Índice de Capítulo

    Ele estava farto.

    Enzo respirava pesado, parado no terraço da antiga estação de metrô desativada, observando as luzes da cidade abaixo. Tokyo parecia normal à distância… mas Enzo sabia: por dentro, estava podre.

    A cidade era o espelho daquilo que Charles havia construído nas sombras. Uma rede invisível de controle, manipulação, sequestros, alianças corruptas e medo.

    Yoru, sequestrado.
    Wallace, desaparecido.
    Charles, no topo.

    E o pior… era que ele parecia sempre saber o próximo passo antes de todos.

    — Maldito… — Enzo sussurrou, cerrando os punhos com tanta força que os nós dos dedos ficaram brancos. — Sempre dois passos à frente… como um maldito fantasma.

    Jogou uma pedra do terraço. Viu-a desaparecer entre os telhados. Não houve som. Nenhum eco.

    — Isso tem que parar… — disse para si mesmo. — Se ninguém for sujo o suficiente pra vencê-lo… eu serei.

    Virou-se e desceu as escadas, o sobretudo negro balançando com o vento cortante da madrugada.

    Meia hora depois – Distrito Desconhecido, Subsolo da Zona Sul

    A entrada era escondida atrás de uma loja de eletrônicos abandonada. Um elevador enferrujado levava a um complexo subterrâneo onde viviam os membros da infame Gangue de Gondon — criminosos, traficantes, mercenários, mas também informantes, técnicos e especialistas em operações ilegais.

    Enzo entrou sem hesitar.

    Os olhares desconfiados dos capangas não o intimidaram. Ele caminhava com um passo firme, a expressão mais gélida do que nunca. Seus olhos buscavam apenas um homem.

    Eli Jang.

    Encontrou-o sentado em uma sala repleta de computadores, telas e arquivos. Parecia um general no meio do caos. Vestia-se como sempre: camisa social, suspensórios, um cigarro aceso entre os dedos, o olhar clínico e impassível.

    Ao ver Enzo, ergueu uma sobrancelha.

    — Ora… finalmente resolveu aparecer.

    Enzo fechou a porta com força. Foi direto ao ponto:

    — Preciso de você.

    Eli deu uma tragada lenta.

    — Engraçado. Todos precisam de mim. Mas nem todos têm o que eu quero em troca.

    Enzo não sorriu.

    — Liberdade.

    Os olhos de Eli brilharam por um instante.

    — Continue.

    — Eu sei que você tá preso nesse porão de ferro, fingindo comandar o submundo quando, na prática, é um prisioneiro. Os olhos do Charles estão em todo lugar. Você não respira sem ele saber.

    Eli apertou os lábios. Não respondeu de imediato.

    — Quero derrubá-lo. — Enzo continuou. — E não vou fazer isso jogando limpo. Quero envenenar o rei com o próprio veneno. Mas pra isso… preciso de você.

    Silêncio.

    Eli se levantou. Aproximou-se com calma.

    — Isso é mais que perigoso, Enzo. É suicídio.

    — Eu já tô morto por dentro. E se ele vencer… o mundo inteiro morre com a gente. Só que aos poucos.

    Eli o encarou por longos segundos.

    — Você quer minha inteligência. Meus contatos. Minha estrutura. E os homens de Gondon.

    — Sim. — Enzo não hesitou.

    — E o que me garante que não vai me entregar no final?

    — Nada. — Enzo falou seco. — Mas se eu cair, você volta a ser o rato que ele alimenta e depois descarta. Se vier comigo, você será o homem que desafiou o rei e sobreviveu.

    Eli deu um sorriso de canto. Um sorriso amargo.

    — E o que exatamente você tem pra me oferecer agora?

    — A única coisa que você não tem. — Enzo se aproximou. — Um plano.

    Puxou um pen drive do bolso. Jogou sobre a mesa.

    — Isso é só a primeira camada. Mapas, rotas, registros das movimentações financeiras de empresas associadas ao Charles. Rastreamos três contas fantasmas com movimentação em criptomoedas que ligam diretamente ao Instituto Hargen, fachada científica onde ele esconde parte dos experimentos. E mais: nomes. Pessoas-chave. Membros da elite que ainda fingem neutralidade. Todos marcados.

    Eli sentou-se lentamente, puxou o pen drive, encaixou em um dos terminais. Os olhos varreram os dados na tela.

    — Você trabalhou com a Sophie nisso?

    — Não. Só eu, Ben e Hayato. A Sophie tá carregando o mundo nas costas. Isso aqui… é coisa suja. Ela não pode se envolver. Ainda não.

    Eli digitava, em silêncio. O brilho das telas refletia em seu rosto. Os olhos atentos, o cérebro processando a informação como uma máquina.

    Depois de alguns minutos, ele tirou o cigarro, jogou fora, se levantou.

    — E se eu aceitar… o que vai acontecer com a Gangue de Gondon?

    — Vocês desaparecem. Deixam de ser procurados. E passam a operar como agentes livres. Sem Charles. Sem interferência.

    — Isso é impossível.

    — Não é. Eu garanto o respaldo da Yuki Corporation. Através de contatos do Ben. Eles lavam os nomes de vocês e transferem os dados judiciais pro Bloco Norte. O sistema deles não se comunica com o daqui. A ficha de vocês… some.

    Eli sorriu. Mais largo dessa vez.

    — Você realmente quer fazer isso acontecer…

    Enzo estendeu a mão.

    — Mais do que tudo.

    Eli a encarou por longos segundos.

    Depois… apertou.

    — Então que comecem as apostas, Enzo.

    — E que o Charles… sinta o gosto da própria arma.

    No alto de um prédio, câmeras rotativas…

    Charles observava.

    Imagens holográficas dos últimos movimentos de Enzo giravam diante dele.

    Ele sorriu. O dedo tocou a imagem de Eli.

    — Até você, Jang?

    Fechou os olhos. Riu baixo.

    — Venham todos. Me cerquem.
    — No fim… eu ainda estarei no centro.

    ….

    A sala subterrânea da Gangue de Gondon estava em completa atividade. Computadores piscavam, mapas digitais se atualizavam em tempo real e vozes se sobrepunham, cada uma trazendo uma peça nova ao tabuleiro do caos. No centro de tudo, Enzo, Eli Jang e Samuel estudavam o plano que poderia colocar Charles de joelhos pela primeira vez.

    Eli apontava para uma projeção 3D da região de Sendai, destacando um enorme complexo empresarial cercado por paredes à prova de explosão e sistemas de vigilância autônoma.

    — Esse aqui e a GHV. Supostamente uma empresa de modelos do Charles

    Samuel, com os olhos semicerrados, balbuciou:

    — Lavagem de dinheiro, financiamentos ocultos, experimentos humanos… e ligações diretas com o Charles.

    Enzo cruzou os braços.

    — E quem administra tudo isso, sem levantar suspeitas, é um dos “reis esquecidos” da Primeira Geração: Renjiro Hoshizaki. Um nome que quase sumiu da história.

    Eli completou:

    — Um fantasma. Alguém que fingiu neutralidade durante as guerras, se afastou das discussões políticas, e hoje vive como um lorde moderno no topo de uma fortuna suja. Trabalha para Charles desde o início da nova era.

    Enzo se inclinou sobre a mesa.

    — Vamos tirá-lo do jogo. Quebrar a estrutura que sustenta os cofres do Charles. Samuel, você vai comigo e com o Eli. Essa missão não vai ser só infiltração: vai ter sangue.

    Samuel sorriu de lado.

    — Perfeito. Não faço nada discreto mesmo.

    Região de Sendai – Três dias depois

    Chovia. O céu de Sendai estava cinza e opressor. Raios riscavam o horizonte, e a cidade parecia sufocar em um silêncio tenso.

    Vinte andares, três torres acima do solo, e uma segurança digna de bunker militar. Mas Eli havia passado os últimos quatro anos estudando suas fraquezas.

    Dentro de uma van preta estacionada a três quarteirões do local, os três se preparavam.

    Samuel vestia um uniforme negro colado ao corpo, repleto de pequenos compartimentos com equipamentos de alta qualidade

    Eli usava luvas táteis conectadas à rede paralela que invadira a infraestrutura digital da GHV.

    Enzo estava quieto, com um coldre embutido no casaco, carregando a famosa pistola G-40 modificado para tiros de energia silenciada.

    — Hora do show. — Eli disse, e digitou o código. As luzes de três quarteirões piscavam e caíram. Um blackout programado.

    Eles saíram da van em sincronia.

    Infiltração no Complexo GHV

    Atravessaram o perímetro externo escalando a parede lateral coberta de sensores ópticos. Eli os desativara por 20 segundos. Tempo suficiente.

    Samuel, como uma sombra viva, neutralizou os dois primeiros guardas com agulhas de sôro neural. Rápido, silencioso, cirúrgico.

    O grupo entrou pelos corredores internos.

    Enzo liderava, sua expressão tensa, mas seus movimentos eram precisos. Ele sabia que não haveria segunda chance.

    — Subsolo 9 é onde o Renjiro faz as reuniões privadas. — Eli cochichou. — Atravessamos os corredores C e D, descemos pela tubulação B2. Tem um ponto cego no scanner ocular. Só dura 8 segundos.

    Chegaram ao local. O som das botas nos corredores ecoava fraco. Cada esquina podia ser uma armadilha.

    Quando alcançaram o Subsolo 9, encontraram a sala de conferência blindada com dois soldados na porta.

    Samuel não esperou a ordem.

    Pulou contra um deles, o arremessando contra a parede com um estalo seco. O outro tentou sacar a arma, mas Enzo atirou com perfeição: um tiro limpo na perna, outro na mão. Silêncio. Rapidez.

    Eli digitou um código extraído de antigos arquivos do sistema. A porta se abriu com um chiado.

    Dentro da Sala de Conferência

    Renjiro Hoshizaki, um homem alto de cabelos brancos penteados para trás e vestindo um terno impecável, estava sentado calmamente em frente a uma mesa holográfica.

    Ele nem se levantou.

    — Tinha certeza que vocês viriam cedo ou tarde. — Sua voz era grave e entorpecente, quase hipnótica.

    Enzo apontou a arma para ele.

    — Acabou, Renjiro. Descobrimos tudo. Os desvios da GHV, os experimentos financiados por você, a sua ligação com o Charles.

    Renjiro sorriu.

    — Vocês são crianças brincando de revolução. Acharam mesmo que poderiam enfrentar o criador do sistema?

    Samuel se aproximou.

    — Você não é criador de nada. É só mais um covarde escondido atrás de cifras.

    Renjiro se levantou com lentidão. O olhar agora era o de um predador.

    — Então me matem. Se têm coragem.

    Eli cruzou os braços.

    — Não. Nós não queremos sua morte.

    Renjiro arqueou a sobrancelha.

    — Então o que querem?

    Enzo respondeu:

    — Sua humilhação. Vamos vazar tudo. Nomes, arquivos, cópias de transações, gravações de voz. Você vai ruir publicamente. O império que construiu… vai ser devorado.

    Eli conectou um pequeno transmissor ao servidor central da sala.

    — Dados sendo enviados para 112 servidores seguros espalhados pelo mundo. Em trinta minutos, todas as redes abertas do continente vão noticiar a verdade sobre Renjiro Hoshizaki.

    Renjiro abaixou a cabeça. Pela primeira vez… ele pareceu pequeno.

    Retorno ao Subterrâneo da Gangue de Gondon

    Horas depois, Eli, Samuel e Enzo retornaram ao QG. A cidade inteira já comentava o escândalo.

    — Um rei caiu. — Enzo disse, exausto, mas satisfeito.

    Eli acenou.

    — E Charles… começa a sangrar.

    Samuel sorriu.

    — Um por um. Até sobrar só ele.

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