Capítulo 139: O Deserto (9/13)
Fsshhhhh… krrrrhh… whuuuuuh… tchkkk…
O som que o verme de areia fez foi longo, arrastado e ecoante.
Com um estrondo, o vento foi lançado para longe quando Wynnyd explodiu um buraco na lateral da criatura. Eugene se agarrou com força a si mesmo enquanto seu corpo era arremessado para fora do buraco.
Ao seu redor, havia escuridão total. Mas isso era esperado. Afinal, ele havia rastejado pelo corpo longo e sinuoso do verme de areia e aberto um buraco na extremidade da cauda antes de ser expelido por ali. Como o verme havia emergido debaixo da areia movediça, o local de onde ele viera, e onde Eugene agora estava, ficava, obviamente, nas profundezas subterrâneas.
— Ugh — Eugene gemeu ao se levantar de onde havia caído.
Tinha sido arremessado por uma boa distância. Eugene teve sorte por não ter batido em nenhuma parede ou montanha de areia durante o voo. Ele estava preparado para ser soterrado no pior dos casos, mas, como previra, isso não aconteceu.
O feitiço de invocação havia trazido apenas o terreno de areia movediça e a tempestade de areia. O verme, em si, não havia sido invocado. Ainda que pudesse ter sido atraído, aquele verme de areia já habitava o subsolo do deserto desde antes.
Sendo assim, obviamente haveria um ninho de verme de areia nas profundezas. E o lugar onde Eugene se encontrava agora era exatamente esse ninho. Ele olhou ao redor com uma expressão de nojo.
A primeira coisa que Eugene olhou foi para cima. Ainda conseguia ver a cauda do verme se contorcendo e se movendo. Ele havia esculpido um novo ânus para o verme, mas será que aquilo era o suficiente para matá-lo? Não fazia ideia. De qualquer forma, graças à criatura, Eugene conseguiu mergulhar no subsolo como esperava.
Os túneis sob o deserto eram… vastos. Mas isso também já era esperado. Foram criados pelos vermes de areia escavando com seus corpos imensos. Minhocas pelo menos tornariam o solo fértil no processo, mas os vermes de areia não traziam benefício algum.
Essas criaturas sugavam toda a água do subsolo, drenando qualquer oásis. Depois, os fluidos corporais que excretavam solidificavam a areia enquanto cavavam, criando esses sistemas de túneis complexos e inúteis sob o deserto.
Isso significava que o verme de areia era apenas um monstro inútil e cruel. Esse ninho poderia ter sido uma fonte de água que daria origem a um oásis, mas agora não restava nem uma gota.
Neste deserto, apenas um grupo de pessoas era capaz de encontrar um uso engenhoso para esses vermes inúteis.
Os magos.
Quando magos atingiam certo nível de poder mágico e passavam a ser chamados de Arquimagos por todos ao redor, frequentemente começavam a pensar em criar coisas chamadas ‘calabouços’1. Talvez para exibir sua superioridade, ou para se dedicar a pesquisas que não queriam que ninguém descobrisse… a razão era incerta.
Esses calabouços eram uma forte expressão do típico temperamento excêntrico dos magos, e o tipo mais conhecido de calabouço era o ‘labirinto’. Os vastos desertos vazios ofereciam um ambiente ideal para combinar com os projetos de calabouços e labirintos dos magos.
Construtores de Calabouços.
A maioria dos monstros eram ameaças nocivas e inúteis para os humanos, mas os vermes de areia eram adorados pelos magos que escolhiam se estabelecer em desertos. O apelido de ‘construtores de calabouços’ foi dado a esses vermes por tais magos.
— Depois de invocá-los, eles vão cavar sob o deserto por conta própria e criar um labirinto pra você. E nem demora tanto assim. Uns dez dias, no máximo? Se você simplesmente os deixar em paz durante esse tempo, eles criam um labirinto subterrâneo bem complexo. E se houver um veio de água por perto, eles ainda cuidam disso pra você. Como também eliminam toda a vida selvagem da superfície e do subsolo, como poderiam ser mais convenientes? É só deixá-los trabalhar e, quando o tempo certo chegar, você desce, extermina os vermes e reforça o labirinto com magia…
— E daí? Você tá pensando em ir pro deserto depois e fazer um labirinto pra morar?
— Tá maluco? Eu não tenho nada pra esconder, por que diabos ia querer morar no fundo do deserto?
Enquanto se lembrava de uma conversa que tivera há muito tempo, Eugene avaliava a profundidade da queda. Enquanto fazia isso, puxou seu mapa e o abriu. Embora tivesse caído em um nível bem profundo do subsolo, a posição onde estava ainda aparecia marcada no mapa.
“Parece que… tem um caminho.”
A sorte de Eugene era boa.
Não, não tinha como ser só isso. O rosto de Eugene se contorceu. Pelo que indicava o mapa, aquele caminho subterrâneo seguia direto para a região onde ficava a antiga cidade natal de Hamel. Isso podia mesmo ser chamado de sorte?
Bem, o deserto era vasto, e ainda era incerto se aquele túnel realmente o levaria até sua antiga cidade natal.
Dito isso, Eugene ainda não podia baixar a guarda. O feitiço de invocação havia sido lançado de um ponto profundo no subsolo, e o local da emboscada ainda estava próximo. Se os Xamãs da Areia de Nahama estavam usando aquele ninho como calabouço, ele poderia acabar cruzando com um deles, ou com algum Assassino, em algum momento mais à frente.
Mas até lá, não deveria haver problemas.
Ainda assim, havia o fato de que adiante estava a cidade natal de Hamel.
O túmulo de Hamel nunca foi revelado ao mundo. Não existiam registros sobre o que aconteceu com seu corpo. Mesmo no conto de fadas que Eugene encontrou no Salão de Sienna, não se dizia se o cadáver havia sido deixado em Helmuth ou se os companheiros de Hamel cuidaram dele de alguma forma.
Mas Eugene sabia que havia um túmulo. Se o túmulo de Hamel existia em algum lugar do mundo, o único lugar possível era a sua cidade natal. Sienna, Anise, Molon e Vermouth… Eugene não sabia o que eles pensaram ao cavar aquele túmulo, mas provavelmente não teriam deixado o corpo do companheiro morto largado em Helmuth.
A cidade natal de Hamel.
Foi lá que um garotinho comum perdeu sua família e tudo o que conhecia, e foi ali que nasceu o ódio que ele passou a nutrir pelos monstros e pelos Reis Demônios que os incitavam. A partir de então, Hamel largou as ferramentas de fazenda e passou a empunhar apenas armas. Passou a brandir a espada de forma impetuosa e se alistou em uma companhia mercenária que precisava de um carregador de acampamento.
Foi ali que Hamel nasceu.
“Se nunca foi revelado em centenas de anos, então deve continuar escondido.”
O subsolo era um esconderijo perfeito.
“Isso é só uma hipótese, mas o fato de Anise ter vindo a Nahama com o pretexto de uma peregrinação… bom… talvez ela só estivesse visitando meu túmulo para prestar homenagem.”
Mas será que Anise faria mesmo algo assim?
“O deserto de Kazani só surgiu há menos de duzentos anos. Se juntar esses fatos, a linha do tempo mais ou menos bate. Enquanto os Xamãs da Areia de Nahama estavam brincando por aqui, talvez tenham encontrado meu túmulo… e se o familiar da Sienna foi morto nesse processo?”
Se esse fosse o caso, então Nahama estaria envolvida no desaparecimento de Sienna? Ou seria Helmuth, que há tempos manipulava Nahama nos bastidores?
Eugene não podia afirmar com certeza. E por isso mesmo, precisava ver com os próprios olhos.
Ele avançou, sem tirar as mãos do manto onde ainda estavam mergulhadas.
- Qualquer fã de fantasia ou rpg deve reconhecer como Dungeons.[↩]
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