Índice de Capítulo

    Tóquio, 23:47

    No alto de um luxuoso arranha-céu, uma figura misteriosa observava a cidade abaixo, as luzes dos edifícios refletindo em seus olhos negros e profundos, enquanto a íris branca brilhava de forma sinistra sob a luz da lua. A brisa noturna entrava pela janela de vidro imensa, balançando suavemente seus longos cabelos negros. A cidade abaixo parecia calma, mas, dentro dela, os ecos das batalhas ainda ressoavam.

    Ela estava sem blusa, vestindo apenas uma fina calça de seda preta, deixando suas costas nuas expostas ao ar frio. Mas o frio não a incomodava. Seu corpo era como mármore – frio, firme e impenetrável.

    Em sua mão direita, segurava um cigarro aceso entre os dedos, a brasa queimando lentamente, produzindo um brilho alaranjado que contrastava com a escuridão ao seu redor. Na outra mão, segurava um telefone, sua expressão era impassível, mas sua postura carregava uma presença esmagadora.

    A voz do outro lado da linha era distorcida, quase como se estivesse sendo alterada propositalmente para não ser reconhecida.

    — O que tem a me dizer? — A voz masculina perguntou.

    A mulher deu uma longa tragada no cigarro antes de responder, soltando a fumaça lentamente enquanto seus olhos passeavam pela paisagem urbana.

    — As batalhas estão se intensificando… — Sua voz era suave, mas carregava um peso inegável. — Neste momento, apenas três escolas permanecem de pé.

    Ela fez uma pausa, apertando o cigarro entre os dedos e observando a brasa cair no chão de mármore escuro.

    — A Escola 25… agora liderada por Yoru Akemi. — O nome dele saiu de seus lábios com um leve tom de interesse. — A Escola 27… sob comando de Hiroshi. E, por último, a Escola 35…

    Do outro lado da linha, houve silêncio. O nome da terceira escola não precisava ser dito. Ambos sabiam quem a liderava.

    — Isso confirma que a reunificação está próxima? — A voz masculina perguntou, tensa.

    A mulher sorriu, seus lábios se curvando levemente.

    — A reunificação seria… um desastre.

    Ela se virou levemente para trás, caminhando lentamente até um sofá preto de couro, onde pegou um copo de whisky e girou o líquido âmbar dentro dele, observando os reflexos da cidade na bebida.

    — Se essas três forças forem reunidas como o resto das outras escolas, inevitavelmente algo como há nove anos acontecerá novamente.

    Do outro lado da linha, o homem respirou fundo.

    — Você acha que eles têm potencial para recriar o que aconteceu?

    A mulher riu baixinho, levando o copo aos lábios e tomando um gole, sentindo o álcool queimar sua garganta.

    — O potencial não importa. O destino sim.

    Seus olhos brilharam na escuridão, e ela se levantou, caminhando de volta para a imensa janela de vidro.

    — Aquele incidente, nove anos atrás, foi inevitável. Tudo caminhava para aquilo. Agora, a história começa a se repetir.

    O homem do outro lado ficou em silêncio por alguns segundos antes de perguntar:

    — Yoru Akemi… ele pode ser a chave?

    A mulher sorriu novamente, um sorriso perigoso, mas não respondeu de imediato.

    Ela encostou o telefone no ombro, pegou outro cigarro, acendeu e tragou profundamente. O brilho vermelho iluminou seus olhos penetrantes.

    — Ele pode ser a chave… ou pode ser o gatilho para algo ainda pior.

    O homem suspirou.

    — E Hiroshi?

    — Hiroshi já entendeu o jogo. Ele está esperando.

    — E a Escola 35?

    A mulher olhou para a cidade mais uma vez, e então riu.

    — O líder deles já sabe de tudo.

    Ela apagou o cigarro na beirada da janela, jogando a ponta lá de cima, observando-a desaparecer no horizonte.

    — As peças foram posicionadas. Agora… só resta ver quem fará o primeiro movimento.

    A ligação foi encerrada.

    A mulher ficou ali, sozinha, olhando para o mundo abaixo, um mundo que estava prestes a mudar para sempre.

    Casa de Ben – 01:37 da madrugada

    A noite estava silenciosa. A luz fraca do poste do lado de fora passava pela janela e iluminava parcialmente o pequeno quarto de Ben. O cheiro de remédio misturado ao leve aroma do pano molhado preenchia o ar.

    Ben estava deitado na cama, o corpo coberto de hematomas e cortes superficiais. Cada movimento seu era um lembrete da surra que havia levado de Danilo. A dor pulsava, mas ele já estava acostumado com isso. O que ele não estava acostumado era com alguém cuidando dele.

    Do outro lado do quarto, Sophie se aproximava em silêncio, segurando um pano úmido em uma das mãos e uma tigela com água fria na outra. Seu cabelo loiro e liso caía um pouco sobre o rosto enquanto ela se ajoelhava ao lado da cama, com um olhar concentrado.

    — Isso vai doer um pouco. — Ela avisou, pressionando o pano gelado contra um corte no rosto de Ben.

    Ele fez uma careta e recuou instintivamente.

    — Porra, Sophie, tá tentando me matar?

    Ela revirou os olhos, sorrindo de canto, e segurou o rosto dele firme.

    — Para de drama, grandão. Você apanhou feito um saco de pancadas, e agora tá chorando por um paninho molhado?

    Ben soltou um suspiro pesado, mas acabou rindo fraco.

    — Tem um pouco de orgulho em jogo, sabe?

    Sophie não respondeu de imediato. Ela molhou o pano de novo e continuou limpando os machucados dele com delicadeza, o toque contrastando completamente com a brutalidade que ambos estavam acostumados a enfrentar.

    O silêncio ficou no ar por alguns instantes, mas era um silêncio confortável.

    — Não precisa ficar aqui, sabia? — Ben disse, olhando para o teto.

    Sophie parou por um segundo, depois voltou a limpar os machucados sem pressa.

    — E perder a chance de ver o durão Ben todo ferrado? Nem ferrando.

    Os dois riram juntos.

    Ben virou um pouco a cabeça para olhar para ela. Era estranho ver Sophie assim, sem estar no meio de uma briga ou em pé de guerra com alguém. Ele nunca tinha reparado antes, mas ela tinha um olhar calmo, quase gentil.

    — Sabe… você nunca fala muito sobre você. — Ele comentou.

    Sophie levantou uma sobrancelha.

    — E você fala?

    — Toque justo.

    Ela deu um meio sorriso e torceu o pano antes de continuar.

    — Bom, já que estou aqui limpando seu rosto todo arrebentado, acho que posso contar um pouco.

    Ben observou enquanto ela se ajeitava, parecendo pensar por onde começar.

    — Eu tenho uma irmã mais velha. — Ela começou. — Ela mora nos Estados Unidos agora. Já foi uma delinquente, acredita?

    Ben arregalou os olhos.

    — Sério? Tipo, nível hard?

    — Bem hard. — Sophie riu. — Ela era bem pior que eu. Mas depois de um tempo, decidiu largar essa vida. Foi estudar, arrumou um emprego, fez tudo certinho. Agora, ela vive lá e me manda mensagens me dizendo para fazer o mesmo.

    Ben fez uma expressão divertida.

    — E você? Pretende seguir o caminho dela?

    Sophie suspirou, olhando para as próprias mãos.

    — Eu não sei… — Ela respondeu, sincera. — Às vezes parece que isso aqui é tudo o que eu sei fazer.

    Ben entendeu o que ela quis dizer. Ele próprio não se via fazendo outra coisa. O mundo deles era brutal, mas era o que conheciam.

    Ele ficou em silêncio por um tempo antes de falar:

    — Eu já pensei em sair disso também… mas sempre acontece alguma merda que me puxa de volta.

    Sophie o encarou com curiosidade.

    — O que te puxou de volta?

    Ben hesitou, mas acabou soltando um riso baixo.

    — Meu pai.

    Sophie franziu o cenho.

    — O que tem ele?

    Ben respirou fundo, como se estivesse escolhendo bem as palavras.

    — Ele era um merda. Bêbado, violento. Batia na minha mãe… até que um dia ela morreu.

    O sorriso de Sophie sumiu.

    Ben continuou, olhando para o teto como se estivesse revivendo aquilo.

    — Depois que ela morreu, ele começou a beber ainda mais. Ficava jogado em casa o dia inteiro, só falando merda. Até que um dia…

    Ele parou por um instante.

    — Eu tive que bater nele.

    Sophie arregalou levemente os olhos.

    — Você…?

    Ben assentiu.

    — Foi a primeira briga que ganhei na vida. — Ele riu, mas o riso tinha um peso. — Depois disso, ele sumiu. Nunca mais voltou pra casa. Não sei se tá vivo ou morto. E, pra ser sincero, eu nem me importo.

    O silêncio caiu entre os dois de novo. Mas, ao invés de ficar pesado, havia uma estranha sensação de compreensão entre eles.

    — Eita… — Sophie quebrou o silêncio. — Acho que você venceu no quesito família ferrada.

    Ben soltou um riso surpreso.

    — Eu ganho em alguma coisa, pelo menos.

    Sophie riu junto, balançando a cabeça.

    — Somos um belo grupo de desajustados, né?

    — O melhor grupo.

    Os dois se encararam por um momento e, sem perceber, sorriram um para o outro. Não era um sorriso forçado ou de provocação. Era um sorriso verdadeiro, de quem encontrou um pouco de paz em meio ao caos.

    Sophie então pegou o pano, deu um último toque no rosto de Ben e se jogou para trás, se espreguiçando.

    — Pronto. Agora, da próxima vez que você for bancar o herói, tenta não apanhar tanto.

    — Vou pensar no seu conselho.

    Sophie olhou para ele de lado.

    — Bom… acho que já é tarde.

    Ela se levantou, pegando suas coisas. Mas antes de sair, olhou uma última vez para Ben.

    — Ben… se precisar de alguma coisa… me chama.

    Ele piscou, meio surpreso.

    — Mesmo que seja só pra conversar?

    Ela sorriu.

    — Principalmente se for só pra conversar.

    E, com isso, Sophie saiu do quarto.

    Ben ficou ali, deitado, olhando para o teto e sentindo algo diferente dentro dele. Algo que não sentia há muito tempo.

    Talvez, só talvez, ele não estivesse tão sozinho quanto achava.

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