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    Gion não conseguiu deixar de se sentir angustiado.

    Ele conhecia os Cavaleiros do Leão Negro desde a infância. Não apenas ouviu os rumores a respeito deles, como também já havia conhecido alguns. Ainda em sua juventude, desistiu de disputar o posto de Patriarca e, em vez disso, passou a vagar pelo mundo. Durante suas viagens, chegou a se hospedar no Castelo do Leão Negro, localizado nas profundezas do Monte Uklas.

    “Eles são, com certeza… necessários.”

    O clã Lionheart era uma das famílias mais prestigiosas de todo o continente. E não apenas isso. Ao manter sua tradição peculiar, havia expandido significativamente, e no centro desse gigantesco clã Lionheart estava a família principal. Para se manter nessa posição, era inevitável que a família principal precisasse de pessoas dedicadas a fazer o trabalho sujo e pesado.

    O clã Lionheart não era o único que criava esse tipo de ‘cão de caça’.

    “Mas a Ciel…”

    Gion não tinha nenhuma hesitação em se tornar um membro dos Cavaleiros do Leão Negro. Essa fora uma decisão que ele tomara por si mesmo, e queria ajudar seu irmão, o Patriarca, mesmo que isso significasse pisar nas trevas. Além disso, como a ambição de Gilead ia contra a rigidez tradicionalista do Conselho, ao se tornar um Leão Negro, Gion esperava servir como uma ponte entre o Conselho e a família principal.

    Fosse um trabalho sujo ou cruel, algo que o obrigasse a sujar as mãos de sangue, Gion faria o que fosse necessário se assim lhe fosse exigido. E não pelo clã Lionheart, mas sim por seu irmão, o Patriarca, e por sua família.

    Gion acreditava que bastava apenas ele ocupar esse papel. Quanto a Ciel, sua pequena sobrinha, ele não queria que ela desse um passo sequer nesse tipo de caminho. Não sabia o que Ciel desejava para si mesma, mas quanto a ele… queria que sua sobrinha, que o seguia por todo lado chamando-o de tio desde que era uma pirralhinha com o nariz escorrendo, pudesse ter uma vida pacífica, livre do cheiro de sangue.

    E isso não valia apenas para Ciel. Cyan, Eugene… e Eward também. Gion nunca se casara nem tivera filhos, e via cada um de seus sobrinhos e sobrinha como se fossem seus próprios filhos.

    “Eward… Por que diabos você recorreria à magia negra…?”

    — Gion — uma voz o chamou.

    Enquanto estava perdido nesses pensamentos amargos, Carmen de repente falou enquanto caminhava à sua frente.

    — Você se arrepende de ter entrado para os Cavaleiros do Leão Negro? — ela perguntou.

    — Como eu poderia? Não é isso, Dama Carmen — Gion respondeu com um sorriso amargo.

    Assim como Gion cuidava dos filhos de Gilead desde que eram pequenos, Carmen também o havia acompanhado durante sua infância. Apenas algumas décadas atrás, Carmen ainda vivia na propriedade principal, e o jovem Gion vivia a seguindo, chamando-a de tia.

    Seu espírito aventureiro também fora algo que herdara de Carmen.

    — Esse tipo de missão não acontece com frequência — ela o lembrou. — Embora você já devesse saber bem disso.

    — Sim, senhora — Gion assentiu diante do lembrete.

    Missões que exigiam a presença direta de alguém no nível de um capitão eram raras. A maioria dos campeões que lideravam os Cavaleiros do Leão Negro quase nunca deixava o Castelo do Leão Negro.

    A situação atual, em que o filho mais velho do Patriarca tentava aprender magia negra, era séria o bastante para exigir a ação de um capitão dos Cavaleiros do Leão Negro.

    — Então, o que acha que é a verdade por trás disso tudo? — Carmen pediu sua opinião.

    — Parece que o Mestre da Torre Negra não está envolvido — Gion admitiu com hesitação. — Na verdade, parece que ele falou a verdade… alguém à margem está tentando provocar discórdia.

    — Amelia Merwin — Carmen cuspiu o nome de repente. — Suspeito que seja ela. É alguém que também quer manter Balzac Ludbeth sob controle. O Rei Demônio do Encarceramento não é conhecido por reprimir a vontade dos magos negros com quem faz contrato. Ele também não interfere nas disputas internas entre seus subordinados.

    — Se Amelia for a mentora desse plano, isso não significaria que Nahama está por trás disso?

    — Ultimamente, os movimentos de Nahama têm sido suspeitos. O sultão Alabur é um porquinho jovem com muita ambição. Provavelmente vai declarar guerra nos próximos anos.

    Guerra. Essa palavra fez os olhos de Gion ficarem frios. O Reino do Deserto de Nahama há muito tempo almejava ser chamado de império.

    — Você está dizendo que eles vão entrar em guerra com Kiehl? — Gion questionou.

    — Provavelmente vão atacar Turas primeiro — corrigiu Carmen.

    O Império de Kiehl fazia fronteira com Nahama. A relação entre os dois países não era hostil, mas Nahama frequentemente arranjava brigas com seu vizinho ocidental, o Reino de Turas.

    — Mesmo sem um casus belli1? — Gion perguntou, curioso.

    — Se precisarem de um casus belli, podem simplesmente inventar um. Mas se Nahama atacar Turas, Kiehl também precisará se preparar para a guerra. E, é claro, como parte dessa ‘preparação’, o clã Lionheart também será convocado — especulou Carmen.

    — Então, para se antecipar a isso, Amelia deu o primeiro passo para criar divisão dentro do clã Lionheart. É isso que você acha?

    — Mesmo que isso não leve a uma divisão imediata, já plantou a semente. De qualquer forma, como o falecido Gavid confessou, talvez tenha sido só um crime por impulso, sem nenhuma conspiração por trás. Mas… não podemos ter certeza. Por isso precisamos desconfiar. — Carmen estreitou os olhos e continuou: — Ouvi dizer que Eward nem sequer conhecia Gavid. Quando o vi na infância, achei que Eward parecia bastante inteligente. Será que o Patriarca não tem qualificação para educar os próprios filhos?

    — …Ele só queria acreditar nos filhos — Gion suspirou.

    — Um chicote para o cavalo, um freio para o burro, e uma vara para as costas dos tolos. Mas não adianta dizer isso agora, depois que tudo já aconteceu. Em vez do herdeiro mais velho, Eward, parece que o próximo Patriarca será Cyan — disse Carmen, voltando o olhar para a prisão que haviam acabado de deixar. — …Gion. Hipoteticamente, o que teria acontecido se não tivéssemos ignorado a provocação do Balzac lá atrás?

    — Teria causado uma bela crise — concluiu Gion, com seriedade.

    — Não diga algo tão óbvio. Estou perguntando se poderíamos tê-lo matado.

    — …Não acho que o que ele disse foi um insulto merecedor de morte. Do ponto de vista do Mestre da Torre Negra, ele também tinha razão em se sentir incomodado. Mas… se tivéssemos que lutar com ele, tirando você, o resto de nós teria morrido ali.

    — Você está sendo modesto demais.

    — Não sou muito bom em lutas contra magos — respondeu Gion com um sorriso constrangido.

    — Assim como você, eu também não tinha confiança suficiente. Por isso não entrei em briga — admitiu Carmen com um estalo de língua, enquanto tirava seu relógio de bolso.

    1. ‘Casus belli’ é uma expressão do latin que significa ‘ocasião para a guerra’ ou ‘motivo para a guerra’.[]
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