomba de gás.

    — ATENÇÂO! TEMOS UM PROBLEMA URGENTE!

    Todos da mesa, que mantinham-se em suas conversas distintas, olharam para a garota de olhos amarelos vibrantes, ela, que tinha se posicionado em cima da mesa, surpreendendo a todos. Começou seu discurso.

    — Devemos unir nossos corações, procurar evidencias, destruir suspeitos e brindar vitorias, pois agora, um problema surgiu de forma que não pode ser evitada… — De um momento a outro, a garota que bradava com orgulho, começou a desabrochar, e vermelha como um tomate continuou. — Alguém, alguém está roubado minhas calcinhas!

    E assim se iniciou uma nova manhã em Insurgia.

    —————————————

    Hora do chá

    —————————————

    Yahalloi

    CaiqueDLF aqui!

    Opa, esse capítulo foi bem grande, né? Pois se acostumem, eu padronizei alguns capítulos bem grandes por agora. Assim se encerra o Capítulo 4. Futuramente eu adicionarei alguns “Cap’s” adicionais extras de algumas cenas que ocorreram, mas foram cortadas para darmos foco ao principal. O verdadeiro arco 2 começa agora. Estão preparados para o caos que se iniciará?

    Um grande mistério vai dar início, mas será que apenas mistério será aquilo que trará tanta tensão a esse grande reino? O que será que acontecerá no futuro e quais grandes catástrofes ele estará prestes a passar? Estejam preparados para ver o..

    Próximo capítulo; Capítulo 5: Um eco emocional (68 – 69)

    Bye bye.

    Ass: CaiqueDLF

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 0% (0 votos)

    Nota