Capítulo 99 — Despertar
Eriel
Olhando para o vasto céu, prestes a mergulhar na penumbra do anoitecer, questionei-me sobre o propósito de minha presença ali. Estava envolvida em conflitos aparentemente sem sentido, como guerras. Embora tenha sido eu mesma quem solicitou participar, reconheci que demonstrar o quanto amadureci era uma tarefa árdua.
Desferi uma magia luminosa em direção ao exército de mortos-vivos. As lâminas etéreas de mana perfuraram os corpos de vários inimigos, porém sem causar a queda deles. “Você deve mirar na cabeça, é a melhor forma de neutralizá-los”, aconselhou Zoe, a presença espiritual que residia dentro de mim.
Apesar do desgaste que se manifestava em meu corpo, o cansaço persistia, como se os minutos se estendessem infinitamente. Paradoxo, minha leal espada, em silêncio, reunia minha mana em sua lâmina. Cortes precisos e magias eram minhas únicas habilidades, porém parecia haver um limite para o que eu era capaz de realizar.
Conforme a batalha se desenrolava ao meu redor, eu me encontrava completamente sozinha, sem aliados para compartilhar o fardo ou proteger minhas costas. Cada golpe que eu desferia com Paradoxo era uma dança mortal, uma luta solitária contra as hordas de mortos-vivos que avançavam sem piedade.
A magia que fluía de minhas mãos se manifestava em feixes brilhantes de luz, perfurando as trevas e dissipando as sombras que cercavam os inimigos. Eu me movia com agilidade e precisão, desviando dos ataques dos mortos-vivos enquanto buscava brechas em sua defesa para atacar.
Cada golpe era um lembrete de minha determinação implacável, um testemunho de minha vontade de lutar até o fim contra as forças do mal que ameaçavam consumir tudo à sua frente. Zoe sussurrava conselhos e encorajamentos, sua voz ecoando em minha mente como um farol em meio à escuridão. Segui suas orientações com devoção, confiando em sua sabedoria para guiar meus passos na batalha.
Apesar da solidão que pesava em meu coração e da exaustão que se acumulava em meus membros, eu me recusei a desistir. Com cada golpe desferido e cada magia conjurada, eu renovava minha determinação de enfrentar o inimigo até o último suspiro, sabendo que o destino de meu mundo dependia de minha coragem.
Foi quando meu corpo cedeu ao cansaço. Minhas mãos não se moviam e meu corpo se tornou pesado. Os inimigos se amontoaram à minha frente, vindo todos de uma vez em minha direção. A horda de inimigos me cercou e todos avançaram, me cobrindo com uma onda de inimigos que parecia infinita.
Os cortes em meu corpo e os ataques deixavam uma sensação de desespero, como se esse fosse meu último momento. Esse é o meu fim? Pensei comigo mesma.
Foi quando lembrei do treinamento que fiz no mundo interno pouco antes de decidir vir ao campo de batalha. Em um momento, olhei a enorme barreira que existia em minha habilidade, como um abismo onde eu nunca poderia atingir o meu potencial máximo.
Foi quando Zoe se aproximou. Seus olhos não demonstravam alegria, já que os dias de treinamento foram infernais. Contudo, aprendi algo com a infernal jornada de treinamento no mundo interno.
“Será que um dia eu vou ser alguém que pode estar ao lado do Azrael?”, perguntei para Zoe, que parecia perdida em seus pensamentos. “Ele não está em um patamar muito elevado. Meu primeiro encontro com Legion foi conturbado, mas logo nos tornamos próximos, o mesmo vale para vocês.”
Talvez eu seja a responsável por colocar uma barreira em meu próprio crescimento. “Veja pelo lado bom, você aprendeu algo que nem mesmo Azrael é capaz de usar com maestria.”
Foi quando voltei ao campo de batalha. A enorme quantidade de inimigos e os ferimentos de batalha pareciam apenas uma brincadeira. Usando [Retroceder], curei todos os ferimentos no meu corpo e usei minha magia para afastar o máximo de inimigos possível.
“Está na hora.”, eu disse com um leve suspiro antes de me preparar mentalmente. “Forma draconica.”
Todo a minha volta foi devastado pela intensa onda de poder emanando de meu corpo, mesmo para aqueles que pareciam mais fortes, foram varridos da existência sem dificuldades.
Meus cabelos, outrora castanhos, se tornaram brancos como a neve e mesmo olhos assumiram a mesma tonalidade de branco puro. Até mesmo minhas roupas mudaram para uma armadura leve feita de metal e a espada em minha mão começou a reagir com a mana de um dragão.
Foi-me explicado sobre a forma diacônica por Zoe. De acordo com Zoe, quando atingimos essa forma, é como se comunicar com nossos corpos do passado, tendo não apenas o poder, mas o sangue puro de apenas uma raça e a infinita capacidade ofensiva que os dragões possuíam.
Usar essa forma no mundo real consumia uma astronômica quantidade de mana, tornando difícil de manter por muito tempo. “Tempo”, minhas palavras criaram uma onda de choque que paralisava tudo ao alcance da habilidade, como se o próprio conceito de tempo fosse apagado da realidade.
Meus movimentos se tornaram leves e precisos, avançando por todos os inimigos sem medo, como se meus pensamentos tivessem se alinhado com minhas habilidades. Minhas capacidades físicas estavam em seu ápice e um simples mover de minha espada destruía meus inimigos como cortar simples insetos.
“Eriel.”, disse Zoe desesperada. Continuei me movendo e à medida que o tempo passava, os inimigos que antes pareciam infindáveis, agora estavam em um número limitado.
“Eriel.” {Retroceder}, utilizando a habilidade em meu corpo, toda a mana que perdera ao longo desses minutos foi restaurada.
Foi quando comecei a sentir uma euforia ao cortar meus inimigos. Meu corpo parecia se mover sozinho enquanto a alegria de estar em um campo de batalha me preenchia.
“Eriel!” Foi quando ouvi a voz de Zoe ao longe, como se ela de alguma forma estivesse tão distante que sua voz se tornava quase inaudível.
“Eriel, acorde!” Meus pensamentos voltaram ao normal e senti meu corpo pesado. “Zoe, o que aconteceu?”, perguntei confusa ao notar que meus inimigos haviam desaparecido.
“Você quase enlouqueceu. Eu disse para não abusar de sua forma perfeita.” Zoe havia me explicado o motivo de Azrael não usar sua forma de dragão. Seu poder poderia corromper uma mente sem preparo e dependendo do usuário, quanto mais poderoso, mais difícil seria para se manter sã.
“Eu quase…”, comentei em um suspiro. Se não tivesse voltado a tempo, a loucura teria me consumido e eu estaria em um estado descontrolado parecido com o Azrael no país dos anjos caídos.
“Não se preocupe, eu estava preparada para te impedir, mas fico feliz que nada de grave aconteceu.” Pensei que poderia usar essa forma no mundo real, mas parece que ainda tenho muito a treinar.
“Ao menos, já acabei por aqui.”
***
Naara
“Ei, cachorrinho…”, eu disse para a imponente criatura negra que me encarava com seus olhos púrpura. Suas três cabeças acompanhavam meus movimentos. Observei suas ações por alguns segundos até perceber que ele não tinha intenção de atacar. Ele estava posicionado estrategicamente na entrada, protegendo a passagem que levava até Azrael.
Poderia permanecer aqui para evitar conflitos, mas isso não seria possível. Quando os outros terminassem sua missão, teríamos que ir até Azrael, e o Cerberus seria um obstáculo difícil. Entendia o quão assustador o cão infernal era, pois sabia que Azrael considerou ficar e lutar contra ele. Me voluntariar era apenas um reflexo da confiança que tinha em mim mesma. Para ser honesta, nunca vi o Cerberus em batalha, mas Azrael presenciou essa criatura destruindo exércitos inteiros com seu sopro infernal.
Dei um passo à frente, me aproximando do Cerberus, e foi quando notei sua postura mudar. Suas três cabeças mostraram os dentes em minha direção. “Cachorrinho, seu elemento é o fogo, certo?”, perguntei, sabendo que ele podia me entender. “Contudo, eu trabalho com água, sabe?”
Meus pensamentos eram simples: deveria apenas apagar seu fogo e congelar seu corpo, de maneira rápida e eficiente. Foi quando ouvi a risada sinistra que saía da boca da cabeça central do Cerberus. “Fufufufu Hahahahaah Você é confiante em suas habilidades, eu admiro isso.”, ele disse, criando uma fina linha de fogo a pouco mais de 10 metros de onde ele estava. “Se atrever a passar por essa linha, será a última coisa que fará. Não haverá volta.”
Sua voz era rígida e estranha, contudo, não me causava medo. “Faremos assim então.” Quantos anos se passaram desde a última vez que enlouqueci? Pensei. Comecei a caminhar em sua direção sem demonstrar hesitação ou medo, e enquanto caminhava, canalizei mana em minha mão para retirar minha máscara do espaço dimensional.
Olhei para a minha máscara antes de colocá-la em meu rosto, uma máscara branca com runas em formatos de ondas negras. A runa de poder embutida tinha o papel de tornar a máscara quase indestrutível e não permitia que ela saísse do meu rosto a menos que eu mesma a tirasse.
Colocando a máscara, a runa se ativou e uma onda de mana passou pelo meu corpo, sinalizando que o efeito passivo da máscara tinha ativado. Para cada cavaleiro, sua máscara tinha um papel diferente, mas para mim, era o mesmo que o Azrael. As máscaras gêmeas tinham a habilidade de suportar todo o dano recebido em nossos corpos, claro que não era o dano de um inimigo, mas o dano do meu próprio poder.
O poder de Azrael estava em um nível acima, por isso não apenas sua máscara, mas suas roupas também faziam esse papel. Ao atravessar a linha de fogo, minhas vestes mudaram para um sobretudo amarelo-alaranjado com runas de poder douradas e meu pingente saltou para a frente do meu peito. O pingente tinha palavras tão pequenas nele que seriam quase ilegíveis, mas eu conseguia ler muito bem o que estava escrito “Para a minha fiel companheira”.
Ao atravessar a linha, bolas de fogo foram lançadas em minha direção e foi quando retirei a minha arma do espaço dimensional. Sua lâmina era negra como a noite mais escura, interrompida apenas por runas que brilhavam em tons de amarelo, como estrelas cintilantes em um céu noturno. As runas eram mais do que meros adornos. Eram símbolos de poder, colocados ali para aumentar o poder de corte e a durabilidade da arma. Quando imbuída de mana, a runa se ativava, permitindo ao usuário se conectar com a arma e aumentar sua maestria.
A gadanha tinha um detalhe ainda mais impressionante. Na ponta do cabo, havia uma caveira. Mas não era uma caveira comum. Seus olhos eram feitos de diamantes, que refletiam a luz e brilhavam com uma intensidade quase sobrenatural.
Usando a lâmina pesada de minha arma, girei em um movimento simples cortando as bolas de fogo do cão infernal e avançando em direção ao seu grande corpo.
O Cerberus rosnou e tentou me morder com suas três cabeças, mas eu desviei com agilidade, aproveitando a minha vantagem de velocidade. Com um golpe rápido, cortei uma das cabeças do monstro, fazendo-o uivar de dor e raiva. O sangue escorreu pelo seu pescoço, mas não demorou muito para que a ferida se fechasse, regenerando a cabeça perdida.
“Você acha que isso vai me deter?” – O Cerberus zombou, com uma voz gutural e ameaçadora. – “Você é apenas uma criatura insignificante, que se atreve a desafiar o guardião do portal do inferno!”
“Eu não sou insignificante, seu idiota!” – Retruquei, ativando o meu poder.
A minha mana brilhou em tons de azul e branco, envolvendo o meu corpo e a minha arma. A minha gadanha se tornou mais afiada e mais leve, permitindo-me atacar com mais força e precisão. A máscara também se iluminou, aumentando a minha resistência e a minha percepção.
Lancei uma rajada de gelo em direção ao Cerberus, tentando congelar as suas três cabeças. O monstro rugiu e cuspiu fogo, derretendo o gelo e criando uma nuvem de vapor. Aproveitei a distração e me aproximei do Cerberus, tentando cortar as suas cabeças novamente.
“Você é persistente, eu admito.” — O Cerberus disse, esquivando-se dos meus ataques. – “Mas você não tem chance contra o meu fogo infernal. Ele é a fonte do meu poder e da minha vida. Ele é inextinguível e imparável!”
“Não seja tão confiante, seu cão estúpido.” — eu disse, irritada. — “O meu gelo é a fonte do meu poder e da minha vida. Ele é frio e implacável. Ele pode apagar o seu fogo!”, eu disse irritada, mas achei que parecia uma criança brigando com um amiguinho.
“Isso é o que veremos!” — o Cerberus gritou, liberando uma explosão de fogo em todas as direções. — “Queime, Insignificante! Queime até virar cinzas!”
Me protegi com uma barreira de gelo, mas senti o calor intenso do fogo. A barreira começou a rachar e a derreter, e sabia que não ia aguentar por muito tempo. Precisava de uma estratégia para vencer o Cerberus, ou ia morrer ali.
Olhei para o meu pingente, lembrando-me do meu mestre e amigo, Azrael. Ele me ensinou tudo o que sei sobre magia e combate. Ele me deu a minha máscara, a minha gadanha e o meu pingente. Me deu um propósito e uma missão.
“Eu não vou desistir, Azrael. Eu não vou desistir por você.” — eu disse, com determinação. Seu maldito! Pensei — “Vou encontrar uma forma de derrotar esse monstro. Cumprirei a nossa promessa.”
Me concentrei na minha mana, sentindo a sua pulsação e a sua força. Lembrei das lições de Azrael, sobre como usar a mana de forma criativa e eficiente. Lembrei-me das técnicas que ele me ensinou, sobre como combinar o gelo com outras formas de magia.
Tive uma ideia. Era arriscada, mas era a minha única chance. Sorri por baixo da máscara e preparei o meu ataque final. Juntando minha mana na lâmina, concentrei um ataque poderoso enquanto canalizava a maldição em minha arma. O ar sombrio emanando dela deixou o Cerberus em alerta. {Maldição, Morte: Fim da Linha}
Corri o mais rápido que pude em direção ao Cerberus que cuspiu fogo em minha direção, usando uma fina camada de gelo, ocultei minha presença para fazê-lo pensar que fui atingida e criei um caminho de gelo. Deslizando pelo caminho recém-criado, me movi até as costas do Cerberus, aparecendo de surpresa e criando um pequeno corte em suas costas.
“Quando você?”, ele gritou surpreso.
Me afastei, esperando os efeitos do meu ataque, quando uma onda de choque atingiu meu corpo. Fui lançada violentamente ao chão, sentindo algo perfurar meu corpo. A dor da perfuração e dos ossos quebrados me fez gritar em agonia, enquanto as garras do Cerberus perfuravam minha perna direita.
O grande cão infernal estava diante de mim, perfurando meu corpo como se meu ataque não tivesse surtido efeito. Em seus olhos, apenas um ódio indescritível. Sua força superava em muito a que eu havia visto momentos atrás, como se ele estivesse apenas brincando.
Tentei me soltar, mas sem sucesso. Sua força me pressionando para baixo era tão opressora que nem mesmo meu esforço desesperado era suficiente. Usei minha arma para cortá-lo, mas a lâmina apenas ricocheteou em sua pele, como se estivesse batendo em aço.
“Nunca pensei que você tivesse a habilidade daquela pessoa”, ele disse com sua voz irritada. “Se você a tem, significa que o cara que me visitava para brincar…”
O Cerberus me levantou com sua garra e me arremessou para longe, em seguida se aproximou rapidamente. Seu focinho estava perto o suficiente para sentir sua pesada respiração.
“É verdade… Meu mestre comentou que ele se foi…”, ele disse com tristeza e sua mana foi canalizada em sua boca. {Fogo infernal} Sua magia foi lançada à queima-roupa, destruindo parte de minhas roupas e queimando minha pele. A dor lancinante que senti nesse momento era diferente de tudo, como se eu estivesse próxima da morte, mas não era permitida se aproximar demais.
“Vamos, você não é a tão temida Cavaleira da Morte. Vamos ser insignificantes, me mostre o que consegue fazer”, ele disse enquanto usava sua enorme pata para perfurar o meu corpo enquanto evitava pontos vitais.
Merda, eu não consigo fazer isso… Pensei. Esse era o motivo de Azrael cogitar lutar contra esse monstro.
{Ei, você não vai ceder à loucura?} A voz de Aquafira, como um maldito demônio em meu ouvido, me fez voltar à razão, apenas para sentir a dor lancinante de ter meu corpo perfurado mais uma vez.
Não posso, Azrael disse para não fazer isso… Pensei.
{Ele disse para cuidar melhor de seu corpo, foi isso que ele disse. Vamos, você vai morrer! Azrael — meu rei, nunca permitiria isso.}
“Está tudo bem mesmo?”, sussurrei com a voz fraca.
{Sim. Você não pode morrer, vamos, estou te observando. Você deseja que eu volte aí para te ajudar, minha querida companheira?}, a voz transmitida pelo mundo interno me deixou confiante mais uma vez.
Então, você estava me observando, hein? Pensei.
“O que você está sussurrando?”, perguntou o Cerberus, me observando ainda com fúria e tristeza aparente.
“Vai se foder!”, gritei.
Mas minhas palavras despertaram a ira do cão infernal que usou sua enorme pata para me afundar no chão.
{Inverno Sem Fim} Ativando meu Inverno Sem Fim, todo o ambiente se tornou frio ao ponto de conseguir ver minha própria respiração. O Cerberus não entendeu o que estava acontecendo, mas não era necessário.
{Parede de Gelo} Usando minha Parede de Gelo, consegui retirar o Cerberus de perto e me levantei ainda cambaleando.
{Vamos, me mostre a Sua Loucura, Naara.} “Sim!”, respondi com um grande sorriso.
Movi minha mão e todo o gelo se transformou em água instantaneamente, me cobrindo e curando todas as minhas feridas. Eu ainda estava fraca, mas não era motivo para preocupação.
“Vamos, cachorrinho, a brincadeira começa agora!” Dos três dragões, Eriel, Azrael e Naara, eu era a única que conseguia entrar na minha forma perfeita, pois sabia o nome de minha forma e não apenas isso, a loucura estava ao meu lado desde o nascimento, logo não me afetava.
{‘Forma Draconica: Dilúvio’}, eu disse em sintonia com Aquafira.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.