Índice de Capítulo

    Ofegante e parando ao ver Ethan e Luanne parados em frente a uma carruagem, Theo indagou curiosamente:

    — A senhora já vai, madrinha?

    Olhando para Theo, suado e destruído, Luanne se agachou e fez um cafuné em seu afilhado.

    — Sim, sim, querido. A madrinha tem algumas coisas para resolver no litoral, então vou agilizar para ir para casa logo.

    — Hum… — Theo respondeu insatisfeito.

    Buscando arrumar os cabelos sujos e desidratados do garoto, Luanne o penteou com a mão e olhou para os olhos cor de âmbar. Um lábio escondido e chateado tentava se esconder a todo custo.

    Ficando chateada, Luanne estalou a língua e olhou para Ethan.

    — Pode nos deixar a sós? — Ela perguntou em tom de pedido.

    Ethan assentiu que sim.

    — Ed… Me faça um relatório sobre o que encontraram.

    — Tá… — respondeu desconfiado, sendo levado por Ethan para longe.

    Levantando-se, Luanne caminhou para a fonte enquanto levava Theo segurando pela mão. Parando em frente a estátua da serpente, a sacerdotisa da lua apoiou a mão nos cabelos loiros do seu afilhado.

    — Tê, você sabe quem é essa serpente?

    O garoto respondeu que não.

    Mas Luanne já esperava aquela resposta.

    — Esta é a representação de um dos primeiros dragões marinhos, pertencente à espécie mítica dos Leviatãs. Seu nome é Aegiron, o guardião das Terras Antigas. Você conhece o conto de Netuno, certo?

    — Sim. Isso é, se estiver falando do conto em que Netuno amaldiçoa o mundo por quarenta e dias e quarenta noites após os deuses dizimaram seu reino…

    — Sim, justamente. Após o sol iluminar o quadragésimo primeiro dia, Netuno se exilou de todos os deuses nas profundezas do mar, mantendo contato apenas com seu irmão mais velho, Hades. Porém, segundo os antigos, o tridente de Netuno ainda está por aí, cravado numa caverna protegida por Aegiron, fortalecendo a maldição do mundo…

    — Maldição do mundo? — Theo perguntou curioso.

    — Uhum. A maldição que cria uma nuvem de tempestade capaz de dividir o mundo… Nenhum navio que nós tenhamos criado será forte para sobreviver às calamidades abaixo da nuvem negra… É impossível passar…

    Theo olhou para a estátua de Aegiron e refletiu… Para ele, foi algo bobo, mas tinha que perguntar.

    — E como sabem que existem algumas coisas do outro lado?

    — Por que é impossível não haver, querido. Nós temos ciência de que nosso mundo é esférico, porém, não conseguimos realizar uma volta… Pense numa bola; nós podemos sair de um ponto, dar uma volta na bola, e chegar nesse mesmo ponto, certo? No entanto, não conseguimos fazer isso… Pense na bola estando rasgada pela metade, impedindo que nosso dedo faça uma volta nela.

    — Hum… Essa nuvem é igual à muralha de Snegriya?

    — Correto! Uma muralha de gelo que ultrapassa as nuvens. Nem mesmo desviantes capazes de voar conseguem chegar no topo, apenas vislumbrar. A casualidade sempre impede que realizemos tais feitos… É como se os deuses quisessem esconder uma gaveta…

    Theo ficou pensativo com aquilo. Claro, como uma criança curiosa, ele queria todas as respostas para suas perguntas, mas, se nem Luanne as tivesse, então ninguém teria.

    Ele tinha total ciência da experiência de Luanne.

    — Foi por isso que me juntei à ordem de Vagus. Existem tantas coisas nesse mundo… Talvez até outros mundos que não conhecemos. O homem nunca pisou em todos os locais do planeta, e foi isso que me moveu. Pelo que Ethan disse, também é o que está te movendo…

    Luanne encarou o brilho etéreo que transparecia aos olhos de Theo; como um âmbar exposto à luz do sol; como pequenas gotas de mel pingando brevemente.

    “Esse brilho…” Luanne admirou-se.

    Era o brilho de uma pessoa que não iria mudar de opinião.

    — Por isso… Você já ouviu falar do filho da Lua, o herói da luz?

    — É… Lu…

    — Lumen, o Senhor da Salvação, guardião da causalidade, o manto da humanidade… O primeiro dos desviantes…

    — Ah, sei! Mas, o que tem ele?

    — Agentes de Vagus precisam de um codinome para suas missões… Sabe, sendo a principal Sacerdotisa da Celestial Lunar Alunne, eu gostaria que você, Theo, adotasse Lumen em seu batismo de desviante consagrado.

    Luanne cruzou e passeou para frente de Theo.

    — Seria uma honra, tanto para mim, quanto para a minha deusa. Você aceita?

    Um silêncio ensurdecedor tomou de conta. Obviamente, era uma responsabilidade imensa carregar o nome de alguém lendário, embora fosse uma prática casual nesse mundo.

    A prática de adotar o nome de alguém importante, um herói ou política relevante para o mundo, como seu codinome de guerra é comum. Porém, entre as diversas prateleiras que separam esses homens, existe o topo da estante; a prateleira onde apenas os intocáveis estão.

    Lumen, por ser o herói que entregou sua vida para que o Senhor do Destino mantivesse a existência da humanidade, foi nomeado como o Salvador de Todos.

    Entre os intocáveis, ele ocupa o primeiro lugar.

    Ninguém nunca cogitou utilizar seu nome, pois, além da responsabilidade que carrega, também é protegido pelas Sacerdotisas de Alunne.

    Entretanto, a principal Sacerdotisa da Lua estava propondo aquilo pessoalmente…

    Uma expectativa alta com uma responsabilidade imensamente superior… Ainda assim, não havia como negar.

    — Claro! — Theo respondeu sorridente. — Será uma honra para mim poder utilizar o nome do Senhor Lumen, e traçar um caminho glorioso para honrá-lo abaixo do céu!

    “Abaixo do céu, Theo?” Luanne pensou soltando um sorriso bobo. “Crianças realmente não conseguem entender o destino…”

    — Obrigado por me confiar tal honra!

    — Por nada, querido! A honra é toda nossa…

    Arrumando novamente os cabelos de seu afilhado, Luanne sorriu abaixo do brilho diurno.

    Após se despedir de todos, Luanne pegou a carruagem em direção à cidade de Loureto, visando pegar o retorno para finalmente ir até o seu local de destino. Isso porque a estrada até a Residência dos Lawrence é privada e de destino único (Loureto até a Residência, da Residência até Loureto).

    No meio do caminho, Luanne encarava a lua escondida pelas nuvens, tão tímida quanto pálida. A coruja branca acompanhava a carruagem, batendo suas asas sem desferir um único som. Por fim, a ave adentrou a carruagem, onde só havia Luanne na cabine, e se posicionou na almofada diante a Sacerdotisa.

    ‘Acha que nossa deusa concorda realmente com isso?’

    — Do que está falando? Não é óbvio? Ela quem me pediu para fazer isso.

    ‘Hm… Então nossa deusa está realmente ligada com a transmigração desse garoto?’

    — Sim… Mas, ao mesmo tempo, não há uma transmigração… Está mais para uma reencarnação. Pelas atitudes, tenho certeza que Theo sabe quem ele é, mas, ao mesmo tempo, está fingindo ser um novo indivíduo… Ou apenas sendo de fato.

    ‘Isso vai dar problema… Mortais que negam sua própria essência e acreditam na mentira até ela se tornar realidade, acabam sendo uma confusão maiores que os deuses.’

    — Eu sei. Por isso estarei por perto quando isso acontecer, pois irá acontecer… As provações existem para mostrar do que cada homem é capaz; derrame sangue, ou tenha seu sangue derramado. Acredito fielmente que nossa deusa o tirou do Julgamento de Elísios para que ele passe por essas provações.

    ‘Novamente… Tem absoluta certeza disso, minha irmã?’

    Luanne suspirou e se apoiou na janela da carruagem, vislumbrando a lua sair por trás das nuvens.

    — Desde que ele não perca o brilho em seus olhos, Lumen existirá.

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