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    Após seis horas de sono turbulento, o grupo de Bastien havia recuperado menos de um quarto da energia gasta. Eles teriam que descansar por quase três meses para poderem se recuperar completamente, no entanto, esse tempo não era cabível no atual estado. 

    O grupo se deslocou ainda na madrugada, aproveitando que a maioria das bestas regionais estariam descansando. Porém, esses cuidados chegavam a ser inúteis; a presença de Nihaya estava, de forma contínua, espantando qualquer besta, não importando sua força.

    Ao caminhar cerca de três horas, eles pararam para descansar novamente abaixo de uma clareira. Enquanto todos preparavam suas armas e depositavam energias novamente, Nihaya decidiu ressaltar o que estava de fato acontecendo e para onde estavam indo. 

    Se fosse por no mapa ao qual os agentes conheciam, eles estariam ao extremo leste, próximo ao litoral do Estado de Nethuns — região de origem do Theo, onde, inclusive, estavam próximos do ducado Lawrence.

    Porém, as coisas eram diferentes. Nihaya apontou que o ducado Lawrence não existia naquele mundo; o Arconte puxou o ducado, porém, há 200/300 anos, estava em seu início com o primeiro fundador, Erling Lawrence. 

    O djinn explicou que Erling morreu em uma das inúmeras guerras travadas com Bvoyna, ainda no mundo físico. Quando o ducado Lawrence veio para o domínio, seu reinado perdurou por apenas cinco gerações antes dos Emissários de Bvoyna destruírem a região por completo, graças ao medo de seu rei pela família Lawrence.

    Theo ficou surpreso, mas não cabisbaixo. 

    Na conversa anterior entre o rapaz e o djinn, Nihaya explicou que sua filha, Jeanne, era uma espécie de princesa general e que estava formando laços com os nobres e ducados contra o rei Bvoyna. 

    Ao receber a informação de que os Lawrence não existiam mais naquele mundo, surgiu a ideia de inventar que ele é o único remanescente. O que, se levar para a realidade, é um fato. Já que a garota, em tese, perceberia as mentiras de Theo, ela iria confiar primordialmente nele por suas palavras serem verdadeiras.

    Em meio a uma tragédia, achou-se uma solução.

    Nihaya então continuou explicando sobre os reinos daquele mundo. Existe o grande império de Bvoyna; Cephian, e os reinos aliados, comandados por seus Emissários. O império de Alsuhindr está comandando um combate armado há eras, buscando sempre se aliar aos reinos dispostos a lutar contra a tirania do Mephys. O que, infelizmente, não é um grande número.

    Existem cerca de 130 reinos, com 25 sendo da Aliança de Bvoyna — e ocupando o maior território do continente — e outros 13 aliados ao império Alsu. Entretanto, existem 92 reinos que se mantêm neutros desde o início. Alguns sofrem com a fome, outros estão em prosperidade por, vez ou outra, ajudarem ao exército de Bvoyna. 

    Porém, se colocarmos em números, o exército da Aliança de Bvoyna possui cerca de 690 mil de soldados, enquanto a Aliança Alsuhindr possui 500 mil. Embora sejam bem treinados, os dons sobrenaturais que o Mephys oferece aos soldados é o suficiente para atropelar o exército Alsu.

    Nihaya comentou sobre a possibilidade de pedirem ajuda ao Arconte do domínio, todavia, este se encontra em repouso. Apenas seu espírito paira pela dimensão, ao mesmo instante em que a consciência descansa para a próxima era.

    Um resumo do que Nihaya quis passar: são mortais lutando contra um ser sobrenatural, onde os humanos não possuem um deus para os proteger.

    Sara até ponderou entrar no debate: “Por quê deveríamos o ajudar? É um problema de outro mundo.” Mas, estava muito cansada para gastar sua energia com um pensamento equivalente a sua idade.

    Ao partirem novamente, Bastien adotou outra formação: Theo e Nihaya caminharam na frente, enquanto os outros se misturaram atrás. 

    Os mais capacitados, vez e outra iam para o fundo e formavam cobertura. Em dado momento, Selina e Aidna recuaram para o grupo descansar.

    Selina, após tanto tempo em silêncio, decidiu romper o clima ensurdecedor.

    Ela suspirou forte, chamando atenção de Aidna no processo.

    — O Theo cresceu, ou é apenas para mim? — comentou Selina, quase em sussurros.

    — Ele cresce constantemente. Desde que nos conhecemos, ele passou por várias fases. E olha que estou mencionando apenas as primeiras horas. Quando o conheci, ele era preconceituoso e não tinha confiança em si… Agora? Ele está tão confiante que bateu de frente com um djinn várias vezes.

    — É. Mas, não é isso… Seus olhos, sua presença, atitudes… Tudo isso está me causando medo desde o momento em que ele acordou.

    — Bom, a lua tingida pelo carmesim costuma causar mau presságio.

    “A lua de sangue… Isso está me incomodando.” pensou Selina, observando Theo ao longe.

    Era como uma criança e seu irmão mais velho. Quando a criança cresce e o mais velho perde o controle que tinha, uma distância surge entre as duas consciências e o antigo elo não há retorno.

    — Sabe, quando ele foi forçado a lutar, vi sua bela pintura se tornar uma mancha vazia. Você acredita em Daemons, Selina?

    Serach distanciou-se brevemente. 

    Ela acreditava, afinal, sua rainha havia decretado a existência desses seres. No entanto, Selina tinha medo do que Aidna estava querendo apontar.

    — São seres com uma aura vazia: sem ressentimento ou culpa de seus atos. Por isso são retratados como criaturas malignas, afinal, não importa quantos pecados cometam, jamais se desculparão. Creio que Theo está adotando uma mentalidade similar, mas ainda humana.

    — Algo como “O que foi feito, não há retorno”?

    — Tipo isso.

    Selina ponderou e se questionou novamente. A mudança drástica de humor e personalidade do rapaz não estaria a incomodando tanto se fosse positiva, porém, aos olhos de Serach, Theo havia criado um espaço infinito de distância entre os dois. 

    Era como um desconhecido, porém, conhecido.

    Enquanto presa em pensamentos incomodados e agonizantes, Selina esbarrou nas costas de Jack sem querer. Quando notou, todos os agentes estavam parados num penhasco, encarando um vale abaixo.

    — É belo… — comentou Aidna, caminhando entre os agentes.

    Tropeçando nos próprios pés — propositalmente — ela procurou se encaixar nas costas de Theo, caindo em seu trapézio.

    — Não é?

    — Sim… Mas… — Theo virou o rosto para o lado, inclinando para cima. A druida seguiu o movimento; chegando ao ponto da gruta em que estavam há pouco mais de três horas. A distância não era tão colossal. — Quase não saímos do lugar.

    — É normal — apontou Bastien. — Na real, para onde estamos indo?

    Nihaya apontou para o nordeste, onde as montanhas abriram caminho para o reino de Kiescrone, onde o exército de Alsuhindr descansava. Todavia, não seria necessário viajar tanto para chegar até Jeanne Mospeliart, que é o atual objetivo do grupo. 

    A princesa de Alsuhindr estava pouco abaixo deles, no penhasco em que observavam à vista. 

    Quando Nihaya anunciou isto, todos olharam para baixo e puseram os olhos numa fortaleza em ruínas: um pequeno forte militar em meio ao bosque, onde os muros estavam despencando aos poucos, tornando uma pequena igreja arruinada o local mais seguro além do forte.

    Fora isso, estava mais movimentado do que o esperado, claro, por ser um local em ruínas não era de esperar tantas pessoas. Contudo, do penhasco em que o grupo olhava, era notório o movimento e a presença de um grupo, ao menos, cinco vezes maior que o de Bastien.

    Na pequena fortaleza, em uma de suas torres que ultrapassaram a igreja, uma jovem moça olhava de cima. Sentada na janela da torre, acompanhava do topo o grupo de soldados se movimentarem de um lado para o outro; alguns corriam para dentro da igreja, enquanto outros preparavam algumas carruagens além dos muros destruídos. 

    Um grupo seleto, no entanto, descansava no canto, próximo da igreja e ao redor de uma fogueira apagada. Suas risadas eram altas o suficiente para serem escutadas do topo da torre.

    — Jennie, estão pedindo sua presença na igreja — anunciou Nora, o braço direito da princesa.

    Jeanne Mospeliart, a filha de Nihaya, se manteve olhando pela janela; seus olhos castanhos acompanhavam os movimentos alheios enquanto seus cílios grandes denotavam uma expressão serena. Os cabelos longos e vermelhos caiam por suas costas e ombros, cobrindo parcialmente sua vestimenta militar branca e de entalhes dourados.

    — Por qual motivo? — indagou Jeanne.

    — Mais soldados feridos chegaram…

    — Eu vi.

    — Também recebemos a informação de que o general Nietsz está no Nariz da Montanha. 1

    — Ótimo. Enfim, outro dia se inicia…

    1. Nariz da Montanha é o nome do penhasco que o grupo de Theo estava, recebe este nome por lembrar o formato de um nariz quando o sol se põe e o reflete numa planície ao lado oposto.[]

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