Índice de Capítulo

    Passado 8

    Enquanto percorria os corredores do majestoso castelo, a ausência dos meus irmãos era palpável, e até mesmo Mana parecia ter se escondido nos recantos do palácio. A vontade de indagar aos guardas se tornou irresistíve, revelando-me que Ex e Alice haviam embarcado para uma conferência. Quanto a Mana, seus passos a levaram aos serenos jardins do castelo, incentivando-me a procurá-la antes de me aventurar para fora.

    Ao adentrar o exuberante jardim, de imediato percebi a figura de Mana, envolta em uma aura de melancolia. Seus olhos, normalmente radiantes, agora refletiam uma tristeza profunda, enquanto ela contemplava o vasto céu azul. Mesmo sem expressar abertamente, era evidente que ela estava enfrentando algum sofrimento.

    As palavras de Samael haviam previamente informado sobre a dor avassaladora que assolava Mana. Fui instruído a aguardar um ano, pois os efeitos do elixir, ao que parecia, seriam efêmeros. “Noir…”, chamei minha companheira que prontamente surgiu ao meu lado. “Seria possível transferir 90% da dor que Mana está suportando?”, indaguei.

    Noir suspirou levemente, mas sem hesitar, empregou a magia que Samael havia ensinado. Conforme solicitado, Noir transferiu a agonia do corpo de Mana para o meu próprio ser. Samael explicou a Mana que sua dor seria consideravelmente aliviada na maioria do tempo, contudo, eu não poderia suportá-la indefinidamente. Portanto, desativava essa habilidade durante a noite, permitindo que Mana descansasse, e a reativava pela manhã.

    Com a magia de Noir infiltrando meu ser, a dor de Mana penetrou profundamente, como se atingisse diretamente minha alma. A dor lancinante ameaçava me envolver, mas minha experiência nos tratamentos do centro de pesquisa tornava a angústia mais suportável. Mesmo assim, caí no chão, lutando para encontrar a calma, enquanto meus ossos e carne ardiam como brasas. Embora essa dor me assolasse diariamente, ainda não conseguia me acostumar.

    Cada dia que passava, a intensidade da dor aumentava, atingindo um ponto quase insuportável. Apesar do meu desejo de absorver toda a dor, Samael me repreendeu severamente, alertando que Mana não suportaria o impacto no momento em que a magia fosse desativada.

    “Obrigado, Noir”, agradeci à minha companheira.

    “Az, você é um jovem forte, mas suportar a dor do veneno de uma besta divina seria desafiador, até mesmo para um adulto da primeira geração”, murmurou Noir em um suspiro desanimado

    “É exatamente por isso. Mana não é uma adulta e muito menos da primeira geração.”

    Mana era apenas uma criança, decidindo suportar a agonia do veneno para permanecer ao meu lado por mais tempo. Senti que era minha responsabilidade, pelo menos, tentar ajudá-la. Olhei na direção de Mana, notando uma considerável diminuição na intensidade de sua dor. Os olhos antes vazios agora brilhavam com sua luminosidade característica.

    Decidi me aproximar, liberando parte da minha mana para que ela percebesse minha presença. Em resposta, um sorriso forçado e uma expressão carinhosa surgiram em seu rosto. Revelando-me gradualmente, esperei para que ela se preparasse, antes de me manifestar. Caminhei lentamente em sua direção e sentei ao seu lado.

    “O dia está maravilhoso”, disse Mana, apreciando os raios de sol que acariciavam seu rosto. Senti uma angústia ao vê-la se esforçar para sorrir em minha presença, mas eu próprio não podia fazer muito a respeito.

    “Você não deveria estar recebendo o tratamento dos médicos?” perguntei, expressando minha preocupação, e recebi um tapinha nas costas como resposta.

    “Fufu, está preocupado comigo? Não se preocupe. Pedi para que o tratamento fosse realizado um pouco mais tarde. Apreciar os raios de sol da manhã é uma sensação muito boa.”

    Me desculpe, Mana. Por não conseguir te ajudar ainda.

    “De qualquer forma, você não vai sair hoje? Ouvi dizer que os guardas estavam preparados para sua próxima tentativa”, comentou Mana, notando os guardas que nos observavam. “É divertido vê-los te procurando.”

    Fiquei preso por anos no laboratório; não quero me sentir da mesma forma.

    “Belial disse que eu precisava de escolta quando saísse do palácio, mas não acho que seja necessário.”

    Não imaginei que ser um príncipe seria tão problemático.

    “Eu ouvi dizer que ainda existem nobres insatisfeitos com sua presença.”

    Era compreensível. Um filho que desapareceu há anos reaparece repentinamente e já recebe o direito de lutar pelo trono. Os nobres que apoiam Alice se sentem ameaçados.

    “Não entendo o motivo. Alice mesmo me contou que não queria o trono, mas não tinha o que fazer.”

    “Oh? Vocês ficaram bem próximas.”

    Minha surpresa provocou um leve sorriso no rosto de Mana. “Não sei do que está falando.”

    Mas era realmente uma pena. Alice só perderia o direito ao trono se fosse derrotada, e a questão era que não parecia possível derrotá-la, já que ela era a mais forte de sua idade.

    “O que me deixa mais curiosa é o motivo de seu desaparecimento. Talvez tenha se encontrado com alguma mulher?” sugeriu Mana. “Uma filha de nobre, ou uma plebeia?”

    “Não sei do que está falando”, cortei rapidamente.

    “De qualquer forma, não me importo muito, já que você parece feliz.”

    “Você acha?”

    “Eu estou errada? Se não estivesse feliz, não sairia todos os dias. Com exceção dos dias de treinamento, você passa a manhã toda fora e algumas vezes à noite.”

    Foi então que uma ideia surgiu em minha cabeça. Se o motivo de me sentir aliviado e menos estressado, mesmo vivendo no palácio, era ir até ‘aquele’ lugar, talvez Mana pudesse experimentar o mesmo.

    “Mana, que tal fazer um passeio comigo?”, perguntei a minha querida irmã, que pareceu surpresa com minha proposta. “Se não estiver se sentindo bem, eu vou entender.”

    “Não é isso, eu estou perfeitamente bem”, ela disse enquanto se levantava e se movimentava para mostrar que estava bem. “Só fiquei um pouco surpresa. Se for com você, eu iria a qualquer lugar”, suas palavras me trouxeram confiança. “Então, para onde vamos?”

    ***

    Caminhamos por alguns minutos na floresta atrás do castelo, conseguindo sair com facilidade, pois Mana era habilidosa em se esconder, e os guardas não notaram nossa presença.

    “O castelo vai ficar uma bagunça quando descobrirem que saímos”, disse Mana em um suspiro.

    “Não se preocupe”, respondi sem pressa. “Deixei uma mensagem em meu quarto. Não é como se fôssemos desaparecer por uma semana.”

    Percebemos que havíamos passado por um pequeno riacho, indicando que meu destino estava próximo. Não demorou muito até encontrarmos uma pequena casa rodeada por várias flores.

    A jovem que regava suas flores notou nossa presença e se aproximou, limpando a sujeira de suas roupas. “Az! Bem-vindo.” Seu olhar curioso se voltou para Mana ao meu lado, revelando o que ela queria dizer.

    “Me desculpe por não tê-la apresentado antes”, disse eu sinceramente. “Essa é a minha irmã, Mana, aquela de quem comentei alguns dias atrás.”

    A jovem de cabelos negros se aproximou de Mana com um olhar curioso e um sorriso amigável. “Oh? O Az falou bastante de você”, disse ela, encantando Mana, que correu para abraçá-la enquanto sorria.

    “Azrael, que coisinha mais bonitinha você estava escondendo”, disse ela animada, abraçando e acariciando.

    “Eu sou uma coisinha?” Seus olhos negros se voltaram para mim, como se estivesse se divertindo.

    “Me desculpe, Mana, essa é Eisheth.”

    Mana rapidamente soltou Eisheth enquanto tentava se controlar. “Me desculpe, Eisheth, mas você é tão fofa que não consegui me controlar.”

    Eisheth sorriu, parecendo gostar das palavras de Mana. “Eisheth, poderia mostrar as flores para Mana?”, perguntei, já que tinha outros assuntos para resolver.

    “Oh? Mana gosta de flores?”, perguntou Eisheth de forma fofa. “Se estiver ao seu lado, eu gostaria até mesmo de fogo. Por favor, esqueça meu irmão e case-se comigo”, disse Mana em tom de brincadeira, mas a resposta de Eisheth a surpreendeu. “Isso não é possível, somos destinados a ficar juntos.”

    Suas palavras surpreenderam não apenas Mana, mas também a mim.

    “Já tem um tempo que ela fala coisas sem sentido. Vamos brincar mais tarde, Eisheth. Onde está sua mãe?”

    “Ela está na cozinha.”

    Me despedi das duas e fui até a cozinha, onde o cheiro de comida me pegou desprevenido. Apenas pelo aroma, eu conseguia imaginar o quão saborosa era a comida que estava sendo preparada.

    Por um momento, pensei no que teria acontecido se não tivesse encontrado Eisheth. Ela pensou que eu estava perdido e me trouxe até sua casa, sempre amigável enquanto me chamava para brincar e acompanhava-me em suas aventuras pela floresta.

    “Olá, Ophelia, como tem passado?”

    A linda mulher de cabelos e olhos negros me olhou com um sorriso enquanto colocava um prato na mesa.

    “Olha, consegui criar uma nova receita. Você será o primeiro a provar, sinta-se grato”, disse ela, colocando a comida, que mais parecia um monstro púrpura, no prato.

    “Tenho que comer isso?”, perguntei preocupado.

    “Não gostou?”, perguntou Ophelia, fazendo biquinho

    “Parece apetitoso”, desisti rapidamente e me preparei para comer. A primeira colher foi a mais difícil, mas ao provar, minha boca parecia estar no céu. Todo o ambiente mudou para um branco puro enquanto eu escutava a voz de Ophelia ao longe: “Não siga para a luz.”

    Demorou algum tempo para recuperar a consciência. Percebi que Eisheth cutucava meu rosto com um galho de árvore, enquanto Mana sorria euforicamente.

    “Fufu hahahah Ele, ele comeu e aí caiu”, disse Mana, incapaz de conter sua risada.

    “Hmm, não sei o que aconteceu. Tenho certeza que a comida estava deliciosa”, comentou Ophelia, colocando o dedo indicador na bochecha, visivelmente confusa.

    “Mamãe, eu lhe disse que sua comida é horrível.”

    “Nossa, Eisheth se tornou tão cruel, certo Mana?”

    “Você está certa, mamãe de Eisheth. Tão cruel.”

    Como eu temia, Mana pareceu fazer amizade com Ophelia extremamente rápido.

    “Não falem de mim assim”, disse Eisheth, mostrando a língua. “Az, não morra ainda. Temos uma longa história”, gritou Eisheth com lágrimas nos olhos.

    “Eu estou bem, Eisheth”, eu disse enquanto me levantava e acariciava a cabeça dela.

    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 0% (0 votos)

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.

    Nota