Capítulo 55: Aroth (4/7)
Terminando sua conversa com Gilead, Eugene deixou o cômodo. Enquanto descia o corredor, ouviu um som de batidas vindo de uma porta trancada.
— O que foi? — Eugene perguntou, sem demonstrar alarme, parando os passos.
Ele sabia de quem era aquele quarto. Era um dos quartos que Ciel estava usando. Desde que começara a passar por uma fase turbulenta da puberdade alguns meses atrás, ela havia parado de ir ao ginásio e passou a usar alguns quartos da mansão para treinar por conta própria.
— Você vai mesmo para Aroth?
Ciel não abriu totalmente a porta, deixando sua voz escapar por uma fresta.
— Foi o Cyan que te contou? — Eugene perguntou.
— Uhum. Ele também disse que você chegou à Terceira Estrela da Fórmula da Chama Branca.
— Então você já ouviu tudo, né.
— Eu perguntei se você vai mesmo pra Aroth.
— Vou sim, até já recebi permissão do Patriarca.
— Mas por que você quer ir? — ao dizer isso, Ciel bateu novamente na porta.
Toc toc.
Eugene sorriu e respondeu com algumas batidas também.
— Porque eu quero aprender magia — explicou.
— Se é isso, não precisa ir pra Aroth. Você pode chamar um mago da capital pra te ensinar — argumentou Ciel.
— Você sabe que eles não são tão bons quanto os magos de Aroth.
— Se você pedisse, o papai até chamaria um mago da corte real.
— Mas eu não acho que um mago da corte seja melhor em ensinar do que um mago de uma das Torres Mágicas de Aroth.
— Os magos da corte com certeza são habilidosos.
— Mas o que eu quero não é um mago habilidoso, e sim um que saiba ensinar bem — Eugene explicou pacientemente.
— Você precisa mesmo aprender magia? — Ciel perguntou, a voz ficando mais manhosa.
Ela abriu um pouco mais a porta e espiou para fora. Aos dezessete anos, restava pouco da expressão travessa de antigamente, mas aquilo era só aparência. Eugene conhecia bem a verdadeira personalidade ardilosa daquela garota.
Ciel insistiu mais uma vez:
— Você não precisa mesmo aprender magia, né?
— Mas também não tem nada de errado em aprender, tem?
— Se é magia que você quer, a magia espiritual não basta? Além disso, se você sair daqui, o meu irmão e eu talvez consigamos alcançar seu nível.
Era uma provocação descarada, mas Eugene apenas deu uma risada divertida.
— Se isso acontecer, melhor ainda pra mim — disse Eugene, com um sorriso.
— …O que tem de bom nisso?
— Isso só quer dizer que a família principal está ficando mais forte, e vai ser mais divertido lutar com vocês dois. Ah, embora já faça um bom tempo desde que treinei com você.
— Se eu começar a treinar com você agora, você fica aqui em vez de ir pra Aroth?
— Não, eu ainda vou.
— Idiota — Ciel xingou, fazendo um bico antes de puxar a cabeça de volta para dentro do quarto.
Até um momento atrás, Ciel estava imersa no treino, então o cabelo estava todo bagunçado e o corpo, suado. Ela não queria mostrar aquela aparência para ninguém, muito menos deixar que sentissem seu cheiro.
Após um breve silêncio, Ciel voltou a falar:
— …Quanto tempo você vai ficar fora?
— Só vou saber quando chegar lá — respondeu Eugene, de forma casual.
— Mas você deve ter uma ideia de quanto tempo vai levar.
— No mínimo, um ano.
— E por que você quer ficar tanto tempo? Mudar de casa vai dar trabalho, e o que você vai fazer em relação ao Sr. Gerhard?
Talvez por serem gêmeos, Ciel havia acabado dizendo a mesma coisa que Cyan.
— Meu pai vai ficar bem sem mim — Eugene respondeu.
— …O tio Gion vai ficar solitário — Ciel acabou dizendo, após hesitar um pouco.
— Isso pode ser verdade.
Eugene também gostava dos treinos frequentes com Gion.
— Já que eu não vou estar aqui, vocês dois deviam aproveitar e brincar bastante com ele — provocou Eugene.
— E o meu irmão? — Ciel mencionou Cyan de repente.
— O que tem o Cyan?
— Quero dizer que o meu irmão também gosta de treinar com você.
— Se ele realmente gosta de apanhar de mim, seu irmão deve ter um parafuso a menos.
— De qualquer forma, ele vai ficar solitário se você não estiver por perto. Mais cedo, enquanto conversava comigo, ele até confessou em segredo que não queria que você fosse embora.
— Mas eu ainda pretendo ir.
— Eu também preferia que você não fosse.
— Já disse que vou mesmo assim.
— Seu filho da puta.
Atrás da porta, o rosto de Ciel se contorceu em uma careta. Na família principal, Eugene era o único que deixava as palavras de Ciel passarem sem reagir. Ela espiou só para lançar um olhar fulminante e então bateu a porta com força.
— …Quando você vai embora? — a voz abafada de Ciel atravessou a porta.
Eugene respondeu:
— Amanhã.
— Por que tão rápido?
— Tem algum motivo pra eu adiar? Já que recebi a permissão do Gilead, é melhor economizar tempo e ir logo.
— Grosseiro. Não devia ao menos ter uma festa de despedida?
— Por que você ia querer fazer uma festa de despedida pra um grosso?
Batendo na porta novamente em forma de despedida, Eugene retomou seu caminho pelo corredor. Só depois de ele se afastar é que Ciel abriu a porta outra vez.
— Você vai mesmo embora amanhã?
Ao ouvir essa voz atrás de si, Eugene apenas acenou com a mão em resposta, sem se virar para encarar Ciel.
Desde que havia obtido a aprovação de Gilead, Eugene não demonstrava hesitação alguma em suas ações. Depois de voltar para o anexo, ele bateu na porta de Gerhard.
— Volte em segurança.
Embora tivesse sido informado de repente que Eugene partiria para Aroth no dia seguinte, Gerhard não perdeu muito tempo refletindo sobre isso antes de lhe dar sua bênção.
Não era que não se preocupasse com o filho, mas Gerhard também não queria restringir a liberdade de Eugene agora que ele havia crescido de forma tão esplêndida.
Gerhard advertiu o filho:
— Enquanto estiver lá, não ande com más companhias e não negligencie os estudos.
Eugene retribuiu:
— Mesmo sem mim por aqui, não vá fazer nada que não deve, pai, e não negligencie seus exercícios também.
Gerhard caiu na gargalhada com essa resposta. Ele havia se aprimorado bastante ao longo dos últimos quatro anos na sede principal. Tinha perdido muito peso e até ganhado bastante massa muscular. Isso se devia às suas caçadas regulares com os patriarcas dos ramos colaterais e às longas caminhadas que fazia nas vastas florestas da família principal.
— Além disso, se alguém tentar te causar problemas só porque eu não estou aqui, me escreva imediatamente. Não sofra calado à toa — insistiu Eugene.
Gerhard tentou acalmar o filho:
— Tenho certeza de que o Patriarca poderá dar atenção ao assunto se eu levar isso até ele.
— Mas não acha que seria melhor se fosse seu único filho quem cuidasse disso, em vez do ocupado Patriarca?
Gerhard sorriu em silêncio e deu um tapinha no ombro de Eugene. Aquele filho talentoso era seu orgulho e seu maior tesouro. Se não fosse por ele… Gerhard assentiu, relembrando os dias em Gidol, onde tinham vivido até poucos anos atrás.
Gerhard tentou suavizar a preocupação excessiva de Eugene:
— Eu só não quero ser um peso para você.
— Que peso? Não diga mais isso. Nunca, nem por um segundo, te vi como um fardo — respondeu Eugene, direto, cutucando o lado de Gerhard. — De qualquer forma, amanhã eu parto. Vou cuidar bem da minha saúde enquanto estiver fora, então você também cuide bem da sua, pai. Entendido?
— Tá bom, tá bom. Entendido.
Eugene agora era mais alto que Gerhard. Gerhard sorriu com felicidade ao olhar para o filho, que havia crescido tanto e se tornado tão maduro.
Naquela noite, Eugene e Gerhard, junto de todos os membros da família principal, sentaram-se ao redor de uma grande mesa. Até mesmo Ciel, que não aparecia nos jantares havia bastante tempo, estava presente, usando um belo vestido.
Apesar de não ser uma festa de despedida luxuosa, conseguiram ao menos organizar algo para que toda a família pudesse desejar a Eugene boa sorte em sua partida pelos próximos anos.
Diversos votos de sucesso foram trocados ao redor de uma mesa repleta de pratos sofisticados.
— Então você pretende mesmo aprender magia em Aroth… Já que você tem um talento tão incrível nas artes marciais, tenho certeza de que também será bom com magia — elogiou Ancilla.
A notícia de que Eugene havia alcançado a Terceira Estrela da Fórmula da Chama Branca fez Ancilla morder os lábios de frustração, mas o fato de aquele garoto monstruoso estar deixando a sede principal por um tempo era um consolo mais do que bem-vindo.
— Eu realmente invejo o Sr. Gerhard por ter um filho tão maravilhoso — lisonjeou Ancilla.
— Haha, é muita gentileza sua — Gerhard aceitou o elogio com uma risada.
Durante esses quatro anos, a postura de Ancilla não havia mudado muito desde quando se conheceram. Ela nunca teve intenção de criar inimizade com Gerhard, muito menos com Eugene. Ao contrário, sempre estendia a mão com um sorriso, cultivando um relacionamento amistoso com ambos.
Mas Tanis, a primeira esposa, mostrava uma atitude completamente diferente.
As olheiras de Tanis e as bochechas pálidas transmitiam uma impressão bastante desoladora. Nos últimos anos, Tanis mal saíra da mansão da família principal e reagia com extrema agitação até aos menores erros dos criados.
Tanis achava que não tinha escolha. Sentia-se cada vez mais encurralada com o passar dos dias. Eward não havia conseguido se tornar discípulo de Lovellian, como ela desejava, nem forjar conexões com magos influentes de Aroth. E como até mesmo Gilford e sua esposa, que eram próximos a ela, haviam deixado a sede há alguns anos, Tanis agora não tinha mais aliados por ali.
“Embora a culpa seja dela por ser tão ríspida”, Eugene desviou do olhar intenso de Tanis e focou em cortar sua carne.
Gilead nunca discriminou Tanis. Nem sequer obrigou Eward a voltar para casa apesar dos rumores negativos. Ao contrário, Gilead continuou oferecendo apoio para compensar as deficiências do filho.
Foi escolha da própria Tanis se isolar e atacar todos à sua volta.
Quando a refeição já se aproximava do fim, Tanis chamou de repente:
— Eugene.
Embora Ancilla sempre tratasse Eugene com cordialidade quando se encontravam, era a primeira vez no ano que a temperamental primeira esposa o chamava pelo nome. Na verdade, eles mal haviam conversado ao longo dos anos.
Tanis pediu:
— Quando chegar a Aroth, cuide do seu irmão mais velho, o Eward.
— … — Eugene não conseguiu responder de imediato àquelas palavras jogadas de repente e apenas piscou surpreso.
Tanis continuou:
— Ele deve ter se sentido solitário, vivendo em Aroth sozinho esses anos. …Eu sei que vocês não passaram muito tempo juntos como irmãos, mas o Eward ainda é seu irmão.
— …Sim, senhora — Eugene respondeu por fim.
— Você pode ser adotado, mas o Eward é seu irmão. Então, trate-o como um irmão mais novo deve tratar o mais velho — enquanto dizia isso, os olhos de Tanis desviaram para o lado. Ela prosseguiu, encarando Cyan e Ciel, que estavam sentados perto de Eugene: — …Cuide do seu irmão mais velho. Você consegue fazer ao menos isso, não consegue?
— …Vou fazer o possível — Eugene evitou prometer.
— Ora, irmã mais velha, está sendo insistente demais. Tenho certeza de que Eugene fará o que puder — Ancilla comentou com um riso educado, desviando o olhar de Tanis dos gêmeos.
Tanis lançou um olhar cortante para Ancilla, estreitando os olhos, e empurrou a cadeira para trás, levantando-se.
— Com licença. Estou exausta. Vou me recolher para descansar.
— …Está dispensada — Gilead assentiu, com uma expressão levemente perplexa.
Nos últimos anos, Eugene havia se aproximado bastante de Gilead. Por isso, era capaz de compreender bem a posição em que ele se encontrava.
“Como imaginei, o assento de Patriarca é mesmo um lugar de merda pra se ficar.”
Eugene jamais quis ser o Patriarca.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.