Índice de Capítulo

    Sua expressão parecia serena, mas seus olhos refletiram algo além da calma: um abismo insondável. Foi então que ele sussurrou as palavras que invocavam o ápice de seu poder:

    “Criação: Olho de Deus.”

    Uma onda de energia divina percorre seu corpo, expandindo seus sentidos além do possivel. Ele podia ouvir o mínimo de folhas roçando no chão distante e enxergar com nitidez até mesmo partículas de poeira no ar. Seus movimentos foram impecavelmente precisos, a mana fluindo em harmonia perfeita dentro de si. Essa era a sensação de transcender, de se tornar um deus.

    Azrael já havia sentido esse poder antes, no passado. Uma mistura avassaladora de euforia e melancolia o dominava sempre que acessava essa forma. Saber que Noir, a divindade que o abençoara, estava ao seu lado era um alívio. Mesmo assim, ele se culpou por não conseguir extrair todo o potencial da terceira forma de Tsukuyomi.

    Devo usar esse poder como se fosse meu, pensou.

    Recordou-se de como havia se sentido ao concluir seu treinamento, uma mistura de frustração e arrogância. Naquela época, julgava-se invencível, capaz de proteger todos que amava. No entanto, uma realidade cruel o atingiu. A mulher que ele mais amava encarou sua própria morte. Para salvá-lo, ela havia sido sacrificada.

    Essa memória pairava em sua mente enquanto ele observava o elfo à sua frente. O inimigo tremia, hesitante, seus olhos cheios de medo.

    “É tão fácil matá-lo nesse estado”, Azrael murmurou, sua voz fria e cortante. “Contudo, imagino que Júlia não aprovaria isso.”

    Fechando os olhos por um breve instante, ele ouviu uma voz em sua mente, tão vívida quanto ao passado. “Az… por favor…”

    Eu sei, pensou. Me desculpe por te preocupar.

    Ao abrir os olhos, a determinação em seu olhar estava renovada. Ele canalizou a mana divina e deu um único passo à frente, atravessando a distância entre ele e o elfo em um piscar de olhos. Seus sentidos ampliados detectaram o fluxo de mana do oponente, revelando a habilidade nascente: clones e ilusões.

    Ah, então é assim que ele sobreviveu. Azrael refletiu. Quando o corpo principal era atacado, o elfo se transferia automaticamente para um de seus clones, evitando qualquer dano.

    Sem hesitar, Azrael estendeu a mão esquerda e desferiu um golpe em direção ao pescoço do elfo. No entanto, como esperado, o adversário mudou, substituído por um clone.

    “Tsukuyomi: Céu Estrelado.”

    Com uma explosão de energia divina, a espada Tsukuyomi se materializou em sua mão. A lâmina, normalmente negra como a noite, agora estava adornada por pontos luminosos que brilhavam como estrelas. Essa técnica, criada por Noir, exigia um vasto uso de mana divina.

    Um único movimento com a espada criou uma área circular de destruição ao redor de Azrael, estendendo-se por 200 metros. O usuário e seus aliados sairiam ilesos, mas qualquer inimigo dentro do raio de alcance seria retalhado instantaneamente. Os clones do elfo começaram a se dissipar um por um, mas ele continuou escapando por frações de segundo, transferindo-se entre os clones restantes.

    “Interessante”, Azrael murmurou, surpreso com a velocidade do oponente. Mesmo para ele, era difícil acompanhar a troca constante do elfo.

    “…”

    Ele respirou fundo, preparando-se para a próxima jogada.

    “Zero Absoluto.”

    A habilidade de Naara fez com que a temperatura despencar instantaneamente, cobrindo o ambiente com uma camada de gelo. Os pés do elfo foram congelados no lugar, interrompendo sua fuga momentaneamente.

    “Cancelar”, Azrael disse calmamente.

    Essa habilidade anulava o fluxo de mana no corpo de um alvo, desfazendo os clones remanescentes do elfo. Sem suas ilusões, o inimigo estava vulnerável.

    “Você sabe”, disse Azrael enquanto avançava com um movimento fluido, “nunca conseguiu controlar totalmente o meu poder. Por isso, não consigo conter…”

    A lâmina estrelada cortou o ar, atravessando o peito do elfo com uma precisão cirúrgica. O corpo dele caiu no chão, a vida esvaindo-se de seus olhos enquanto o sangue tingia o gelo sob seus pés.

    Azrael parou por um momento, observando. O mundo ao redor parecia mais nítido, como se o silêncio que se seguiu à morte tivesse limpado tudo.

    “Não perguntei o nome dele”, ele pensou, fechando os olhos por um instante.

    Mas nada disso importava. Ele não queria saber o nome do inimigo, apenas desejava acabar com tudo o mais rápido possível.

    Talvez no futuro existe alguém forte o suficiente para que eu não precise mais lutar, pensou Azrael, quase como uma súplica silenciosa ao destino. Por um instante, visualizou-se como um mero espectador, observando outra pessoa lutando para proteger os companheiros. Era um papel que ele havia almejado cumprir por anos, mas que jamais conseguiu cumprir plenamente.

    O inimigo diante dele, ofegante e com o olhar enevoado de dor, tentou falar algo.

    “Parece que não consegui vingar meus companheiros…”, murmurou o elfo, a voz enfraquecida e embargada pela agonia iminente.

    “Você deveria ter mirado nos deuses, como eu sugeri.”

    Azrael encontrou-se imóvel, observando o ser diante dele. Não sentia pena. Ele sabia o que era ser um assassino, pois também o era. Contudo, qualquer traço de empatia que pudesse existir havia sido enterrado sob o peso das escolhas que fariam ao longo da vida.

    “Não se preocupe”, disse ele, a voz baixa e afiada como uma lâmina. “No sofrimento eterno que você enfrentará, saiba que meu objetivo é destruir os deuses.”

    O elfo arfava, a dor gravada em cada traço de seu rosto. A convulsão final tomou seu corpo, mas mesmo assim, ele encontrou forças para falar.

    “Estou morrendo… Sabe? Você deveria tomar cuidado com a Aliança. Você é o alvo deles.”

    Azrael franziu o cenho. O nome da Aliança ecoou em sua mente como um fantasma do passado. Ele acreditava que aquele grupo terrorista havia desaparecido anos atrás.

    “Não é possível. A Aliança foi desfeita quando derrotei o chefe deles.”

    O elfo, com um sorriso amargo e os olhos já opacos, sussurrou: “Você já se perguntou por que o chefe possuía o seu sangue, sendo tão precioso? Ele não era o verdadeiro líder por trás da Aliança. Assim como você, foi apenas alguém manipulado.”

    Azrael se inclinou, o tom de sua voz carregado de urgência. “Ei, você sabe quem é o responsável?”

    No entanto, antes que o elfo pudesse responder, a marca em seu braço começou a brilhar. A “Maldição de Hades” se manifestava, uma habilidade que Azrael havia recebido do próprio deus. A maldição marcava o inimigo, garantindo que, ao chegar ao Tártaro, sua alma fosse identificada como a de um criminoso e condenada a sofrer por toda a eternidade.

    Ele observou enquanto o brilho se intensificava, até que o corpo do elfo ficava imóvel. “Ele morreu…“, constatou Noir, sua voz quase um sussurro.

    “Parece que sim”, murmurou para si mesmo.

    Ele então caminhou até o corpo sem vida de Júlia. Seus olhos se fixaram na ferida fatal que ela sofreu. Não era algo que pudesse ser revertido, nem mesmo com suas habilidades de cura. Ferimentos graves poderiam ser tratados, mas uma ferida mortal exigia horas para cicatrizar, enquanto a morte vinha em questão de minutos ou segundos.

    A visão de Júlia morta deveria provocar uma onda de dor em seu coração, mas, estranhamente, ele não sentiu nada. Apenas um vazio, uma frieza que parecia aumentar a cada segundo. “Será que essa falta de empatia é efeito da divindade?”, questionou-se.

    Ele queria chorar, expressar alguma emoção, mas era incapaz. As lágrimas que deveriam rolar por seu rosto parecem presas em algum lugar distante, como se ele estivesse desconectado de sua própria humanidade.

    Azrael notou o fluxo de mana à sua frente. Era sutil, mas inconfundível, como se alguém o observasse de uma fenda dimensional. Ele não precisou de muito tempo para identificar a presença.

    “Você viu tudo, certo… Eriel?”

    Não havia motivos para fingir. Como uma imaginação, Azrael sabia que aquilo não interferiria com o futuro. Ainda assim, o silêncio de Eriel era palpável. Ela parecia analisar as palavras de Zoe, que provavelmente explicava sobre a presença e o motivo pelo qual podiam conversar.

    “…Sim, eu vi”, respondeu ela, com hesitação.

    “Agora você me odeia… É normal. Eu fui o responsável pela morte de sua mãe.”

    Eriel suspirou, desviando o olhar para o corpo sem vida de Júlia no chão. Seus olhos estavam vermelhos, talvez por causa das lágrimas. Mas, devido às regras de viagem no tempo, não havia nada que ela pudesse fazer para interagir ou se vingar.

    “Me desculpe por isso”, disse Azrael, com sinceridade.

    “Não existem motivos para se desculpar.”

    Algo na postura de Eriel parecia diferente. Talvez fosse sua experiência com a versão passada dela, ou o peso de saber que aquela Eriel não era a pessoa que ele conheceu no passado, mas sim sua reencarnação.

    “O que você vai fazer agora que sabe a verdade?” ele perguntou, estudando suas respostas.

    “Observar… É só isso que posso fazer, certo?”

    A resposta dela demonstrou um entendimento profundo sobre sua própria habilidade. Mas havia algo mais ali, algo que precisava ser dito.

    “Azrael… Estou brava com você”, começou ela, a voz transmitida de emoção contida. “Você selou minhas memórias e partiu. Depois, quando nos reencontramos, fingiu não me conhecer e me tratou como uma estranha. Não sei qual é o seu objetivo, mas sei que você está sofrendo com tudo isso.”

    “Selar sua memória foi para mantê-lo longe. As pessoas que se aproximam de mim acabam tendo um fim trágico. Não quero que o mesmo aconteça com você”, explicou ele, tentando explicar suas ações.

    “Esse é o motivo? Me salvar? Você é um idiota!”

    Eriel finalmente deixou suas emoções transbordarem.

    “Você nunca me perguntou. Sempre agiu de forma idiota enquanto fingia se importar! Azrael… Az… Me escuta bem. Afastar as pessoas não é…”

    Ela deu um passo à frente, aproximando-se lentamente. Seus dedos delicados tocaram o rosto de Azrael, mas, devido à diferença de planos, sua mão passou por ele. Mesmo assim, ele compreendeu o que ela tentou transmitir.

    “Não… Essas não são as palavras certas…”

    Os olhos dela encontraram os dele. Eram gentis, repletos de um calor que ele não sentia há muito tempo. O sorriso dela, refletido sob a luz da lua, parecia genuíno, e sua beleza era quase etérea. Azrael sentiu-se nostálgico ao observar; ela era idêntica à única pessoa que o fez sentir-se vivo no passado. O sorriso gentil lembrava-lhe da versão antiga, e seus olhos carinhosos faziam-no pensar em Mana. Mesmo sabendo que não deveria comparar, ele não conseguiu evitar o sentimento de felicidade.

    “Você fez bem, Az… Sei que está sofrendo, mas está tudo bem. Eu não te culpo.”

    Eriel tentou abraçá-lo, mesmo sabendo que seus braços provavelmente atravessariam seu corpo. Contudo, ao surpreender até mesmo Azrael, ela conseguiu. O toque dela era real, e ele sentiu o aperto enquanto lágrimas quentes molhavam seu ombro. Inconscientemente, ela havia atravessado o plano apenas para abraçá-lo.

    “Obrigada pelo seu esforço… Obrigada por fazer minha mãe feliz, Az.”

    Então, de forma tão súbita quanto havia chegado, a presença de Eriel estava ausente. Ainda assim, seu rosto sorridente permaneceu gravado na memória de Azrael. Ele sabia que precisava proteger aquele futuro com todas as suas forças.

    Isso foi algo inesperado, disse uma voz em sua mente. Era Legion.

    “Devo imaginar que você sabia da presença delas?”, perguntou Azrael, sentindo um leve tom de ironia em sua voz.

    Sim… Z me pediu para manter isso em segredo por causa das regras, respondeu Legion.

    “Tudo bem…”

    Azrael notou seu estado mental alterado. As informações fluíam em sua mente como um turbilhão. Ele segurou o corpo sem vida de Júlia nos braços. Cada movimento era acompanhado por uma dor agoniante. A sobrecarga de usar a terceira forma tornava até mesmo o simples ato de carregar Júlia uma provação.

    Eriel

    Depois de abraçar Azrael, Eriel sentiu sua consciência se dissipar lentamente, como se fosse engolida por uma vastidão escura onde nem mesmo a luz conseguia penetrar. Sua magia já estava se formando, preparando-se para devolvê-la à sua linha temporal. A sensação era estranha, quase desconfortável.

    “Nossa. Tudo foi interessante.”

    A voz distorcida interrompeu seus pensamentos, ecoando no vazio. Eriel virou-se abruptamente e encontrou um indivíduo que não fazia parte da viagem temporal. Sua presença era inquietante, quase etérea.

    “Z…” murmurou Eriel, com um tom de surpresa e cautela.

    Z a observava com olhos impossíveis de decifrar, um sorriso sinuoso desenhando-se em seu rosto. A postura dele exalava confiança, como se ele soubesse mais do que deixava transparecer.

    “Imaginei que a experiência fosse interessante. Mas isso não importa. Você se saiu bem. Parece que está começando a se acostumar com parte de seu poder.”

    Eriel refletiu sobre suas palavras, intrigada com as implicações. Nunca havia imaginado voltar no tempo. Se meu poder é capaz de algo assim, o que mais ele pode fazer? Pensou, sentindo uma mistura de temor e excitação.

    Ela sabia que as três habilidades nascentes — Tempo, Realidade e criação — tinham suas formas mais poderosas. Era quase um mito entre os magos e estudiosos. O controle absoluto do Tempo, por exemplo, não era apenas um poder de viajar entre passado e futuro, mas também de conhecer informações que já haviam ocorrido ou que ainda ocorreriam. É uma habilidade que conferia onisciência.

    Quanto à Criação. A ideia de poder conceber qualquer magia ou habilidade nascente era incompreensível para a maioria. Uma vez criada, a magia pertencia ao usuário, tornando-o praticamente onipotente.

    Por fim, Realidade oferecia “Alterar Realidade”. Essa habilidade era ainda mais aterrorizante. Era o poder de moldar tudo à sua volta, desfazendo eventos, apagando existências ou reescrevendo a própria essência de um ser. O conceito de limites simplesmente não existia.

    Z, com um ar casual, comentou: “Bom, o Tempo é notoriamente difícil de dominar.”

    Eriel franziu o cenho. “Por falar em Tempo… Quem são os outros usuários das habilidades primordiais?”

    Ela hesitou por um instante, receando que sua curiosidade fosse mal recebida. No entanto, Z apenas deu um sorriso enigmático.

    “Se for uma informação que você ainda não tem acesso…”

    “Na verdade,” interrompeu Z, inclinando-se ligeiramente para ela, “acho que não há motivos para esconder.”

    Eriel prendeu a respiração, sentindo a tensão no ar.

    “Você é a usuária do Tempo,” explicou Z, pausando por um momento para avaliar sua reação. “Já a Realidade pertence ao próprio anjo caído que liderou a rebelião… Lúcifer.”

    Os olhos de Eriel se arregalaram. As histórias sobre Lúcifer ecoaram em sua mente. O primeiro ser criado pelo Deus supremo, um anjo de poder incomparável, e também o arquiteto da rebelião celestial. Ele não era apenas um anjo, mas o primogênito do Criador, formado a partir de seu próprio sangue.

    “Criação…” continuou Z, agora com um tom quase divertido, “Você já conhece o usuário dessa habilidade.”

    Eriel piscou, confusa. “Eu conheço?”

    Zoe, que estava silenciosa até então, riu baixinho. “Você acha que ela já percebeu?”

    “Claro, claro. Ela é esperta,” respondeu Z com um aceno casual. “A habilidade nascente mais poderosa, segundo o próprio Deus supremo… Azrael é o dono da habilidade ‘Criação’.”

    O choque atravessou Eriel como uma lâmina. “O quê?”

    “O destino é cruel com Azrael, mas também o favorece,” continuou Z, ignorando sua surpresa. “Ele é a reencarnação do dragão do caos. Possui a alma e o poder de um deus, carrega uma espada lendária criada pelo Deus supremo e detém a habilidade de criar a habilidade que ele imaginar. Além disso, seu sangue é especial…”

    Eriel sentiu as palavras rodopiarem em sua mente. Azrael é realmente tão extraordinário assim? Talvez seja por isso que todos confiam tanto nele.

    “Se ele é tão forte, por que não conseguiu salvar Júlia?” A pergunta escapou antes que ela pudesse contê-la. As emoções estavam à flor da pele, uma mistura de tristeza e frustração.

    Zoe ergueu uma sobrancelha, como se estivesse avaliando a profundidade da questão. “Você acha que ele é forte?”

    A resposta inesperada fez Eriel vacilar. “Como assim?”

    “Azrael passou boa parte da infância sendo fraco,” disse Zoe, com um tom mais grave. “Ele perdeu a primeira pessoa que mostrou afeto por ele. Depois viu o amor de sua vida morrer em seus braços. Agora, mais uma vez, perdeu alguém importante. Isso é ser força? Perder aqueles que você ama?”

    Eriel apertou os punhos, mordendo o lábio inferior para conter a frustração.

    “Ele tem todas essas habilidades, mas existem limites. ‘Criação’ só pode ser usada com a mana a 100%. Quando usou antes, foi por causa da divindade em seu corpo. Mas mesmo isso tem efeitos colaterais insanos.”

    Z finalizou com um olhar significativo. “Força verdadeira é algo que vai alé de poder bruto. Você deveria lembrar disso, Eriel.”

    “Seu corpo era ferido conforme usava a divindade. A cada segundo, Azrael perdia parte de suas emoções, sentidos e funções. Utilizar a divindade em seu estado atual poderia deixá-lo em um estado vegetativo.”

    … ….. ………

    Eriel permaneceu em silêncio ao ouvir as palavras de Zoe. Ela não sabia como responder e, na verdade, não havia palavras certas para aquele momento.

    “Sua mãe é mais forte que o Azrael no estado atual, lembre-se disso.”

    “É?” perguntou Eriel, hesitante.

    Não deveria falar ‘era’?

    “Zoe…”

    “Não foi isso que eu—”

    “Espera! Na verdade, minha mãe era muito forte. Como ela caiu em uma armadilha e foi atingida tão facilmente?” A mente de Eriel girava em busca de explicações. Utilizando sua habilidade, sua mãe poderia criar uma magia capaz de escapar de qualquer situação com vida, independentemente da força do inimigo.

    “Zoe, me leva até o momento do acidente.”

    “Não posso…”

    Havia um motivo para ela não conseguir ver o acidente? Presenciar o que aconteceu naquele momento mudaria o futuro?

    “Eriel, você não tem permissão para ver aquele momento.”

    Eriel olhou para Z com desespero. Ele era o próximo Deus Supremo; certamente, poderia conceder a permissão necessária para acessar aquela parte do passado.

    “Z, por favor…”

    Z pareceu hesitar por um instante. Seu semblante mostrou um misto de alívio e indecisão, como se ponderasse a importância daquela decisão.

    “Me desculpe, mas não posso te dar a permissão.”

    As esperanças de Eriel desmoronaram.

    “Mas… posso permitir que você fale com uma pessoa que pode conceder essa permissão.”

    “Z!” exclamou Zoe, alarmada.

    “Está tudo bem, Zoe. Sei o que estou fazendo.”

    Com um leve gesto de mão, Z distorceu o espaço ao seu redor, revelando um pequeno portal. Embora Eriel não sentisse a mana de Z, ela percebeu claramente o uso do tempo.

    “Não pensei que você me chamaria assim, Z,” ecoou uma voz familiar do outro lado do portal.

    “Quem melhor para permitir uma infração nas regras? Um usuário de tempo é a melhor escolha.”

    Eriel observou com atenção. A pessoa do outro lado era quem poderia conceder a permissão necessária para acessar o momento do acidente.

    “Essa pessoa…” murmurou Eriel.

    A figura emergiu do portal. Seus longos cabelos avermelhados e olhos dourados chamaram a atenção de Eriel, despertando memórias da visão que tivera há pouco tempo. O jaleco branco que vestia indicava sua conexão com a área de desenvolvimento e pesquisa da facção humana.

    “Não pensei que veria uma versão jovem…” disse a figura, aproximando-se com um leve sorriso.

    Eriel a encarou, confusa.

    “Muito prazer. Sou sua versão mais velha. Com o chamado de Z, fui trazida até este espaço dimensional.”

    As palavras ressoaram na mente de Eriel. A figura à sua frente realmente era uma versão mais velha de si mesma. Eriel podia sentir o poder latente que parecia adormecido dentro dela.

    “Ela é a pessoa que pode me dar permissão?”

    “Permissão?” perguntou sua versão futura, franzindo levemente a testa antes de olhar para Z.

    Eriel também voltou seu olhar para ele, aguardando explicações.

    “Sim… Eriel do futuro, sua versão mais nova deseja permissão para observar o que aconteceu com sua mãe no dia do acidente,” Z declarou, rompendo o silêncio.

    A Eriel do futuro suspirou, como se já esperasse por aquele momento. Seu olhar recaiu sobre sua contraparte mais jovem, carregando um peso de melancolia e esperança.

    “Então chegamos a essa parte… Imaginei que logo aconteceria,” ela disse, aproximando-se ainda mais. Com um toque firme e tranquilizador em seu ombro, a versão mais velha continuou: “Escute com atenção. Te dar permissão para observar o que aconteceu pode enfurecer o Deus Criador, mas… Como um certo alguém me disse uma vez, ‘Não devemos ter medo do Criador’. Portanto, você tem a minha permissão.”

    Eriel engoliu em seco, sentindo uma mistura de alívio e ansiedade enquanto ouvia cada palavra.

    “Você vai presenciar várias tragédias. Não estou aqui para lhe contar sobre o futuro, mas quero que leve estas palavras com você: você é a responsável por seu destino. Não se sinta obrigada a ir até Azrael. Mas, se decidir estar ao lado dele… saiba que sua felicidade estará garantida.”

    As palavras eram pesadas, mas carregavam uma estranha sensação de conforto. Antes que pudesse responder ou fazer perguntas, Eriel percebeu que sua eu do futuro estava desaparecendo, como uma brisa que se esvai.

    “Eriel, esteja preparada… Ah, e diga estas palavras a Azrael do passado, ao encontrá-lo: ‘O que você precisa está no planeta Hidekon’. Ele saberá o que fazer. Mas cuidado, diga isso apenas quando encontrar o ‘antigo rei’.”

    A Eriel do futuro desapareceu antes que sua versão mais jovem pudesse sequer formular suas perguntas.

    “Ela continua a mesma… deveria apenas ter dado a permissão sem rodeios,” Z comentou, cruzando os braços com um meio sorriso. “De qualquer forma, a escolha é sua. Vamos.”

    O espaço à volta de Eriel começou a se distorcer, ondulando como uma superfície de água perturbada. Em um instante, ela estava observando a estrada onde o acidente de sua mãe havia ocorrido. A cena era nítida, como se estivesse acontecendo diante dela naquele momento.

    Júlia estava ao telefone, dirigindo com uma expressão tranquila no rosto. O som de pneus cantando preencheu o ar quando uma figura apareceu repentinamente à sua frente. O impacto foi violento, jogando o carro para longe. Eriel sentiu um aperto no peito enquanto observava a cena.

    A figura — um elfo negro — caminhou até o carro destruído e retirou Júlia inconsciente dos destroços. Foi então que um portal surgiu no ar, pulsando com uma energia sombria. Dele emergiu um ser misterioso, com o rosto oculto por sombras. O desconhecido pegou o corpo de Júlia, observando-a por um momento antes de criar uma ilusão perfeita. A duplicata de Júlia era indistinguível, replicando sua mana, aura e até mesmo seus trejeitos.

    Sem palavras, o ser misterioso desapareceu pelo portal, levando a verdadeira Júlia consigo. O elfo negro ficou para trás, agora ao lado da farsa.

    Eriel cerrou os punhos. Isso significa que minha mãe está viva… em algum lugar.

    Antes que pudesse absorver completamente o que acabara de testemunhar, sentiu sua magia se esgotar. O local desmoronou em escuridão, e ela foi puxada de volta para sua própria linha temporal.

    Quando abriu os olhos, encontrou Charlotte observando-a com curiosidade.

    “Então você voltou,” Charlotte comentou, inclinando a cabeça de leve.

    “Sim…” respondeu Eriel, ainda processando o que havia visto.

    Charlotte então falou, seu tom ficando mais direto. “Não temos muito tempo, então escolha agora. Você vai até Azrael ou não?”

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