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    A chuva fina da madrugada ainda deixava o asfalto da rua 25 reluzindo sob as luzes alaranjadas dos postes, quando Sophie caminhava sozinha para a escola. O ar frio da manhã carregava o peso da ansiedade. Desde a captura de Yoru e Wallace, nada parecia normal. Nem mesmo o som das conversas no portão da escola, nem o sorriso preguiçoso de alguns colegas. Tudo soava abafado, distante.

    No corredor central da Escola 25, Sophie encontrou Ben encostado no bebedouro, com uma pasta repleta de anotações. Ele levantou o olhar quando a viu se aproximar.

    — Dormiu alguma coisa? — ele perguntou, a voz grave denunciando preocupação.

    — Se dormir conta como fechar os olhos e pensar em como tirar o Yoru daquela prisão… então sim — ela respondeu com sarcasmo, mas o tom carregava exaustão.

    Poucos minutos depois, Leonard e Hiroshi chegaram. Leonard sempre mantinha o rosto sério, mas naquela manhã parecia ainda mais tenso. Já Hiroshi mantinha o costumeiro olhar analítico, como se cada movimento das pessoas ao redor fosse parte de um tabuleiro de xadrez.

    — Descobriu alguma coisa? — Sophie perguntou, olhando diretamente para Hiroshi.

    — Nada concreto — ele respondeu, ajustando os óculos. — Mas se o Charles ainda está por trás, é óbvio que eles estão fora do alcance comum. Precisamos ir onde a polícia não vai.

    Ben abriu a pasta, revelando um mapa de Tokyo com várias marcações vermelhas. Uma delas destacava a Rua 12, conhecida por ser território neutro, mas cheia de figuras suspeitas.

    — O Ash pode saber algo — Ben sugeriu. — Ele sempre ouve coisas que não devia.

    Cena — Rua 12

    A Rua 12 tinha uma atmosfera pesada, onde os cheiros de comida de rua, óleo queimado e fumaça de cigarro se misturavam. A luz do sol mal alcançava o chão, bloqueada por prédios estreitos e sujos. Pessoas observavam das janelas, enquanto alguns motociclistas passavam devagar, avaliando rostos desconhecidos.

    O grupo encontrou Ash sentado na calçada, com um cigarro preso entre os dedos e os olhos semicerrados como se cada piscada fosse uma preguiça calculada. O cabelo castanho desgrenhado e o casaco surrado faziam parte da sua marca registrada.

    — Long time no see, Sophie — ele disse com um sorriso torto. — Mas não é dia de visita de colegiais.

    Sophie cruzou os braços.
    — Precisamos saber onde o Charles está mantendo dois amigos nossos.

    Ash soltou a fumaça devagar, olhando para os quatro como quem mede o valor de cada um.
    — Vocês sabem que não é assim tão simples. O homem controla metade da cidade. E quando ele decide esconder alguém… é como enterrar um segredo no fundo do mar.

    Hiroshi deu um passo à frente.
    — Então nos dê ao menos uma pista.

    Ash inclinou a cabeça.
    — Pista eu não tenho… mas ouvi rumores de movimentação na zona industrial velha. Não sei se é isso que procuram, mas… — ele deu um sorriso irônico — eu não iria lá se quisesse viver muito.

    Cena — Escola 25, manhã seguinte

    A sala estava barulhenta até a professora entrar. Um clima diferente pairava, algo que Sophie percebeu assim que a professora anunciou:

    — Temos dois novos alunos. Vieram de longe, então espero que sejam bem recebidos.

    As portas se abriram, e dois jovens entraram. O primeiro, alto, com cabelo preto levemente bagunçado, vestindo um casaco marrom claro sobre uma camiseta branca simples, mas com uma postura de quem sabia exatamente o espaço que ocupava. Óculos escuros cobriam seus olhos, mas o sorriso confiante denunciava seu temperamento.

    — Este é Vini Jin — disse a professora.

    Atrás dele, uma garota loira de olhos azuis claros, usando um sobretudo cinza claro e luvas pretas. Seu olhar era frio, mas curioso, como se analisasse tudo à sua volta.

    — E esta é Neom.

    Sophie sentiu um arrepio. Não era comum ver gente de Ōtsu por ali, ainda mais com aquele ar misterioso.

    Vini Jin falou com um tom casual:
    — É um prazer, mas não se incomodem em fazer perguntas demais.

    Neom não disse nada, apenas sorriu de canto.

    Cena — Torre principal da GHV

    Enquanto isso, no alto do prédio mais luxuoso da cidade, Charles observava o skyline de Tokyo pela parede de vidro. O escritório era amplo, com uma decoração que misturava arte moderna e relíquias caras. Ele falava ao telefone, resolvendo detalhes sobre uma campanha de suas modelos mais famosas, até que um de seus capangas entrou apressado.

    — Chefe… — o homem hesitou, olhando para o chão. — Duas crianças de Ōtsu foram vistas na Escola 25.

    Charles tirou o charuto da boca, soltando a fumaça lentamente, e virou-se com um sorriso gelado.
    — Crianças de Ōtsu… Isso só pode significar uma coisa.

    — O que o senhor quer que a gente faça? — o capanga perguntou, tentando esconder o nervosismo.

    — Elimine-os. Hoje. — Charles se aproximou, tocando o ombro do homem com força suficiente para passar a mensagem. — Se eles são alunos de quem eu penso… não podem dar um passo sequer nessa cidade.

    O capanga engoliu seco e saiu. Charles voltou a olhar pela janela, um brilho predatório nos olhos.

    A manhã seguinte na Escola 25 estava estranhamente silenciosa. Não era o silêncio natural de um dia preguiçoso, mas sim aquele que pesa nos ombros, como se todos carregassem um pressentimento ruim. Sophie estava encostada na grade da varanda do segundo andar, olhando para o pátio. O vento frio cortava seu rosto e bagunçava suas mechas loiras. Desde a chegada dos dois novos alunos, ela sentia uma pressão no peito. Algo neles não se encaixava — e Sophie não era do tipo que ignorava instintos.

    Lá embaixo, Neom e Vini Jin caminhavam lado a lado, conversando baixo. Ele, alto e de postura impecável, usava um par de óculos escuros que refletiam a luz fraca do sol da manhã, com um terno casual e tênis brancos, mesclando classe e insolência. Ela, uma loira de olhos cortantes, tinha um olhar que pesava sobre tudo ao redor como se analisasse cada detalhe. Mesmo cercados de olhares curiosos dos alunos, agiam como se nada ali fosse digno de atenção.

    Sophie decidiu que começaria pela garota.
    No intervalo, encontrou Neom sozinha, apoiada no corrimão do prédio de ciências, mexendo no celular.

    — Você é Neom, certo? — disse Sophie, aproximando-se devagar, medindo a reação dela.
    — Sou. — Neom não olhou para cima, mas um pequeno sorriso se formou. — E você é Sophie… difícil não reconhecer a antiga líder da Escola 12.
    O corpo de Sophie enrijeceu. — Como você sabe disso?

    Neom guardou o celular no bolso e finalmente encarou Sophie. Seus olhos tinham algo de perigoso, mas também… familiar.
    — Eu conheço muita coisa, Sophie. Mais do que imagina. — Ela se apoiou no corrimão, inclinando o corpo para frente, olhando o pátio vazio. — Eu vim até Tokyo por dois motivos: conhecer Yoru… e dizer algumas coisas importantes a ele.

    Sophie a observou com atenção. — E como você ficou sabendo do que aconteceu com ele?
    — Eu fiquei sabendo do sequestro no dia em que pisei nessa cidade. — A voz de Neom se tornou mais grave. — E Vini veio comigo… não porque conheça Yoru, mas porque alguém pediu para procurá-lo. Esse “alguém” acredita que Yoru é a chave de tudo.

    Sophie estreitou os olhos. — “Chave de tudo”? O que isso significa?
    Neom apenas sorriu de forma vaga, como quem sabia muito mas não pretendia dizer. — Significa que vocês não têm ideia da guerra que está prestes a começar.

    Em outro lugar, muito distante da Escola 25…

    Yoru acordou pela segunda vez desde que foi sequestrado. O ar estava pesado, frio e úmido. A sala era completamente branca, exceto pelo metal gelado da porta. Ele estava sentado no chão, encostado contra a parede, completamente nu. O frio queimava sua pele. Seu cabelo… raspado.

    Ao lado, Wallace permanecia desacordado, respirando de forma irregular. Em cima de uma mesa, seringas, frascos e medicamentos de nomes que Yoru nunca tinha visto. Ele tentou se lembrar do que acontecera… nada. Apenas flashes confusos: luzes, vozes distantes, dor e depois escuridão.

    Ele olhou para os próprios braços. Pequenas marcas de agulha. Um arrepio percorreu sua espinha.

    — O que diabos… — sussurrou, a voz quase sem força.

    Passos ecoaram do corredor. Yoru recuou até bater as costas na parede, o coração disparando. Mas a porta não se abriu. Apenas o som, e depois… silêncio absoluto outra vez.

    Na cidade, em uma lanchonete perto do centro, Bunkjae, Philips e Kaito estavam reunidos em uma mesa encostada na janela. O cheiro de óleo e café velho impregnava o ar. Bunkjae mastigava devagar um hambúrguer, enquanto Philips bebia seu refrigerante de forma inquieta.

    — O Yoru era nossa maior carta — disse Bunkjae, limpando a boca com um guardanapo. — Sem ele, a Escola 25 virou… uma piada.

    Kaito riu sem humor. — Piada? Eu chamaria de piada de mau gosto. Temos poder, sim, mas não conseguimos encostar em caras que já estão fora do mundo escolar. Esses delinquentes mais velhos… eles jogam outro jogo.

    Philips apoiou o cotovelo na mesa e falou baixo, olhando para fora. — E o pior… é que ninguém sabe onde ele tá. Charles não é burro. Ele não vai deixar rastros.

    O silêncio caiu sobre eles. Apenas o som dos talheres e das conversas distantes dos outros clientes preenchia o ambiente. Cada um ali sabia que, sem Yoru, eles não tinham como contra-atacar. E, mesmo que tivessem… não era certeza de que sobreviveriam.

    Enquanto isso, no prédio principal da GHV, Charles estava sentado atrás de uma mesa imensa de madeira escura, revisando contratos e ordens relacionadas às suas modelos. A sala, cercada de janelas panorâmicas, oferecia vista para quase toda Tokyo. Ele vestia um terno impecável, o cabelo perfeitamente alinhado para trás.

    A porta se abriu e um de seus capangas entrou, apressado.

    — Chefe, notícia rápida… duas crianças de Ōtsu apareceram em Tokyo.

    Charles levantou os olhos, o rosto frio como gelo.
    — Duas crianças…? — repetiu lentamente. — E por acaso… são alunos de uma certa pessoa?

    O capanga hesitou. — É possível. Ainda não confirmamos.
    Um sorriso quase imperceptível se formou nos lábios de Charles. — Então não perca tempo. Quero eles eliminados… hoje.

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