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    A manhã surgiu pesada na base subterrânea da Hunides. O clima que antes carregava esperança agora era tingido por um silêncio desconfortável. Jakson, com os olhos fixos na televisão, assistia à matéria que tomava conta de todos os canais noticiosos: Baron, estelionatário e figura chave no submundo, encontrado morto após revelações explosivas. A mídia o retratava como um corrupto sem escrúpulos, envolvido em uma rede de crimes que ia além do que qualquer um imaginava.

    Jakson não dizia uma palavra. Suas mãos tremiam, não de medo, mas de raiva. Ele sabia que aquilo era obra de Charles. O mesmo homem que sempre sujava o nome dos outros para manter as mãos limpas.

    — Isso foi ele… — murmurou Jakson, apertando os dentes. — Maldito Charles…

    Hayato entrou na sala, seguido por Sophie e Yoru.

    — A notícia está em todo lugar — disse Sophie. — Mas não faz sentido. Baron não era santo, mas ele não era tudo aquilo…

    — Ele sabia demais — completou Yoru. — E agora está morto. Você confiou nele, e Charles fez isso parecer um erro.

    Jakson socou a mesa com força, fazendo o projetor holográfico desligar.

    — Ele não vai parar. E agora vai vir pra cima de mim. Ele quer me desacreditar como fez com o Baron… mas eu não sou tão fácil de calar.

    Sophie se aproximou, colocando uma mão em seu ombro.

    — Então temos que agir rápido. Se ele quer guerra, que receba uma.

    Enquanto isso, nos estudos de pesquisa da GHV, uma sala de tecnologia avançada com telas holográficas e servidores zumbindo incessantemente, Charles observava as últimas manchetes com um sorriso satisfeito no rosto.

    Ao seu lado, Enzo analisava dados sobre movimentações da Hunides e atividade digital.

    — Parece que Baron serviu ao seu propósito final — comentou Enzo, cruzando os braços.

    Charles virou-se lentamente para ele.

    — Ele era um tolo, mas um tolo útil. Agora, qualquer ligação entre ele e a Hunides foi descreditada publicamente. Jakson perdeu uma de suas cartas mais poderosas.

    Enzo assentiu.

    — E o Dagon? Foi eficaz.

    — Mais do que o necessário — respondeu Charles. — Um verdadeiro cão de caça. Mas agora precisamos lidar com o dono da coleira: Jakson. Ele é persistente, inteligente. Um risco real.

    Charles caminhou até uma mesa de comando e pressionou um botão. Um painel lateral se abriu, revelando arquivos e perfis.

    — Está na hora de ativar um grupo especial. Vou mobilizar os Silencers.

    Enzo ergueu uma sobrancelha.

    — Os Silencers? Você os manteve inativos por anos.

    — Justamente por isso. Ninguém sabe da existência deles. Eles não deixam rastros, não pedem explicações, não têm rosto. Jakson quer brincar de guerra… então vamos mostrar a ele o que é guerra real.

    Enzo sorriu de lado.

    — E se isso não for suficiente?

    Charles se aproximou dele, com um olhar de fogo.

    — Então nós queimamos a Hunides até não sobrar cinzas

    A noite caía sobre a cidade com um peso anormal. O céu, encoberto por nuvens grossas e densas, deixava escapar apenas pequenos feixes da lua cheia. Um vento gelado cortava pelas ruas, assobiando nos becos e atravessando as grades das escolas, como se o próprio ar estivesse tentando avisar: algo estava para acontecer. Algo grande.

    Na Escola Secundária 25, os corredores estavam mais silenciosos do que o habitual. As luzes fluorescentes, intercaladas por piscadas instáveis, iluminavam o piso gasto por anos de uso e por incontáveis confrontos entre delinquentes.

    Na sala dos fundos do prédio administrativo, Yoru estava sentado no parapeito da janela, observando o pátio deserto. Seus olhos carregavam um peso silencioso. Ben, sentado na cadeira com os pés em cima da mesa, mordia a unha do polegar com impaciência.

    — Você acha que vai rolar? — perguntou Ben, quebrando o silêncio, a voz grave e baixa, quase como um sussurro conspiratório.

    Yoru não respondeu de imediato. Continuou olhando para o nada, como se procurasse uma resposta nos telhados do outro lado da rua. Finalmente, murmurou:

    — É inevitável… Com o Jakson batendo de frente com Charles, é só questão de tempo até algo explodir.

    Ben bufou, abaixando os pés da mesa.

    — Mas e se… a polícia se meter? Digo, uma guerra dessas chamaria atenção até da mídia. Isso não vai acabar em uma briga entre escolas. É coisa de gente grande agora.

    Antes que Yoru pudesse responder, a porta se abriu lentamente com um rangido metálico. Um vulto entrou. Alto, de postura rígida, os olhos escondidos atrás de óculos de aro escuro. Hiroshi. Atualmente, um dos mais inteligente da escola, que nos últimos tempos vinha se envolvendo cada vez mais nas investigações por trás do sistema sujo que sustentava o mundo dos delinquentes.

    — Estava esperando vocês chegarem a essa conclusão — disse ele, fechando a porta atrás de si com cuidado. — Eu tenho algo pra mostrar.

    Ele caminhou até a mesa, puxou um pen drive do bolso interno do casaco e conectou no computador da sala. A tela brilhou, e diversos documentos confidenciais apareceram.

    — O que é isso? — perguntou Ben, franzindo a testa.

    Hiroshi olhou para os dois, seus olhos agora refletindo o brilho do monitor.

    — Isso… é a ligação entre Charles Choi e algumas unidades policiais do Japão. Não só a local. Tenho nomes de investigadores, delegados, agentes federais… todos eles com registros de depósitos diretos de empresas fantasmas ligadas ao grupo econômico de Charles.

    Yoru se afastou da janela, se aproximando com passos lentos.

    — Você tem certeza disso?

    — Absoluta — respondeu Hiroshi. — Passei as últimas semanas rastreando as contas. Tem até uma planilha com o nome “Projeto Quimera” vinculada a operações clandestinas… E pasmem, tem movimentações dentro de colégios específicos. Escolas estão sendo usadas como fachadas. A nossa, inclusive.

    Ben ficou boquiaberto, e Yoru cerrou os punhos.

    — E o que isso tem a ver com o confronto com o Jakson?

    Hiroshi girou a tela para eles verem.

    — Tem um grupo especial que o Charles manteve em segredo durante anos. Operações de campo silenciosas, todos treinados fora do país. Nomes como “Capanga Zero”, “Unidade Carmesim” e “Esquadrão das Sombras”. Esse último… foi mobilizado essa semana.

    Yoru e Ben se entreolharam.

    — Eles vão atrás do Jakson — sussurrou Ben, a voz quase engasgando com a tensão.

    — Exato. E tem mais — Hiroshi virou outra tela, mostrando fotos pixeladas de encontros em restaurantes luxuosos. Em cada uma delas, homens engravatados trocando apertos de mão com Charles.

    — Reconhecem esse cara? — perguntou Hiroshi, apontando para um rosto marcado, com cicatriz na sobrancelha.

    — É o delegado Romulus. Ele é da Divisão Antidrogas — respondeu Ben, incrédulo.

    — Ex-delegado — corrigiu Hiroshi. — Ele agora está alocado na força-tarefa secreta do Charles. A função dele? Acobertar tudo que o Charles fizer, desde que o “acordo” seja mantido.

    Yoru se afastou, respirando fundo. Caminhou até o canto da sala, encostando-se na parede, a testa suada.

    — Então a polícia… não vai impedir a guerra. Vai participar dela.

    — Não diretamente — explicou Hiroshi. — Mas vão “olhar para o outro lado”. Sumir com corpos, esconder provas, desmentir a mídia.

    Um silêncio pesado tomou conta da sala.

    Ben levantou-se bruscamente.

    — Isso é sujo demais. A gente não vai conseguir lutar contra isso tudo! Não é só o Charles, não é só a 35… agora é o governo, a polícia, o dinheiro, tudo contra nós!

    Yoru olhou para ele, com uma calma sombria.

    — Então temos que pensar como eles. Antecipar os passos. Encontrar uma forma de expor isso tudo. Se esse material cair nas mãos certas…

    — Errado — Hiroshi o interrompeu. — Se esse material cair nas mãos erradas, estamos todos mortos.

    Yoru se aproximou dele.

    — Então nos diga. O que fazemos?

    Hiroshi hesitou, olhando para os dois como se pesasse cada palavra.

    — Existe alguém. Um repórter investigativo. O nome dele é Seth Kalman. Trabalha de forma independente, financiado por ONGs internacionais. Já expôs corrupção policial antes. Se conseguirmos contato com ele, podemos divulgar tudo isso sem passar pela mídia tradicional, que já está nas mãos do Charles.

    — Onde ele está? — perguntou Yoru, com os olhos agora cheios de determinação.

    — Está fora do país. Mas virá para cá semana que vem, investigando um caso sobre tráfico de jovens em escolas… exatamente o que o Charles faz.

    Ben passou as mãos no rosto.

    — Então temos sete dias… sete dias até tudo ruir.

    Hiroshi assentiu.

    — E até lá, o Esquadrão das Sombras já vai estar em campo.

    Lá fora, o vento batia forte nas janelas, fazendo ranger as estruturas da escola. Um presságio. Algo estava para começar. Não era mais apenas uma guerra entre adolescentes. Era uma conspiração. Um império podre prestes a entrar em colapso — ou se consolidar de vez.

    Yoru apertou os olhos, lembrando-se da morte de sua mãe, das cicatrizes que carregava, da vida que foi arrancada à força. Aquilo não era apenas justiça. Era pessoal.

    — Vamos derrubar esse império… nem que custe nossa própria ruína — declarou ele, a voz como uma lâmina.

    E naquele instante, mesmo sob a escuridão, mesmo diante do caos, um novo fogo acendeu-se dentro deles. O fogo da rebelião.

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