Índice de Capítulo

    Assim que chegaram no quarto de Jeanne, ambos tomaram banhos separados para se livrarem do cansaço.

    Enquanto Theo estava terminando o banho, Jeanne penteava seus longos e lisos cabelos vermelhos em frente ao espelho. 

    Diferente de antes, quando estava trajada por um vestido branco e militarmente caracterizado, a princesa estava com uma regata branca e gola alta, acompanhada por uma saia justa e calça preta.

    Após sair do banheiro, Theo carregava uma toalha branca no ombro enquanto secava seus cabelos cor de trigo e ondulados. 

    Sobre suas roupas, infelizmente não havia para onde o rapaz fugir. Como não entrou em contato com roupas externas desde que chegou no domínio, Theo estava preso em sua calça e gola alta preta.

    Ao ver o rapaz sair com a mesma roupa, Jeanne prometeu:

    — Assim que chegarmos na capital, irei providenciar roupas novas para toda sua trupe.

    — Obrigado — agradeceu, sentando-se na quina da cama, ainda mexendo no cabelo — Por que ela está tão cheirosa? — perguntou sentindo um cheiro agradável emanar de sua roupa.

    Depois de tanto sangue, lutas e dias sem ver água, sua roupa estar limpa o causou estranheza.

    — Enquanto estava no banho, pedi para minhas criadas prepararem suas roupas. A sujeira e odores impregnadas estava incomodando a mim, imagina a você.

    — Elas lavaram e passaram num período de dez minutos?

    — Sim. Usaram o elemento água, depois usaram da manipulação deste elemento para secar com eficiência. Foi só passar e pronto, limpinha. Vocês não usam seus poderes dessa forma?

    Jeanne perguntou após notar que Theo estava perplexo. Claro, aquilo seria o lógico a se fazer, porém, no mundo casual, a realidade era outra.

    — Não. Nem todos os desviantes possuem afinidade com elementos no meu mundo, os que possuem, utilizam para combates a missões. Além de que, gasta energia para isso e nós evitamos gastar dessa forma.

    — Ainda tem o medo do núcleo esgotar, é? — indagou guardando o pente.

    — É um risco de vida. Preferimos evitar.

    — Quem tem medo de viver, da morte está próximo.

    Theo suspirou, como se dissesse “Tanto faz”. Levantando-se da cama, ele utilizou o vento para guardar a toalha num suporte perto da porta do banheiro. 

    Andando até a janela ele parou para vislumbrar a festa que ainda acontecia no pátio, em seguida, sentou-se numa poltrona ao pé da janela aberta que permitia a passagem de uma brisa fria.

    Cruzando as mãos e repousando no colo, Theo olhou para Jeanne que terminava de passar um batom vermelho brilhante nos lábios.

    — Tenho algumas perguntas para ti, sobre os Vanir… — comentou Theo, olhando fixamente para os cílios enormes da pequena deusa.

    — Pode fazer — retrucou, guardando o batom na mesa.

    Usando o atributo vento, Theo puxou o livro dos Vanir entregue por Nihaya e o segurou com a mão direita. Deixando a capa virada para Jeanne, tendo em mente forçá-la a entender do que se tratava, Theo a esperou vir até si.

    A princesa chegou na frente de Theo e pegou o livro com delicadeza. Analisando a capa do livro, arqueou a sobrancelha em dúvida e abriu a boca para suspirar levemente. 

    Antes de concluir do que se tratava totalmente, Jeanne se sentou no braço da poltrona que Theo estava, o surpreendendo rapidamente.

    Adotando o gesto, Theo escorou a cabeça por debaixo do braço de Jane, o que lhe permitiu ver o livro junto da deusa. Folheando algumas páginas, Jeanne resmungou relutantemente.

    — É, com certeza é verídico. É um livro da Casa Vanir. Onde achou isso? — perguntou, não duvidando da conduta de Theo.

    Se fosse qualquer outro membro do clã Vanir, pensaria que Theo se aproximou dela apenas para aquilo.

    — Ganhei de um homem…

    — Nietsz? Com certeza. Ele deve ter usado isso para te forçar a se aproximar de mim.

    — Quê?

    Ela sorriu pacificamente. A expressão de surpresa que Theo expressou foi o suficiente para a deusa.

    — É, faz sentido. Fala muito sobre selos, criação de sigilos, encantamentos Vanir, atribuição elementar… Alteração genética.

    — Alteração genética? — Theo não conseguiu crer naquela afirmação.

    Jeanne assentiu que sim.

    — Os deuses conseguem alterar o gene de um homem para que se tornem semi-deuses. Porém, o clã Vanir pode fazer homens se tornarem semi-deuses apenas usando a energia do próprio núcleo…

    — Usando a mana para alterar o DNA e atribuir dados superiores, assim, fazendo que um corpo humano se torne… Divino — afirmou boquiaberto, ainda sem acreditar que aquelas afirmações estavam saindo da boca de uma deusa verídica.

    Aquilo era apenas outra teoria no ramo científico que estava se revelando uma realidade na frente do jovem.

    — Isso aí. Você aprende rápido, lindo. Enfim. Tá falando muito sobre sigilos, poderes, criação e materialização de artefatos… Tudo e mais um pouco do que os Vanir podem oferecer ao mundo.

    — Pode me ajudar a traduzir? — perguntou educadamente. Naquela altura do campeonato, Jeanne não podia mais negar.

    — Óbvio. Posso passar uma cópia para você, mas vai durar um tempo até eu transcrever.

    — Posso ajudar com isso, é só me guiar — sugeriu.

    A princesa assentiu em concordância. Passando algumas folhas, ela tirou uma dúvida de mais cedo: a conjuração que Theo havia feito com sua espada era claramente dos Vanir, mas, agora estava esclarecido para ela do como ele teve acesso àquelas informações.

    “É mesmo… Aquele manto dele tinha um encantamento único…”

    Jeanne olhou para o cabide onde o manto deveria estar, porém, não o encontrou. Correndo vagarosamente os olhos pelo cômodo, ela o buscou por todos os cantos, mas, não o achou.

    — Onde está aquele manto? — perguntou.

    Esticando os braços, Theo mostrou os braceletes.

    — Se transformaram nisto.

    “Uhum… Então o manto consegue alterar sua aparência. Se ele decidir nomear também…”

    — Vamos, crie um sigilo.

    — Quê?

    Ela levantou-se e olhou para Theo.

    — Você criou um sigilo ao vincular sua alma com a existência daquela espada; ao dá-la um nome, você criou um sigilo que aperfeiçoou seu artefato. Com isso, se você realizar o mesmo feito com o manto, pode conseguir aprimorar de formas surpreendentes…

    — Mas, e se isso já for um sigilo?

    — Não é. Ele possui propriedades distintas e poderosas, tão divinas que nem eu consigo entender de onde vieram. Porém, afirmo com certeza de que ele não possui sigilo, tão pouco um nome.

    Theo hesitou por um momento. Ele sabia, mas não queria dizer, que aquele traje era um presente do Arconte Araav. 

    Mexer em algo angelical, até para Theo que não era um crente de Yahweh, parecia um absurdo sem pretendentes. Contudo, por que ele se importava tanto com aquilo? Além de aumentar consideravelmente o armazenamento e fluidez do éter, o manto não lhe proporcionou muitas coisas.

    Talvez Araav tenha deixado essa responsabilidade para Theo; criar um sigilo para o artefato e despertar o verdadeiro potencial. Sim, isso fazia sentido para ele. Com essa ideia consolidada, Theo decidiu arriscar.

    — Tá bom… — concordou em resmungos.

    Fechando os olhos, ele se concentrou na energia que flui dentro do seu corpo. 

    O éter caminhava pelos canais de chakra como o sangue nas veias, carregando cada porcentagem do poder de Theo. Bruscamente abrindo os olhos, que entoaram um brilho vermelho como o sangue, invocou pela primeira vez;

    [Sigilo de Araav: Véu da Casualidade]

    Subitamente os braceletes tornaram-se tecido, escorregando pelos braços de Theo e criando as ombreiras de prata novamente, segurando, por fim, o manto negro em suas costas. 

    Invés de se dividir novamente em três camadas, o [Véu da Casualidade] se fragmentou entre o manto negro e o bracelete que Theo usou casualmente.

    Não apenas isso, uma explosão de energia vagou pelos polos da região; bêbados demais para notar, nenhum soldado na festa, além de Selina, conseguiu sentir a emissão de energia vagar por seus pés. 

    Eles trataram como uma enorme ventania capaz de apagar as labaredas e derrubar os descuidados.

    — Hum, foi fácil — disse, quase comemorando.

    Encarando a emissão de energia, enquanto Theo sorria, Jeanne se surpreendeu momentaneamente com a pressão emanada. 

    Ao passar da demonstração do despertar, a deusa observou Theo sorrir genuinamente, sem estar orgulhoso ou forçando felicidade. Ela se perdeu nos brilhos dourados dos olhos de Theo, enquanto mergulhava na felicidade dos lábios.

    Sem conseguir se conter, ela se aproximou. 

    Sentando de joelhos no colo dele, Jeanne segurou o maxilar de Theo e o forçou a encarar seus olhos castanhos. Soltando completamente seu corpo nas pernas do rapaz, sentiu ele agarrar sua cintura e firmá-la contra si.

    O coração de Theo acelerou a um nível sem igual, aliás, era a primeira vez que ele tinha esse contato com uma mulher — nessa vida, obviamente. Jane estava acostumada, mas nunca teve o prazer de ter seu sentimento voltado para si. Anteriormente, ela estava sendo forçada a se relacionar com meninos que a temiam e respeitavam como a deusa que ela era.

    Todavia, Theo estava partilhando do mesmo sentimento que a princesa; uma confusão absoluta. 

    Eles não sabiam a origem do que sentiam, mas queriam aproveitar. Afinal, já haviam avançado muito, embora se conhecessem há pouco menos de um dia, e a compatibilidade que os permitiu chegar tão longe estava puxando suas almas uma para a outra.

    Ambos se ajustaram na poltrona, sorrindo desastrosamente mutualmente. 

    Os cabelos ruivos de Jeanne despencaram fio por fio e, por fim, a testa e nariz dos dois se encontraram. As pupilas se encararam uma última vez antes de decidirem se fechar para o próximo passo.

    No entanto, antes que pudessem realizar o primeiro beijo, uma sombra tomou o brilho da lua que os banhava.

    Nietsz coçou a garganta.

    Jeanne encarou o general, sem saber que era seu pai, com uma expressão de ódio. Theo, entretanto, estava surpreso por vê-lo ali. Por um segundo, o jovem pensou em hesitar e soltar a cintura da princesa, mas ela não permitiu.

    Ignorando a presença de seu general, Jeanne voltou seu rosto para Theo e o beijou sem poderem hesitar. Agarrado pelo beijo repentino, Theo abraçou escancaradamente as costas de Jeanne, enquanto esta retribuiu o gesto abraçando a nuca do rapaz.

    Nihaya, tentando ignorar que sua filha estava tendo um contato tão íntimo com um garoto reencarnado, saltou por cima dos dois e aterrissou no meio do quarto ainda de costas para eles, alongando e estalando suas costas enquanto esperava seus pombinhos terminarem o que já haviam começado.

    Ao terminarem, os dois ficaram abraçados e sentados na poltrona enquanto Nihaya, desconfortado, analisou a decoração do quarto.

    Abraçando-a firmemente, sentiu os seios de Jeanne pressionarem contra seu peitoral, mas se afastou gradualmente por escolha própria. Tomando uma distância razoável, a expressão da princesa não podia ser outra senão alegria.

    — Um avanço — disse sorrindo para Theo.

    Ele inclinou a cabeça e a encarou.

    — Depois ele te pede em casamento — interrompeu Nietsz. — Acabou com ele? Ou vai precisar dele noutras circunstâncias também?

    Jeanne revirou os olhos e se livrou amistosamente dos braços de Theo.

    — Pode parar de bancar minha figura paterna. Meu pai é outro — disse a princesa, se levantando e puxando Theo consigo.

    “Na verdade, esse é teu pai mesmo…” Theo brincou mentalmente. 

    Brincadeira essa escutada por Nihaya que, infelizmente, estava lendo a mente do rapaz. Theo percebeu este fato quando olhou para o djinn, com a aparência do general, e o viu lançar um olhar furioso.

    — E sim, já terminamos. Podem ir, seja lá pra onde quiser… — Jeanne olhou para Theo e mostrou o livro dos Vanir. — Vou tentar traduzir um pouco e irei dormir, vê se não demora pra voltar.

    — Tá bom — concordou com uma voz doce.

    “O moleque até ficou manso…” pensou Nihaya.

    Tocando no ombro após diminuir a distância entre os dois, Nihaya desapareceu subitamente com o rapaz, deixando apenas uma turbulência no vento.

    Ilha da Asa de Pegasus

    3.600 quilômetros da Capital de Kiescrone

    A viagem de Theo e Nihaya durou apenas alguns minutos, o que surpreendeu o rapaz com a velocidade do djinn. 

    Em pouco mais de um minuto eles haviam viajado cerca de três mil e seiscentos quilômetros e atravessado um mar. Theo não conhecia o local pessoalmente, apenas por ilustrações, mas estava praticamente igual. 

    A sensação de pisar na areia era a mesma de qualquer outra praia de Nethuns; uma areia fina e consistente, sem grudar nos pés ou queimar graças às horas exposta ao sol.

    Nihaya deu as costas para Theo e caminhou pela praia. Ao notar o comportamento do djinn, o rapaz correu.

    — Ei! Aconteceu rápido…

    — Não me importo — retrucou Nihaya, retornando a sua forma original; um homem alto e de cabelos claros em tons de cinza, com olhos claros e aparência madura trajado com uma roupa real, digno de um rei.

    — Essa é sua aparência real? — sacudiu a cabeça. — Como assim não se importa? É a sua filha!

    — Justamente. Ela é responsável. Se você não for igual aos outros namorados dela, estou de acordo.

    — Outros namorados? Ela teve outros? Ela tem minha idade.

    — Teve uns cinco. Relacionamentos planejados e curtos, não duraram sequer um mês direito. Enfim, te trouxe aqui por outro motivo…

    Nihaya se virou para o norte, onde o mar estava agitado naquela noite. Alguns postes iluminavam o canto pedregoso da praia, dando lar aos ventos que sopravam como uma melodia impagável.

    — Quero que descubra por mim, para ter um pouco de confiança. Também, se descobrir por outros, para não enlouquecer…

    Theo recuou os olhos, sem conseguir interpretar as palavras do djinn. Aquilo estava o assustando.

    — Além deste oceano, existe um continente ao qual vocês, do mundo “real”, ainda não descobriram pelo que li em sua mente. Um novo mundo, que para eles é o mundo primordial. Onde dois impérios egoístas e soberanos governam um único território…

    Virando-se para Theo, Nihaya trocou olhares com o rapaz antes de mudar sua direção; induzindo Theo a olhar uma bandeira que batia junto ao vento. Estava rasgada no centro, mas era notório sua cor e símbolo…

    O rapaz se espantou e ficou chocado com o que estava vendo; uma bandeira vermelha com uma águia de seis penas ilustrada, rasgada por um corte de espada…

    — Além dessas ondas, está um local familiar.

    O coração de Theo acelerou, sendo, por um instante, a única coisa que emitia som para o rapaz como se estivesse no vácuo. 

    Seus olhos não pararam de se mexer, tremendo junto da mão que não acreditava no que estava vendo.

    — O império de Egon, sua casa, Liam Mason. Você não morreu e reencarnou noutro mundo. Você sempre esteve no mesmo mundo.

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 0% (0 votos)

    Nota