Capítulo 75 — Passado 5
Após emergir das ruínas, antecipei um ataque iminente no momento em que coloquei os pés no local, mas para minha surpresa, as criaturas mantiveram-se ocultas enquanto passávamos para o outro lado. A batalha contra a besta divina foi implacável, mas com determinação e habilidade, consegui emergir vitorioso. De acordo com as instruções de Noir, coletei os dentes da criatura e também seu veneno, elementos necessários para a criação de uma cura.
Ao deixar as ruínas, um grupo de guardas se apresentou e quase me ordenou a retornar. Contudo, um homem interveio, persuadindo-os a permitir minha permanência. Ferido tanto eu quanto Mana, fomos tratados por esse nobre cavalheiro, que prontamente providenciou uma carruagem para nos levar a algum lugar seguro. Observando o homem idoso de olhos negros, percebi que ele carregava consigo um ar de cansaço, como se tivesse enfrentado inúmeras batalhas pessoais.
Não havia razão para questionar as intenções do homem que havia nos ajudado, especialmente porque ele não demonstrava hostilidade. A orientação de Noir ecoou em minha mente, aconselhando-me a seguir o nobre por enquanto.
“Então, jovem Azrael, como foi sua experiência do outro lado?” perguntou o ancião, quebrando o silêncio da carruagem.
“Fui submetido a torturas implacáveis enquanto meu sangue era coletado. Não creio que seja uma história particularmente interessante”, respondi com um toque de amargura em minhas palavras.
O homem pareceu genuinamente surpreso com minha resposta, mas optou por não compartilhar seus pensamentos sobre o assunto.
Minha aparência naquele momento estava longe de ser a mais apresentável, devido à intensa luta que enfrentei, mas mesmo exausto e com minhas energias drenadas, tinha confiança em minhas habilidades para enfrentar qualquer ameaça. No entanto, o nobre à minha frente, apesar de sua idade avançada, emitia uma aura de poder indomável.
“Não se preocupe. Seu pai fará justiça contra aqueles que lhe causaram tanto sofrimento”, declarou o homem com uma serenidade impressionante.
“Meu pai?” falei com desdém. “Não há necessidade de preocupação. Ele está morto e foi ele quem autorizou meu tratamento… daquela maneira.”
“Não me refiro ao homem que o levou, jovem mestre. Refiro-me ao seu verdadeiro pai.”
Suas palavras ecoaram por um momento, deixando-me momentaneamente perplexo.
“Meu verdadeiro…”
“Parece que chegamos, jovem mestre”, interrompeu ele, enquanto a carruagem parava. Ele indicou a janela e eu segui seu gesto. À nossa frente, desenrolava-se uma cena que me deixou sem palavras. Uma cidade majestosa, repleta de casas e pessoas, estendia-se diante dos meus olhos. Uma cidade viva, pulsando com a energia da multidão que a habitava. Nunca em meus sonhos mais distantes eu havia imaginado ver algo assim, uma visão que me deixou maravilhado e sobrecarregado de sentimentos que eu não sabia como expressar.
“É uma cidade realmente magnífica”, comentei, admirando a vista à minha frente. No entanto, o homem apenas sorriu enigmaticamente, como se houvesse mais a ser revelado.
“Todos estavam ansiando pelo seu retorno, mas não é a cidade em si que você deve focar sua atenção. Eu estava me referindo a isso”, disse ele, apontando para o centro da cidade. Meus olhos seguiram sua indicação e fixaram-se em um imponente castelo que dominava a paisagem. Era uma estrutura tão vasta que poderia abrigar um vilarejo inteiro em sua área. Além do castelo, uma densa floresta se estendia e, curiosamente, não havia outras construções visíveis ao seu redor.
“Aquele é o castelo do rei, e sua família está aguardando por você enquanto conversamos”, explicou o homem, seu tom carregado de significado.
Enquanto eu contemplava o castelo, notei a aproximação de um dos cavaleiros que nos escoltava. Ele se aproximou rapidamente do nobre, aparentemente com algo importante a comunicar.
“Meu lorde, a garota acordou”, relatou o cavaleiro.
Essa notícia imediatamente chamou minha atenção, e virei-me para olhar para a segunda carruagem que se aproximava de nós. Dentro dela, estava Mana. Porém, parecia que minha presença não era necessária para acordá-la, pelo menos não naquele momento.
“Você poderia trazê-la?” perguntei, preocupado.
“Peço desculpas, meu lorde, mas seria possível deixar isso para depois? Há um nobre na carruagem que vai explicar a situação para sua irmã. No momento, sua prioridade é entrar no castelo”, pediu o cavaleiro.
Embora eu estivesse ansioso para ver Mana, compreendi a importância da situação. Não queria desrespeitar os protocolos e a ajuda que nos foi oferecida pelo nobre.
“Está bem, mas quero vê-la assim que for possível”, declarei, transmitindo minha preocupação.
“Isso será considerado”, assegurou o cavaleiro.
O castelo imponente continuava a dominar minha visão, e eu sentia uma mistura de emoções dentro de mim. A jornada estava longe de ter acabado, e novos desafios e descobertas aguardavam, dentro daquelas muralhas majestosas.
***
Após um trajeto que pareceu um tanto longo, finalmente alcançamos o castelo. Ao descer da carruagem, percebi que todos os olhos dos guardas presentes se voltaram para mim, carregados de surpresa e, em alguns casos, desconfiança. Seguindo o guarda que parecia ser o superior, fomos conduzidos para dentro do castelo. Os olhares curiosos e, por vezes, desconfortáveis dos servos que cruzavam nosso caminho não me abalaram, mas mantive minha atenção fixa no nobre que me guiava para não me perder nos corredores labirínticos do castelo.
Após percorrer um caminho considerável, chegamos a uma imponente porta de ouro. O guarda deu duas batidas leves, e a porta começou a se mover, revelando um vasto salão repleto de nobres e guardas. Como se um único organismo, os olhares intensos de todos os presentes se voltaram na minha direção, e mana de cada nobre parecia se erguer como uma onda, uma tentativa de me intimidar. Era evidente que eu era o foco de atenção, e essa atenção não parecia ser amistosa.
Em busca de auxílio, recorri a Noir mentalmente, e ele prontamente me respondeu. Uma sensação reconfortante e protetora me envolveu, como se estivesse cercado por uma barreira que neutralizava a intensidade das auras de mana emanadas no local. Era como se Noir estivesse me defendendo de toda essa hostilidade direcionada a mim, e eu senti uma onda de gratidão por sua ajuda.
O nobre que me acompanhava também parecia incomodado pela intensidade avassaladora da hostilidade dos demais. Em determinado momento, ele parou de se mover e se curvou levemente. Pegando o sinal, eu imitei o gesto e me ajoelhei, direcionando meu olhar para a frente. Foi então que, finalmente, notei a presença de quatro indivíduos que estavam claramente me observando. Eram eles, as figuras que eu esperava encontrar nesse encontro crucial.
A primeira pessoa que atraiu minha atenção foi uma jovem de cabelos rosados, cujo olhar vermelho carregava um brilho sutil e misterioso. Seus fios cor de rosa eram tão delicados ao olhar quanto as pétalas de uma rosa, algumas mechas caíam graciosamente emoldurando seu rosto angelical. A palidez de sua pele contrastava lindamente com as bochechas coradas, emanando uma doçura encantadora. Seus lábios pareciam botões de rosa prestes a se desabrochar, e um tímido sorriso iluminava todo o seu semblante juvenil.
Seus olhos vermelhos, como rubis preciosos, eram hipnotizantes e pareciam irradiar uma intensidade inexplicável. A cada piscar, pequenos brilhos pareciam dançar em suas íris, conferindo-lhe uma aparência mágica e cativante. Sua expressão combinava curiosidade com uma serenidade única, como se ela estivesse conectada ao mundo de uma maneira especial. Vestindo um traje nobre, seu vestido fluía com suavidade à sua volta, como se tivesse sido tecido a partir das próprias cores da natureza. Bordados detalhados adicionavam um toque de sofisticação, exalando graciosidade e requinte.
A segunda pessoa que meu olhar alcançou era uma mulher de tirar o fôlego, com cabelos castanhos escuros que caíam em ondas perfeitamente definidas, reluzindo como ébano polido à luz do sol. Seus olhos vermelhos eram como rubis ardentes, profundos e hipnotizantes, carregados de uma intensidade magnética que parecia penetrar até a alma.
Sua beleza era inigualável, digna de uma nobre da mais alta classe em uma narrativa de realeza. Seu rosto esculpido à perfeição exibia traços delicados e simetria invejável, realçando ainda mais sua graça natural. Sua pele alva era tão suave quanto pétalas recém-desabrochadas de uma rosa, conferindo-lhe um aspecto etéreo e encantador.
Ela estava envolta em um vestido feito de tecido luxuoso, que fluía com elegância ao redor de sua figura esguia. A peça era adornada com detalhes ricamente bordados, reluzindo com fios dourados e pedras preciosas, realçando sua elegância majestosa. Uma coroa cravejada de diamantes adornava sua cabeça, enfeitando-a como uma rainha de contos de fada.
Sua postura era nobre e graciosa, emanando uma aura de confiança e charme que cativava todos ao seu redor. Cada gesto que ela fazia era executado com uma graça quase sobrenatural, como se ela estivesse em um balé celestial.
A terceira pessoa que capturou minha atenção era um homem verdadeiramente majestoso, cuja presença enchia o ambiente com uma aura de poder e grandeza. Seus olhos azul-escuros, profundos como o oceano em uma noite estrelada, emanavam uma sabedoria ancestral que parecia atravessar séculos de história. Seu olhar penetrante parecia sondar almas, revelando segredos e anseios profundos, como se ele pudesse decifrar os mistérios do universo.
Seus cabelos vermelhos como chamas pareciam dançar em volta de seu rosto, refletindo a intensidade ardente de sua personalidade. Cada mecha parecia ter vida própria, como fagulhas dançantes que iluminavam o ambiente ao redor dele. Seu porte era imponente e ereto, como se tivesse sido esculpido pelas próprias mãos divinas para assumir a posição de um rei.
Uma coroa magnífica adornava sua cabeça, simbolizando seu papel como monarca supremo. Incrustada com gemas preciosas, a coroa brilhava com uma luz própria, em perfeita harmonia com a personalidade carismática do rei. Ela conferia um toque ainda mais grandioso à sua figura, fazendo-o parecer ter saído diretamente de um retrato real que ilustrava os mais nobres contos de cavaleiros e dragões.
A última figura que surgiu diante de mim trouxe uma surpresa sem igual. Seus olhos vermelhos eram tão intensos quanto brasas ardentes, fixando-se em mim enquanto seus cabelos negros caíam em cascata sobre seus ombros de forma graciosa. No entanto, o que mais me deixou perplexo foi sua aparência, um reflexo claro e nítido da minha própria imagem, como se estivesse me observando em um espelho perfeito.
Cada traço de seu rosto era uma cópia exata do meu. Seus olhos, sua expressão, até mesmo os menores gestos pareciam ser uma réplica fiel de mim mesmo. Era como se o destino tivesse decidido brincar, criando um duplicado para desafiar minha compreensão.
A surpresa se misturou com uma sensação de inquietação e curiosidade. Quem era essa pessoa que se assemelhava tanto a mim? O enigma de sua existência estava diante de mim, e a sensação de estar encarando um reflexo vivo de mim mesmo era desconcertante.
“Qual é o seu nome, jovem?”, falou o homem sentado no trono, sua voz grave e profunda ecoando pelo salão.
“Sou Azrael”, respondi sem vacilar diante da presença imponente.
A mulher ao lado dele suspirou, como se aliviada por algo. Notei seus olhos vermelhos, como se ela tivesse chorado momentos atrás, mas agora tentasse ocultar sua fragilidade.
“Azrael? Um belo nome”, comentou a mulher, sua voz suave e delicada, carregando um peso indescritível.
“Eu sou Lilith”, ela indicou o homem ao seu lado. “Este é Belial, e ao lado dele está Alice.”
Ela então voltou seu olhar para o jovem idêntico a mim.
“E ao meu lado está Ex”, completou.
Belial suspirou, tentando manter uma expressão imponente.
“Posso lhe fazer uma pergunta? Pode nos contar a sua história?”, perguntou o homem, evidenciando uma genuína curiosidade. O mesmo valia para os nobres que permaneceram em silêncio.
Sem hesitar, narrei todos os acontecimentos que vivi no centro de pesquisas. Os dias de dor e sofrimento enquanto meu sangue era retirado para experimentos. Falei sobre minha convivência com Mana e como consegui escapar. Detalhei o desafio para adquirir a espada lendária e a batalha contra a besta divina.
Não omiti nada, senti que não havia motivos para esconder nada daqueles que pareciam interessados em minha história.
“Que horror”, Alice parecia à beira das lágrimas enquanto ouvia a narrativa. O mesmo ocorreu com Lilith, que lutava para manter sua compostura diante dos nobres.
“Você disse que obteve uma espada, correto? Onde ela está?”, indagou o homem, talvez buscando uma confirmação visual para a minha história. Embora Noir fosse minha companheira, permaneci cauteloso, consciente de que a situação poderia mudar.
“Noir, revele-se.”
A espada negra apareceu flutuando ao meu lado, revelando-se para todos os presentes. Ela sempre esteve ali, mas permaneceu invisível até eu decidir revelá-la.
“Essa é a espada!”, exclamou Alice, surpreendendo os nobres com a súbita aparição da arma que estivera oculta até então.
“Isso é uma ordem. Todos saiam do salão. A família real vai conversar com o jovem Azrael”, declarou Belial com autoridade. Rapidamente, os nobres deixaram o recinto, deixando apenas as cinco pessoas presentes.
Lilith se levantou de seu trono e correu em minha direção, me envolvendo em um abraço caloroso enquanto deixava suas lágrimas fluírem livremente. Não retruquei seu gesto, mas estranhamente senti uma dor aguda em meu peito enquanto ouvia suas palavras.
“Me desculpe, minha criança. Me desculpe. Se eu fosse mais forte naquela época, você não teria passado por todo esse sofrimento”, ela lamentou enquanto continuava a me abraçar com força, tornando a situação um tanto desconfortável.
Contra todas as minhas expectativas, meu corpo se moveu por conta própria, abraçando-a de volta. A sensação de sua pele macia era estranha, mas ao mesmo tempo reconfortante. Ela pareceu surpresa com a minha resposta, e pude notar um sutil sorriso nos lábios de Belial.
Alice correu em nossa direção e parou diante de nós. Seus olhos expressavam sinceridade e um sorriso encantador adornava seu rosto enquanto ela mantinha uma distância respeitosa.
“Eu sou… como eu deveria fazer isso?”, Alice perguntou a Lilith, claramente envergonhada.
Lilith sorriu enquanto enxugava suas lágrimas. “Apenas se apresente”, sua voz tremulante transbordava de compaixão e carinho.
“Claro… Olá, Azrael”, disse Alice timidamente. “Pode não parecer, mas sou sua irmã mais velha. Aquele homem ali é nosso pai, e o garoto que se parece tanto com você é seu irmão mais novo, Ex.”
“Esse é o nosso pai?”, murmurei, quase involuntariamente, observando o homem de presença imponente sentado no trono. Minha voz carregava uma mistura de surpresa e um toque de inquietação.
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